Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
366/19.9T8ABTA.E1
Relator: JOSÉ ANTÓNIO MOITA
Descritores: COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA
CONSERVADOR DO REGISTO PREDIAL
Data do Acordão: 02/27/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1- Não existindo litígio entre as partes, recai sobre o Conservador do Registo Predial a competência material para, em processo de justificação relativa ao trato sucessivo previsto no artigo 116.º do Código do Registo Predial suprir, com fundamento na causa originária da usucapião, a falta de título (documento) de propriedade de imóveis, tendo em vista o adequado registo da inscrição predial.
2- Tal insere-se no regime de desjudicialização de matérias que não corporizem em si um verdadeiro litígio, regulado pelo Decreto-Lei n.º 273/2001, de 13/10.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Apelação nº 366/19.9T8ABTA.E1

Comarca de Santarém
Juízo Local Cível de Abrantes

Apelantes: (…), (…), (…), (…) e (…), representada por seu pai (…).
Apelados: (…), (…), (…), (…), (…), (…) e (…).

Sumário do Acórdão
(da exclusiva responsabilidade do relator – artigo 663º, nº 7, do C.P.C.)
(…)
***
Acordam os Juízes que compõem a 1ª Secção Cível deste Tribunal da Relação de Évora no seguinte:

I – RELATÓRIO
Os Autores intentaram a presente ação declarativa contra os Réus peticionando o seguinte:
“A) Os R.R. serem condenados a reconhecer que da Doação dos pais de (…), (…) e (…) e consequente divisão verbal efectuada com os A.A. em relação ao prédio rústico matricialmente anteriormente inscrito sob o artº (…) da Secção (…), da freguesia de … (e antes deste sob o art.º … da mesma Secção), resultaram sete parcelas autonomizadas, as quatro referidas no artº 3º desta p.i. já autonomizadas a favor dos RR com a área total de 7.060 m2 e, como tal já registadas a seu favor e as seguintes, como parte sobrante do prédio descrito na CRP de Abrantes sob o artº (…) da freguesia de (…):
1 - PARCELA “A” – Prédio Rústico, com a área de 330m2, sito no lugar de (…), freguesia de (…), do concelho de Abrantes, composto de cultura arvense em olival, a confrontar de norte com os RR. (…) e outros, sul e nascente com (…), e de poente com Rua (…), inscrito na matriz predial respectiva sob o art.º (…), da Secção (…), da freguesia de (…), do concelho de Abrantes e fazendo parte do remanescente do prédio descrito na CRP de Abrantes sob o nº (…) da aludida freguesia de (…) do concelho de Abrantes.
2 - PARCELA “A1” – Prédio rústico, com a área de 1.060m2, sito no lugar de (…), freguesia de (…), do concelho de Abrantes composto de cultura arvense em olival, a confrontar de norte com (…) e outros, sul e poente com (…) e de nascente com Rua (…), inscrito na matriz predial respectiva sob o art.º (…), da Secção (…), da freguesia de (…), do concelho de Abrantes;
3 - PARCELA “A2” – Prédio urbano, sito em (…), composto de casa de habitação com uma loja de uma divisão e rés-do-chão com 5 divisões para habitação, com a área coberta de 133m2 e descoberta de 997m2, sendo a área total de 1130m2, a confrontar de norte com a R. (…), de sul o R. (…) e outros, nascente com a Rua (…) e de poente com (…), inscrito na respectiva matriz predial sob o actual artº (…) correspondente aos antigos arts. matriciais (…) e (…) da mesma freguesia de (…), do concelho de Abrantes, estando parcialmente descrito na CRP de Abrantes, independentemente, a favor do falecido (…) e da A. (…) sob o n.º (…) da aludida freguesia de (…), embora em duplicação com a parte remanescente do prédio n.º (…) da mesma freguesia.
B) Os RR. serem condenados a reconhecer que os AA. adquiriram através do instituto da usucapião a parcela “A” com 330 m2 e a parcela “A1” com 1.060 m2, acima identificadas – arts. matriciais rústicos ora inscritos a seu favor sob os arts. (…) e (…), Secção (…), da freguesia de (…), do concelho de Abrantes respectivamente e também da parcela “A2” com a área de 1130 m2 – artigo matricial urbano (…) da mesma freguesia de (…), das quais são donos, legítimos proprietários e possuidores das mesmas, há mais de 20 anos e que do prédio rústico inscrito na matriz sob o artº (…), da Secção … (antigo …-…), da freguesia de (…), do concelho de Abrantes resultaram aquelas três parcelas autonomizadas.
C) Os RR. serem condenados a reconhecer o direito de propriedade dos AA. sobre os prédios descritos e correspondentes à parcela “A”, com a área de 330m2 e a composição referida, à parcela “A1”, com a área de 1.060m2 e a composição referida e à parcela “A1” com a área de 1.330m2 e a composição referida.
D) Os RR. serem condenados a reconhecer que a aquisição dos prédios dos AA. retroage à altura em que os referidos AA. passaram a exercer posse sobre aqueles prédios de forma distinta, autónoma e demarcada, ou seja, há mais de 20 anos.
E) Em consequência, deve ordenar-se o cancelamento das inscrições constantes das Ap. nos. (…) e (…) de 12/07/1991 e Ap. nº (…) de 05/02/1997, todas da descrição do prédio nº …/19910712 na parte respeitante a 1/3 da R. (…) e a 1/3 dos RR. (…), (…) e mulher (…).
F) Os R.R. serem condenados em custas e procuradoria condigna. “
Alegaram, em síntese, terem adquirido originariamente, pela usucapião, o direito de propriedade sobre a dita parcela, que vêm possuindo desde há mais de vinte anos com convicção de serem seus proprietários exclusivos.
Pessoal e regularmente citados, os Réus não apresentaram contestação à presente acção.
Após, foi proferido despacho de acordo com o disposto nos artigos 566º e 567º do CPC, tendo os Autores apresentado alegações.
O Tribunal a quo ouviu ainda os Autores sobre a verificação de excepção dilatória de incompetência em razão da matéria tendo aqueles se pronunciado em sentido negativo.
Seguiu-se a prolação de sentença que culminou com o seguinte dispositivo:
“Em face do exposto, julgando verificada a exceção dilatória de incompetência em razão da matéria, decreto a incompetência deste Juízo Local Cível para conhecer da presente ação e, consequentemente, absolvo os réus da instância.
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Valor da ação: € 19.000,00 (artigos 296.º, 302.º, 305.º/4 e 306.º/2 do Código de Processo Civil).
Condeno os autores no pagamento das custas da ação, uma vez que à mesma deram causa (artigo 527.º/1/2, do Código de Processo Civil)”.
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Inconformados com o decidido na sentença os Autores apresentaram requerimento de recurso, que não foi objecto de resposta por parte dos Réus.
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O recurso foi recebido na 1ª Instância como apelação, a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
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Já nesta Relação, foi proferido pelo relator despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões, a que os Apelantes acederam, tendo os mesmos aperfeiçoado da seguinte forma:
“A- A douta sentença recorrida enferma de nulidade, nos termos do disposto no arts. 615º, nº 1, alínea c) e violou, entre outros, o disposto nos artigos 63º, alínea a), 64º, 65º e 70º, todos do CPC e artigos 1263º, alínea a), 1268º, nº 1, 1287º, 1288º, 1289º, 1298º, 1316º e 1317º, alínea c), todos do Código Civil dos quais fez uma errada interpretação, aplicação ou falta de aplicação.
B- Pois, a douta sentença “a quo” ao julgar verificada a excepção dilatória de incompetência em razão da matéria, fê-lo de forma ilegal, a nosso modesto entender, por ter considerado existir violação das regras de competência fundadas na matéria (artigos 96.º/a), 97.º/1, 99.º/1, 576.º/2 e 577.º/a), todos do Código de Processo Civil) e, por ter entendido que a “competência material para o processo de justificação de registo – designadamente aquele em que seja invocada a usucapião como causa de aquisição – cabe às conservatórias do registo predial, encontrando-se ressalvada a possibilidade de recurso, tanto para o tribunal de primeira instância, como para o tribunal da relação (artigos 117.°-I e 117.º-L, ambos do Código do Registo Predial)”.
C- Ora, o problema em causa é que a Conservatória do Registo Predial de Abrantes ou um qualquer Cartório Notarial não aceita resolver qualquer dos pedidos ora em causa nestes autos.
D- E, por outro lado, os Tribunais Portugueses são competentes, em razão da matéria, para apreciar e julgar as questões de registo predial ora trazidas a Juízo e também tem quanto às indicadas nos arts. 116º e segs. do Cod. Reg. Predial e também as dos arts. 117.°-I e 117.º-L do Código do Registo Predial, conforme Acs. da Relação de Évora proferido em 20.03.2007 no processo nº 2619/06-2 e nos termos do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do S.T.J. publicado no D.R. II Série de 24.06.1996, podem adquirir por usucapião, se a posse não for elidida, os que exercem o poder de facto sobre a coisa”.
E– Até porque os prédios ora em causa estão descritos: não se trata de uma primeira inscrição...sendo até os que agora se pretendem regularizar na CRP de Abrantes, a parte restante e cuja área e titulares está erradamente descrita e averbada na dita Conservatória.
F- Depois…o facto dos R.R. não terem contestado não significa que inexista litígio.
G- Os RR, se forem para tal notificados, dirão que não comparecerão em qualquer ato de escritura ou justificação notarial ou perante Conservador do Registo Predial para resolver o problema destes autos até porque já resolveram o problema da divisão das suas parcelas no processo – sem contestação – que correu termos sob o nº 548/13.7TBABT do Extinto 2º Juízo do então Tribunal Judicial de Abrantes.
H- E por uma questão de igualdade, sob pena de violação do disposto, entre outros no artº 13º da Constituição da República, os ora Recorrentes têm direito a ver o seu processo decidido, como o
foram os de vários outros que como eles no Extinto Tribunal Judicial de Abrantes e em outras Primeiras Instâncias viram, recentemente, resolvidos os seus processos de direito de propriedade adquirida por usucapião (de prédios divididos e demarcados) reconhecido judicialmente, nomeadamente, só do mandatário subscritor, como o foram, entre outros, e ao abrigo da mesma legislação vigente: 320/11.9TBABT do Extinto 1º Juízo do Tribunal Judicial de Abrantes; 1153/11.8TBABT do Extinto 3º Juízo do Tribunal Judicial de Abrantes; 1731/12.8TBCTB do Extinto 2º Juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco; 614/13.9TBABT do Extinto 1º Juízo do Tribunal Judicial de Abrantes; 1731/12.8TBCTB do Extinto 1º Juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco ou nos demais supra indicados, mesmo não tendo o subscritor como mandatário.
I- Todos estes acórdãos respeitaram a independência e soberania do Tribunal, pelo que não podem os ora Recorrentes deixar de verificar que, a ocorrer sentença de incompetência em razão da matéria como a constante da douta sentença de que ora se recorre, casos rigorosamente iguais têm tratamento judicial diferente em clara violação do princípio da igualdade vertido no artº 13º da Constituição da República Portuguesa.
J- E, ainda, que a divisão operada no supra indicado procº nº 548/13.7TBABT do Extinto 2º Juízo do então Tribunal Judicial de Abrantes, permitiu aos ora Recorridos neste processo (AA. naqueloutro) dividir e registar as suas parcelas da forma e meio que ora se pretende concretizar em relação aos ora Recorrentes (sendo a destes a parte restante do prédio dividido e demarcado).
K- Ora, tendo a instância percorrido todas as suas fases incluindo a da notificação para alegar e já tendo sido juntas as alegações dos Recorrentes sem que o Tribunal “a quo” se tenha julgado incompetente é mais do que prova da regularidade da instância e de que aquele se reputou de competente para julgar os pedidos formulados nestes autos, pelo que a decisão “a quo” viola as legítimas expectativas das partes e os princípios da celeridade, da cooperação e da adequação formal.
L- Consequentemente, deve a sentença “a quo” ser revogada e substituída por outra que julgue a acção procedente por provada e julgue procedentes os pedidos formulados pelos ora Recorrentes.
Com todas as legais consequências
Assim se fazendo a devida Justiça”.
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O recurso é o próprio e foi admitido adequadamente quanto ao modo de subida e efeito fixado.
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Correram Vistos.
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II – QUESTÕES OBJECTO DO RECURSO
Nos termos do disposto no artigo 635º, nº 4, conjugado com o artigo 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil (doravante apenas CPC), o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recurso, salvo no que concerne à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas pertinentes ao caso concreto e quando se trate de matérias de conhecimento oficioso que, no âmbito de recurso interposto pela parte vencida, possam ser decididas com base em elementos constantes do processo, pelo que as únicas questões que importa traduzem-se no seguinte:
1 – Nulidade da sentença;
2 – Competência em razão da matéria do Tribunal a quo para apreciar e decidir a presente causa.
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III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos a considerar são os já acima descritos no relatório.
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IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Impõe-se iniciar este segmento naturalmente pela primeira das questões objecto do recurso.
Assim, decorre do artigo 615º, nº 1, do CPC que:
“É nula a sentença quando:
[ …]
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
Relativamente à nulidade definida na alínea c) diz-nos António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa in “Código de Processo Civil Anotado, Vol. I – Parte Geral e Processo de Declaração, artigos 1º a 702º”, (Almedina, 2018), em anotação ao referido artigo 615º, o seguinte:
“A nulidade a que se reporta a 1ª parte da al. c) ocorre quando existe incompatibilidade entre os fundamentos e a decisão, ou seja, em que a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final. Situação que, sendo violadora do chamado silogismo judiciário, em que as premissas devem condizer com a conclusão, também não se confunde com um eventual erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide contrariamente aos factos apurados ou contra norma jurídica que lhe impõe uma solução jurídica diferente” (cfr. pág. 737-738).
E acrescentam os referidos Autores na obra acabada de citar, relativamente à 2ª parte da alínea c), que:
“A decisão judicial é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível e é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes” (cfr. pág. 738).
A este respeito decidiu-se no acórdão proferido no STJ em 14/06/2011 no Processo 214/10.5YRLSB.S1 (acessível para consulta in “Sumários”, 2011, pág. 501), o seguinte:
“A nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão, na acepção da existência de uma contradição real entre os fundamentos e a respectiva parte dispositiva, acontece quando os fundamentos referidos pelo juiz conduziriam, necessariamente, a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente, mas não já quando se verifica uma errada subsunção dos factos à norma jurídica aplicável, nem, tão pouco, quando se verifica uma errada interpretação da mesma, situações essas que configuram antes um erro de julgamento”.
Na mesma linha de orientação (adoptada, aliás, pacificamente noutros arestos do mesmo Tribunal), surge o acórdão proferido pelo STJ de 03/02/2011 no Proc.º 1045/04.7TBALQ.L1.S1, (acessível para consulta in www.dgsi.pt) , quando refere que:
“A nulidade por contradição entre a fundamentação e a decisão supõe um vicio intrínseco à sua própria lógica, traduzido em a fundamentação em que se apoia não poder suportar o sentido da decisão que vem a ser proferida”.
Atendendo ao supra exposto, analisando os fundamentos plasmados na decisão recorrida e designadamente os passos seguidos na fundamentação fáctica e jurídica, entendemos, desde logo, que a mesma não padece de obscuridade, nem de ambiguidade, na medida em que o seu conteúdo revela-se compreensível, assim como se revela insusceptível de interpretações dispares, não se descortinando, outrossim, a existência de oposição entre os ditos fundamentos e o dispositivo mostrando-se a parte decisória em coerência com os fundamentos que foram relevados pelo Tribunal a quo.
Se houve erro de julgamento isso é questão diversa que será objecto de apreciação a seu tempo, mas não nesta sede em que não tem cabimento fazê-lo.
Isto dito improcede a arguida nulidade da sentença constante da alínea c), do nº 1, do artigo 615º, do CPC.

Passemos de seguida à abordagem da segunda questão objecto do recurso e que se prende com a reapreciação do mérito da decisão impugnada.
Resulta do artigo 64º do CPC que:
“São da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional”.
Esta norma deve ser devidamente conjugada com a norma prevista no artigo 96º do dito CPC que estatui o seguinte:
“Determinam a incompetência absoluta do tribunal:
a) A infração das regras de competência em razão da matéria e da hierarquia e das regras de competência internacional;
b) A preterição de tribunal arbitral”.
As regras sobre a competência em razão da matéria resultam essencialmente da Lei de Organização do Sistema Judiciário (LOSJ), em conjugação com outros diplomas legais ou normas.
A competência em razão da matéria deve ser aferida através do confronto entre as normas que a definem e o teor da petição inicial, com especial destaque para o pedido e a causa de pedir (neste sentido ver “Código de Processo Civil Anotado Vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração artigos 1º a 702º”, António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa, Almedina, 2018, pág. 124).
De reter ainda nesta senda, por todos, o recente Acórdão do STJ de 09/11/2017 proferido no Processo nº 8214/13TBVNG-A.P1.S1, Relator António Piçarra, acessível para consulta em www.dgsi.pt, de que extratamos o seguinte trecho:
“II - Como é doutrina e jurisprudência pacíficas, a competência em razão da matéria (ou jurisdição) afere-se em função da relação material controvertida configurada pelo autor, tendo presente que o sistema judicial não é unitário, mas constituído por várias categorias de tribunais, separados entre si, com estrutura e regime próprios”.
Da leitura da petição inicial resulta desde logo claro que os Apelantes assentam o seu petitório na causa de aquisição originária do direito de propriedade da usucapião.
E formulam no final da sua peça inicial o seguinte petitório, que vamos já recordar, salientando o mesmo em itálico.
“A) Os R.R. serem condenados a reconhecer que da Doação dos pais de (…), (…) e (…) e consequente divisão verbal efectuada com os A.A. em relação ao prédio rústico matricialmente anteriormente inscrito sob o artº (…) da Secção (…), da freguesia de … (e antes deste sob o artº … da mesma Secção), resultaram sete parcelas autonomizadas, as quatro referidas no artº 3º desta p.i. já autonomizadas a favor dos RR com a área total de 7.060m2 e, como tal já registadas a seu favor e as seguintes, como parte sobrante do prédio descrito na CRP de Abrantes sob o artº (…) da freguesia de (…):
1 - PARCELA “A” – Prédio Rústico, com a área de 330m2, sito no lugar de (…), freguesia de (…), do concelho de Abrantes, composto de cultura arvense em olival, a confrontar de norte com os RR. (…) e outros, sul e nascente com (…), e de poente com Rua (…), inscrito na matriz predial respectiva sob o art. (…), da Secção (…), da freguesia de (…), do concelho de Abrantes e fazendo parte do remanescente do prédio descrito na CRP de Abrantes sob o nº (…) da aludida freguesia de (…) do concelho de Abrantes.
2 - PARCELA “A1” – Prédio rústico, com a área de 1.060m2, sito no lugar de (…), freguesia de (…), do concelho de Abrantes composto de cultura arvense em olival, a confrontar de norte com (…) e outros, sul e poente com (…) e de nascente com Rua (…), inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo (…), da Secção (…), da freguesia de (…), do concelho de Abrantes;
3 - PARCELA “A2” – Prédio urbano, sito em (…), composto de casa de habitação com uma loja de uma divisão e rés-do-chão com 5 divisões para habitação, com a área coberta de 133m2 e descoberta de 997m2, sendo a área total de 1130m2, a confrontar de norte com a R. (…), de sul o R. (…) e outros, nascente com a Rua (…) e de poente com (…), inscrito na respectiva matriz predial sob o actual artº (…) correspondente aos antigos arts. matriciais (…) e (…) da mesma freguesia de (…), do concelho de Abrantes, estando parcialmente descrito na CRP de Abrantes, independentemente, a favor do falecido (…) e da A. (…) sob o nº (…) da aludida freguesia de (…), embora em duplicação com a parte remanescente do prédio nº (…) da mesma freguesia.
B) Os RR. serem condenados a reconhecer que os AA. adquiriram através do instituto da usucapião a parcela “A” com 330m2 e a parcela “A1” com 1.060m2, acima identificadas – artigos matriciais rústicos ora inscritos a seu favor sob os artigos (…) e (…), Secção (…), da freguesia de (…), do concelho de Abrantes respectivamente e também da parcela “A2” com a área de 1130m2 – artigo matricial urbano (…) da mesma freguesia de (…), das quais são donos, legítimos proprietários e possuidores das mesmas, há mais de 20 anos e que do prédio rústico inscrito na matriz sob o artº (…), da Secção … (antigo …-…), da freguesia de (…), do concelho de Abrantes resultaram aquelas três parcelas autonomizadas.
C) Os RR. serem condenados a reconhecer o direito de propriedade dos AA. sobre os prédios descritos e correspondentes à parcela “A”, com a área de 330 m2 e a composição referida, à parcela “A1”, com a área de 1.060 m2 e a composição referida e à parcela “A1” com a área de 1.330 m2 e a composição referida;
D) Os RR. serem condenados a reconhecer que a aquisição dos prédios dos AA.. retroage à altura em que os referidos AA. passaram a exercer posse sobre aqueles prédios de forma distinta, autónoma e demarcada, ou seja, há mais de 20 anos.
E) Em consequência deve ordenar-se o cancelamento das inscrições constantes das Ap. nos. (…) e (…) de 12/07/1991 e Ap. nº (…) de 05/02/1997, todas da descrição do prédio nº …/19910712 na parte respeitante a 1/3 da R. (…) e a 1/3 dos RR. (…), (…) e mulher (…).
F) Os R.R. serem condenados em custas e procuradoria condigna”.
A sentença recorrida faz apelo à aplicação ao caso concreto do regime do artigo 8º, nº 2, do Decreto-Lei nº 273/2001, de 13/10, bem como dos artigos 116º, 117º-A a 117º-O, 118º, 120º a 131º e 132º-A a 132º-D, do Decreto-Lei n.º 224/84, de 06/07 (Código do Registo Predial).
Decorre do artigo 8º, nº 2, acima mencionado, o seguinte:
“É revogado o Decreto-Lei n.º 224/84, de 22 de Agosto”.
Este último Decreto-Lei estatuíra sobre o processo de justificação judicial.
Por seu turno, da leitura do preâmbulo do Decreto-Lei nº 273/2001, extrai-se o seguinte:
“O presente diploma opera a transferência de competências em processos de carácter eminentemente registral dos tribunais judiciais para os próprios conservadores de registo, inserindo-se numa estratégia de desjudicialização de matérias que não consubstanciam verdadeiro litígio.
Trata-se de uma iniciativa que se enquadra num plano de desburocratização e simplificação processual, de aproveitamento de actos e de proximidade da decisão, na medida em que a maioria dos processos em causa eram já instruídos pelas entidades que ora adquirem competência para os decidir, garantindo-se, em todos os casos, a possibilidade de recurso.
Passa assim a ser objecto de decisão por parte do conservador o processo de justificação judicial, aplicável à maioria das situações de suprimento de omissão de registo não oportunamente lavrado, aos casos de declaração de nulidade ou inexistência de registo, para efeitos do respectivo cancelamento, e aos casos do óbito não comprovado por certificado médico ou auto de verificação …”.
Foi, aliás, nos termos preconizados em tal preâmbulo que o identificado Decreto-Lei 273/2001 alterou a redacção dos supra referidos artigos 116º, 118º, 120º a 131º e aditou os artigos 117º-A a 117º-O e 132º-A a 132º-D, todos do Código do Registo Predial (doravante apenas CRP).
Atendendo à actual redacção conferida ao CRP pela Lei nº 89/2017, de 21/08, prevê-se no seu artigo 116º, o seguinte:
“Artigo 116.º
Justificação relativa ao trato sucessivo
1 - O adquirente que não disponha de documento para a prova do seu direito pode obter a primeira inscrição mediante escritura de justificação notarial ou decisão proferida no âmbito do processo de justificação previsto neste capítulo.
2 - Caso exista inscrição de aquisição, reconhecimento ou mera posse, a falta de intervenção do respetivo titular, exigida pela regra do n.º 2 do artigo 34.º, pode ser suprida mediante escritura de justificação notarial ou decisão proferida no âmbito do processo de justificação previsto neste capítulo.
3 - Na hipótese prevista no número anterior, a usucapião implica novo trato sucessivo a partir do titular do direito assim justificado.“

Relacionado com este preceito encontramos o artigo 89º, do Dec.Lei nº 207/95 de 14/08 (Código do Notariado), que estipula o seguinte:
“Artigo 89.º
Justificação para estabelecimento do trato sucessivo no registo predial
1 - A justificação, para os efeitos do n.º 1 do artigo 116.º do Código do Registo Predial, consiste na declaração, feita pelo interessado, em que este se afirme, com exclusão de outrem, titular do direito que se arroga, especificando a causa da sua aquisição e referindo as razões que o impossibilitam de a comprovar pelos meios normais.
2 - Quando for alegada a usucapião baseada em posse não titulada, devem mencionar-se expressamente as circunstâncias de facto que determinam o início da posse, bem como as que consubstanciam e caracterizam a posse geradora da usucapião. “
Por seu turno resulta do artigo 118º, nºs 1 e 2, do CRP que:
“Artigo 118.º
Outros casos de justificação
1 - As disposições relativas à justificação para primeira inscrição são aplicáveis, com as devidas adaptações, ao cancelamento pedido pelo titular inscrito do registo de quaisquer ónus ou encargos, quando não seja possível obter documento comprovativo da respetiva extinção.
2 - Ao registo da mera posse são aplicáveis as disposições relativas ao processo de justificação para primeira inscrição. […] “

Prevê ainda o artigo 120º do CRP que:
“Artigo 120.º
Processo de retificação
O processo previsto neste capítulo visa a retificação dos registos e é regulado pelos artigos seguintes e, subsidiariamente e com as necessárias adaptações, pelo Código de Processo Civil.”
E no artigo 121º, nºs 1 e 2, ainda mesmo diploma legal, consta que:
“Artigo 121.º
Iniciativa
1 - Os registos inexatos e os registos indevidamente lavrados devem ser retificados por iniciativa do conservador logo que tome conhecimento da irregularidade, ou a pedido de qualquer interessado, ainda que não inscrito.
2 - Os registos indevidamente efetuados que sejam nulos nos termos das alíneas b) e d) do artigo 16.º podem ser cancelados com o consentimento dos interessados ou em execução de decisão tomada neste processo […]”.

Regressando agora aos concretos aspectos factuais do caso vertente instaurado pelos ora Apelantes verifica-se, desde logo, que os mesmos não pretendem intentar uma acção de reivindicação contra os Apelados , dado que é cristalino que não alegam factos concretos que fundamentem a restituição dos prédios/ parcelas que invocam pertencer-lhes e menos ainda o peticionam expressamente, razão pela qual se conclui não se integrar a demanda em apreço na previsão do artigo 1311º do Código Civil (doravante apenas CC).
Estar-se-á, contudo, perante uma acção de processo comum declarativa condenatória, atenta a redacção das alíneas A) a D) da parte final da petição inicial onde é pedida expressamente a “condenação” dos Apelados, susceptível de afastar a aplicabilidade do supra mencionado processo de justificação relativa ao trato sucessivo previsto no CRP e da exclusiva competência das Conservatórias do Registo Predial?
Desde já adiantamos ser negativa a resposta.
Na realidade, da leitura integral da petição inicial, mormente dos seus artigos 1º a 19º, constata-se que os Apelantes identificam 3 prédios ou parcelas, referindo que as mesmas integraram um prédio que se encontra dividido, demarcado e autonomizado em sete parcelas, acrescentando que o dito prédio foi objecto de uma acção judicial que procedeu a tal divisão tendo atribuído individualmente aos Apelados as outras quatro parcelas, mais esclarecendo que as 3 parcelas objecto desta causa foram doadas verbalmente ao falecido cônjuge da Co-Apelante (…), (…), pelos pais do mesmo, duas delas no inicio do ano de 1971 e a outra há cerca de 30 anos, mantendo-se as ditas três parcelas, (sem correspondência com a realidade), registadas na Conservatória do Registo Predial de Abrantes na proporção de 1/3 para os Apelantes, 1/3 para a Co-Apelada (…) e 1/3 para os restantes Co-Apelados.
Por seu turno, dos artigos 20º até ao seu final da petição inicial os Apelantes alegam factos tendentes a ilustrar que por si e anteriormente pelo donatário (…) vêm exercendo há mais de 20 anos sobre as três parcelas, tendo inclusive edificado e reconstruído numa delas uma casa de habitação onde vivem permanentemente desde os anos setenta, actos de posse exclusiva, pública, pacífica e de boa fé, invocando serem os donos exclusivos das aludidas três parcelas por as terem adquirido pela usucapião.
Não resulta em parte alguma da descrição factual feita na petição inicial que os Apelantes pretendam dirimir com os Apelados um conflito existente, ou objectivamente eminente, mas sim, como ressalta do expresso designadamente nos artigos 5º e 8º e bem assim do peticionado no final em E) da peça inicial, obter a justificação relativa ao trato sucessivo para efeitos de registo, prevista no artigo 116.º, n.º 1, do CRP, visto não terem título (documento), para comprovar o seu exclusivo direito, nem a possibilidade de suprir tal pelas vias extrajudiciais normais.
Com efeito, são os próprios Apelantes que alegam expressamente na peça inicial, quando se referem à divisão e autonomização do prédio em sete parcelas, (artigo 10º), que tal foi feito “por via das doações dos pais e acordo efectuado entre A.A. e R.R.” (itálico nosso), bem como admitem que exercem a sua posse em relação às três parcelas “sem oposição de ninguém” (artigo 27º da petição inicial) e com o reconhecimento das “pessoas da terra” (artigo 3º da petição inicial).
Por conseguinte, tem que se concluir do expresso que os Apelantes não sofrem oposição dos Apelados e que estes últimos também reconhecem o exercício da posse daqueles sobre tais parcelas.
E por isso, apesar dos Apelantes exprimirem expressamente, mormente nas alíneas A ) a D ), no final da sua petição inicial, o propósito de verem os Apelados condenados não pode valorizar-se os pedidos em apreço nessa parte atentos os fins concretos em vista, na medida em que a questão da competência em razão da matéria tem que ser avaliada independentemente da formulação do pedido de condenação dos Apelados, atendendo a que o peticionado, como supra já se referiu, tem de ser conjugado com a sua fundamentação, mormente com a causa de pedir concreta, nos termos das regras interpretativas do negócio jurídico previstas nos artigos 236º e 238º do CC, sendo certo que do alegado na petição inicial não se descortina a que título devem os Apelados serem condenados em acção judicial de acordo com o peticionado pelos Apelantes.
Note-se, aliás, que o facto de os Apelantes, como também acabámos de constatar supra, alegarem que vêm possuindo as parcelas em apreço sem oposição de ninguém e com o reconhecimento de que são donos delas pelas pessoas da terra (como tal, pela lógica, também pelos Apelados), revela-se contraditório com a peticionada condenação dos Apelados.
Inexiste, assim, fundamento para os Apelados serem demandados nesta acção judicial, a que foi formalmente conferido o figurino, ou a capa, de acção declarativa condenatória, pois os factos relatados pelos próprios Apelantes não ilustram a existência de um litígio, impondo-se aqui e agora relembrar o preâmbulo do Dec.-Lei nº 273/2001, de 13/10, quando realça de forma clara a preocupação e o propósito de desjudicialização de matérias que não traduzem verdadeiro litígio entre as Partes.
E não se vislumbrando litígio, por não ter sido minimamente aflorada a violação ou ameaça objectiva de violação por parte dos Apelados do invocado direito de propriedade dos Apelantes, soçobra apenas com interesse a pretensão registral que, aliás, ficou vincada na alínea E) do petitório, não sendo, assim, a acção da competência material do tribunal comum, antes pertencendo a mesma ao Conservador de Registo Predial em sede de processo de justificação relativa ao trato sucessivo previsto no artigo 116º do CRP.
Neste sentido, por todos, destacamos os Acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça de 25/11/2004 (Processo nº 04B3644/04-2, relator Moitinho de Almeida) e de 03/03/2005 (Processo nº 04A4610, relator Faria Antunes), ambos acessíveis para consulta em www.dgsi.pt.
Embora tendo decidido no caso concreto pela competência material do tribunal comum reveste ainda interesse pela argumentação exposta que vem em grande medida na esteira dos dois acórdãos do STJ acima identificados o Acórdão da Relação de Coimbra de 22/06/2010 (Processo nº 2081/09.2TBPBL.C1, relator Gregório Jesus), igualmente acessível para consulta em www.dgsi.pt.

Por último e quanto ao argumentário dos Apelantes em sede de conclusões recursivas sempre diremos o seguinte:
Quanto ao argumento de que a “Conservatória do Registo Predial de Abrantes ou um qualquer Cartório Notarial“ não aceita resolver qualquer um dos pedidos formulados pelos Apelantes nestes autos naturalmente que tal não pode determinar que seja o tribunal comum (residual ou supletivamente), a fazê-lo, tanto mais que confirmado fica através deste acórdão que a competência em razão da matéria para tal apreciação recai sobre a Conservatória do Registo Predial, não sendo, ademais, de olvidar que, de acordo com o artigo 205º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, “As decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades”.
Referem ainda os Apelantes não estar em causa relativamente aos prédios em apreço “uma primeira inscrição”.
Sucede, porém, que no nº 2 do artigo 116º do CRP prevê-se expressamente a aplicação da justificação relativa ao trato sucessivo também para casos em que “exista inscrição de aquisição, reconhecimento, ou mera posse”.
E ainda que no caso em apreço estivesse em causa a “regularização” registral dos três prédios de que os Apelantes invocam serem donos unicamente por existência de erros/inexactidões quanto à área e titulares descritos e averbados sempre a competência material para tal retificação recairia sobre as Conservatórias dos Registos Prediais, de acordo com o disposto nos artigos 120º a 127º do CRP.
Já no que concerne à alegada violação do principio constitucional de igualdade previsto no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, carece tal referência de qualquer sentido no caso vertente.
Com efeito, como bem refere o Tribunal a quo na sentença recorrida, no nosso sistema não vigora a regra do precedente, havendo, porém, que levar em linha de consideração, quando se revele aplicável, a jurisprudência fixada anteriormente pelo Supremo Tribunal de Justiça em sede de acórdãos de uniformização de jurisprudência (AUJ), o que não sucede no caso vertente relativamente ao AUJ publicado no D.R., II – Série, de 24/06/1996, chamado à colação pelos Apelantes, uma vez que este último não se debruçou sobre a matéria de (in)competência do tribunal comum em razão da matéria que se encontra em apreciação nestes autos.
O mesmo se diga, aliás, no que respeita aos vários acórdãos proferidos por este Tribunal da Relação de Évora que os Apelantes resolveram enunciar no ponto 18 da sua motivação recursória, uma vez que os mesmos se debruçaram sobre a problemática da anulabilidade de escrituras de justificação em caso de alegado fracionamento de prédio rústico em violação da unidade de cultura mínima versus aquisição dos mesmos por usucapião e não propriamente sobre a questão que constitui o objecto desta acção respeitante, relembre-se, a incompetência material do tribunal comum.
Sustentam, ainda, os Apelantes que a sentença proferida violou as legítimas expectativas das Partes, bem como os princípios da celeridade, da adequação formal e da cooperação.
Também aqui, a nosso ver, sem razão,
Quanto à violação das expectativas das Partes resulta dos autos que antes de se pronunciar sobre a questão da incompetência do tribunal em razão da matéria, a Mmª Juíza a quo concedeu o contraditório aos Apelantes para se pronunciarem sobre a verificação da referida excepção, o que os mesmos fizeram.
Já no que tange aos princípios da celeridade e adequação formal, atendendo a que resulta expresso do artigo 97º, nº 2, do CPC, que a incompetência em razão da matéria “deve ser suscitada oficiosamente pelo tribunal enquanto não houver sentença com trânsito em julgado proferida sobre o fundo da causa“ (com a ressalva ali também prevenida, não aplicável ao caso em apreço), sem esquecer que a acção em causa não foi contestada pelos ora Apelados, o que determinou a aplicabilidade do regime previsto nos artigos 566º a 568º do CPC, não se vislumbra em que medida tais princípios de celeridade e adequação formal foram beliscados.
Por outro lado, integrando-se a incompetência em razão da matéria no portefólio das excepções dilatórias insupríveis, tão pouco incorreu o Tribunal a quo em violação do principio da cooperação, ou mesmo do dever de efectiva gestão processual, concretamente no que tange ao disposto no nº 2 do artigo 6º do CPC.
Improcedem, assim, na totalidade as conclusões recursivas dos Apelantes.
*
V – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal em negar provimento ao presente recurso interposto pelos Apelantes (…), (…) e marido (…), (…) e (…), representada por seu pai (…) e, em consequência, decidem:
a) Confirmar a sentença recorrida;
b) Fixar as custas a cargo dos Apelantes, nos termos do disposto no artigo 527º, nº 1 e 2, do CPC.
Notifique-se.
Évora, 27/02/2020
José António Moita
Silva Rato
Mata Ribeiro