Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
51/16.3T8LLE.E1
Relator: ANTÓNIO JOÃO LATAS
Descritores: RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO
SANÇÃO ACESSÓRIA DE INIBIÇÃO DE CONDUZIR
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
Data do Acordão: 12/06/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário:
1. O artigo 141.º, nº 3, do C. Estrada prevê a possibilidade de suspender a sanção acessória de inibição de conduzir se o infrator, nos últimos cinco anos, tiver praticado apenas uma contraordenação grave, pelo que apesar de o arguido ter averbadas duas condenações por infração grave no Registo Individual de Condutor, importava verificar se ambas as condenações haviam sido praticadas nos últimos cinco anos, por referência à data da prática da infração ora em apreço e das infração anteriores.

2. Em matéria contraordenacional as finalidades da punição são essencialmente de prevenção negativa. Tanto de dissuasão geral (prevenção geral negativa), na medida em que se visa a dissuasão de todos os destinatários da norma, como de dissuasão especial negativa, ou seja, prevenção da prática futura de outras contraordenações por parte do infrator, dissuadindo-o através da respetiva sanção.

3. A conduta anterior do ora arguido, que beneficiou anteriormente da suspensão da execução da sanção acessória em duas condenações anteriores por contraordenação grave, dita o prognóstico de que aquelas mesmas finalidades não serão realizadas mediante a suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir aplicada nos autos.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora

I. Relatório

1. Nos presentes autos de recurso de impugnação judicial em matéria contraordenacional que correm termos na Secção criminal (J3) da Instância Local de Loulé da Comarca de Faro, A. veio impugnar judicialmente a decisão proferida em 25.03.2014 pela A.N.S.R., pela qual condenado no pagamento de uma coima no valor de €120,00, que pagou voluntariamente, pela prática da contraordenação prevista e punível pelos artigos 27.°, nºs l e 2 a), 138.°, 145.°, alínea b) e 147.°, todos do Código de Estrada, acrescida da sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 90 dias.

2. – Remetidos os autos aos serviços do MP, realizou-se Audiência de Discussão e Julgamento, após o que o tribunal a quo julgou parcialmente procedente o recurso interposto e, mantendo a decisão administrativa, condenou-o, na coima de €120,00, que por si já foi liquidada e alterar a decisão quanto à sanção acessória de inibição de conduzir condenando-o a cumprir a mesma pelo período de 75 (setenta e cinco) dias.

3. – Inconformado, recorreu o arguido para este Tribunal da Relação, extraindo da sua motivação as seguintes conclusões, que se transcrevem:
«EM CONCLUSÃO

I - Foi o arguido autuado pela prática de uma contraordenação grave.

II - No seu recurso da decisão da autoridade administrativa, o arguido insurgiu-se contra a medida concreta da sanção acessória de inibição de conduzir que lhe foi aplicada, de 90 dias, na medida em que, atenta a sua situação concreta, naquela decisão, é referido que tal implica que o limite mínimo da sanção acessória de inibição de conduzir aplicável, que no caso em apreço são 30 dias, seja elevada para o dobro - 60 dias -, concluindo, contudo, pela aplicação de 90 dias.

III - Existe assim uma contradição insanável entre a fundamentação que sustenta a decisão e a própria decisão, uma vez que, a respetiva fundamentação vai sentido da aplicação de 60 dias de inibição de conduzir, e não de 90 dias.

IV - Todavia, o Tribunal a quo, entendeu de forma diversa, considerando que, naquela decisão da autoridade administrativa "não se diz que apenas vai aplicar o mínimo. O que se diz é que os limites mínimos são elevados para o dobro", rejeitando parcialmente o recurso do arguido, aplicando-lhe a sanção acessória de inibição de conduzir de 75 dias.

v - O Tribunal a quo mesmo assim, andou mal, pois na verdade, conforme supra exposto, a concreta medida da sanção acessória a aplicar ao arguido e que resulta do próprio teor da decisão da autoridade administrativa, de acordo com a respetiva fundamentação são 60 dias, não podendo a medida da sanção ser modificada pelo Tribunal em prejuízo do arguido, violando a decisão da qual ora se recorre o disposto no artº 72º - A, do Regime Geral das Contraordenações e Coimas - Decreto-Lei 433/82, atualizado pelo Decreto-Lei 356/89 de 17110 e Lei n" 10912001, de 24/12.

VI - No que respeita ao pedido do arguido no sentido da suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir que lhe foi aplicada, vem o mesmo indeferido, na medida em que, considerou o Tribunal a quo que, atendendo ao facto de aquele ter averbadas no seu registo de condutor, pelo menos, mais duas contraordenações graves praticadas e sancionadas nos últimos cinco anos (ponto 6 dos factos provados), não é possível aplicar o disposto no artº 141º do Código da Estrada e, consequentemente, não é possível determinar a suspensão da inibição de conduzir, devendo o arguido cumprir os 75 dias de inibição de conduzir.

VII - Sucede que, inexistem na sentença quaisquer elementos sobre as datas em que foram as ditas contraordenações praticadas e sancionadas.

VIII - Pelo que, inexistindo qualquer prova, na sentença, sobre as datas exatas em que as ditas contraordenações ocorreram, sempre deverá considerar-se que existe insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

IX - Consequentemente, sempre deverá ser ordenada a suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir aplicada ao arguido, o que deverá ser feito com base no disposto no artº 141º do Código da Estrada, uma vez que se encontram reunidos todos os pressupostos legais para o efeito.

X - Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas, deverá a aliás douta sentença recorrida ser revogada, dando-se provimento ao recurso, devendo ser substituída por outra que reduza a medida da sanção acessória ao arguido para 60 dias, ordenando ainda a respetiva suspensão da sua execução, nos termos aliás do disposto no art° 1410 do Código da Estrada»

4. Notificado da interposição do presente recurso, o Ministério Público junto do Tribunal de 1.ª Instância pronunciou-se no sentido da sua improcedência.

5. Nesta Relação, a senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no mesmo sentido.

6. -Cumprido o disposto no n.º 2 do art. 417.º do Código de Processo Penal, o arguido nada acrescentou.

7. Sentença recorrida (Transcrição parcial):

«(…)
Produzida a prova e discutida a causa resultaram provados os seguintes factos:

1. No dia 19.08.2013, pelas 09 horas e 09 minutos, na EN396, km19,7, Poço da Amoreira, Loulé, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula MV, fora da localidade, pelo menos, à velocidade de 128km/h, correspondente à registada de 135 km/h.

2. O limite máximo permitido no local é de 90km/h.

3. A velocidade foi verificada pelo Radar Fotográfico Multanova MUVR-6FD n.005-06-2629, aprovado pelo IPQ, Desp. Aprov. Mod. N.Ol 1 1.20.06.3.43 de 01.10.2007 e aprovado para uso, despa. ANSR n.015919/2011, de 23.11.2011, verificação IPQ em 14.06.2012.

4. Com a conduta descrita o arguido revelou desatenção e irreflectida inobservância das normas de direito rodoviário, actuando com manifesta falta de cuidado e prudência que o trânsito de veículos aconselha e no momento se lhe impunham, agindo de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e sancionada pela lei contra-ordenacional.

5. O arguido pagou voluntariamente a coima.

6. O arguido tem averbado no seu registo de condutor duas contra-ordenações graves, praticadas e sancionadas nos últimos cinco anos.

7. O arguido trabalha como motorista de turismo e aufere quantia que se situa entre €500,00 a €600,00, sendo por isso essencial para o exercício da sua atividades a carta de condução.

8. É casado, tem um filho menor de idade e é considerado um bom profissional. Nada mais resultou provado com relevância para a decisão da causa.

Na fixação da factualidade em apreço, o tribunal teve em consideração o auto de contra-ordenação de fis.1, a prova fotográfica de fls.2 e o certificado de verificação de fls.3, o registo individual do condutor de fls.9 e seguintes e ainda o depoimento das testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento.

A testemunha AC autuante nestes autos confirmou o auto de notícia e todos os factos aí constantes, factos esses que nem sequer foram colocados em causa pelo arguido.

A testemunha TM conhece o arguido por ter sido seu colega de trabalho e esclareceu que o arguido necessita da sua carta de condução para exercer a sua profissão. Sabe que o mesmo tem de rendimentos quantia que se situa entre €500,00 e €600,00, que é casado e tem um filho menor e considera-o um excelente profissional.

Desconhece em concreto a forma como o arguido conduz mas declara que nunca existiu qualquer queixa por parte dos clientes.

Atenta a matéria de facto provada dúvidas não existem de que o arguido praticou uma contra-ordenação prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 27°, 138° e 145°, al, b), todos do Código da Estrada, pelo que se tem por correcta a subsunção jurídica efectuada na decisão posta em crise.

Efectivamente, o artigo 27°, n.º1 , do Código da Estrada dá-nos os limites de velocidade que não podem ser ultrapassados pelos diversos veículos.

Por sua vez, o nº 2, alínea a), 2,° dispõe que: "Quem exceder os limites máximos de velocidade é sancionado: aa) Se conduzir automóvel ligeiro ou motociclo, com as seguintes coimas: 2.° De € 120 a € 600, se exceder em mais de 20 km/h e até 40 km/h, dentro das localidades, ou em mais de 3O km/h e até 60 km/h, fora das localidades.

No caso o arguido circulava a, pelo menos 128km/hora, sendo que o local tem um limite de 90k111/hora, o que consubstancia a prática da referida contra-ordenação.

A presente contra-ordenação é classificada como grave e por isso punida com a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 1 mês a 1 ano, por força do disposto nos artigos 138° e 1450 aI. b), ambos do Código da Estrada, que dispõem que:

Artigo 138.° Sanção acessória

1 - As contra-ordenações graves e muito graves são sancionáveis com coima e com sanção acessória. 2 - Quem praticar qualquer ato estando inibido de o fazer por força de sanção acessória aplicada em sentença criminal transitada em julgado, por prática de contra-ordenação rodoviária, é punido por crime de violação de imposições, proibições ou interdições, nos termos do artigo 353.° do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro. 3 - Quem praticar qualquer ato estando inibido de o fazer por força de sanção acessória aplicada em decisão administrativa definitiva, por prática de contra-ordenação rodoviária, é punido por crime de desobediência qualificada, nos termos do n.º 2 do artigo 348.° do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro. 4 - A duração mínima e máxima das sanções acessórias aplicáveis a outras contra-ordenações rodoviárias é fixada nos diplomas que as prevêem. 5 - As sanções acessórias são cumpridas em dias seguidos.

Artigo 145.° Contra-ordenações graves
I - No exercício da condução, consideram-se graves as seguintes contra-ordenações: b) O excesso de velocidade praticado fora das localidades superior a 30 km/h sobre os limites legalmente impostos, quando praticado pelo condutor de motociclo ou de automóvel ligeiro, ou superior a 20 km h, quando praticado por condutor de outro veículo a motor;

No caso, tal como consta supra, tal contra-ordenação é punida com coima, que foi voluntariamente, paga pelo arguido e com a inibição de conduzir de 1 a 12 meses.

No entanto, o arguido já tem averbado no seu registo de condutor pelo menos mais duas contra-ordenações graves, praticadas nos últimos 5 anos, o que toma o arguido reincidente, nos termos do artigo 143.°, do Código da Estrada e que eleva, dessa forma os limites mínimos da sanção acessória para o dobro.

E ao contrário do alegado pela defesa a autoridade administrativa não diz que apenas vai aplicar o mínimo. O que se diz é que os limites mínimos são elevados para o dobro.

A questão que se pode colocar é a de saber se os 90 dias aplicados ao arguido são adequados e justos ao caso concreto tendo em conta que o limite mínimo passa a ser de 60 dias.

O arguido tem averbadas mais duas contra-ordenações graves praticadas há menos de 5 anos.

Precisa da carta de condução para o exercício da sua actividade profissional e dos autos não resulta que o mesmo tivesse colocado em perigo qualquer utente da via pública com a sua conduta.

Assim sendo, considera-se que ser de reduzir o número de dias aplicados ao arguido de 90 dias para 75 dias.

O arguido vem requerer a suspensão da sanção acessória nos termos do artigo 141,°, do Código da Estrada.

Dispõe o mencionado artigo à data da prática dos factos que:

1 - Pode ser suspensa a execução da sanção acessória aplicada a contra-ordenações graves no caso de se verificarem os pressupostos de que a lei penal geral faz depender a suspensão da execução das penas, desde que se encontre paga a coima, nas condições previstas nos números seguintes.

2 - Se o infractor não tiver sido condenado, nos últimos cinco anos, pela prática de crime rodoviário ou de qualquer contra-ordenação grave ou muito grave, a suspensão pode ser determinada pelo período de seis meses a um ano.

3 - A suspensão pode ainda ser determinada, pelo período de um a dois anos, se o infractor, nos últimos cinco anos, tiver praticado apenas uma contra-ordenação grave, devendo, neste caso, ser condicionada, singular ou cumulativamente: aa) À prestação de caução de boa conduta; bb) Ao cumprimento do dever de frequência de acções de formação, quando se trate de sanção acessória de inibição de conduzir; cc) Ao cumprimento de deveres específicos previstos noutros diplomas legais.

4 - A caução de boa conduta é fixada entre € 500 e € 5000, tendo em conta a duração da sanção acessória aplicada e a situação económica do infractor.

5 - Os encargos decorrentes da frequência de acções de formação são suportados pelo infractor.

6 - A imposição do dever de frequência de acção de formação deve ter em conta a personalidade e as aptidões profissionais do infractor, não podendo prejudicar o exercício normal da sua actividade profissional nem representar obrigações cujo cumprimento não lhe seja razoavelmente exigível

No caso em apreço, a infracção foi imputada ao arguido a título de negligência. Sucede porém que o arguido tem averbadas no seu registo de condutor, pelo menos, mais duas contra-ordenações graves, pelo que não é possível a aplicação deste artigo e, consequentemente, não é possível determinar a suspensão da inibição de conduzir, devendo o arguido cumprir os 75 dias de inibição de conduzir.»

Cumpre agora apreciar e decidir o presente recurso.

II. fundamentação

1. - Delimitação do objeto do recurso e poderes de cognição deste tribunal.

O arguido recorrente vem suscitar duas questões, que se impõe decidir.

Em primeiro lugar, alega que a sentença recorrida violou o disposto no art. 72º-A. que proíbe a reformatio in pejus, ao modificar a sanção acessória de inibição de conduzir aplicada pela autoridade administrativa em sentido quantitativamente desfavorável ao arguido, pelo que deve considerar-se apenas a sanção antes aplicada pela ANSR que, no seu entender, foi de 60 dias de inibição e não 90 dias como consta da parte final daquela decisão.

Em segundo lugar, o arguido vem pôr em causa que a sentença recorrida, tal como a decisão administrativa, tenham negado a pretendida suspensão da sanção acessória de inibição de conduzir com fundamento na existência de duas condenações anteriores em contraordenação grave, nos termos do art. 141º do C. Estrada, considerando que deve ser essa a decisão deste tribunal.

2. – Decidindo
2.1.- Quanto à primeira das duas questões suscitadas, é manifesta a falta de razão do arguido e recorrente. Na verdade, Da arguida nulidade de omissão de diligência essencial para a descoberta da verdade, prevista no art. 120º nº2 d) do CPP.

Pretende o arguido que o incumprimento do dever de notificar a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), das câmaras fixas instaladas e dos meios portáteis disponíveis, imposto às forças de segurança responsáveis pelo tratamento de dados e pela utilização dos meios de vigilância eletrónica pelo artigo 5º do Dec. Lei 207/2005 de 29 de novembro, implica que a utilização daqueles aparelhos não goza da especial força probatória que lhe é conferida pelos nºs 3 e 4 do art. 170º do C. Estrada. Sem razão, porém.

Na verdade, contrariamente ao entendimento reiteradamente assumido pelo recorrente não se verifica qualquer contradição na fundamentação da decisão administrativa condenatória, pois como destacado na sentença recorrida não há qualquer contradição entre afirmar que por via da agravante geral comum da reincidência o limite mínimo da moldura abstrata é elevado para o dobro, como expressamente refere o art. 142º nº3 do C.Estrada, para concluir que é de 90 dias a medida concreta da sanção a aplicar.

Sendo de 90 dias a sanção aplicada pela autoridade administrativa, a sanção acessória de inibição de conduzir por 75 dias) aplicada pela sentença recorrida é inferior àquela e não o contrário, pelo que é manifesta a improcedência do recurso nesta parte, como aludido.

2.2.1. Quanto à segunda questão tem o arguido razão ao argumentar que a autoridade administrativa e o tribunal a quo não estavam legalmente impedidos de suspender a execução da inibição de conduzir nos termos do art. 141º do C. Estrada. Na verdade, o tribunal a quo frustrou a razão de ser da intervenção jurisdicional no processo de contraordenações ao deixar de analisar com o cuidado e rigor exigível a verificação dos pressupostos de que o art. 141º do C. Estrada faz depender a suspensão da execução da sanção acessória, limitando-se a concluir que tendo o arguido «… averbadas no seu registo de condutor, pelo menos, mais duas contra-ordenações graves, … não é possível a aplicação deste artigo [art. 141º C.Estrada] e, consequentemente, não é possível determinar a suspensão da inibição de conduzir, devendo o arguido cumprir os 75 dias de inibição de conduzir

Com efeito, o art. 141º nº 3 do C. Estrada prevê a possibilidade de suspender a sanção acessória de inibição de conduzir se o infrator, nos últimos cinco anos, tiver praticado apenas uma contraordenação grave, pelo que mesmo tendo averbada duas condenações por infração grave, importava verificar se ambas as condenações averbadas no registo de condutor do ora arguido haviam sido praticadas nos últimos cinco anos, por referência à data da prática da infração ora em apreço e das infrações anteriores, conforme resulta do teor literal do art. 141º nº3 do C. Estrada, em termos idênticos aos estabelecidos no art. 143º nº1 para a reincidência contraordenacional e mesmo no art. 75º nº2 do C. Penal para reincidência penal.

Ora, mesmo não se encontrando transcritos na sentença recorrida os dados importantes para a decisão da causa que dele constam, pode ver-se do Registo Individual de Condutor que constitui fls. 9 dos presentes autos, que o ora arguido praticou a primeira das contraordenações graves aí inscritas em 29.12.2007 e a segunda delas em 19.06.2008, pelo que à data dos factos ora em causa (19.08.2013), já haviam decorrido cinco anos sobre a prática da primeira infração registada, pelo que apenas uma das contraordenações anteriores fora praticado há menos de cinco anos.

Verifica-se, assim, o pressuposto formal de que o art. 141º nº3 faz depender a possibilidade de suspender a execução da sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de um a dois anos, impondo-se apreciar da verificação do pressuposto material cumulativo exigido pelo nº1 do art. 141º do C. Estrada por remissão para o art. 50º do C. Penal, ou seja, que a simples censura do facto e a ameaça da sanção realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, atendendo à personalidade infrator, às suas condições de vida, à sua conduta anterior e posterior à infração e às circunstâncias desta.

2.2. Não o tendo feito o senhor juiz a quo, cabe então a este tribunal de recurso decidir, em substituição, se a pretendida suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir realiza de forma suficiente e adequada as finalidades da punição, que em matéria contraordenacional consistem essencialmente em finalidades de prevenção negativa. Tanto de dissuasão geral (prevenção geral negativa), na medida em que se visa a dissuasão de todos os destinatários da norma, como de dissuasão especial negativa, ou seja, prevenção da prática futura de outras contraordenações por parte do infrator, dissuadindo-o através da respetiva sanção – vd., por todos, Taipa de Carvalho, Direito Penal. Parte Geral, 2003, p. 163 e Pinto de Albuquerque, Comentário do regime Geral das Contra-Ordenações, UCP, 2011, p. 84, e autores aí citados, negando à coima (sanção paradigmática das contraordenações) finalidades de prevenção especial positiva, pois não visa a ressocialização de uma personalidade deformada do agente.

Assim sendo, não pode deixar de ser negativa a resposta à pretensão do recorrente, pois conforme consta do seu Registo Individual de Condutor, beneficiou anteriormente da suspensão da execução da sanção acessória nas duas condenações anteriores por contraordenação grave, o que não o impediu de praticar a presente infração, igualmente grave, deixando claro que a suspensão da execução da sanção acessória nas duas condenações anteriores não foi suficiente para que o infrator pautasse a sua conduta estradal pelo respeito das regras que a regem, sendo certo que os presentes autos não assinalam qualquer alteração na sua situação pessoal ou profissional com reflexos na prognose sobre o comportamento futuro do arguido em matéria de contraordenações rodoviárias.

Concluímos, pois, como referido, que mesmo a considerarem-se apenas finalidades de prevenção negativa às sanções contraordenacionais, a conduta anterior do ora arguido dita o prognóstico de que aquelas mesmas finalidades não serão realizadas quanto a ele (prevenção especial) mediante a suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir, tal como não previnem suficientemente que a generalidade dos destinatários da norma se inibam de seguir-lhe o exemplo, pelo que não pode deixar de improceder o recurso do arguido também nesta parte, ainda que com fundamentos diversos dos invocados pelo tribunal recorrido, que fundamentou a sua decisão na inadmissibilidade legal da suspensão daquela sanção no caso presente, como vimos.

III. Dispositivo

Em face do exposto, acordam os Juízes desta Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido, A., mantendo o decidido pelo tribunal recorrido.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC. – Cfr arts.92º do RGCO, 513º do CPP, e art 8º nº5 do Regulamento das Custas Processuais (RCP) aprovado pelo Dec-lei 34/2008, conjugado com a tabela III a que se refere este último preceito.

Évora, 6 de Dezembro de 2016
(Processado e revisto pelo relator)

António João Latas

Carlos Jorge Berguete