Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
10/21.4GALLE-E.E1
Relator: LAURA GOULART MAURÍCIO
Descritores: COMUNICAÇÕES POR CORREIO ELETRÓNICO
ASSINATURA DIGITAL
COMUNICAÇÕES POR TELECÓPIA
APRESENTAÇÃO DOS ORIGINAIS DO ACTO TELECOPIADO
PROPORCIONALIDADE
Data do Acordão: 11/22/2022
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Sumário: I. A falta de apresentação do original do requerimento para abertura da instrução do arguido, remetido a juízo, por correio eletrónico simples e sem validação cronológica, no prazo legal de 10 dias, não tem como consequência imediata a rejeição liminar daquele requerimento, por inadmissibilidade legal, nos termos do disposto no artigo 287º, nº 3, do Código de Processo Penal.
II. O dever de notificar o arguido para apresentar o original do requerimento para a abertura da instrução, que foi remetido por correio eletrónico simples e sem validação cronológica, antes de rejeitar o requerimento de abertura de instrução corresponde à exigência de um processo equitativo, revelando-se desproporcional, sancionar essa omissão, com a rejeição liminar.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora

No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo de Instrução Criminal de Faro, foi, em 11 de julho de 2022 proferido despacho com o seguinte teor (transcrição).
“Do requerimento de abertura de instrução apresentado pelo arguido AA fls. 3403
O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/2014 pronunciou-se no sentido de que «em processo penal, é admissível a remessa a juízo de peças processuais através de correio eletrónico, nos termos do disposto no art. 150 n.º 1 al. d) e n.º 2 do CPC e na Portaria n.º 624/2004, de 16/6, aplicáveis por força do disposto no art. 4.º do CPP.».
Por sua vez, o art. 3.º, n.º 4 da Portaria n.º 624/2004, de 16 de junho, dispõe que «O envio de peças processuais por correio eletrónico equivale à remessa por via postal registada, nos termos do n.º 3 do art. 6.º do DL n.º 290-D/99, de 2/8, bastando para tal a aposição de assinatura eletrónica avançada.» e o n.º 6 do mesmo normativo assinala que «A expedição da mensagem de correio eletrónico deve ser cronologicamente validada, nos termos da al. u) do art. 2.º do DL n.º 290-D/99, de 2/8, com a redação que lhe foi dada pelo DL n.º 62/2003, de 3 de Abril, mediante a aposição de selo temporal por uma terceira entidade idónea.».
Em complemento, o art. 10.º da aludida portaria sustenta que à apresentação de peças processuais através de correio eletrónico simples ou sem validação cronológica é aplicável, para todos os efeitos legais, o regime estabelecido para o envio através de telecópia.
Nos termos de tudo o exposto devidamente concatenado, firma-se que o envio de peças processuais via correio eletrónico só pode suceder em conformidade com o legalmente definido, ou seja, com aposição de assinatura eletrónica do subscritor, para que se possa garantir que a mesma foi elaborada pelo próprio e que se junta por mandatário judicial seja uma garantia ao mandante, arguido em processo penal.
O art. 4.º, do Decreto-Lei n.º 28/92, de 27-02, delineia que:
“1 - As telecópias dos articulados, alegações, requerimentos e respostas, assinados pelo advogado ou solicitador, os respectivos duplicados e os demais documentos que os acompanhem, quando provenientes do aparelho com o número constante da lista oficial, presumem-se verdadeiros e exactos, salvo prova em contrário.
2 - Tratando-se de actos praticados através do serviço público de telecópia, aplica-se o disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 54/90, de 13 de fevereiro.
3 - Os originais dos articulados, bem como quaisquer documentos autênticos ou autenticados apresentados pela parte, devem ser remetidos ou entregues na secretaria judicial no prazo de sete dias contado do envio por telecópia, incorporando se nos próprios autos.» -sublinhado nosso.
Em decorrência do plasmado no art. 6.º, n.º 1, al. b), do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12-12, o prazo para entrega dos originais deve ser de 10 dias e não de 7 dias.
Sucede que o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo arguido foi enviado por correio eletrónico, sem assinatura digital, nem manual, ou validação cronológica, gozando do valor da telecópia, sem que tenha carreado o original aos autos no prazo legalmente concedido, de 10 dias.
Este Tribunal segue o entendimento de que em tais situações não pode ser formulado um convite para juntar os originais, de um documento nem sequer manualmente assinado, sob pena de se desvirtuar um dever imposto por lei e contornar o prazo legalmente concedido para requerer a abertura de instrução. Salvo melhor entendimento, é de considerar que este tipo de convites não se compadece com o processo penal, com a celeridade processual que se impõe e não existe qualquer razão que os sustente, gerando um desequilíbrio injustificado entre os interesses em conflito. Neste sentido veja-se Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 13-04-2021, relatora Maria Fernanda Palma, disponível em www.dgsi.pt. Perante o esquadrinhado, ao abrigo do disposto no art. 287.º, n.º 3 do CPP, enquanto legalmente inadmissível, mais não resta do que rejeitar o requerimento de abertura de instrução de fls.3403, por não respeitar as exigências de forma legalmente exigidas.”
*
Inconformado com a decisão, o arguido AA interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões:
1. Objeto do presente recurso: Despacho proferido no passado dia 11 de julho de 2022, com a referência ...80, através do qual FOI REJEITADO O REQUERIMENTO DE ABERTURA DE INSTRUÇÃO APRESENTADO PELO ARGUIDO.
2. Nos presentes autos o arguido encontra-se sujeito à medida de coação de prisão preventiva desde o dia .../.../2021.
3. Até ser proferido despacho de rejeição do requerimento de abertura de instrução, muitos e vários foram os requerimentos e peças processuais apresentadas nestes autos a juízo exclusivamente por correio electrónico a partir do email da ordem dos advogados da ora subscritora sem que, nunca antes, qualquer deles fosse rejeitado por tal motivo ou tivesse e arguido recorrente ou sua mandatária, notificados para juntarem o respectivos originais,
4. A 19 de maio de 2022 foi deduzida acusação pública, não concordando o recorrente com a mesma, veio o recorrente apresentar requerimento de abertura de instrução.
5. No seu RAI pugnou o recorrente pela nulidade da acusação por não conter todos os elementos exigidos pelo art. 283º do CPP, nulidade de alguns dos meios de prova elencados nessa acusação e nos quais se fundou, e, ainda, pela falta indícios suficientes da prática pelo recorrente do crime do art. 21º mas apenas do art.25º da Lei da droga, sendo que o art. 25º não admite a MC a que o arguido se encontra sujeito.
6. O Requerimento de Abertura de Instrução foi apresentado pela sua mandatária, ora subscritora, e mais uma vez através do seu correio eletrónico da Ordem dos Advogados, tendo o mesmo sido recepcionado pelo Ministério Público de ....
7. Mais uma vez, o RAI foi apresentada exclusivamente por correio eletrónico.
8. Distribuídos os autos ao JIC, este para surpresa do recorrente tendo em conta todo o processado até então - profere o despacho recorrido de rejeição do RAI apresentado pelo recorrente, por o mesmo ter sido apresentado por email sem assinatura digital, nem manual, ou validação cronológica, gozando do valor da telecópia, sem que tenha carreado o original aos autos no prazo legalmente concedido, de 10 dias.
9. Depois de todos os requerimentos e peças processuais que deram entrada nos presentes autos exclusivamente por correio electrónico, da Ordem dos advogados da ora subscritora, sem que nunca antes tenha havido qualquer exigência muita ou pouca de serem juntos os respectivos originais receber agora um Despacho com tal teor relativamente a uma matéria de tão crucial importância para a efectiva defesa do recorrente enquanto arguido acusado da prática de um crime que vai até aos 12 anos de cadeia e que se encontra em prisão preventiva desde Novembro de 2021, consubstancia, antes de mais, uma clara violação do principio da segurança e da legitima expectativa dos respectivos intervenientes processuais, principalmente do arguido!
10. PARA ALÉM DISSO, a ora subscritora na qualidade de mandatária do Recorrente enviou o requerimento de abertura de instrução através do seu email da Ordem dos Advogados o qual só funciona através da utilização de um Certificados Digital único, pessoal atribuído, individualmente, a cada um dos advogados, emitidos por uma terceira parte legalmente credenciada (a entidade certificadora) que emite e regula os serviços de gestão e emissão de certificados digitais. Esta informação é, desta forma, incluída automaticamente no Certificado a emitir.
11. Assim, não corresponde à verdade que o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo Recorrente tenha sido enviado através de correio electrónico sem assinatura digital ou sem certificação digital e se tal não é visível nos emails enviados, tal facto não é da responsabilidade do arguido recorrente ou sua mandatária, pelo que entendemos que o Tribunal recorrido devia ter notificado a ora subscritora para juntar aos autos comprovativo de que o email da ordem dos advogados através do qual foi enviado o RAI do recorrente tem certificado/assinatura digital válida ou oficiar a OA nesse sentido.
12. CASOP ASSIM NÃO SE ENTENDESSE, devia Tribunal recorrido ter notificado a ora subscritora e o recorrente para juntar aos autos no prazo de 10 dias ou no prazo que fosse fixado para o efeito, o original do RAI apresentado devidamente assinado manualmente.
13. Ao ter rejeitado sem mais o RAI, o tribunal que preferiu a decisão recorrida, não interpretou corretamente a legislação aplicável ao caso concreto.
14. Esta surpreendente decisão do tribunal a quo, não se coaduna com a jurisprudência dominante, nem com o espírito de um legislador que pretende desmaterializar e simplificar os atos processuais com o objetivo de facilitar o acesso à justiça e simplificar os processos de trabalho nos tribunais através da utilização intensiva das novas tecnologias.
15. Para além de que, na verdade o princípio do contraditório em processo penal, por impossibilidade constitucional e por via da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, significa que o arguido tem o direito de intervir no processo e de se pronunciar e contraditar todos os elementos de prova ou argumentos jurídicos trazidos ao processo, abrangendo todos os actos suscetíveis de afectar a sua posição assim sentenciou o Acórdão do STJ de 20/2/2005, proc. 4740/04, 5ª secção.
16.Só este entendimento pode dar vida ao art. 32º da CRP ”assegurar ao arguido todas as garantias de defesa”, pois que a instrução é o único momento em que o arguido tem a possibilidade de requerer a confirmação judicial de ser ou não submetido a julgamento, sendo que o exercício do direito de defesa não pode deixar de ter por referência a imputação de factos concretos e objectivos e não meras disposições gerais (que não permitem o exercício de qualquer contraditório) um enquadramento jurídico preciso, sendo que no caso em concreto o exercício desse direito de obter o controlo judicial da opção do MP está directa e intimamente ligado com a possibilidade de o arguido poder ver a sua MC passar de detentiva para não detentiva.
17. É da essência das garantias de defesa que o arguido possa exercer o seu direito em ver operar o controlo judicial da opção do MP de o submeter a um julgamento, pelo que o arguido deveria ter sido convidado a juntar aos autos os documentos supra indicados.
18. É inconstitucional as normas previstas no art. 287º, nº 3 do CPP e do nº 3 do art. 4 do DL nº 28/92 de 27/2 quando interpretadas no sentido de que não há lugar ao convite para juntar o original do RAI apresentado por email enviado pelo email da Ordem dos Advogados do mandatário do arguido quando o mesmo não é junto no prazo de 10 dias após o seu envio, por violação do disposto no art. 32º da CRP Inconstitucionalidade que aqui se alega para todos os efeitos legais e também já alegada junto do tribunal recorrido por requerimento de 24 de julho de 2022.
19. No que tange à rejeição do requerimento de abertura de instrução rege o nº 3, do art. 287º, do CPP, onde se diz que o requerimento só pode ser rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução.
20. Sobre tal temática pronunciou-se o nosso mais Alto Tribunal no Acórdão Fixação de Jurisprudência, n.º 7/2005, de 12.05.2005, no Processo n.º 430/2004 - 3.ªSecção, no DR 212 SÉRIE I-A, de 2005-11-04, que aqui damos por integralmente reproduzido.
21. Como flui do despacho sindicado, o fundamento que conduziu à rejeição do requerimento de abertura de instrução não consistiu em nenhum dos fundamentos de rejeição previstos nas normas que acabamos de analisar, mas tão só e porque o RAI foi enviado exclusivamente por correio electrónico simples
22. Incorrecta interpretação e aplicação no despacho recorrido, do disposto no artigo 287º, nº 3, do Código de Processo Penal, relativamente à rejeição do requerimento de abertura de instrução formulado pelo recorrente.
23.É pacífico que em processo penal a apresentação de peças processuais por correio electrónico “avançado” e “simples” é admissível.
24.Pretendendo pôr termo a divergências jurisprudenciais na matéria, o Pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça, no seu Acórdão nº 3/2014, publicado no DR, 1ª Série, de 15 de Abril de 2014, fixou a seguinte doutrina: “em processo penal, é admissível a remessa a juízo de peças processuais através de correio electrónico, nos termos do disposto no artigo 150º, nº 1, alínea d), e nº 2, do Código de Processo Civil de 1961, na redacção do Decreto-Lei nº 324/2003, de 27-12, e na Portaria nº 642/2004, de 16-06, aplicáveis conforme o disposto no artigo 4º do Código de Processo Penal”.
25. Esta mencionada jurisprudência permanece aplicável às acções excluídas da Portaria nº 280/2013, conforme o Acórdão do STJ, de 24-1-2018, (proc. nº 5007/14.8TDLSB.L1.S1, disponível in www.dgsi.pt), nomeadamente nas acções que se encontrem na fase de inquérito/instrução, e de acordo com o artigo 17º, da Portaria nº 267/2018 de 20 de setembro.
26. Ou seja, a Portaria 280/2013, referente à tramitação eletrónica dos processos judiciais, não se aplica nas ações que se encontrem na fase de inquérito/instrução.
27. Daqui decorre que o correio electrónico constitui ainda uma forma admissível de prática de actos processuais em todos aqueles processos ou fases processuais, excluídos do âmbito de aplicação da Portaria nº 280/2013.
Razão por que, no caso sub judice teremos de chamar à colação a Portaria nº 642/2004 de 16-06, que regula a forma de apresentação a juízo dos atos processuais enviados através de correio eletrónico, aplicável no que respeita ao envio de peças processuais em processo penal), uma vez que o requerimento de abertura de instrução do arguido foi apresentado por via de correio eletrónico e o envio do original remetido aos autos não contém a assinatura original do subscritor, nem a certificação dessa mesma assinatura, pelas formas legais admissíveis, tratando-se de uma mera fotocópia.
28.Preceitua o artigo 3°, n° 1, da mencionada Portaria, que: “o envio de peças processuais por correio eletrônico equivale à remessa por via postal registada, nos termos do n° 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n° 290-D/99 de 2 de Agosto, com a redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 62/2003, de 3 de Abril, bastando para tal a aposição de assinatura electrónica avançada”
29.Por sua vez, o nº 3 do mencionado normativo refere que: “a expedição da mensagem de correio electrónico dever ser cronologicamente validada, nos termos da alínea u) do artigo 2 º do Decreto-Lei nº 290D/99, de 2 de Agosto, com a redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 62/2003, de 3 de Abril, mediante a aposição de selo temporal por uma terceira entidade idónea.”
30.Diz o Tribunal recorrido que, verificamos que no caso em apreço, o recorrente aquando da apresentação do requerimento de abertura de instrução, enviou apenas um email simples com o referido requerimento digitalizado, não contendo o email qualquer assinatura eletrónica avançada nem a aposição de selo temporal por entidade terceira idónea – o que poderá até corresponder à verdade – contudo tal não pode ser imputado ao recorrente nem à sua mandatária, na medida em que se trata do correio eletrónico da Ordem dos Advogados o qual por si só é um email certificado pela Ordem dos Advogados, remetido pelo endereço oficial, o qual inclusive está registado na plataforma da Ordem dos Advogados (OA) e por esta certificado, a mandatária subscritora usou a assinatura digital facultada pela Ordem dos Advogados certificado multicert, a qual encontra-se instalada no seu computador eque lhe permite a utilização para assinatura de documentos digitais.
31. Mas mesmo que assim não se entenda, e se entenda que o facto da impressão do email e do próprio enviado pela ora signatária não consta qualquer assinatura eletrónica avançada nem a aposição de selo temporal por entidade terceira idónea é imputável ao recorrente e ou à sua mandatária, e nessa medida, ter-se-á de aplicar o regime estabelecido para o envio através de telecópia, que se encontra regulado pelo Decreto-lei nº 28/92, de 27/02 e, no seu artigo 4º, nº 3, refere que “os originais dos articulados, bem como quaisquer documentos autênticos ou autenticados apresentados pela parte, devem ser remetidos ou entregues na secretaria judicial no prazo de 10 dias contado do envio por telecópia, incorporando-se nos próprios autos - em consequência do disposto no artigo 6º, nº 1, alínea b), do Decreto-lei nº 329-A/95, de 12-12, então, ainda assim, dizemos nós, deveria o recorrente e sua mandatária terem sido notificados para juntarem, num prazo fixado para o efeito, o original do RAI.
32. Obviamente que estando o recorrente e sua mandatária convictos que bastava o envio do RAI por email, tendo até em conta todo o processado até então, não foi cumprido o disposto no artigo 4º, nº 3, do Decreto-lei nº 28/92, de 27-02, ou seja, a ora signatária não juntou o original do requerimento de abertura de instrução, devidamente assinado por si no prazo de 10 dias.
33. Porém, a cominação ou a consequência jurídica da não apresentação dos originais das peças processuais remetidas a juízo, por telecópia, no prazo legalmente estabelecido de 10 dias, não pode ser a rejeição, sem mais, do RAI. Senão vejamos:
34. Nem no Decreto-Lei nº 28/92, de 27 de fevereiro, nem noutro diploma legal é prevista cominação específica para o caso de a parte não fazer juntar ao processo, no prazo legal de 10 dias, os originais dos articulados ou dos documentos autênticos ou autenticados que haja apresentado, através de telecópia.
35.Segundo o entendimento perfilhado pelo Sr. Juiz “a quo”, no despacho recorrido e que tem apoio na jurisprudência, que cremos ser maioritária, a remessa de um requerimento para a abertura da instrução, a juízo, por correio eletrónico, simples, sem a aposição de assinatura eletrónica e sem validação cronológica do respetivo acto de expedição, não sendo o respetivo original remetido ou entregue na secretaria judicial, no prazo de dez dias, com a assinatura do subscritor igualmente original e não com uma simples cópia, nos termos estabelecidos no artigo 4º, nº 3, do Decreto-Lei nº 28/92, de 17 de Fevereiro, em conjugação com o artigo 6º, nº 1, al. b), do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, determina a rejeição do requerimento de abertura de instrução, por inadmissibilidade legal da instrução,aoabrigo dopreceituadonoartigo287º, nº 3, do Código de Processo Penal, não havendo lugar à notificação do apresentante do requerimento de abertura de instrução para apresentar o respetivo original.
36. Salvo o devido respeito por esse entendimento, não podemos com o mesmo concordar.
37. Entendemos que não fixando a lei cominação específica para falta de apresentação do original da telecópia, no prazo legalmente previsto de 10 dias, a rejeição liminar do articulado ou do requerimento remetido a juízo, por telecópia, por falta de apresentação do o respetivo original, naquele prazo, corresponde a uma solução demasiado drástica, que o legislador não pretendeu consagrar.
38. No processo civil, quando se admitia a apresentação de peças processuais por telecópia, formou-se jurisprudência maioritária, no sentido de que não fixando a lei cominação específica, para a falta de apresentação dos originais de tais peças, no prazo de 7 dias, era possível, fazê-lo além desse prazo, desde que não se deixasse de o fazer quando para o efeito se era notificado.
39. Ou seja, de acordo com esta orientação jurisprudencial a não apresentação dos originais, no prazo legalmente previsto, não tem como efeito imediato a invalidade ou a ineficácia do acto praticado por telecópia, o qual, nos termos do disposto no artigo 4º, nº 5, do Decreto-Lei nº 28/92, de 27 de fevereiro, só não aproveita à parte se esta, notificada para exibir os originais, o não fizer, inviabilizando culposamente a incorporação nos autos.
40. E, salvo o devido respeito, pela orientação em sentido contrário, não se vê razão para que este entendimento não seja aplicado, no processo penal, designadamente e, no que ao presente caso importa, ao requerimento para abertura da instrução apresentado pelo arguido, pelas razões que passaremos a explicitar.
41. Entendemos que não têm aqui aplicação os fundamentos subjacentes à jurisprudência fixada, pelo Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de Fixação de Jurisprudência nº 7/2005, de 12-05-2005, no sentido de que “Não há lugar a convite ao assistente para aperfeiçoar o requerimento de abertura de instrução, apresentado nos termos do artigo 287º, nº 2, do Código de Processo Penal, quando for omisso relativamente à narração sintética dos factos que fundamentam a aplicação de uma pena ao arguido.”
42. No caso dos presentes autos, diferentemente daquele sobre que versou a jurisprudência fixada no referenciado AFJ nº 7/2015, não está em causa a concessão de um prazo suplementar, ao assistente, para apresentar um novo requerimento para abertura da instrução, posto que, este acto considera-se praticado, com o envio daquele requerimento, por correio eletrónico, que, por não se mostrar eletronicamente assinado e por falta de validação cronológica do respetivo acto de expedição, nos termos sobreditos, tem o valor de telecópia.
43.A apresentação do original do requerimento de abertura de instrução, tem apenas a função de confirmar o acto antes praticado, através de telecópia, permitindo a respetiva conferência, não servindo para completar ou corrigir eventuais deficiências da telecópia
44.E assim sendo, nessa situação, a possibilidade de notificação do assistente/arguido para apresentar, no prazo que venha a ser fixado pelo juiz, o original do requerimento de abertura de instrução, remetido, por telecópia, não se traduz na concessão, ao mesmo, de qualquer prazo suplementar para requerer a abertura da instrução, nem viola as garantias de defesa do arguido ou o princípio do acusatório
45.Em relação ao principio da celeridade processual, também não fica afectado, se a referida notificação tiver lugar, sendo fixado um prazo curto, havendo que procurar o necessário equilíbrio entre esse princípio e a justiça da decisão, em ordem a salvaguardar o direito à tutela jurisdicional efetiva e a um processo equitativo, consagrado no artigo 20º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa e a respeitar o princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 18º, nº 2, da mesma Constituição da República Portuguesa.
46.Afigura-se-nos que a rejeição liminar do requerimento para abertura da instrução, apresentado pelo recorrente, por correio eletrónico, mesmo que considerado correio electrónico simples, com o valor de telecópia, por falta de apresentação do respetivo original, no prazo legalmente previsto de 10 dias, sem que haja prévio convite, para suprir essa omissão, se traduziria numa cominação desproporcionada.
47.Por identidade de razões, relativamente à rejeição liminar do recurso apresentado pelo arguido, enviado por correio eletrónico – não sendo este um meio legalmente previsto para apresentação de peças processuais –, sem que fosse formulado convite, ao recorrente, para apresentação do recurso pela via considerada adequada, o Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 174/2020, de 11-03-2020, decidiu julgar inconstitucional, por ferir, de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efectiva, na modalidade de direito a um processo equitativo (artigo 20º, nº 4, e artigo 18º da Constituição), “a interpretação normativa extraída da conjugação do artigo 4º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, do artigo 144º, nºs 1, 7 e 8, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, e da Portaria nº 280/2013, de 26 de Agosto, com o disposto nos artigos 286º, 294º e 295º do Código Civil, e artigo 195º do Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho segundo a qual é nulo o recurso apresentado pelo arguido a juízo, por correio eletrónico, dentro do prazo, no âmbito do processo penal, sem prévio convite à apresentação daquela peça processual pela via considerada exigível.”
48. Entendemos, assim, que a falta de apresentação do original do requerimento para abertura da instrução do arguido, remetido a juízo, por correio eletrónico simples e sem validação cronológica, no prazo legal de 10 dias (cfr. Disposições conjugadas dos artigos 4º, nº 3, do Decreto-Lei nº 28/92, de 17 de Fevereiro e no artigo 6º, nº 1, al. b), do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro), não tem como consequência imediata a rejeição liminar daquele requerimento, por inadmissibilidade legal, nos termos do disposto no artigo 287º, nº 3, do Código de Processo Penal.
49. Sufragamos o entendimento de que a rejeição do requerimento de abertura de instrução, remetido a juízo, pelo arguido, através de correio eletrónico, por inobservância dos legais requisitos de forma para a prática do acto, por esse meio, pressupõe a prévia notificação determinada pelo juiz para apresentar o original do requerimento de abertura de instrução, para que seja incorporado no processo e que, só no caso, de, na sequência dessa notificação, o arguido não apresentar o original desse requerimento, poderá, com esse fundamento e nos termos do disposto no artigo 4º, nº 5, do Decreto-Lei nº 28/92, de 17 de Fevereiro, rejeitar o requerimento de abertura de instrução.
50. O dever de notificar o arguido para apresentar o original do requerimento para a abertura da instrução, que foi remetido por correio eletrónico simples e sem validação cronológica, antes de rejeitar o requerimento de abertura de instrução corresponde à exigência de um processo equitativo, revelando-se desproporcional, sancionar essa omissão, com a rejeição liminar.
51. Nesta conformidade, devem V. Exas., Exmos. Senhores Drs. Juízes Desembargadores, reconhecerem assistir razão ao recorrente, devendo V. Exas revogarem o despacho recorrido, substituindo-o por outro que notifique o arguido recorrente, na pessoa da sua Mandatária, para, em prazo a fixar, apresentar o original do requerimento para abertura da instrução, que foi remetido a juízo, por correio eletrónico simples, com a assinatura original do seu subscritor.
52. Assim, pelo exposto deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente com todas as consequências legais.
DAS NORMAS VIOLADAS:
1. Artigo 287.º do CPP;
2. Artigo 286º, nº 1, do CPP;
157 de 167
3. Artigo 289º, n.º 1, do CPP;
4. Artigo 287º, nº 1, alínea a) do CPP;
5. Artigo 21º do DL 15/93 de 22 de janeiro;
6. Artigo 25º do DL 15/93 de 22 de janeiro;
7. Artigo 20º e 32.º, n.º 1, da C.R.P;
8. Artigo 283º, n.º 3 e 308º, n.º 2 do CPP;
9. Artigo 287º, nº 2 e 3 do CPP;
10. Decreto-Lei nº 28/92, de 27 de fevereiro
Nos termos e pelos fundamentos expostos, devem V. Exas. julgar procedente o presente recurso interposto com todas as consequências legais.
*
O Ministério Público respondeu ao recurso interposto nos seguintes termos:
Respondendo à motivação de recurso interposto nos autos supra referenciados, diz o Ministério Público:
Por despacho proferido nos presentes autos, o Tribunal “a quo” rejeitou o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo recorrente pelo facto de que o requerimento apresentado não preencher as exigências de forma exigidas para a prática do acto “in casu”.
Em suma, o requerimento de abertura de instrução foi remetido a juízo por correio electrónico mas sem a aposição de qualquer assinatura eletrónica, sem validação cronológica, e ademais, sem que tenha sido carreado o original aos autos no prazo legalmente concedido, de 10 dias.
Assim, o requerimento de abertura de instrução foi rejeitado por decisão judicial, a qual, desde já, entende-se que não merece qualquer reparo, e desta forma, salvo devido respeito por opinião contrária, afigura-se-nos que não assiste razão ao recorrente.
Assim, prescreve o art. 3.º, n.º 4 da Portaria n.º 624/2004, de 16 de junho, dispõe que“O envio de peças processuais por correio eletrónico equivale à remessa por via postal registada, nos termos do n.º 3 do art. 6.º do DL n.º 290-D/99, de 2/8, bastando para tal a aposição de assinatura eletrónica avançada.” e o n.º 6 do mesmo normativo assinala que “A expedição da mensagem de correio eletrónico deve ser cronologicamente validada, nos termos da al. u) do art. 2.º do DLn.º 290-D/99, de 2/8, com a redação que lhe foi dada pelo DLn.º 62/2003, de3 de Abril, mediante a aposição de selo temporal por uma terceira entidade idónea.”.
Em complemento, o art. 10.º da aludida portaria sustenta que à apresentação de peças processuais através de correio eletrónico simples ou sem validação cronológica é aplicável, para todos os efeitos legais, o regime estabelecido para o envio através de telecópia.
Assim, da leitura dos preceitos legais indicados, conclui-se que o envio de peças processuais via correio eletrónico só pode suceder em conformidade com o legalmente definido, ou seja, com aposição de assinatura eletrónica do subscritor, para que se possa garantir que a mesma foi elaborada pelo próprio e que se junta por mandatário judicial seja uma garantia ao mandante, assistente ou arguido em processo penal.
Por sua vez, o art. 4.º, do Decreto-Lei n.º 28/92, de 27-02, delineia que “1 – As telecópias dos articulados, alegações, requerimentos e respostas, assinados pelo advogado ou solicitador, os respectivos duplicados e os demais documentos que os acompanhem, quando provenientes do aparelho com o número constante da lista oficial, presumem-se verdadeiros e exactos, salvo prova em contrário. 2 - Tratando-se de actos praticados através do serviço público de telecópia, aplica-se o disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 54/90, de 13 de Fevereiro. 3 - Os originais dos articulados, bem como quaisquer documentos autênticos ou autenticados apresentados pela parte, devem ser remetidos ou entregues na secretaria judicial no prazo de sete dias contado do envio por telecópia, incorporando-se nos próprios autos.”.
Ademais, decorre do art. 6.º, n.º 1, al. b), do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12-12, o prazo para entrega dos originais deve ser de 10 dias e não de 7 dias.
Sucede que o requerimento de abertura de instrução apresentado pela recorrente foi enviado por correio eletrónico, sem assinatura digital ou validação cronológica, gozando do valor da telecópia, sem que tenha carreado o original aos autos no prazo legalmente concedido, de 10 dias.
Entende-se e defende-se que em tais situações não pode ser formulado um convite para juntar os originais, sob pena de se desvirtuar um dever imposto por lei e contornar o prazo legalmente concedido para requerer a abertura de instrução.
Em conclusão, o convite pela junção aos autos dos originais, não se compadece com o processo penal, com a celeridade processual que se impõe e não existe qualquer razão que os sustente.
Nestes termos, deverá ser negado provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
Este é o entendimento que perfilhamos.
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No Tribunal da Relação o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Cumprido o disposto no art.417º, nº2, do CPP, não foi apresentada resposta.
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Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos legais foram os autos à conferência.
Cumpre decidir
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Fundamentação
Delimitação do objeto do recurso
O âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, só sendo lícito ao Tribunal “ad quem” apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410º, nº2, do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (cfr. Ac. do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19/10/1995, DR I-A Série, de 28/12/1995 e artigos 403º, nº1 e 412º, nºs 1 e 2, ambos do CPP).
São, pois, as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões da respetiva motivação que o Tribunal ad quem tem de apreciar.
No caso sub judice o arguido/recorrente limita o recurso à questão de saber se deve ser revogado o despacho recorrido, substituindo-o por outro que notifique o arguido recorrente, na pessoa da sua Mandatária, para, em prazo a fixar, apresentar o original do requerimento para abertura da instrução, que foi remetido a juízo, por correio eletrónico simples, com a assinatura original do seu subscritor, por ter havido incorrecta interpretação e aplicação no despacho recorrido do disposto no artigo 287º, nº 3, do Código de Processo Penal, relativamente à rejeição do requerimento de abertura de instrução formulado.
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Apreciando
No caso sub judice, o requerimento de abertura de instrução foi remetido a juízo por correio eletrónico, mas sem a aposição de assinatura eletrónica e sem validação cronológica do respetivo ato de expedição.
Por outro lado, não se verificou a entrega dos originais dos requerimentos de abertura de instrução, nem a sua remessa por correio.
Ora, sobre esta questão já se pronunciou o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do S.T.J. n.º 3/2014, que veio admitir a remessa a juízo de peças processuais através de correio eletrónico, tendo afirmado que “em processo penal, é admissível a remessa a juízo de peças processuais através de correio eletrónico, nos termos do disposto no art. 150 n.º 1 al. d) e n.º 2 do CPC e na Portaria n.º 624/2004, de 16/6, aplicáveis por força do disposto no art. 4.º do CPP.
Dispõe o art. 3.º da Portaria n.º 642/2004, de 16/6, que:
“(…)
4- O envio de peças processuais por correio eletrónico equivale à remessa por via postal registada, nos termos do n.º 3 do art. 6.º do DL n.º 290-D/99, de 2/8, bastando para tal a aposição de assinatura eletrónica avançada.
5- (…)
6- A expedição da mensagem de correio eletrónico deve ser cronologicamente validada, nos termos da al. u) do art. 2.º do DL n.º 290-D/99, de 2/8, com a redação que lhe foi dada pelo DL n.º 62/2003, de 3 de Abril, mediante a aposição de selo temporal por uma terceira entidade idónea.”
E o art. 10º dispõe que:
“À apresentação de peças processuais por correio eletrónico simples ou sem validação cronológica é aplicável, para todos os efeitos legais, o regime estabelecido para o envio através de telecópia.”
É pacífico o entendimento de que a remessa a juízo de qualquer peça processual através de telecópia continua a estar submetida ao regime estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 28/92, de 27 de Fevereiro.
E neste diploma preveem-se duas situações distintas, a que é dado tratamento igualmente distinto, e que respeitam, por um lado, à remessa dos articulados e de documentos autênticos ou autenticados, e, por outro, à remessa das demais peças processuais e documentos.
Na verdade, sob a epígrafe «Força probatória», estabelece o art.º 4.º do referido Dec.- Lei n.º 28/92, de 27 de Fevereiro, que:
«1 - As telecópias dos articulados, alegações, requerimentos e respostas, assinados pelo advogado ou solicitador, os respetivos duplicados e os demais documentos que os acompanhem, quando provenientes do aparelho com o número constante da lista oficial, presumem-se verdadeiros e exatos, salvo prova em contrário.
2 - Tratando-se de actos praticados através do serviço público de telecópia, aplica-se o disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 54/90, de 13 de Fevereiro.
3 - Os originais dos articulados, bem como quaisquer documentos autênticos ou autenticados apresentados pela parte, devem ser remetidos ou entregues na secretaria judicial no prazo de sete dias contado do envio por telecópia, incorporando-se nos próprios autos.
4 - Incumbe às partes conservarem até ao trânsito em julgado da decisão os originais de quaisquer outras peças processuais ou documentos remetidos por telecópia, podendo o juiz, a todo o tempo, determinar a respetiva apresentação.
5 - Não aproveita à parte o ato praticado através de telecópia quando aquela, apesar de notificada para exibir os originais, o não fizer, inviabilizando culposamente a incorporação nos autos ou o confronto a que alude o artigo 385.º do Código Civil.
6 - A data que figura na telecópia recebida no tribunal fixa, até prova em contrário, o dia e hora em que a mensagem foi efetivamente recebida na secretaria judicial.»
Assim, de acordo com o normativo legal transcrito, após remessa, por telecópia, dos articulados ou de documentos autênticos ou autenticados, devem os respetivos originais ser remetidos ou entregues na secretaria judicial no prazo de sete dias contado do envio por telecópia, a fim de serem incorporados nos próprios autos (n.º 3 do referido art.º 4.º do Dec.-Lei n.º 28/92, de 27 de Setembro).
Quanto às demais peças processuais ou documentos igualmente remetidos por telecópia, o regime estabelecido é distinto, cabendo em tal caso às partes conservar, até ao trânsito em julgado da decisão, os originais daqueles, situação em que, a todo o tempo, poderá o juiz determinar a respetiva apresentação (n.º 4 do referido art.º 4.º do Dec.-Lei n.º 28/92, de 27 de Setembro).
E estabelece ainda a lei a cominação para o incumprimento de tal imposição, determinando o n.º 5 do citado artigo 4.º que não aproveita à parte o ato praticado através de telecópia quando aquela, apesar de notificada para exibir os originais, o não fizer, inviabilizando culposamente a incorporação nos autos ou o confronto a que alude o artigo 385.º do Código Civil.
Como claramente resulta da conjugação das normas legais referidas, a apresentação dos originais visa, no caso dos articulados e documentos autênticos ou autenticados, a sua incorporação nos autos, sendo sempre exigida e obrigatória, e nos demais casos, isto é, naqueles em que cabe às partes conservarem na sua posse os originais, tal apresentação visará tão só o confronto da cópia existente nos autos com os originais nas situações em que surja dúvida quanto à autenticidade daquela.
Ora, sobre a questão em apreciação, decidiu-se no Ac. do TRE de 27-09-2022, acessível in www.dgsi.pt, que se transcreve: “ (…) É pacífico que em processo penal a apresentação de peças processuais por correio electrónico “avançado” e “simples” é admissível.
Pretendendo pôr termo a divergências jurisprudenciais na matéria, o Pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça, no seu Acórdão nº 3/2014, publicado no DR, 1ª Série, de 15 de Abril de 2014, fixou a seguinte doutrina: “em processo penal, é admissível a remessa a juízo de peças processuais através de correio electrónico, nos termos do disposto no artigo 150º, nº 1, alínea d), e nº 2, do Código de Processo Civil de 1961, na redacção do Decreto-Lei nº 324/2003, de 27-12, e na Portaria nº 642/2004, de 16-06, aplicáveis conforme o disposto no artigo 4º do Código de Processo Penal”.
Esta mencionada jurisprudência permanece aplicável às acções excluídas da Portaria nº 280/2013, conforme o Acórdão do STJ, de 24-1-2018, (proc. nº 5007/14.8TDLSB.L1.S1, disponível in www.dgsi.pt), nomeadamente nas acções que se encontrem na fase de inquérito/instrução, e de acordo com o artigo 17º, da Portaria nº 267/2018 de 20 de setembro.
Ou seja, a Portaria 280/2013, referente à tramitação eletrónica dos processos judiciais, não se aplica nas ações que se encontrem na fase de inquérito/instrução.
Daqui decorre que o correio electrónico constitui ainda uma forma admissível de prática de actos processuais em todos aqueles processos ou fases processuais, excluídos do âmbito de aplicação da Portaria nº 280/2013.
Razão por que, no caso sub judice teremos de chamar à colação a Portaria nº 642/2004 de 16-06, que regula a forma de apresentação a juízo dos atos processuais enviados através de correio eletrónico, aplicável no que respeita ao envio de peças processuais em processo penal, uma vez que o requerimento de abertura de instrução das arguidas foi apresentado por via de correio eletrónico.
Preceitua o artigo 3°, n° 1, da mencionada Portaria, que: “o envio de peças processuais por correio eletrônico equivale à remessa por via postal registada, nos termos do n° 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n° 290-D/99 de 2 de Agosto, com a redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 62/2003, de 3 de Abril, bastando para tal a aposição de assinatura electrónica avançada”
Por sua vez, o nº 3 do mencionado normativo refere que: “a expedição da mensagem de correio electrónico dever ser cronologicamente validada, nos termos da alínea u) do artigo 2 º do Decreto-Lei nº 290D/99, de 2 de Agosto, com a redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 62/2003, de 3 de Abril, mediante a aposição de selo temporal por uma terceira entidade idónea.”
Compulsados os autos, verificamos que no caso em apreço, as arguidas, aquando da apresentação do requerimento de abertura de instrução, enviaram apenas um email simples com o referido requerimento digitalizado, não contendo o email qualquer assinatura eletrónica avançada nem a aposição de selo temporal por entidade terceira idónea.
Assim, ter-se-á de aplicar o regime estabelecido para o envio através de telecópia, que se encontra regulado pelo Decreto-lei nº 28/92, de 27/02 e, no seu artigo 4º, nº 3, refere que “os originais dos articulados, bem como quaisquer documentos autênticos ou autenticados apresentados pela parte, devem ser remetidos ou entregues na secretaria judicial no prazo de sete dias contado do envio por telecópia, incorporando-se nos próprios autos”.
No caso dos autos, o prazo de 7 dias deve ter-se como alargado para 10 dias, em consequência do disposto no artigo 6º, nº 1, alínea b), do Decreto-lei nº 329-A/95, de 12-12.
Dos autos resulta que as arguidas apresentaram o seu requerimento de abertura de instrução através de correio eletrónico simples, não constando do mesmo a assinatura eletrónica certificada nem a aposição de selo temporal por entidade terceira idónea.
Não resulta do processado, nem as recorrentes o invocam, que foi cumprido o disposto no artigo 4º, nº 3, do Decreto-lei nº 28/92, de 27-02, juntando aos mesmos o original do requerimento de abertura de instrução, no prazo de 10 dias.
A questão reside em saber qual a cominação ou a consequência jurídica da não apresentação dos originais das peças processuais remetidas a juízo, por telecópia, no prazo legalmente estabelecido de 10 dias.
Nem no Decreto-Lei nº 28/92, de 27 de Fevereiro, nem noutro diploma legal é prevista cominação específica para o caso de a parte não fazer juntar ao processo, no prazo legal de 10 dias, os originais dos articulados ou dos documentos autênticos ou autenticados que haja apresentado, através de telecópia.
Segundo o entendimento perfilhado pelo Sr. Juiz “a quo”, no despacho recorrido e que tem apoio na jurisprudência, a remessa de um requerimento para a abertura da instrução, a juízo, por correio eletrónico, simples, sem a aposição de assinatura eletrónica e sem validação cronológica do respetivo acto de expedição, não sendo o respetivo original remetido ou entregue na secretaria judicial, no prazo de dez dias, nos termos estabelecidos no artigo 4º, nº 3, do Decreto-Lei nº 28/92, de 17 de Fevereiro, em conjugação com o artigo 6º, nº 1, al. b), do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, determina a rejeição do requerimento de abertura de instrução, por inadmissibilidade legal da instrução, ao abrigo do preceituado no artigo 287º, nº 3, do Código de Processo Penal, não havendo lugar à notificação do apresentante do requerimento de abertura de instrução para apresentar o respetivo original.
Salvo o devido respeito por esse entendimento maioritário, permitimo-nos divergir do mesmo.
Entendemos que não fixando a lei cominação específica para falta de apresentação do original da telecópia, no prazo legalmente previsto de 10 dias, a rejeição liminar do articulado ou do requerimento remetido a juízo, por telecópia, por falta de apresentação do o respetivo original, naquele prazo, corresponde a uma solução demasiado drástica, que o legislador não pretendeu consagrar.
No âmbito do processo civil, quando se admitia a apresentação de peças processuais por telecópia, formou-se jurisprudência maioritária, no sentido de que não fixando a lei cominação específica, para a falta de apresentação dos originais de tais peças, no prazo de 7 dias, era possível, fazê-la além desse prazo, desde que não se deixasse de a fazer quando para o efeito se era notificado. Ou seja, de acordo com esta orientação jurisprudencial a não apresentação dos originais, no prazo legalmente previsto, não tem como efeito imediato a invalidade ou a ineficácia do ato praticado por telecópia, o qual, nos termos do disposto no artigo 4º, nº 5, do Decreto-Lei nº 28/92, de 27 de Fevereiro, só não aproveita à parte se esta, “notificada para exibir os originais, o não fizer, inviabilizando culposamente a incorporação nos autos.”
E, salvo o devido respeito, pela orientação em sentido contrário, não se vê razão para que este entendimento não seja aplicado, no processo penal, designadamente e, no que ao presente caso importa, ao requerimento para abertura da instrução apresentado pelas arguidas, pelas razões que passaremos a explicitar.
Entendemos que não têm aqui aplicação os fundamentos subjacentes à jurisprudência fixada, pelo Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de Fixação de Jurisprudência nº 7/2005, de 12-05-2005, no sentido de que “Não há lugar a convite ao assistente para aperfeiçoar o requerimento de abertura de instrução, apresentado nos termos do artigo 287º, nº 2, do Código de Processo Penal, quando for omisso relativamente à narração sintética dos factos que fundamentam a aplicação de uma pena ao arguido.”
No caso que nos ocupa, diferentemente daquele sobre que versou a jurisprudência fixada no referenciado AFJ nº 7/2015, não está em causa a concessão de um prazo suplementar, ao assistente, para apresentar um novo requerimento para abertura da instrução, posto que, este acto considera-se praticado, com o envio daquele requerimento, por correio eletrónico, que, por não se mostrar eletronicamente assinado e por falta de validação cronológica do respetivo acto de expedição, nos termos sobreditos, tem o valor de telecópia.
A apresentação do original do requerimento de abertura de instrução, tem apenas a função de confirmar o acto antes praticado, através de telecópia, permitindo a respetiva conferência, não servindo para completar ou corrigir eventuais deficiências da telecópia.
E assim sendo, nessa situação, a possibilidade de notificação do assistente/arguido para apresentar, no prazo que venha a ser fixado pelo juiz, o original do requerimento de abertura de instrução, remetido, por telecópia, não se traduz na concessão, ao mesmo, de qualquer prazo suplementar para requerer a abertura da instrução, nem viola as garantias de defesa do arguido ou o principio do acusatório.
Em relação ao principio da celeridade processual, também não fica afectado, se a referida notificação tiver lugar, sendo fixado um prazo curto, havendo que procurar o necessário equilíbrio entre esse princípio e a justiça da decisão, em ordem a salvaguardar o direito à tutela jurisdicional efetiva e a um processo equitativo, consagrado no artigo 20º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa e a respeitar o princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 18º, nº 2, da mesma Constituição da República Portuguesa.
Afigura-se-nos que a rejeição liminar do requerimento para abertura da instrução, apresentado pelas arguidas, por correio eletrónico, simples, com o valor de telecópia, por falta de apresentação do respetivo original, no prazo legalmente previsto de 10 dias, sem que haja prévio convite, para suprir essa omissão, se traduziria numa cominação desproporcionada.
Por identidade de razões, relativamente à rejeição liminar do recurso apresentado pelo arguido, enviado por correio eletrónico – não sendo este um meio legalmente previsto para apresentação de peças processuais –, sem que fosse formulado convite, ao recorrente, para apresentação do recurso pela via considerada adequada, o Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 174/2020, de 11-03-2020 , decidiu julgar inconstitucional, por ferir, de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva, na modalidade de direito a um processo equitativo (artigo 20º, nº 4, e artigo 18º da Constituição), “a interpretação normativa extraída da conjugação do artigo 4º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, do artigo 144º, nºs 1, 7 e 8, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, e da Portaria nº 280/2013, de 26 de Agosto, com o disposto nos artigos 286º, 294º e 295º do Código Civil, e artigo 195º do Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho segundo a qual é nulo o recurso apresentado pelo arguido a juízo, por correio eletrónico, dentro do prazo, no âmbito do processo penal, sem prévio convite à apresentação daquela peça processual pela via considerada exigível.”
Entendemos, assim, que a falta de apresentação do original do requerimento para abertura da instrução das arguidas, remetido a juízo, por correio eletrónico simples e sem validação cronológica, no prazo legal de 10 dias (cfr. disposições conjugadas dos artigos 4º, nº 3, do Decreto-Lei nº 28/92, de 17 de Fevereiro e no artigo 6º, nº 1, al. b), do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro), não tem como consequência imediata a rejeição liminar daquele requerimento, por inadmissibilidade legal, nos termos do disposto no artigo 287º, nº 3, do Código de Processo Penal.
Sufragamos o entendimento de que a rejeição do requerimento de abertura de instrução, remetido a juízo, (…), através de correio eletrónico, por inobservância dos legais requisitos de forma para a prática do acto, por esse meio, deverá pressupor a prévia notificação determinada pelo juiz para apresentar o original do requerimento de abertura de instrução, para que seja incorporado no processo e que, só no caso, de, na sequência dessa notificação, as arguidas não apresentarem o original desse requerimento, poderá, com esse fundamento, rejeitar o requerimento de abertura de instrução.
O dever de notificar as arguidas para apresentarem o original do requerimento para a abertura da instrução, que foi remetido por correio eletrónico simples e sem validação cronológica, antes de rejeitar o requerimento de abertura de instrução corresponde à exigência de um processo equitativo, revelando-se desproporcional, sancionar essa omissão, com a rejeição liminar.
Nesta conformidade, reconhecendo-se assistir razão às recorrentes, impõe-se revogar o despacho recorrido, que deve ser substituído por outro que notifique as arguidas, na pessoa do seu Mandatário, para, em prazo a fixar, apresentar o original do requerimento para abertura da instrução, que foi remetido a juízo, por correio eletrónico simples.”
Assim, sufragando o entendimento perfilhado no Acórdão supra citado e transcrito, julga-se procedente o recurso interposto pelo arguido AA.
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Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em:
- Julgar procedente o recurso interposto pelo arguido AA e, em consequência, revogar o despacho recorrido, que deve ser substituído por outro que notifique o arguido, para, em prazo a fixar, apresentar o original do requerimento para abertura da instrução, que foi remetido a juízo por correio eletrónico simples.
- Sem tributação.
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Elaborado e revisto pela primeira signatária
Évora, 22 de novembro de 2022
Laura Goulart Maurício
J. F. Moreira das Neves
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Declaração de voto
Com o devido respeito pela posição que fez vencimento, permitimo-nos discordar da mesma e sustentar o presente voto de vencida nos termos e com os fundamentos seguidamente melhor explicitados.
Na verdade, entendemos que a decisão recorrida deveria manter-se nos seus precisos termos, por se encontrar legalmente sustentada e por não afrontar quaisquer princípios ou direitos com assento constitucional (1), designadamente o princípio da proporcionalidade ou o direito a um processo justo e equitativo, reiterando-se a argumentação explanada no acórdão proferido neste Tribunal da Relação, no processo nº 8/21.2PAOLH.E1, com data de 24 de maio de 2022, que relatámos, e que passamos a transcrever na parte que assume relevância para a apreciação da questão em análise nos presentes autos:
“Efetivamente, o nº 5 da norma transcrita [art.º 4.º n.º 3 Decreto-Lei n.º 28/92 de 27] preceitua que “Não aproveita à parte o ato praticado através de telecópia quando aquela, apesar de notificada para exibir os originais, o não fizer, inviabilizando culposamente a incorporação nos autos ou o confronto a que alude o artigo 385.º do Código Civil”. Porém, resulta, a nosso ver, da leitura integrada e sistemática da norma em causa que tal regime sancionatório de não aproveitamento do ato à parte por incumprimento da notificação para apresentação dos originais, previsto no nº 5, se reporta apenas aos atos processuais consignados no nº 4, ou seja a “quaisquer outras peças processuais [que não os articulados e os documentos autênticos ou autenticados referidos no nº 3] apresentados pela parte ou documentos remetidos por telecópia”.
Explicando melhor, diremos que o preceito em causa estabelece dois regimes diferentes no que diz respeito às condições de entrega e validade de documentos e de peças processuais, atendendo ao grau de relevância dos mesmos:
- Para os articulados, documentos autênticos ou autenticados, fixa como condição de validade e eficácia processual da sua apresentação nos autos, a remessa ou a entrega dos respetivos originais na secretaria judicial no prazo de dez dias contado do envio por correio eletrónico (nº 3).
- Para quaisquer outras peças processuais ou documentos atribui às partes o dever de conservarem os respetivos originais até ao trânsito em julgado da decisão, explicitando que, relativamente àqueles, o juiz poderá, a todo o tempo, determinar a respetiva apresentação (nº4).
Ora, resulta com meridiana clareza da leitura sequencial do preceito que a consequência processual estabelecida pelo nº 5 – não aproveitamento à parte do ato praticado por falta de apresentação dos originais após notificação para o efeito – se reporta apenas aos atos relativamente aos quais nos números anteriores se previra a possibilidade de tal notificação, ou seja, os atos processuais previstos no nº 4. Dito de outro modo, os números 3 e 4 da norma em análise estabelecem regas de procedimento e condições de eficácia para diferentes atos; o nº 5 estabelece um regime processual sancionatório para a situações de desrespeito das regras anteriormente estabelecidas, não se nos afigurando legítimo retirar de tal regime sancionatório qualquer regra de procedimento que o legislador não quis prever nos números precedentes.
Assim, a apresentação dos originais no prazo legal é obrigatória para os articulados e para os documentos autênticos ou autenticados, sob pena de tais atos se não considerarem validamente praticados (nº 3); quanto às restantes peças processuais e documentos, a obrigatoriedade de junção dos originais ficará dependente da respetiva necessidade aferida pelo juiz do processo, a quem é conferida a possibilidade de determinar por despacho tal junção (nº 4), sendo que apenas o não cumprimento deste despacho acarreta a consequência processual prevista no nº 5. (2)”
Na situação em causa nos presentes autos, não tendo aposto no correio eletrónico que utilizou para enviar o requerimento de abertura de instrução a assinatura eletrónica avançada e a validação cronológica, nem tendo apresentado os originais de tal requerimento no prazo de 10 dias, o recorrente não cumpriu os trâmites adequados à validação da entrega de tal peça processual, pelo que teríamos optado por decidir manter a decisão recorrida.
Estas as razões pelas quais decidimos não acompanhar o sentido da decisão que fez vencimento.
Évora, 22.11.2022
Maria Clara Figueiredo

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1. Ao invés, estamos em crer que a posição que fez vencimento poderá redundar num desrespeito pelo princípio da legalidade em virtude de impor ao julgador que proceda a uma notificação que, a nosso ver, não encontra apoio nem na letra nem no espírito da lei, o que, ademais, poderá dar causa a situações de tratamento desigual dos diferentes intervenientes processuais, beneficiando os que não cuidaram de cumprir as regras, concedendo-lhes um prazo suplementar para o fazerem, prazo do qual não puderam dispor os que desde logo optaram por atuar no estrito cumprimento das normas legais.
2. Neste sentido decidiram, entre outros, os seguintes arestos: Acórdão do STJ de 24.01.2018, relatado pelo Conselheiro Raúl Borges; acórdão da Relação de Coimbra de 13.05.2020, relatado pela Desembargadora Elisa Sales; acórdãos da Relação de Évora de: 09.03.2021, relatado pela Desembargadora Ana Brito; de 13.04.2021, relatado pela Desembargadora Fernanda Palma; de13.07.2021, relatado pelo Desembargador João Amaro; de 08.01.2022, relatado pelo Desembargador Nuno Garcia, todos disponíveis em www.dgsi.pt