Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | PAULA DO PAÇO | ||
Descritores: | SUSPENSÃO DE TRABALHADOR SUBSÍDIO DE ALIMENTAÇÃO SANÇÃO ABUSIVA ÓNUS DA PROVA | ||
Data do Acordão: | 12/21/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | N | ||
Decisão: | REVOGADA EM PARTE | ||
Sumário: | I – Durante o período de suspensão preventiva, não será pago à trabalhadora o subsídio de alimentação cujo valor não exceda os montantes normalmente despendidos com o pagamento de uma refeição, uma vez que tal prestação pecuniária não integra a retribuição da trabalhadora. II – Não obstante o poder disciplinar constituir uma prerrogativa da entidade empregadora, o mesmo deve ser exercido exclusivamente para punir uma conduta ilícita e culposa do trabalhador, e nunca por razões persecutórias ou de retaliação, designadamente por o trabalhador ter exercido legitimamente um direito que lhe compete. III – O conceito de sanção abusiva é composto por dois elementos: - o elemento objetivo: a verificação de qualquer uma das situações descritas no n.º 1 do artigo 331.ª; - o elemento subjetivo: a intenção persecutória ou de retaliação por parte do empregador. Exige-se, também, uma relação direta de causa /efeito entre as situações previstas nas alíneas do n.º 1 do normativo e a sanção aplicada, que pode ser provada ou resultar da presunção consagrada no n.º 2 do normativo. IV – ónus de alegação e prova dos pressupostos que determinam o carácter abusivo da sanção recai sobre o trabalhador, nos termos previsto pelo artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil. Ao empregador cabe a alegação e prova de que se limitou a exercer os direitos que a lei lhe confere, não tendo a sanção aplicada qualquer fim de perseguição ou retaliação do trabalhador, e que a mesma sempre seria aplicada mesmo que o trabalhador nada tivesse empreendido. V – Tendo a empregadora alterado unilateralmente o horário de trabalho acordado com a trabalhadora, impossibilitando, com tal alteração, a conciliação entre a atividade profissional e a vida familiar da trabalhadora, a aplicação de uma sanção disciplinar motivada pela circunstância da mesma se ter oposto à alteração do horário e continuar a praticar o horário acordado, que é o que lhe permite conciliar a vida profissional com as responsabilidades maternais e familiares, leva à consideração de que a sanção aplicada é abusiva, com o consequente direito a indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, com o limite mínimo estabelecido no n.º 5 do artigo 331.º do Código do Trabalho. (Sumário da relatora) | ||
Decisão Texto Integral: | P. 1856/16.0T8EVR.E1 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] 1. Relatório BB (A.) intentou ação declarativa emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra CC (R.), ambas com os demais sinais identificadores nos autos, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe : a) € 367,22, relativos aos subsídios de refeição do período de suspensão preventiva da A.; b) € 19.512,80, nos termos do n.º 5 do artigo 331.º do Código do Trabalho [por lapso que é manifesto, indicou-se o artigo 311.º na petição inicial]; c) € 5.000,00, pelos danos morais sofridos pela A. em consequência da perseguição de que foi vítima por parte da Mesa da R., nos termos do n.º 3 do aludido artigo 331.º; d) Juros de mora, calculados à taxa legal, a partir do respetivo vencimento; no que respeita à alínea a), e da data da sentença no que respeita às alíneas b) e c). Alegou, em muito breve síntese e no essencial, que, na qualidade de empregadora, a R. lhe aplicou uma sanção disciplinar não extintiva, claramente desproporcionada e abusiva, tendo a A., em consequência, sofrido diversos danos não patrimoniais. Mais referiu que durante o período em que esteve preventivamente suspensa do exercício das suas funções profissionais, não lhe foi pago o subsídio de refeição. Realizada a audiência de partes, não se logrou obter solução conciliatória para o litígio. Contestou a R., tendo afirmado, desde logo, que a A. não tem direito ao peticionado subsídio de refeição, porque o mesmo só é devido nos dias de prestação efetiva de trabalho, o que, naturalmente, não ocorreu no período em que a trabalhadora esteve preventivamente suspensa das suas funções. Impugnou, também, a aplicação de qualquer sanção abusiva e desproporcionada, negando qualquer perseguição laboral à trabalhadora. Pugnou pela improcedência do pedido indemnizatório formulado. Foi proferido despacho saneador tabelar. Dispensou-se a identificação do objeto do litígio, bem como a enunciação dos temas de prova. Após a realização da audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença com o dispositivo que se transcreve: «Pelo exposto julgo a ação parcialmente procedente por provada e em consequência: a) absolvo a Ré CC dos pedidos formulados pela Autora BB. b) custas pela Autora. As partes não litigaram de má-fé. Fixo à ação o valor de € 24.880,22.» Inconformada com esta decisão, veio a Autora interpor recurso da mesma, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1- Do depoimento de parte da provedora da apelada de fls 1 a 9 da transcrição, resulta confessado o facto alegado no Artº71º da p.i:”, tendo a suspensão, sem perda de retribuição, durado 87 dias, procurou objetivamente a Mesa da R “compensar” aqueles dias de retribuição sem prestação de trabalho”. 2- Também entendemos que deveriam ser dados como provados os factos alegados nos Artºs. 38º e 39º da petição inicial, em face dos depoimentos das testemunhas … de Fls 158 a a fls 169 e …, de Fls 179 a 182, irmãs da apelante, bem como o relatório médico e o testemunho da Drº … de Fls 203 a 218 da transcrição. 3- Compaginando estes testemunhos com a data em que a apelante consultou a testemunha Drª … e a data da informação clínica que constitui o Doc. Nº32, junto à p.i – 9 de Julho de 2016 – i.e, quase mais de um ano depois da tentativa de alteração do horário de trabalho e de três notas de culpa, duas delas com intenção de despedimento, estando a correr a suspensão de 90 dias com perda de remuneração, o quadro clínico observado -tristeza, baixa de auto estima, insónia inicial e intermédia, ansiedade e sentimento de afronta à sua dignidade pessoal - é perfeitamente credível e enquadrado como consequência direta da situações vividas pela apelante no seu local de trabalho. 4- Sendo certo que a apelante exerceu legitimamente um direito que foi reconhecido judicialmente. 5- É devido o pagamento à apelante do subsídio de refeição durante o período de suspensão preventiva Conf. o sumário do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 5/12/2012, proferido no Procº2918/11.6TTLSB.L1 4 (in WWW:DGSI:PT): 21. A sanção disciplinar aplicada foi motivada pelo facto de a trabalhadora se recusar a cumprir uma ordem, a que na altura devia obediência, não devendo confundir-se com uma decisão judicial posterior à da verificação da infração. 22. Só existiria sanção disciplinar abusiva se tivesse sido ministrada à Apelante uma ordem para trabalhar aos sábados, já depois do trânsito em julgado da sentença que lhe reconheceu o direito de não trabalhar nesse dia e esta se recusasse legitimamente a fazê-lo, sendo-lhe, por tal motivo, instaurado procedimento disciplinar. 23. Como também só existiria sanção disciplinar abusiva, nos termos da alínea d), do nº 1, do artigo 331º, do Código do Trabalho, se a mesma decorresse de processo disciplinar instaurado, pela falta aos sábados, após o trânsito em julgado da referida sentença, sem que houvesse uma ordem para tanto. 24. A aplicação de uma qualquer sanção disciplinar é um dos direitos do empregador no exercício do poder disciplinar. 25. Não existindo qualquer ordem ilegítima, no que concerne aos factos constantes das duas primeiras notas de culpa, uma vez que a Apelante não podia faltar ao trabalho naqueles dias e faltou. 26. Quanto à terceira nota de culpa a Apelante não podia deixar de cuidar da utente sem autorização da Apelada. 27. Os três procedimentos disciplinares, objeto de apensação entre si, não revelam infrações primárias por parte da Apelante. 28. Uma vez que a mesma já tem sanções anteriores registadas no seu processo individual de trabalhadora, conforme resultou provado nos autos, a primeira das quais remonta ao ano de 2010. 29. A sanção disciplinar aplicada é justa, quer pela gravidade da conduta da Apelante quer por se tratar de infratora recidiva. 30. Não ocorrendo a aplicação de qualquer sanção desproporcionada ou abusiva, conforme estatuídas na Lei, a Apelante não tem direito a receber qualquer indemnização. 31. Não sendo também devida qualquer indemnização a título de danos morais, pois não resultou provado que a Apelante tivesse sido vítima de perseguição por parte da Mesa da Ré. 32. A Sentença proferida pelo Tribunal a quo não violou qualquer normativo legal. 33. Não merecendo qualquer censura ou reparo, mormente quanto às questões apontadas pela Apelante no presente recurso, devendo a mesma, em consequência, vir a ser confirmada, com todas as consequências legais. Admitido o recurso, os autos subiram ao Tribunal da Relação. * II. Objeto do RecursoÉ consabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, com a ressalva da matéria de conhecimento oficioso (artigos 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil aplicáveis por remição do artigo 87.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho). Em função destas premissas, as questões suscitadas no recurso são: 1.ª Impugnação da matéria de facto; 2.ª Direito ao subsídio de alimentação durante o período de suspensão preventiva; 3.ª Aplicação de sanção abusiva e desproporcionada, e direito a indemnização. * III. Matéria de FactoO tribunal de 1.ª instância considerou provados os seguintes factos: 1 – Em 4 de Dezembro de 2014 a Ré deferiu o pedido formulado pela Autora por carta datada de 23 de Outubro de 2014, para prestar trabalho em regime de flexibilidade de horário a partir de 9 de Dezembro de 2014. 2 – Este horário era rotativo (2 semanas) sendo na 1ª semana o dia de descanso semanal obrigatório na 3ª feira da 2ª semana e o dia de descanso semanal complementar no sábado. 3 – Na 2ª semana dia de descanso semanal obrigatório no domingo e o dia de descanso semanal complementar no sábado. 4 – A Autora propôs a adoção daquele horário flexível por necessitar do Sábado para cuidar do seu filho menor, à data com 6 meses de idade e não ter quem cuidasse dele ao Sábado. 5 – Em 15 de Junho de 2015 a Autora enviou à Ré uma missiva na qual pede seja dispensada de exercer funções aos Sábados por motivo de assistência familiar ao seu filho e o seu cônjuge trabalhar ao Sábado e a Creche onde o filho fica encontrar-se encerrada ao sábado. 6 – A Ré em 25 de Junho de 2015 indeferiu o pedido da Autora, alegando "... a necessidade de assegurar a prestação de cuidados aos utentes 365 dias por ano, sendo que não podemos criar exceções entre colaboradores, quando estas são motivo de reparos entre os que se sentem discriminados ...". 7 – A Autora por carta de 3 de Julho de 2015 recebida pela Ré em 6 de Julho de 2015 manifestou a sua oposição à alteração do seu horário flexível com o descanso complementar ao Sábado. 8 – Por carta de 9 de Julho de 2015 a Ré comunicou à Autora que "... deve cumprir integralmente o horário que lhe foi atribuído para vigorar a partir de 9. 7. 2015. 9 - A Autora não acatou esta decisão e continuou a praticar o horário em vigor e anterior a 9. 7. 2015. 10 - Em 20. 8. 2015, a Ré por carta datada de 20. 8. 2015, na sequência de carta da Autora datada de 3 do corrente mês, comunicou à Autora que "... Assim, contabilizadas as "horas a mais" e as "horas a menos" correspondentes ao período de 9. 12. 2014 a 30. 6. 2015, verificaram-se os seguintes desvios: - Horas feitas a mais: 78horas - Horas feitas a menos: 19horas - Diferença a seu favor: 59horas Constatado este facto a Mesa Administrativa deliberou aceder à sua pretensão de retirar duas horas diárias ao horário que lhe foi atribuído durante o período correspondente às 59horas Por mera questão de conveniência de serviço estipula-se que as duas horas diárias devem ser retiradas no período da tarde, imediatamente anterior à hora da sua saída ...". 11 – Com data de 3 de Setembro de 2015 foi comunicado à Autora a instauração de processo disciplinar e enviada a respetiva nota de culpa. 12 – A autora respondeu à nota de culpa alegando não existir qualquer desobediência ilegítima a ordem da entidade patronal por a ordem da Mesa Administrativa ser ilegal. 13 - Com data de 4 de Novembro de 2015 a Ré decidiu enviar nova nota de culpa com factos não incluídos na primeira, por à data não serem conhecidos e comunicando-lhe a intenção de proceder ao despedimento da Autora com justa causa. 14 - A Autora ofereceu resposta à nota de culpa e arrolou prova testemunhal. 15 - Em 19 de Janeiro de 2016 a Ré suspendeu preventivamente a Autora sem perda de retribuição. 16 - Em 18 de Fevereiro no âmbito do mesmo processo disciplinar enviou à Autora a nota de culpa com intenção de despedimento. 17 - A Autora apresentou a sua resposta em 7 de Março de 2016. 18 - Em 20 de Abril de 2016 foi enviada à Autora notificação de arquivamento do inquérito que correu termos no DIAP - … em que era ofendida DD e arguida a ora Autora. 19 - DD era utente da Ré e a Autora tinha a seu cargo a higiene pessoal da utente. 20 - Em 3 de Maio de 2016 Autora e Ré foram notificadas da sentença proferida nos autos de processo comum que correu termos por este Juízo, ao tempo Tribunal, sob o nº 282/16.6T8EVR e em que a Ré foi condenada a manter à Autora o horário de trabalho flexível em vigor até 9. 7. 2015 e acordado com a anterior Mesa da Ré. 21 - Em 20 de Maio de 2016 a Ré comunicava à Autora que decidira aplicar noventa dias de suspensão com perda de retribuição e antiguidade, correspondentes aos factos constantes das 3 notas de culpa. 22 - À data da suspensão preventiva a Autora auferia a remuneração mensal base de € 550,00 e um subsídio diário de alimentação de € 4,27. 23 - A partir de 1 de Agosto de 2016 a Autora passou a auferir a remuneração mensal base de € 578,00 e subsídio diário de alimentação de € 4,27. 24 - A Ré não pagou à Autora o subsídio de refeição respeitante ao período de suspensão preventiva. 25 - A Autora cumpriu suspensão nos meses de Junho, Julho e Agosto de 2016 e apresentou-se ao serviço da Ré no dia 2 de Setembro de 2016. 26 - A partir dessa data a utente DD deixou de estar a cargo da Autora. 27 - A Autora iniciou no dia 6 de Outubro o gozo das suas férias vencidas em 1 de Janeiro de 2016. 28 - A informação clínica de 9 de Julho de 2016 foi elaborada com base nas informações prestadas pela Autora na consulta de psiquiatria a que compareceu nessa data de 9 de Julho de 2016. 29 - Nem antes dessa data, nem posteriormente a Autora voltou a ser observada na consulta de psiquiatria. 30 - Desde finais do ano de 2015, Novembro/Dezembro que se falava na instituição entre as colegas da Autora sobre a acusação que a utente DD havia feito à Autora. 31 - Na sequência dessa imputação a Autora deixou de prestar os cuidados de higiene à utente DD ao mesmo tempo que deixou de lhe falar. 32 - A Autora não solicitou à Ré dispensa de cuidar da utente DD nem comunicou que o deixara de fazer. 33 - Eram as colegas da Autora que ao verem que a utente não tinha sido cuidada quem lhe prestava os cuidados de higiene que aquela necessitava. 34 - A Autora já anteriormente em Março de 2010 e Setembro de 2013 havia sido punida disciplinarmente com a sanção de repreensão registada. 35 - À data 20 de Maio de 2016 em que a Autora foi notificada da sanção disciplinar a sentença proferida nos autos que correu termos por este Juízo, ao tempo Tribunal, sob o nº 282/16.6T8EVR ainda não se tornara definitiva. 36 - A Mesa da Ré não desconhecia o arquivamento do inquérito crime contra a Autora por força da incongruência das declarações da utente DD, pois a mesma, data a sua provecta idade, foi objeto de acompanhamento naquele processo por responsáveis da Ré, designadamente por membros da Mesa. 37 - A decisão do processo disciplinar aguardou pela prolação da sentença, na medida em que poderia perfeitamente ser proferida antes da sentença. 38 - A autora é a associada nº … do CESP - Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal. * IV- Impugnação da matéria de factoEm sede de recurso, a apelante impugna a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de 1.ª instância, por considerar que deveriam ter sido dados como provados: (…) Pelo exposto, face à prova produzida, afigura-se-nos que deverá ser aditado à factualidade assente o ponto 39 com o seguinte teor: - Em consequência do procedimento disciplinar e do circunstancialismo de que foi acusada, a Autora sentiu-se perseguida pela entidade empregadora, tendo-lhe sido diagnosticado, em 9 de julho de 2016, um quadro clínico de Perturbação Ansiodepressiva reativa, caracterizada por “tristeza, baixa de auto estima, insónia inicial e intermédia, ansiedade e sentimento de afronta à sua dignidade pessoal”. Mostra-se, assim, parcialmente procedente a impugnação. * V. Subsídio de alimentaçãoNa petição inicial, a agora apelante pediu a condenação da empregadora a pagar-lhe a quantia de € 367,22, relativa aos subsídios de refeição do período de suspensão preventiva, que não foram pagos, acrescida dos respetivos juros moratórios. O tribunal de 1.ª instância julgou improcedente tal pedido, com a seguinte fundamentação: «Ora quanto ao subsídio de alimentação vigora quer na doutrina quer na jurisprudência uma presunção ilidível sobre o seu carácter não retributivo durante o período de suspensão preventiva do trabalhador, a não ser que tal presunção seja ilidida pelo trabalhador, (neste sentido veja-se por os Acórdãos do S.T.J. de 27.11.2007 processo 07S2879 e do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.5.2014 processo nº 665/12.0TTBRR.L1-4, ambos in www.dgsi.pt). Atento o exposto cabia à Autora alegar e provar que o pagamento daquele subsídio ocorria independentemente dos dias efetivamente trabalhados, para o seu pagamento ser devido mesmo durante o período de suspensão preventiva, ora a Autora nem alegou nem provou tal facto pelo que deve quanto a este ser julgado improcedente o peticionado.» Analisemos a questão. Estipula o n.º 1 do artigo 354.º do Código do Trabalho que, com a notificação da nota de culpa, o empregador pode suspender preventivamente o trabalhador cuja presença na empresa se mostrar inconveniente, mantendo o pagamento da retribuição. No mesmo sentido, preceitua o n.º 5 do artigo 329.º do referido código que «[i]niciado o procedimento disciplinar, o empregador pode suspender o trabalhador se a presença deste se mostrar inconveniente, mantendo o pagamento da retribuição». A pergunta que de imediato se coloca em face da questão suscitada no recurso é a de saber se conceito de “retribuição” previsto nas duas normas, contempla o subsídio de refeição, uma vez que o legislador optou por não especificar quaisquer prestações pecuniárias. De harmonia com o preceituado no artigo 260.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 do Código do Trabalho, as importâncias pagas a título de subsídio de refeição, não se consideram retribuição, salvo quando o valor pago exceda largamente o gasto com a alimentação que o trabalhador incorre por causa da prestação do trabalho, e que se visa compensar com tal subsídio. Sobre a matéria, escreve Monteiro Fernandes[2], que ao subsídio de refeição não deve ser conferido carácter retributivo, apesar da regularidade e periodicidade da sua atribuição. A lei admite a sua consideração como tal se e quando o seu valor exceda um montante dito normal ou o mesmo seja tido, pelo contrato ou pelos usos, como elemento integrante da retribuição, sem embargo de, ainda assim, não ser devido nos dias em que, por qualquer razão, o trabalhador não compareça ao trabalho. Este tem sido, igualmente, o entendimento assumido pelo Supremo Tribunal de Justiça (cfr. v.g. Acórdãos de 26/5/2015, P. 373/10.7TTPRT.P1.S1; de 17/1/2007, P. 2188/06.4; e de 22/2/2017, P. 2236/15.0T8AVR.P1.S1. E, especificamente quanto à não inclusão ou condições para a inclusão do subsídio de refeição na retribuição a que o trabalhador tem direito no período de suspensão preventiva, pronunciou-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça identificado na decisão recorrida, que embora se reporte ao Código do Trabalho de 2003, permanece atual para o Código do Trabalho de 2009 (dado não ter ocorrido qualquer alteração na lei). Escreveu-se no douto aresto: «O artigo 417.º do Código do Trabalho dispõe que «[c]om a notificação da nota de culpa, o empregador pode suspender preventivamente o trabalhador, sem perda de retribuição, sempre que a sua presença se mostrar inconveniente» (n.º 1). Por sua vez, o n.º 2 do artigo 260.º do mesmo Código, determina que o disposto no seu n.º 1, com as necessárias adaptações, se aplica ao abono para falhas e ao subsídio de refeição, estabelecendo esse n.º 1 que não se consideram retribuição as importâncias aí discriminadas, salvo quando excedam os respetivos montantes normais, sendo, por isso, superiores aos encargos assumidos pelo trabalhador. Assim, no que se refere ao subsídio de refeição, ainda que este seja pago com regularidade e periodicidade, não deve ser qualificado como uma prestação retributiva, salvo se o seu valor exceder os respetivos montantes normais, ou seja, o gasto que essa prestação pretende compensar.» Não vislumbramos qualquer razão para divergir desta jurisprudência, que emerge dos termos utilizados pela própria lei. A natureza retributiva do subsídio de refeição está diretamente ligada com o objetivo de compensar o trabalhador com os gastos que tem de suportar com a sua alimentação quando vai trabalhar. Assim, apenas aquilo que excede o valor normal de uma refeição poderá constituir rendimento proveniente do trabalho, isto é, retribuição. Na concreta situação dos autos, resultou demonstrado que a apelada pagava à apelante um subsídio diário de alimentação de € 4,27. Trata-se de um valor que não excede os montantes normalmente despendidos com o pagamento de uma refeição, pelo que, não há como considerar que tal subsídio integrava a retribuição da trabalhadora. Destarte, a trabalhadora não tinha direito ao recebimento do aludido subsídio, durante o período de suspensão preventiva. Sufragamos, assim, a decisão recorrida que não reconheceu à trabalhadora esse direito, julgando, em conformidade, improcedente o fundamento do recurso agora analisado. * VI. Sanção abusiva e desproporcionada e direito à indemnizaçãoInvoca a apelante que a sanção que lhe foi aplicada é uma sanção abusiva. O Código do Trabalho não define o conceito de sanção abusiva, mas elenca taxativamente no n.º 1 do artigo 331.º as situações que, na eventualidade de virem a originar a aplicação de uma sanção disciplinar, levam à consideração de que a sanção aplicada é abusiva. Dispõe o aludido preceito legal: «Considera-se abusiva a sanção disciplinar motivada pelo facto de o trabalhador: a) Ter reclamado legitimamente contra as condições de trabalho; b) Se recusar a cumprir ordem a que não deva obediência, nos termos da alínea e) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 128.º; c) Exercer ou candidatar-se ao exercício de funções em estrutura de representação coletiva dos trabalhadores; d) Em geral, exercer, ter exercido, pretender exercer ou invocar os seus direitos ou garantias.» Nos termos previstos pelo n.º 2 do preceito, a sanção aplicada alegadamente para punir uma infração, presume-se abusiva, quando tenha lugar: a) Até seis meses após qualquer dos factos mencionados no n.º 1 do artigo; b) Até um ano após reclamação ou outra forma de exercício de direitos relativos a igualdade e não discriminação. Esta presunção é uma presunção júris tantum, portanto, ilidível, cabendo ao empregador fazer a prova do contrário (artigos 344.º, n.º1 e 350.º, n.º 2 do Código Civil). Da análise do preceito, pode concluir-se que, não obstante, o poder disciplinar constitua uma prerrogativa da entidade empregadora, o mesmo deve ser exercido exclusivamente para punir uma conduta ilícita e culposa do trabalhador, e nunca por razões persecutórias ou de retaliação, designadamente por o trabalhador ter exercido legitimamente um direito que lhe compete. Sobre a matéria, escreve Menezes Cordeiro, in “Manual de Direito do Trabalho”, Almedina, 1999, págs. 755-756: «O princípio da boa fé apresenta-se aqui sob a sua dupla faceta de tutela da confiança e da primazia da materialidade subjacente. (…) A primazia da materialidade subjacente veda a utilização do processo disciplinar para quaisquer outros fins que não aqueles para que a lei o estabelece: o apuramento duma efetiva infração disciplinar e a sua punição. Justamente este ponto dá lugar a delicados conflitos de interesses: o empregador pode usar o poder disciplinar para retaliar contra trabalhadores incómodos ou para os desincentivar no exercício das suas posições sindicais. A lei especificou, assim, a categoria das sanções abusivas, que mais não são do que um afloramento desta regra geral.» E, prossegue este autor: «O abuso implica, se bem se atentar, a conjugação entre dois elementos: - um elemento objetivo, traduzido no facto de, a uma determinada atuação do trabalhador em defesa dos seus direitos, se seguir um procedimento disciplinar; - um elemento subjetivo, consistente no facto de, com o procedimento disciplinar, a entidade empregadora visar responder ao exercício, pelo trabalhador, das suas posições.» Deste modo, o conceito de sanção abusiva é composto por dois elementos: - o elemento objetivo: a verificação de qualquer uma das situações descritas no n.º 1 do artigo 331.ª; - o elemento subjetivo: a intenção persecutória ou de retaliação por parte do empregador (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16/1/2013, P. 1767/08.3TTLSB.L1.S1, acessível em www.dgsi.pt). Exige-se, também, uma relação direta de causa /efeito entre as situações previstas nas alíneas do n.º 1 do normativo e a sanção aplicada, que pode ser provada ou resultar da presunção consagrada no n.º 2 do normativo ou (v.g. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 31/3/2001, CJ/STJ, 2001, 1.º pág. 303; de 6/11/2002, Acórdãos Doutrinais, 498.º, pág. 1001; de 15/1/2003, Rev. n .º 698/02-4.ª , Sumários, Jan/2003) O ónus de alegação e prova dos pressupostos que determinam o carácter abusivo da sanção recai sobre o trabalhador, nos termos previsto pelo artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24/4/1996, BMJ 456, pág. 276). Ao empregador cabe a alegação e prova de que se limitou a exercer os direitos que a lei lhe confere, não tendo a sanção aplicada qualquer fim de perseguição ou retaliação do trabalhador, e que a mesma sempre seria aplicada mesmo que o trabalhador nada tivesse empreendido (v.g. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 13/11/1996, CJ/STJ, 1996, 3.º, pág.251; da Relação de Lisboa, da mesma data, CJ, 1996, 5.º, pág.168). Feitas as considerações gerais que se nos afiguraram pertinentes para melhor compreensão da figura jurídica da “sanção disciplinar abusiva” e dos ónus de alegação e de prova a ter em atenção em ação de impugnação de sanção abusiva, apreciemos, então, a concreta situação dos autos. Do acervo factual provado, resulta, com interesse, o seguinte: - Em 4 de dezembro de 2014, a R. deferiu um pedido formulado pela A. para prestar trabalho em regime de flexibilidade de horário, com descanso garantido ao sábado, porque a trabalhadora necessitava deste dia para ficar a cuidar do seu filho menor, à data com seis meses de idade, por não ter quem dele cuidasse nesse dia da semana; - O horário flexível, com descanso garantido ao sábado, entrou em vigor em 9 de dezembro de 2014; - Em 15 de junho de 2015, a A. enviou à R. uma missiva na qual pede para ser dispensada de exercer funções aos sábados, por motivo de assistência familiar ao seu filho, dado que o seu cônjuge trabalhava nesse dia da semana e a Creche onde a criança habitualmente ficava, encerrava ao sábado; - A R , em 25 de junho de 2015, indeferiu tal pedido, alegando "... a necessidade de assegurar a prestação de cuidados aos utentes 365 dias por ano, sendo que não podemos criar exceções entre colaboradores, quando estas são motivo de reparos entre os que se sentem discriminados ..."; - Por carta de 3 de julho de 2015 recebida pela R. em 6 de julho, manifestou a sua oposição à alteração do seu horário flexível com o descanso complementar ao sábado; - Por carta de 9 de julho de 2015 a R. comunicou à A. que "... deve cumprir integralmente o horário que lhe foi atribuído para vigorar a partir de 9. 7. 2015”; - A A. não acatou esta decisão e continuou a praticar o horário em vigor e anterior; - Em 3 de setembro de 2015, foi comunicada à A. a instauração de processo disciplinar, sendo a primeira nota de culpa deduzida, por a A. não ter comparecido ao serviço em dois sábados (11 e 25 de julho de 2015), por rejeitar o horário fixado pela R. para vigorar a partir de 9 de julho de 2015, continuando a praticar o anterior horário de trabalho; - Em 4 de novembro de 2015, a R. deduz e comunica à A. uma segunda nota de culpa, que abrange a não comparência da A. ao serviço em sábados, por continuar a rejeitar o novo horário; - Em 18 de fevereiro de 2016, é enviada uma terceira nota de culpa à A. por factos respeitantes à relação da A. com uma utente da instituição. - Em 20 de maio de 2016, a R. comunica à A. que lhe foi aplicada a sanção disciplinar de 90 dias de suspensão com perda de retribuição e antiguidade, correspondente aos factos constantes das 3 notas de culpa. Apreciemos os factos à luz do ordenamento jurídico- laboral. No que concerne ao horário de trabalho, estipula o n.º 1 do artigo 212.º do Código do Trabalho que o mesmo é determinado pelo empregador, com observância dos limites legais. Nos termos previstos na alínea b) do n.º 2 do normativo, na elaboração do horário de trabalho, o empregador deve facilitar ao trabalhador a conciliação da atividade profissional com a vida familiar. Também a alteração do horário de trabalho está sujeita ao mesmo condicionalismo (n. º1 do artigo 217.º do Código do Trabalho). Em causa está um princípio de suma importância social, ao ponto da sua violação constituir contraordenação grave – cfr. n.º 4 do mencionado artigo 212.ª e n.º 6 do artigo 217.º. A conciliação equilibrada entre a atividade profissional e a vida familiar é uma condição fundamental e constitui direito constitucional [cfr. artigo 59.º, n.º 1, alínea b) da Constituição da República Portuguesa]. Importa, também ter presente que, nos termos previstos pelo n.º 4 do mencionado artigo 217.º, o horário de trabalho individualmente acordado, não pode ser unilateralmente alterado (n.º 4 do mesmo artigo). Analisando o caso sub judice, infere-se do acervo factual provado que o horário de trabalho acordado para vigorar a partir de 9 de dezembro de 2014, foi unilateralmente alterado pela empregadora e tal alteração impossibilitou a conciliação entre a atividade profissional e a vida familiar da trabalhadora, dado que esta, como era do conhecimento da apelada, necessitava de ter o sábado livre para poder cuidar do seu filho menor, pois não tinha ninguém que o pudesse fazer. A trabalhadora recusou-se a praticar o horário alterado, continuando a cumprir o horário acordado. Por conseguinte, não compareceu ao serviço em alguns sábados que o horário alterado considerava dias de trabalho. Na sequência, foi-lhe instaurado procedimento disciplinar que culminou com a aplicação de uma sanção disciplinar conservatória. Ora, a decisão da empregadora de alterar unilateralmente um horário de trabalho acordado, sabendo que a apelante não tinha ninguém que ficasse com o filho ao sábado, constitui uma decisão ilegal, por violação do regime previsto no n.º 4 do artigo 217.º e desrespeito pelo princípio constitucional da conciliação entre a atividade profissional e a vida familiar – neste sentido, cfr. Acórdão da Relação do Porto de 8/7/2015, P. 410/13.3TTVFR.P1. Estando em causa uma determinação ilegal, violadora de direitos da trabalhadora, esta não estava obrigada ao dever de obediência correspondente. A oposição à alteração do horário e a manutenção do cumprimento do horário que havia sido acordado, com o gozo das folgas ao sábado, constituem atos de exercício de defesa dos direitos, executados pela trabalhadora. Porém, a apelada sancionou esse proceder com uma sanção disciplinar. Destarte, consideramos demonstradas as situações previstas nas alíneas a), b) e d) do n.º 1 do artigo 331.º do Código do Trabalho. E o exercício do poder disciplinar pela recusa de prestação de serviço aos sábados, sendo a ausência da trabalhadora, nesses dias, apenas a face visível dessa recusa, não deixa de constituir um ato de retaliação da empregadora, nas concretas circunstâncias dos autos, sendo manifesta a relação direta de causa/efeito entre a situação enquadrável nas alíneas a), b) e d) do n.º 1 do artigo 331.º e a sanção aplicada. A sanção aplicada é um efeito que visa prejudicar a trabalhadora, em resposta reativa ao exercício legitimo de um direito que lhe é reconhecido pelo ordenamento jurídico-laboral e mesmo pela Constituição da República Portuguesa. Demonstrados, assim, os elementos objetivo e subjetivo e a relação causa/efeito supra enunciadas e que o artigo 331.º pressupõe, há que considerar que a sanção aplicada se mostra abusiva. Tal vício afeta a sanção disciplinar na sua totalidade. A aplicação da sanção abusiva confere à trabalhadora o direito à indemnização nos termos gerais, que não deve ser inferior a 10 vezes a importância da retribuição perdida (n.º 5 do artigo 331.º). Explica Abílio Neto, in “Novo Código do Trabalho e Legislação Complementar anotados”, 1.ª edição, maio de 2009, Ediforum, pág. 564: …se o empregador usa dos poderes que a lei lhe reconhece para fins diferentes dos que lhe estão assinalados ou por forma desproporcionada está, em derradeira análise, a abusar do seu direito (art. 334.º do Cod. Civil), o que o faz incorrer na obrigação de indemnizar o trabalhador pelos danos patrimoniais ou não patrimoniais que lhe causar (arts. 483.º e 562.º e ss. Do Cod. Civil). Como forma de superar as dificuldades probatórias aliadas à quantificação dos danos e/ou ao respetivo nexo de causalidade, a lei estabelece uma espécie de quadro indemnizatório mínimo, dentro do qual, uma vez provado o carácter abusivo da sanção aplicada, o trabalhador fica liberto dos demais ónus probatórios, consoante decorre dos n.ºs 2 a 4 deste artigo. (…) Tratando-se de sanção pecuniária ou de suspensão com perda de retribuição, a indemnização devida não pode ser inferior ao décuplo da sanção pecuniária aplicada ou da retribuição perdida em consequência da suspensão.» Assim sendo, considerando que por força da sanção aplicada e executada, a apelante perdeu a quantia de € 1678,00 de retribuição [€550,00 + € 550,00 + € 578,00] – cfr. factos 22, 23 e 25 – a mesma tem direito a receber o valor mínimo de € 18.458,00, correspondente ao décuplo da retribuição perdida, acrescido da própria retribuição perdida e que se mostra peticionada. Resultou, também, demonstrado que em consequência do procedimento disciplinar, a apelante se sentiu perseguida pela empregadora, tendo-lhe sido diagnosticado, em 9 de julho de 2016, (a sanção foi comunicada em 20 de maio e cumprida em junho, julho e agosto de 2016), um quadro clínico de Perturbação Ansiodepressiva reativa, caracterizada por “tristeza, baixa de auto estima, insónia inicial e intermédia, ansiedade e sentimento de afronta à sua dignidade pessoal”. Tal circunstancialismo permite-nos responsabilizar a apelada nos termos previstos pelo artigo 483.º do Código Civil, uma vez que se encontra demonstrado o facto ilícito, voluntário e deliberado do lesante (a aplicação de sanção disciplinar abusiva), o dano e o nexo causal entre o facto e o dano. Nos termos previstos pelo artigo 496.º, n.º 1 do Código Civil, apenas são indemnizáveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade mereçam a tutela do direito. Não se concretiza na disposição legal os casos de danos não patrimoniais que justifiquem uma indemnização. Refere-se tão só que esses danos, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Significa isto que cabe ao tribunal, ao apreciar o caso concreto, dizer se o dano é grave e se merece ou não a tutela do direito. Conforme refere Bruno Bom Ferreira, num artigo publicado na Verbo Jurídico, sob o tema “A problemática da titularidade da indemnização por danos não patrimoniais em direito civil”, pág. 10: «A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objetivo (essa apreciação deve ter em linha de conta as circunstâncias do caso concreto), devendo abstrair-se dos fatores subjetivos (“de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada”)». Na concreta situação dos autos, os danos sofridos em consequência do ato abusivo constituem uma lesão grave e relevante que afetou a saúde psicológica da trabalhadora, justificando-se a sua reparação. Estão em causa danos que ultrapassam a fronteira da banalidade, saindo da mediania. As lesões provocadas fizeram a autora perder o seu bem estar, deixou de conseguir descansar, ficou com uma baixa autoestima e sentiu-se desrespeitada. Não se trata de meras contrariedades ou incómodos, mas de um estado de verdadeiro sofrimento geral. A apelante peticionou uma indemnização de € 5.000,00, para ressarcimento de tais danos. Considerando os concretos danos sofridos, o tempo de duração do procedimento disciplinar, a situação económica da lesada, a missão de assistência da lesante que é de conhecimento público, o grau de culpa da lesante e as específicas circunstâncias do caso, afigura-se-nos justo, adequado e equitativo de harmonia com preceituado nas disposições conjugadas dos artigos 496.º, n.ºs. 1 e 3 e 494.º, ambos do Código Civil, a quantia de € 3.000.00. Sobre as quantias em dívida acrescem os juros moratórios à taxa legal, até integral pagamento que foram peticionados. Concluindo, o recurso mostra-se parcialmente procedente. * VII. DecisãoNestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso parcialmente procedente, e, em consequência, revoga-se parcialmente a sentença absolutória recorrida, condenando-se a Ré a pagar à Autora, em consequência da sanção disciplinar abusiva aplicada: - € 18.458,00, correspondente ao décuplo da retribuição perdida, acrescido da própria retribuição perdida; - € 3.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos; - Juros de mora, à taxa legal, a partir desta data até integral pagamento. No mais, confirma-se a decisão recorrida. Custas da ação a suportar pelas partes processuais, na proporção do decaimento. Notifique. Évora, 21 de Dezembro de 2017 Paula do Paço (relatora) Moisés Silva João Luís Nunes __________________________________________________ [1] Relatora: Paula do Paço; 1.º Adjunto: Moisés Silva; 2.º Adjunto: João Luís Nunes [2] “Direito do Trabalho”, 16.ª edição, pág. 409: |