Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
202/05.3TASTB,E1
Relator: JOÃO GOMES DE SOUSA
Descritores: LENOCÍNIO
CONSTITUCIONALIDADE
APLICAÇÃO DA PENA
Data do Acordão: 01/20/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO EM PARTE
Sumário:
1. Tem sido constante a jurisprudência constitucional a defender a constitucionalidade do tipo penal contido no anterior artigo 170º do Código Penal, posição que se mantém face à actual redacção do artigo 169º do Código Penal (decisão sumária nº 57/2010 e o acórdão 141/2010).

2. Há que realçar a dificuldade dos parâmetros dogmáticos habituais para a definição da pena concreta neste tipo de ilícito de moralidade penal ou de direito penal alcandorado a padrão de comportamento ético-social, situação a que nos vimos remetidos pela supra citada jurisprudência. Consideramos então que os critérios a que haverá que atender serão o dolo directo, o tempo de execução, determinação do número de sujeitos envolvidos nos actos de prostituição e nisso foram explorados. Será de ponderar a forma de execução (não do acto em si, já se vê) mas do tipo de prostituição praticada. Já ganha relevo agravativo a forma de exposição ou oferta do acto, via imprensa. [1]

Acordam os Juízes que compõem a 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

A - Relatório:
No Tribunal Judicial de Setúbal correu termos o processo comum colectivo supra numerado no qual são arguidos:
MI
NF
AM
AS
*
A final - por acórdão lavrado a 07 de Junho de 2010 - veio a decidir o Tribunal recorrido:

1. Absolver a arguida MI, da prática em co-autoria material na forma consumada e na forma continuada, de 4 dos crimes de lenocínio, p. e p. pelos artºs 170°/1, 26 e 30° C. Penal, pelos quais vinha pronunciada.

2. Absolver o arguido NF, da prática como cúmplice na forma consumada e na forma continuada, de 5 crimes de lenocínio, p. p. pelos artºs 170°/1, 27 e 30° C. Penal, pelos quais vinha pronunciado;

3. Absolver a arguida AM, da prática em co-autoria material na forma consumada e na forma continuada, de 5 crimes de lenocínio, p. e p. pelos artºs 170°/1, 26 e 30° C. Penal, pelos quais vinha pronunciada.

4. Absolver a arguida AS, da prática em co-autoria material na forma consumada e na forma continuada, de 5 crimes de lenocínio, p. e p. pelos artºs 170°/1, 26 e 30° C. Penal, pelos quais vinha pronunciada.
*
5. Condenar a arguida MI, pela prática em autoria material na forma consumada, de um crime de lenocínio, p. e p. pelos artºs 170°/1 do C. Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão que se suspendem na sua execução por igual período de tempo.

6. Condenar a arguida AM, como cúmplice na prática de um crime de lenocínio, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artºs 170°/1, 27°/2 e 73°, todos do C. Penal, na pena de 7 meses de prisão, que se substitui por 210 dias de multa à taxa diária de € 5,00 (o que perfaz um total de € 1 050,00) e à qual corresponde uma pena de 140 dias de prisão subsidiária, caso tal multa não venha a ser paga voluntária ou coercivamente (art" 49° do C. Penal).

As arguidas AM e MI, não se conformando com a decisão, interpuseram recurso formulando as seguintes (transcritas) conclusões:

AM:

Mal interpretou a sentença o estabelecido no nº 1 do artigo 60º do Código Penal.

MI:

1. O conceito material de crime e a teoria do bem jurídico, como conceito legitimador da incriminação, assumem a primazia na discussão em torno da validade constitucional da norma do n." 1 do artigo 170.° do CP;

2. Ora, após a ampliação do âmbito de incriminação do lenocínio através Lei n. 65/98, que suprimiu do tipo a exploração de quem se prostitui, a doutrina entende que o bem jurídico tutelado pelo crime de lenocínio é o interesse geral da sociedade na preservação da moralidade sexual e do ganho honesto;

3. Sendo que o artigo 170.°, n.º1 do CP, após entrada em vigor da Lei n." 65/98, deixou de prever, como elemento do tipo, uma qualquer relação de exploração do agente sobre quem se prostitua ou pratique actos sexuais de relevo;

4. Concomitantemente, o alargamento do âmbito da incriminação deitou por terra o elemento que dava validade constitucional à incriminação do lenocínio, i. é, a exploração da pessoa de quem se prostitui, retirando-lhe a sua liberdade e autonomia;

5. Ou seja, o crime de lenocínio é um crime sem vítima, prosseguindo a defesa do sentimento geral de pudor e de moralidade;

6. Ora, o pudor e a moral, por si só, não merecem tutela penal;

7. Em suma, o tipo incriminador do n.º 1 do artigo 170.° do CP reproduz uma concepção alegórica de um Direito supra-individual e transpersonalista típico de Estados totalitários que consideram que os valores da personalidade e do indivíduo estão necessariamente ao serviço dos valores colectivos;

8. Pelo que, a norma em causa protege um bem jurídico abstracto e sem substância, prosseguindo finalidades moralizantes e apartando-se das reais necessidades dos indivíduos e da sociedade;

9. Note-se, ainda, que o bem jurídico deve representar um interesse humano vital, expressão das condições básicas da vida em comunidade, sendo um conceito legitimador do Direito Penal;

10. Assim, salvo melhor opinião, a norma do artigo 170. °, n.º 1 do CP aplicável aos presentes autos, por se apartar do conceito material de crime, viola o disposto nos artigos 1.0, 2.° e 18.°, n.º 2 da CRP, pelo que deverá revogar-se a douta sentença por aplicação de norma inconstitucional.

Se assim não se entender, sempre se dirá o seguinte:

11. Os factos considerados provados, que suportaram a condenação da Recorrente, assentaram no depoimento da arguida AM, que, segundo o Tribunal a quo, mostrou convincente credibilidade;

12. Porém, o depoimento da testemunha CL, a qual, de forma objectiva e assertiva, corrobora a versão dos factos da arguida MI, aqui Recorrente, coloca em dúvida a reputada credibilidade da arguida AM;

13. Na verdade, há contradições insanáveis entre os depoimentos da arguida AM e da testemunha CL;

14. Sendo certo que inexistem motivos para desconsiderar o teor do depoimento da testemunha CL em benefício do relatado pela arguida AM;

15. Com efeito, ao contrário do avalizado pelo Tribunal a quo, do depoimento da testemunha CL não se destrinça qualquer manifestação de protecção solidária da Recorrente nem, por outro lado, qualquer má vontade que pretendesse descredibilizar a versão dos factos narrada pela arguida AM;

16. Precisamente, do depoimento da testemunha CL não transparece nenhum estado de alma que possa permitir a valoração do depoimento da arguida AM em prejuízo da narração dos factos trazida por si ajuízo;

17. Assim, o apego do Tribunal a quo à versão dos factos trazida pela arguida AM não é ancorado em qualquer critério razoável ou objectivo;

18. Pelo que a valoração do depoimento da testemunha AM, que constituiu a principal mobilização probatória, assenta primordialmente numa apreciação discricionária que não poderá sustentar a elenco dos factos considerados provados;

19. Também, nem a própria documentação apreendida, a que o Tribunal a quo faz apelo para sufragar a versão dos factos declarada pela arguida AM, assume qualquer apetência para desvalorizar o depoimento da testemunha CL;

20. Com efeito, a existência da "agenda" manuscrita por AM, onde se pode ler as anotações respeitantes a diversas mulheres e os montantes cobrados e entregues, é explicado pela testemunha CL quando refere que diariamente cada "menina" punha de parte € 10,00, contribuindo desse modo para as despesas da casa, o que, mensalmente, permitia o pagamento das despesas fixas, nomeadamente renda, água, luz, e telefones;

21. Sendo que a existência de envelopes do jornal "Correio da Manhã" e de recibos de pagamentos de anúncios, conjuntamente com os extractos bancários juntos aos autos, compaginam-se com o declarado pela testemunha CL e com o depoimento da Recorrente;

22. Do mesmo modo, note-se que a Recorrente declarou que era frequente publicar anúncios das suas "colegas" a pedido, o que foi frisado de modo imutável pelas testemunhas CL e APCB;

23. Ademais, a existência da agenda na casa da Recorrente pode ser justificada pelo declarado no seu depoimento, mormente quando afirmou que AM a levou a casa para justificar que não lhe podia pagar a dívida contraída porque o "negócio" que AM manteve na casa da Moita estava fraco, o que, inclusivamente, se compagina com o afirmado pela testemunha CL ao referir que deixou a casa da Moita acompanhada da Recorrente, tendo a arguida AM permanecido com a exploração da mesma;

24. Em suma, assume particular relevância o depoimento da testemunha CL quando a mesma refere que deixou a casa da M, tendo sido acompanhada pela Recorrente;

25. Facto este que é reforçado pelo depoimento da testemunha JCC, que se reputa imparcial e objectivo;

26. Com efeito, por força do depoimento da testemunha JCC afigura-se plausível que a Recorrente, após um período de três a quatro meses em que permaneceu na casa da M, tenha ido com a CL para Setúbal, deixando os destinos da casa da M entregues à arguida AM;

27. Ora, tais depoimentos descredibilizam o teor das declarações da arguida AM;

28. Sendo que a arguida AM, não obstante reunir condições para possuir conhecimento privilegiado da questão, prestou o seu depoimento de forma desabridamente subjectiva, pelos pontos concretos que "espontaneamente" se ia lembrando, (remetendo a sua actuação em todos os aspectos para uma posição secundária na casa da M, ao contrário do que nos mostra as regras da experiência comum);

29. Ou seja, AM manifestou percepção clara de que o depoimento que prestou implicaria a sua absolvição enquanto autora material:

30. Em síntese, a arguida AM revelou um claro conhecimento da importância de que determinados pontos do seu depoimento assumiam para a decisão da causa, deixando dúvidas, por isso, quanto à credibilidade do mesmo;

31. Nestes termos, a subjectividade que se aponta às declarações da arguida AM, conjugada com o teor dos depoimentos das testemunhas CL e JCC, obsta a que se tenha esse depoimento como base de demonstração dos factos sobre os quais incidiu;

32. Logo, encontra-se estabelecida a dúvida que, no nosso entender, imporia ao Tribunal a quo a absolvição da Recorrente.

33. Assim, a respeito dos factos considerados provados que fundamentaram a condenação da Recorrente, subsiste uma dúvida insanável, por ter havido todo o empenho no esclarecimento dos factos, sem que tenha sido possível ultrapassar o estado de incerteza; razoável, por se tratar de uma dúvida racional e argumentada; e objectivável, por poder ser justificada perante terceiros, excluindo, deste modo, dúvidas arbitrárias ou fundadas em meras conjecturas e suposições:

34. Nestes termos, no que concerne ao recurso sobre a matéria de facto, considera a Recorrente que houve vários erros de julgamento;

35. Assim, face às regras da experiência comum e à prova testemunhal, nomeadamente aos depoimentos de CL e JCC e às declarações da aqui Recorrente, apelando, em consequência, ao princípio do in dubio pro reo, deve o Venerando Tribunal considerar como não provados os factos que fundamentaram a condenação da Recorrente, impondo-se a absolvição da Recorrente da prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de lenocínio.
Sem prescindir, sempre se dirá que:

36. A pena fixada encontra-se incorrectamente graduada, enfermando de severidade injustificada;

37. Na verdade, o circunstancialismo atenuativo é tão evidente e relevante que nada justifica a fixação da pena de 2 anos de prisão, ainda que suspensa pelo mesmo período, antes devendo fixar-se no limite mínimo, atento o disposto no artigo 71.0 do CP;

38. Com efeito, os factos provados permitem concluir com segurança que a ilicitude integrada pela Recorrente não foi, ao contrário do que se encontra expresso na douta sentença sob censura, de grau intenso, na medida em que o número de prostitutas que utilizaram a "Casa da M" não foi concretamente apurado, não se tendo chegado sequer a um número estimado;

39. Também, note-se que a exploração da "Casa da M" ocorreu durante um curto período;

40. Ainda, avulta, por outro lado, que a actuação da Recorrente na prática do crime cingia-­se a rotinas e práticas bastante rudimentares;

41. Em suma, a culpa da Recorrente não poderá considerar-se intensa por ser apenas integrada por dolo directo sem mais;

42. Também, veja-se que os parcos rendimentos que a Reclamante auferiu através da exploração da "Casa da M", segundo o constante da douta sentença, afiguram-se de diminuto relevo;

43. Precisamente, note-se que a renda mensal devida pela "Casa da M" se situava em € 550,00, havendo ainda a considerar a "remuneração" de AC no valor de € 400,00 e as despesas correntes com a normal "actividade" da "Casa", que, em tese, se cifrariam em € 250,00;

44. Em suma, mensalmente a "Casa" teria despesas na ordem dos € 1.200,00;

45. Por outro lado, a "Casa", como resultou da discussão da causa, teria em média 5 clientes por dia, o que representaria uma receita mensal de € 1.200,00;

46. Ou seja, a Recorrente, através da exploração da "Casa da M", terá trabalhado para "aquecer" porque lucros não os teve ... ;

47. Tudo isto aponta para uma pena concreta que não deverá ultrapassar o mínimo previsto na norma. Daí que se afigure adequada a pena de 6 meses de prisão, suspensa pelo mesmo período;

48. De tudo o exposto resulta que, subsidiariamente, deverá revogar-se a douta sentença sob censura, substituindo-se por outra que condene a Recorrente no limite mínimo da pena, suspensos na sua execução pelo mesmo período de tempo.

A decisão sob censura violou, entre outros, os seguintes preceitos legais:

• artigos 1.0,2.0 e 18.0, n." 2 da CRP

• Artigo 71.0, n. os 1 e 2 do Código Penal.

*
A Digna magistrada do Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso interposto, defendendo a improcedência do mesmo

A Exmª Procuradora-geral Adjunta neste Tribunal da Relação emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

Deu-se cumprimento ao disposto no artigo 417º n.º 2 do Código de Processo Penal.
*
B - Fundamentação:

B.1 - O Tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos:

A arguida MI tomou de arrendamento a casa sita na R. José Afonso, …, sito na Urbanização de …, para o exercício da prostituição.

Para o exercício dessa actividade, publicitou-a no jornal "Correio da Manhã", indicando um número de telefone para o contacto de clientes com as mulheres que na mencionada casa praticavam actos sexuais mediante pagamento de retribuição monetária.

Para organização da actividade de prostituição na casa sita na M, MI acordou com MC que, mediante contrapartida monetária paga por aquela, esta fosse para esse local tendo-lhe entregue um telemóvel ao qual se encontrava associado o número 96………

Os telefonemas resultantes da leitura dos "supra" referidos anúncios publicitados no jornal passaram então a ser recebidos por MC, que marcava as horas a que os interessados seriam atendidos.

Na casa em questão estiveram até 21 de Novembro de 2005 várias mulheres, em número não concretamente apurado que nela praticavam actos sexuais - orais e vaginais - pelo preço de € 20,00 cada um.

Essas mulheres entregavam metade do preço que cobravam por cada acto sexual à arguida AM.

Esta arguida por seu turno, após receber a totalidade do dinheiro que lhe era entregue pelo descrito modo, pelas mulheres que exerciam prostituição na mencionada casa, de acordo com instruções recebidas pela arguida MI separava a quantia de € 20,00 diários que eram destinados ao pagamento da renda da casa, entregando a totalidade da quantia a esta última arguida.

Para tal efeito. AM anotava a quantia realizada diariamente por cada uma das mulheres que ali se prostituíam, fazendo a soma da totalidade, umas vezes diariamente, outras no final de cada semana, altura em que procedia à entrega a MI, do valor apurado.

Como retribuição pelas tarefas exercidas na referida casa, MI pagava a MC a quantia de € 400,00 mensais.

Os contratos respeitantes aos serviços de água e de electricidade da mencionada casa, figuravam em nome de JC, pessoa a quem MI a tomou de arrendamento.

A arguida MI actuou movida pela obtenção de lucro, mediante a prática de actos sexuais das mulheres que se dedicaram à prostituição na casa que a mesma geria para tal efeito, delas obtendo remuneração financeira como contrapartida dessa prática.

A arguida AM, ao desempenhar na casa em questão as funções remuneradas "supra" descritas, prestou auxílio à arguida MI ajudando-a a obter remuneração financeira por intermédio da prática de actos sexuais das mulheres que se dedicavam à prostituição na casa que esta geria para tal efeito.

Ambas as arguidas sabiam que o seu comportamento era proibido e penalmente punível, não se coibindo ainda assim de actuar da forma descrita.

Mais se provou:

Que AM por vezes retirava directamente da quantia que lhe era entregue pelas mulheres que na "Casa da M" se dedicavam ao exercício da prostituição, a percentagem necessária a perfazer o montante mensal que MI lhe pagava pelo desempenho das suas tarefas.

Que AM foi para a casa da M. numa ocasião em que nesta já se exercia a actividade de prostituição, em Maio de 2004.

Que na casa da M permaneciam duas mulheres por um período de 15 dias, volvido o qual eram substituídas por outras duas que ali permaneciam por igual período de tempo.

Era AM quem, por instruções dadas por MI, pagava a retribuição mensal pelo uso da casa a JC, o qual se deslocava mensalmente à residência em causa para receber o dinheiro correspondente.

Era AM quem, por instruções dadas por MI, procedia ao pagamento do consumo de água e de electricidade havidos na referida casa.
A casa da M foi arrendada por MI desde Abril de 2003 até Dezembro de 2005.

Era de € 550,00 a retribuição mensal paga pelo uso da mesma.

Do relatório social de MI que faz fls. 1231 e ss. dos autos, cujo teor aqui se dá inteiramente reproduzido para todos os legais efeitos e se transcreve parcialmente, consta que o presente processo perturbou toda a sua vida r .. ) terá episódios de pânico (. . .) o que parece poder estar relacionado coma emergência de sentimentos de receio r . .) realçou o impacto (.) do presente processo na sua situação económica dado que alguns dos seus bens terão sido alvo de arresto cautelar .. ) a arguida não terá beneficiado de um contexto familiar que ao longo do seu desenvolvimento, se tenha constituído enquanto estrutura securizante .. ) com cerca de 30 anos depara-se com uma situação de maior complexidade. a ausência de suporte financeiro. com ma qual não consegue lidar.

Neste contexto ter-se-á iniciado na prostituição, actividade que manterá até os dias de hoje, desvalorizando os riscos, as alternativas e as consequências que possam advir .. ) ".

O arguido NM é solteiro e tem 2 filhos (um com 6. outro com 13 anos de idade) que vivem com as mães.

É serralheiro metalo-mecânico de profissão. a qual desempenha por contra de outrem.

Ganha cerca de 1 500/1600 Euros mensais.

Contribui para os filhos (para o mais novo dá € 300,00 e para a mais velha € 170,00).

Vive na casa de um amigo, pela qual nada paga apenas contribuindo com as despesas correntes.

Como habilitações literárias, tem o 6° ano de escolaridade.

Dá-se como inteiramente reproduzido o teor do seu relatório social, que faz fls. 1247 -, dos autos.

A arguida AM é solteira e reformada por invalidez, auferindo 246,36 € de pensão de reforma por mês.

Vive em casa arrendada, pela qual paga 234,00 € por mês.

Tem um companheiro de há 5 anos a esta palie que trabalha com máquinas agrícolas, no campo, onde aufere cerca de 1600.00 € mensais, aproximadamente.

Recebe o RSI (180,00 por mês).

Como habilitações literárias tem a 4º classe.

Do seu relatório social que faz fls. 1209 e ss. dos autos, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido para todos os legais efeitos e se transcreve parcialmente no que às suas conclusões respeita, a arguida pessoa com 52 anos de idade .. / não beneficiou ao longo do seu desenvolvimento ( .. ,) de um suporte familiar securizante em termos afectivos e educativos (,.) foi trabalhar em idade precoce e face a uma gravidez na adolescência vê-se confrontada com um vazio ao nível de apoio. Esse vazio, associado /, .. ) terão promovido a sua adesão a um estilo desviante, o qual terá mantido durante pelo menos, 25 anos da sua vida (. . .) terá tentado manter um estilo de vida mais pró – social, tendo efectuado tentativas de inserção no mercado de trabalho e tendo estabelecido uma relação afectiva mais estável (. .. ) ",

Dos CRCs dos arguidos, juntos aos autos a fls. 1130 a 1132. "nada consta",

E como não provados os seguintes factos:
Qualquer outro dos factos vertidos na acusação, para a qual remete o despacho de pronúncia.

E apresentou como motivação da decisão de facto os seguintes considerandos:

A nossa convicção alicerçou-se no seguinte:
Tendo a arguida AM prestado declarações, fê-lo nos precisos termos que foram apurados, tendo as suas declarações mostrado convincente credibilidade, "de per si" e por conjugação com outros meios probatórios (que "infra' serão referidos individualmente) que nos permitiram concluir no sentido dessas declarações.

Deles se destacando:
o depoimento prestado pela testemunha CL que iniciou conjuntamente com MI, a actividade de prostituição na casa da M, dando-nos nota do modo como esta ali decorria, quais os pagamentos efectuados e por quem, qual o montante cobrado pelos actos sexuais e "distribuído" pela casa, de que modo foi essa casa arrendada, por quanto, por quem a quem (descrição que coincide na essência com aquela que nos foi feita por AM, no que respeita aos referidos segmentos, pese embora com distinta autoria, já que AM vai para a casa em questão e nela permanece depois dos cultos dois meses em que a testemunha esteve na mesma).

E se:

Entre as declarações prestadas por esta arguida e pela testemunha que ora se refere se encontram contradições:

Tal facto, atribuiu-o o tribunal de um lado:

A circunstância desta testemunha ter permanecido cerca de 2 meses apenas na casa em questão, para a qual foi depois AM trabalhar (a testemunha refere que também na prostituição), razão pela qual: o modo como se processa a organização da mesma após a saída desta testemunha, não é do conhecimento desta (razão pela qual as declarações prestadas por AM nos merecerem crédito, pese embora as mencionadas contradições) e de outro:

Porque se notou no depoimento prestado por esta testemunha (porventura por este se reportar aos únicos dois meses em que esta trabalhou conjuntamente com MI na casa sita na M, pese embora na sua descrição se reconheçam traços semelhantes ao modo como tudo terá decorrido após), a sua vontade em não prejudicar aquela MI, porventura por razões que emergem da solidariedade de terem trabalhado "em parceria" e alguma "má vontade" relativamente a AM "estados de alma" esses que, não tendo sido tão veementes que nos levassem a concluir pelo "contágio" quanto à credibilidade intrínseca do depoimento em crise, nos levaram a crer em que as anotadas contradições, neles têm origem:

Outrossim, no que respeita ao depoimento prestado pela testemunha JC, senhorio da casa em questão, que arrendou a MI, que foi prestado no sentido das declarações transmitidas por AM.

Também:
O depoimento prestado pela testemunha FJS - inspector da PJ, que interveio na busca domiciliária levada a cabo na referida casa da M (sendo indubitável a prática de prostituição na casa em questão, o que se depreende não apenas dos termos do depoimento que a testemunha presta. como também de todos os elementos que objectivamente nela foram então apreendidos).

Finalmente:
Tendo em consideração toda a documentação que é apreendida na busca domiciliária realizada na habitação de MI, sita na R. ASM n 44 - r/c esq, onde lhe é apreendida uma "panóplia" de documentação, dela se destacando uma agenda manuscrita por AM, onde se pode ler as anotações respeitantes a diversas mulheres, identificadas por diversos nomes, os montantes cobrados e entregues, nos precisos moldes que nos foram transmitidos pela arguida AM, para além de extractos bancários, de envelopes do jornal "correio da manhã" e de recibos de pagamentos de anúncios que por cruzamento com aqueles elementos bancários, nos levaram indubitavelmente a concluir no sentido apurado.

Quanto às declarações prestadas por MI a tal propósito:
Não tiveram qualquer consistência ou credibilidade, tratando-se de mero exercício de "desesperada retórica" (que foi persistente), em face da versão dos factos que foi trazida a julgamento por AM, que MI teimou em negar apesar de (ademais) toda a documentação encontrada em sua casa persistir em demonstrá-lo.
Razão pela qual:

Não foram as mesmas valoradas do ponto de vista da demonstração positiva do seu conteúdo, antes pelo contrário:

Delas só nos restou a constatação de que à arguida falhou a capacidade colaborar para a descoberta da verdade e que no descrito contexto, melhor serviço se teria prestado, caso tivesse exercido até ao final do julgamento (como o fez, até terem sido inquiridas todas as testemunhas indicadas na acusação) o seu direito em permanecer em silêncio”.

Seguem resumos de depoimentos que o Tribunal não considera relevante transcrever.

Cumpre conhecer.

B.2 - O âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso, designadamente a verificação da existência, ou não, dos vícios indicados no art. 410°, n.° 2, do Código de Processo Penal de acordo com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das secções do STJ de 19/10/95 in D.R., I-A de 28/12/95.

São, assim, questões a conhecer:
Da constitucionalidade do artigo 170º do Código Penal;
Da apreciação da prova operada pelo tribunal recorrido;
Da pena (questão abordada por ambas as arguidas).

B.3 – Nas suas conclusões 1ª a 10ª a recorrente MI pugna pela inconstitucionalidade do tipo penal contido no artigo 170º do Código Penal.

Bem se pode afirmar que a argumentação da recorrente encontra respaldo no voto de vencido da Cons. Maria João Antunes lavrado no acórdão nº 396/2007 do Tribunal Constitucional:

“Votei vencida por entender que o artigo 170º, nº 1, do Código Penal, na redacção dada pela Lei nº 65/98, de 2 de Setembro, é inconstitucional, por violação do artigo 18º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

A Lei nº 65/98 alterou a estrutura típica do crime de Lenocínio, previsto no artigo 170º do Código Penal, eliminando a exigência típica da “exploração duma situação de abandono ou necessidade”, ao arrepio de uma evolução legislativa, em matéria de crimes sexuais, que se inscreve num paradigma de intervenção mínima do direito penal, o ramo do direito que afecta, mais directamente, o direito à liberdade (artigo 27º, nºs 1 e 2, da CRP). Num paradigma em que a intervenção é apenas a necessária para a tutela de bens jurídicos (não da moral), que não obtêm protecção suficiente e adequada através de outros meios de política social.

Com eliminação daquela exigência típica, o legislador incrimina comportamentos para além dos que ofendem o bem jurídico da liberdade sexual, relativamente aos quais não pode ser afirmada a necessidade de restrição do direito à liberdade, enquanto direito necessariamente implicado na punição (artigos 18º, nº 2, e 27º, nºs 1 e 2, da CRP).

Como se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 211/95 (Diário da República, II Série, de 24 de Junho de 1995) “o que justifica a inclusão de certas situações no direito penal é a subordinação a uma lógica de estrita necessidade das restrições de direitos e interesses que decorrem da aplicação de penas públicas (artigo 18º, nº 2, da Constituição). E é também ainda a censurabilidade imanente de certas condutas, isto é, prévia à normativação jurídica, que as torna aptas a um juízo de censura pessoal.

Em suma, é, desde logo, a exigência de dignidade punitiva prévia das condutas, enquanto expressão de uma elevada gravidade ética e merecimento de culpa (artigo 1º da Constituição, do qual decorre a protecção da essencial dignidade da pessoa humana), que se exprime no princípio constitucional da necessidade das penas (e não só da subsidiariedade do direito penal e da máxima restrição das penas que pressupõem apenas, em sentido estrito, a ineficácia de outro meio jurídico” (cf., ainda, no sentido de o artigo 18º, nº 2, ser critério para aferir da legitimidade constitucional das incriminações, os Acórdãos nºs 634/93, 650/93, Diário da República, II Série, de 31 de Março de 1994, e 958/96, Diário da República, II Série, de 19 de Dezembro de 1996).”.

O seu argumentário, no entanto, em nada se diferencia do argumentário já analisado pela corte constitucional no citado acórdão, onde fez vencimento a tese da constitucionalidade, na sequência, aliás, de vários outros arestos (144/2004 e 303/2004).

De notar que, nestes três acórdãos citados, estava directamente em análise o anterior tipo penal contido no artigo 170º do Código Penal.

Ainda recentemente a Relação de Coimbra, no seu acórdão de 21-10-2009 (proc. nº 206/07.1GAMMV.C1, sendo relator o Exmº Des. Mouraz Lopes) lavrou acórdão a recusar a aplicação do actual artigo 169º do Código Penal por entender ocorrer inconstitucionalidade material.

Na sequência, a decisão sumária nº 57/2010 e o acórdão 141/2010 do Tribunal Constitucional vieram a considerar de manter a constante jurisprudência constitucional sobre a matéria.

Nos termos da Decisão Sumária nº 57/2010, decidiu-se “Não julgar inconstitucional a norma extraída do artigo 169º, n.º 1, do Código Penal, na redacção conferida pela Lei n.º 59/2007, de 04 de Setembro”.

E alinhavou-se a seguinte ordem de argumentos:

“A circunstância de a jurisprudência supra mencionada ter sido proferida a propósito do (então) artigo 170º, n.º 1, do Código Penal não invalida a sua aplicação à norma agora extraída do artigo 169º, n.º 1, do Código Penal (na redacção da Lei n.º 59/2007), na medida em que a interpretação desta última norma – tal como vertida na decisão alvo de recurso – corresponde, no seu sentido normativo – à que já resultava da versão anteriormente vigente. A menção, pela decisão recorrida, da eliminação legislativa da referência aos “actos sexuais de relevo” não afecta, de modo algum, a identidade daquelas normas, na medida em que – neste caso concreto – não se curava de saber se a arguida era responsável por fomentar, favorecer ou facilitar a prática de “actos sexuais de relevo”, mas antes de actos qualificáveis como “prostituição”.

Em suma, mantém-se a jurisprudência deste Tribunal, no sentido de que a incriminação do lenocínio, mesmo nos casos em que se verifique plena liberdade na formação da vontade do/a prostituto/a, não é inconstitucional, por visar proteger bens jurídicos fundamentais que encontram consagração na Constituição Portuguesa”.

Esta a orientação da jurisprudência constitucional, que se subscreve, por inexistir argumento que não tenha já sido analisado nas anteriores decisões.

B.4 – Da apreciação da matéria de facto.

O recurso sobre matéria de facto está estabelecido na lei de forma irrestrita quanto ao seu objecto potencial, quer para apreciação dos vícios indicados nos nºs. 2 e 3 do artigo 410º do Código de Processo Penal, quer para a apreciação de outros vícios de facto da decisão, desde que possam ser apreciados numa base puramente racional (erros de apreciação, erros de raciocínio, contradições, insuficiências) ou que assentem numa base factual ou probatória existente nos autos (lógica factual, prova documental ou por referência a declarações orais documentadas).

Entende-se que a recorrente MI cumpriu o ónus de impugnação especificada contido nos números 3 e 4 do artigo 412º do Código de Processo Penal.

a) - A indicação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (al. a) do nº 3 do artigo 412º do Código de Processo Penal);

b) - A indicação das concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida (al. b) do nº 3 do artigo 412º do Código de Processo Penal);
c) - A indicação concreta das passagens em que se funda a impugnação por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 364 (nº 4 do artigo 412º do Código de Processo Penal).

Mas o legislador não exige, apenas, que o recorrente indique as provas que permitam uma diversa apreciação da matéria de facto. O legislador exige que o recorrente indique as provas que impõem uma diversa apreciação da matéria de facto.

A razão é clara: o recurso não é um novo julgamento, sim um mero instrumento processual de correcção de concretos vícios praticados e que resultem de forma clara e evidente da prova indicada. É que houve um julgamento em 1ª instância. E do que aqui se trata é de remediar o que de errado ocorreu em 1ª instância. O recurso como remédio jurídico.

Daí a necessidade de impugnação especificada com a devida fundamentação da discordância no apuramento factual, em termos de a prova produzida, as regras da lógica e da experiência comum imporem diversa decisão.

Se a decisão factual do tribunal recorrido se baseia numa livre convicção objectivada numa fundamentação compreensível e naquela optou por uma das soluções permitidas pela razão e pelas regras de experiência comum, a fonte de tal convicção (declarações, depoimentos, acareações) – assente que obtida com o benefício da imediação e da oralidade – apenas pode ser afastada se ficar demonstrado ser inadmissível a sua utilização pelas mesmas regras da lógica e da experiência comum.

Não basta, pois, que o recorrente pretenda fazer uma “revisão” da convicção obtida pelo tribunal recorrido por via de argumentos que permitam concluir que uma outra convicção “era possível”.

Impõe-se-lhe que “imponha” uma outra convicção. É imperativo que demonstre que a convicção obtida pelo tribunal recorrido é uma impossibilidade lógica, uma impossibilidade probatória, uma violação de regras de experiência comum, uma patentemente errada utilização de presunções naturais.

Não apenas o relativo do “possível”, sim o absoluto da imperatividade de uma diferente convicção.
Apuremos, então, se a recorrente cumpriu esse desiderato.

A recorrente coloca o assento tónico da sua insatisfação quanto à apreciação da matéria de facto na circunstância, basilar, de o tribunal recorrido ter atribuído credibilidade bastante às declarações da co-arguida AM, desvalorizando o depoimento de CL. Ao invés, a recorrente pretende que seja dada toda a credibilidade ao depoimento desta testemunha, com a consequente desvalorização das declarações de AM.

A seu favor, co-adjuvando a sua pretensão, invoca o depoimento da testemunha JCC.

Admitindo a oposição das respectivas declarações e depoimento, haverá que ultrapassar essa oposição por referência a elementos intrínsecos a esses meios de prova de carácter subjetivante (características pessoais, posição no processo, teor das declarações e depoimentos, sendo de reconhecer que este tribunal de recurso está limitado na apreciação do primeiro elemento por ausência de oralidade e imediação) e a elementos extrínsecos, designadamente, outras declarações, depoimentos e outros meios de prova de carácter objectivo.

As únicas características intrínsecas de relevo nas declarações e depoimento que ganham relevo assumem diversa coloração. De um lado, a circunstância de a co-arguida o ser, o que abre a porta à consideração de as suas declarações a poderem favorecer. O que não está demonstrado, mas que é uma possibilidade.

De outra banda, a circunstância de a testemunha CL apenas saber dos factos que se reportam a momento anterior ao objecto do processo. Isto é, esta testemunha de nada sabe quanto aos factos imputados às arguidas, já que ela própria refere que trabalhou na casa em momento anterior.

Um dos elementos extrínsecos a estes meios de prova de carácter subjectivante, o depoimento de JCC, proprietário da casa em questão, não ganha relevo, pois que não nega o potencial papel desempenhado pela arguida MI na prática do ilícito criminal. Apenas nega que a arguida, a partir do terceiro ou quarto mês, pagasse pessoalmente a renda, mas daí se não pode inferir que aquela arguida continuasse a desempenhar papel de relevo no iter criminis.

O segundo elemento de carácter extrínseco e, de grande relevo, objectivo, é a apreensão na busca domiciliária realizada na habitação de MI, sita na R. ASM n.º---- onde lhe é apreendida vária documentação, dela se destacando uma agenda manuscrita por AM, onde se podem ler as anotações respeitantes a diversas mulheres, identificadas por diversos nomes, os montantes cobrados e entregues, nos precisos moldes que foram transmitidos pela arguida AM, para além de extractos bancários, de envelopes do jornal "correio da manhã" e de recibos de pagamentos de anúncios que por cruzamento com aqueles elementos bancários, nos levaram indubitavelmente a concluir no sentido apurado, como fundamenta o tribunal recorrido.

Estes elementos objectivos ganham enorme relevo, confirmando as declarações da co-arguida AM e a apreciação da prova efectuada pelo tribunal recorrido.

Não há, pois, erro na apreciação da prova.

Nem há, portanto, um non liquet, não havendo lugar à operatividade do princípio in dubio pro reo.

B.5 – Das medidas das penas.

Afirma a arguida AM – sua única conclusão – que “mal interpretou a sentença o estabelecido no nº 1 do artigo 60º do Código Penal”, o que consubstancia a sua pretensão à substituição da multa imposta por uma pena de admoestação.

No que ao caso concreto respeita (não há danos a considerar) são pressupostos de aplicação da pena de admoestação, a virtualidade de aplicação de uma pena de multa de montante máximo não superior a 240 dias (nº 1 do preceito) e as preocupações de prevenção (nº 2, 2ª parte do mesmo preceito).

Desde logo nos defrontamos com a circunstância de o tipo penal não prever pena de multa alternativa. O tipo penal apenas prevê a aplicação de pena de prisão.

No caso, a circunstância de a pena de prisão aplicada ter sido substituída por multa não permite a aplicabilidade da pena de admoestação, pois que a pena inicial, a de prisão, não perde a sua natureza detentiva pelo facto de se ter operado a substituição por multa.

Por outro lado, as necessidades de prevenção, quer geral quer especial, desaconselham a aplicação da pena de admoestação.

É, pois, improcedente, a pretensão da recorrente AM.

Quanto à arguida MI, invoca esta recorrente excessiva severidade do tribunal recorrido na fixação de uma pena de dois anos de prisão.

Por seu turno o tribunal recorrido faz ressaltar, e bem, a dificuldade dos parâmetros dogmáticos habituais para a definição da pena concreta neste tipo de ilícito de moralidade penal ou de direito penal alcandorado a padrão de comportamento ético-social, situação a que nos vimos remetidos pela supra citada jurisprudência do Tribunal Constitucional.

E na fundamentação do tribunal recorrido somos conduzidos a uma espécie de presunção de gravidade da conduta por não apurados parâmetros de apreciação – v. g. a indeterminação do número de mulheres envolvidas nos actos de prostituição, gravidade das suas consequência, o que no dizer do próprio tribunal recorrido se não pode “medir com exactidão”, e a mera “eventualidade” (ressaltada pelo tribunal recorrido) de fricção com a moral sexual, face à prática generalizada na localidade (igualmente ressaltada).

A conclusão óbvia passará pela depreciação de tais parâmetros na vertente agravativa.

Consideramos então que, numa moldura penal abstracta de seis meses a cinco anos, os critérios a que haverá que atender serão o dolo directo, o tempo de execução, a constatação de que “outras” intervenientes houve que praticaram actos de prostituição e nisso foram exploradas.

Quanto ao grau de ilicitude será ele moderado, considerando que a forma de execução em pouco se diferencia de uma prostituição de vão de escada, pelo menos não assume uma forma sub-reptícia de alta especialização e requinte, forma que se entende mais grave e mais lesiva do tecido social.

Ao fim e ao cabo, a “mais velha profissão do mundo” num nível de ilicitude que, na forma de execução, pouco se alcandora do padrão de menor ilicitude.

Já ganha relevo agravativo, como aliás, salientado pelo tribunal recorrido, a forma de exposição ou oferta do acto, via imprensa.

As necessidades de prevenção ganham pouquíssimo relevo.

Assim, entre a dogmática e os considerandos ético-sociais, entende-se baixar a pena para os 14 (catorze) meses de prisão, suspensos por igual período, já que a pretensão da recorrente ao mínimo abstracto nos parece excessivamente tolerante.

C - Dispositivo
Assim, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a 2ª Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Évora:

em negar provimento ao recurso interposto pela arguida AM;

em conceder provimento parcial ao recurso interposto pela arguida MI, reduzindo a pena concreta para 14 (catorze) meses de prisão, suspensa por igual período de tempo.

Custas pela arguida C, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) U.C., sem prejuízo do apoio judiciário.

(elaborado e revisto pelo relator antes de assinado).

Évora, 20 de Janeiro de 2011

João Gomes de Sousa

António Alves Duarte

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[1] - Sumariado pelo relator

Decisão Texto Integral: