Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
69/17.9T8GDL.E1
Relator: PAULO AMARAL
Descritores: CONTRATO DE COMPRA E VENDA
RESOLUÇÃO DO NEGÓCIO
Data do Acordão: 02/14/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: A resolução de um contrato pode resultar do comportamento de uma das partes incompatível com a sua manutenção em vigor.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 69/17.9T8GDL.E1
Acordam no Tribunal da Relação de Évora

(…) intentou a presente acção de condenação sob a forma de processo comum contra (…) peticionando a condenação da desta a:
- Reconhecer que não lhe assistia o direito a resolver o contrato-promessa celebrado com o Autor, nomeadamente fixando unilateralmente prazo para pagamento da cortiça;
- Reconhecer que o contrato promessa está definitivamente incumprido por parte e culpa da Ré que vendeu ou pelo menos, fez desaparecer do local a cortiça que o Autor que o Autor se propôs e prometeu comprar;
- A entregar ao Autor a quantia de € 20.000,00 respeitante à devolução do sinal recebido e uma indemnização de igual valor, acrescida dos juros desde a data da citação até integral pagamento.
Subsidiariamente caso se entenda que o contrato celebrado era de compra e venda a condenação da Ré a:
- Reconhecer que não cumpriu culposamente o contrato;
- A indemnizar o Autor por perda de lucros que o mesmo obteria caso pudesse negociar a cortiça adquirida no valor de € 11.250,00, a que acresce a devolução da quantia entregue a título de preço, no valor de € 10.000,00 no total de € 21.250,00 bem como nos juros que se vencerem desde a data da citação até integral pagamento;
Subsidiariamente caso se entenda que não há contrato promessa nem contrato de compra e venda, a condenação da Ré a:
- A devolver ao Autor a quantia que este lhe entregou, ou seja, € 10.000,00 acrescida dos juros à taxa legal, desde a data de citação até integral pagamento.
Alegou para tanto que por escrito de 19 de Agosto de 2016, a Ré se comprometeu a vender ao Autor a cortiça referente a extracção de 2016 com peso aproximado de 2.500 arrobas, pelo valor global de € 75.000,00. Acordaram ainda que o levantamento da cortiça apenas seria feito após pagamento integral do preço acordado. Nessa altura, o Autor entregou à Ré o valor de € 10.000,00.
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A R. contestou e em reconvenção, pediu a condenação do Autor/reconvindo a indemnizá-la no valor global de € 5.880,00, sendo a quantia de € 5.000,00 respeitante ao valor que deixou de receber por ter vendido a cortiça por valor mais baixo e a quantia de € 880,00 pelas despesas que suportou com a guarda e segurança da cortiça.
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O processo seguiu os seus termos e, depois de realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, julgando parcialmente procedente o pedido subsidiário invocado pelo Autor, condenou a Ré a restituir ao Autor a quantia de € 10.000,00 (dez mil euros), acrescido de juros de mora à taxa legal supletiva desde a data da citação, até integral e efectivo pagamento, absolvendo-se a Ré do pedido principal, bem como do demais subsidiariamente formulados.
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Desta sentença recorre a R. impugnando a matéria de facto bem como a solução de direito.
Conclui a sua alegação desta forma:
O facto não provado 4 deverá ser considerado facto provado.
Deverá ser acrescentado um facto provado D (renumerando-se os seguintes) com o seguinte teor: “O montante de € 10.000,00 foi entregue pela R. como sinal”.
Aplicando-se as regras previstas no artigo 236.º do Código Civil, a carta contrato subscrita pelas partes deverá ser qualificado como contrato promessa.
Tendo havido incumprimento do promitente comprador, nos termos do artigo 442.º do CC a parte cumpridora tem direito a fazer seu o sinal, o que deve ser reconhecido.
Mesmo que se entenda, sem conceder, que a “carta contrato” é um contrato de compra e venda, a aplicação do regime legal relativo ao sinal, considerando o incumprimento do comprador, permitiria à vendedora, ora recorrente, fazer sua a quantia recebida a título de sinal.
Mesmo que assim não seja entendido, não há neste processo qualquer resolução – nos termos do artigo 436.º do CC é exigida uma declaração de resolução que neste caso não existe – pelo que não pode haver qualquer limitação na indemnização pelo interesse contratual negativo.
Pelo que no presente processo, a justa compensação da recorrente é fazer sua a quantia recebida de 10.000 euros e igualmente ter vencimento no pedido reconvencional, na quantia de 5.000 euros que peticionou, que é o montante em falta para perfazer a quantia de 75.000 que a recorrente teria recebido se a “carta contrato” tivesse sido cumprida.
Acrescidos da quantia peticionada de 880 euros de despesas comprovadas que teve fruto da mora do comprador.
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O A. recorreu subsidiariamente concluindo a sua alegação nestes termos:
O que o ora recorrente e a recorrida quiseram celebrar e celebraram foi um contrato promessa de compra e venda da pilha de cortiça constante da carta contrato junta aos autos, alterando-se para provada a matéria constante dos nºs 1 e 2 da sentença pois
Nunca foi transmitida a propriedade da pilha de cortiça para o ora recorrente;
Nunca o mesmo a poderia levantar nem dar-lhe o destino que entendesse como coisa sua;
Nunca o mesmo, para além de não ter adquirido a cortiça, entrou na posse da mesma;
Foi a ora recorrida, Dra. (…), quem suportou os custos com a guarda da cortiça tal como fazia anteriormente à celebração do contrato, correndo os encargos com a sua guarda por sua conta e risco;
Independentemente de se considerar que o Tribunal não está vinculado à qualificação dos negócios dadas pelas partes, atendendo ao circunstancialismo fático dado como provado, deverá dar-se como provado que as partes celebraram, não um contrato de compra e venda, mas sim um contrato promessa de compra e venda e assim o declararam quando foi entregue a quantia de € 10.000,00 a título de sinal conforme resulta do documento que instrui os autos.
Não tendo estipulado prazo para o pagamento integral da cortiça, por sobre tal o contrato ser omisso, deveria a Dra. Noémia intentar acção especial de fixação judicial do prazo (artigo 1026.º do Código de Processo Civil) dado que é uso e costume nesta actividade o negócio ser pago em parte e depois, o final, só na data estipulada no mesmo, o que, in casu, não aconteceu;
Não poderia a ora recorrida fixar unilateralmente um prazo, nas condições em que o fez, mais até porque não é uso e costume neste tipo de negócios assim acontecer.
Caso a ora recorrida tivesse instaurado uma acção judicial visando o estabelecimento dum prazo judicialmente, dada a simplicidade e a brevidade duma acção deste tipo, obteria sentença em menos de trinta dias, a fixar o prazo que unilateralmente fixou ao ora recorrente.
Ao vender a cortiça a outra entidade, conforme resulta provado da discussão da matéria de facto, a ora recorrida incumpriu o contrato prometido.
Impendendo sobre si a responsabilidade de restituir a quantia recebida a título de sinal, no valor de € 10.000,00, acrescida de importância de montante igual nos termos do n.º 2 do art.º 442.º do Código Civil, o que se pede no presente recurso.
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O facto não provado n.º 4 tem o seguinte teor:
O Autor assegurou à Ré que o levantamento e pagamento da cortiça seria feito em poucos dias, tendo sido nessa convicção e com essa vontade que a Autora subescreveu a “carta-contrato”.
Baseia-se no seu próprio depoimento de parte, corroborado pelo depoimento da testemunha (…).
Contudo, estas declarações apenas serviriam para provar uma parte e não a totalidade que a R. pretende. Com efeito, o que se retira da prova oferecida a este respeito é que o A. iria apressar a retirada da cortiça — nada mais. Mas o que não está provado é muito mais do que isto (designadamente a parte final) e para tanto não há prova.
Assim, mantém-se o facto como não provado.
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Em relação ao facto que se pretende aditar, não vemos qualquer prova que suporte a alteração pretendida.
O único elemento de que se socorre é o facto de estar manuscrito, na face do contrato, «cheque de sinal (…) 10.000 Euros».
Mas isto não converte o princípio de pagamento em sinal. O sinal, para valer como tal, tem de ser expressamente estipulado pelas partes. Se no contrato promessa se presume que qualquer quantia entregue é um sinal, num contrato de tipo diferente tal presunção não existe; o que significa que para que uma quantia entregue tenha tal qualidade ela tenha quer fixada entre as partes.
No caso dos autos, apenas temos a declaração aposta pela R. no documento que incorpora o contrato sem que se veja qualquer mútuo consenso a respeito de uma cláusula de sinal. É que, por um lado, não vemos, para já e sem prejuízo de melhor análise a ter lugar mais adiante, que estejamos perante um contrato promessa; e, por outro, do contrato não consta aquela cláusula.
Assim, não se faz o aditamento.
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Também o A. pretende a alteração da matéria de facto entendendo que devem ser dados por provados os seguintes (e que, na sentença, foram dados por não provados):
A Ré tinha conhecimento que o Autor teria de encontrar previamente comprador para a cortiça, de molde a gerar receita para o pagamento desta.
É uso e prática corrente que depois de pago parte do preço, o pagamento do remanescente é pago a 3, 4 e 5 meses, dado as especificidades do produto.
Para isto baseia-se em diversos depoimentos mas que não têm o alcance querido pelo A.. Com efeito, o que deles se retira é que a R. sabia que a cortiça seria para revender mas nada mais. Quanto ao segundo facto, cremos que ele é inócuo uma vez que o contrato define exactamente os termos em que o preço deve ser pago (a cortiça só será levantada depois de pago o preço).
Uma regra usual cede perante uma regra estabelecida no contrato.
Assim, nada se altera.
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A matéria de facto é a seguinte:
A) Por documento de fls. 12 subscrito por Autor e Ré denominado “Carta-Contrato de compra e venda” datado de 19 de Agosto de 2016, declararam as partes que: “Esta carta-contrato firma a compra de cortiça efectuada pela firma (…), domiciliada em (…) – Sta. Maria da Feira, e venda da cortiça efectuada pela Exma. Sra. (…), domiciliada em (…) – S. Margarida da Serra. Esta cortiça da extracção do ano de 2016 fica situada na propriedade denominada (…) da freguesia Sta. Margarida, concelho de Grândola, com o peso aproximado de 2500 arrobas, sendo o preço da cortiça amadia acordado entre ambas as partes de € 30,00 por arroba de 15 kgs. ou o valor global de € 75.000,00.”
B) Acordaram ainda as partes que:
“1 – A cortiça comprada a peso deve estar totalmente isenta de humidade.
2 – A cortiça comprada em globo deve ser carregada em qualquer situação atmosférica.
3 – Condições e pagamento e carregamento devem ser de mútuo acordo entre vendedores e compradores. Levantamento da cortiça será feito após o pagamento total da mesma”.
C) Na altura da celebração do contrato, o Autor entregou a Ré o cheque n.º (…) sacado sobre o Montepio Geral no montante de € 10.000,00 e, por esta, apresentado a pagamento.
D) A Autora remeteu ao Réu carta registada de 20 de Setembro de 2016, com o seguinte teor: “Verificando-se que até à presente data não houve da parte de V. Exas. qualquer sobre o pagamento e o levantamento da cortiça – e que não há interesse numa situação de indefinição, a vendedora vem pela presente comunicação, nos termos do artigo 777º do Código Civil, fixar um prazo para o cumprimento do contrato que será de 30 dia a contar da recepção da presente comunicação. Decorrido que seja esse prazo, sem que o supra identificado contrato esteja cumprido, a vendedora considerará o contrato em incumprimento por parte de V. Exas., com as legais consequências”.
E) Em fins de Outubro/princípios de Novembro de 2016, a Ré já tinha vendido a terceiro a cortiça.
F) A cortiça já tinha sido retirada da árvore e não atrasava a possibilidade de futuras extracções.
G) A Ré vendeu a cortiça à empresa (…) – Cortiças Lda., pelo preço de € 60.000.00.
H) A cortiça encontrava-se visível da estrada, no interior da propriedade da Ré onde existia uma corrente, sujeita a roubos e outras formas de a colocar em risco.
I) A Ré contratou uma pessoa – o Sr. (…) – que ficou a pernoitar no monte para guardar a cortiça e a quem pagava a quantia de € 20,00 por noite.
J) Passados alguns dias da assinatura da “carta-Contrato”, a Ré começou a insistir com o Autor para que fizesse o pagamento e levantasse a cortiça.
L) O Autor ia arranjando pretextos até que deixou simplesmente de atender as chamadas da Ré e do Sr. (…).
M) Na data da missiva mencionada em D) já a Ré não conseguia falar com o Autor há vários dias, o mesmo sucedendo após a expedição desta.
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O primeiro problema é o da qualificação do contrato: ou se trata de um contrato promessa de compra e venda ou se trata de um contrato definitivo de compra e venda.
Ambas as partes defendem nas alegações que se trata do primeiro tipo.
Foi a tese logo defendida pelo A. (daí o seu pedido principal) sendo que a R. apenas coloca hipóteses (se for promessa, segue-se uma consequência e se não for segue-se outra) na sua contestação, não defendendo, a este respeito, qualquer solução.
Uma coisa temos por certa: não é por as partes, no recurso, querem que o contrato dos autos seja contrato promessa que ele o é; será ou não consoante a sua vontade no momento da celebração do negócio. A vontade real que vale, que realiza o negócio, é a vontade real ao tempo da celebração. Sobre isto devemos ter em conta a regra fundamental da interpretação de contratos escritos e que é esta: não pode valer, como resultado da interpretação, a declaração «com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento» (art.º 238.º Cód. Civil).
Nem é por haver uma quantia entregue que leva à conclusão de existe um contrato promessa. Nos termos do art.º 440.º, a entrega é havida como antecipação do cumprimento, sem prejuízo, face ao disposto neste preceito e ao disposto no art.º 405.º, n.º 1, as partes estipularem o contrário. Em sentido oposto, é quando existe um contrato promessa que a lei presume ser sinal a quantia entregue (cfr. António Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, Almedina, Coimbra, 1990, p. 175). Ou seja, não é por haver uma entrega de dinheiro que (1.º) estamos perante um contrato promessa ou que (2.º) esse dinheiro tem o carácter de sinal. Primeiro é preciso apurar os termos da cláusula concreta do negócio e, se não se descortinar qual a vontade das partes sobre a qualificação da quantia entregue, deveremos, então, aplicar as presunções legais. Mas para tanto, teremos de interpretar a totalidade do contrato e não só a cláusula em questão.
Lendo o contrato escrito junto aos autos, não vemos que as partes tenham prometido seja o que for; pelo contrário, o que dele resulta é que o negócio jurídico já havia sido realizado pois que o documento «firma a compra de cortiça efectuada». Claro que isto não significa que o negócio tenha sido logo executado; o próprio litígio deixa ver que assim não aconteceu. Mas a falta de execução não altera a substância nem a natureza do contrato que as partes fizeram. Não é por as prestações deverem ser realizadas posteriormente que estamos perante um contrato promessa; estamos sim perante um contrato definitivo que ainda se não cumpriu.
Mas, dado o tipo de contrato (art.º 408.º, n.º 1), tal não impede a produção dos seus efeitos típicos: a transferência do direito de propriedade, a obrigação de pagar o preço e a obrigação de entregar a coisa (art.º 879.º).
Assim, concordamos com a qualificação que foi feita na sentença: não é um contrato promessa nem o dinheiro entregue é sinal.
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A recorrente defende ainda que não há neste processo qualquer resolução – nos termos do art.º 436.º do CC é exigida uma declaração de resolução que neste caso não existe – pelo que não pode haver qualquer limitação na indemnização pelo interesse contratual negativo.
Com isto quer dizer que o contrato se mantém em vigor?
A R. exigiu o cumprimento da prestação do A. e fixou para tal o prazo de 30 dias, com o aviso de que, caso o cumprimento não se realizasse, «a vendedora considerará o contrato em incumprimento por parte de V. Exas., com as legais consequências» [al. D]. Com a carta referida, a R. pretendeu pôr fim ao contrato pois que a consequência da omissão do devedor, nos termos do art.º 808.º, é ter-se por não cumprida a sua prestação, o que, por sua vez, confere o direito de resolução. Não há, é certo, uma declaração (expressa ou tácita) de resolução mas como entender esta carta? Não pode ser outra vez uma intimação para cumprir pois que o prazo já tinha sido dado. Por outro lado, e então, que significado, neste contexto, pode ter a venda a terceiro da cortiça que tinha sido vendida ao A.? Se isto é afirmação da vigência do contrato, o mínimo que se pode dizer é que é uma forma estranha de o mostrar. A venda do bem a terceiro é um acto jurídico (além, claro, da sua intrínseca natureza) cujos efeitos vão além da produção dos efeitos típicos do negócio. Na verdade, a venda referida tem reflexo no anterior contrato uma vez que inviabilizou o seu cumprimento (dando agora de barato a resolução) e uma vez que (tendo havido resolução como houve) é um sinal de que a R. se considerava desvinculada perante o A.. Ou seja, vista a questão de um ou de outro prisma, a conclusão que tiramos é que a R. resolveu o contrato pois que a isto levam os elementos interpretativos disponíveis.
Não pela declaração que a lei exige mas sim por um comportamento incompatível com a manutenção do contrato. Não houve declaração porque esta tem um destinatário e o comportamento da R. não foi dirigido ao A. (desconhece-se quando o A. soube da segunda venda). E o mesmo se passa, aliás, com o A. cujo desinteresse, revelado pelo seu silêncio face às tentativas de contacto pela R., é indicador da sua desvinculação.
O que se passa é houve uma revogação real traduzida num comportamento que assenta na vontade de não mais ser parte em determinado contrato. E a revogação real, seja unilateral, seja bilateral, é o exercício de um direito potestativo cujo efeito é uma alteração na ordem jurídica (no caso, a extinção do contrato).
Entendemos, assim, que houve resolução do negócio, entendemos que o contrato já não estava em vigor.
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A «resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico» (art.º 433.º), isto é, deve ser restituído tudo o que tiver sido prestado, nos termos do art.º 289.º.
Mas isto não afasta, em termos gerais, a indemnização pelo interesse contratual negativo, a indemnização que visa reparar o dano «que o credor não sofreria se o contrato não tivesse sido celebrado» (Pinto Monteiro, ob. cit., p. 694; cfr. também os acs. do STJ, de 12 de Fevereiro de 2009 e de 15 de Dezembro de 2011, além de outros elementos citados na sentença).
É isto que a recorrente defende mas, cremos, sem razão neste caso concreto.
Escreve-se na sentença:
«No caso vertente, poder-se-á admitir com facilidade em face dos factos provados, que a Ré acabou por vender a cortiça por um valor mais baixo do que o valor que o Autor declarou comprá-la.
«Indemnizar a Ré/reconvinte pela diferença, representaria colocá-la na mesma posição em que ficaria se o contrato tivesse sido regularmente cumprido.
«O interesse contratual negativo implicaria um plus probatório (que em boa verdade foi tentado, apesar de não ter sido alegado) designadamente, pela prova que se não tivesse existido a venda ao Autor, a Ré/reconvinte teria logrado comercializar a sua cortiça em condições mais favoráveis e por um preço melhor» — e, acrescentamos nós, seria este o seu dano.
Mas não temos na matéria de facto este dano diferencial, se assim se pode dizer, sendo certo que o que a A. pede é o dano contratual positivo, de cumprimento.
Assim, e por estes motivos, improcede o recurso da R..
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O recurso subordinado do A. assenta, em todos os seus fundamentos, na existência de um contrato promessa, com as consequências, nomeadamente ao nível do dinheiro entregue, deste tipo de contrato.
Já acima se afastou tal qualificação pelo que nos permitimos remeter para o que já foi exposto.
Em todo o caso, parece-nos importante arredar um argumento descrito nas alegações.
Defende o A. que a carta de 20 de Setembro de 2016 [al. D)] é a fixação unilateral de um prazo omisso no contrato pelo que deveria a R. intentar acção especial de fixação judicial do prazo.
Não concordamos.
O art.º 777.º, n.º 1, é claro ao afirmar que na falta de disposição legal ou convencional em contrário, o «credor tem o direito de exigir a todo o tempo o cumprimento da obrigação, assim como o devedor pode a todo o tempo exonerar-se dela».
O n.º 2 deste preceito legal regula uma situação diferente: aquela em que seja necessária a fixação de um prazo, necessidade esta que se impõe pela «própria natureza da prestação, quer por virtude das circunstâncias que a determinaram, quer por força dos usos».
Não vemos que neste caso exista alguma destas situações.
Por outro lado, a R. fixou, sem dúvida, um prazo ao A. para ele cumprir a sua prestação e fê-lo nos termos (embora citando outro dispositivo legal, o que é indiferente) do art.º 777.º, n.º 1, por um lado, e do art.º 808.º, n.º 1, por outro. Daí que, como acima já se disse, tenha havido resolução do contrato findo o prazo para prestar.
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Pelo exposto, julgam-se improcedentes os recursos.
Custas por ambas as partes em partes iguais.
Évora, 14 de Fevereiro de 2019
Paulo Amaral
Rosa Barroso
Francisco Matos