Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
366/13.2TTEVR.E1
Relator: BAPTISTA COELHO
Descritores: DESPEDIMENTO VERBAL
FORMA DE PROCESSO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Data do Acordão: 06/09/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: 1. A forma de processo especial prevista nos arts.º 98º-B e seguintes do Código de Processo do Trabalho é restrita aos casos em que o despedimento, por facto imputável ao trabalhador, por extinção do posto de trabalho, ou por inadaptação, é comunicado por documento escrito.
2. A ação de impugnação judicial de um despedimento verbal deve por isso seguir a forma de processo comum.
3. O ónus de impugnação, por via de recurso, da decisão sobre matéria de facto, a que se refere o art.º 640º, nº 1, al. c), do código de Processo Civil, exige que a parte recorrente indique com clareza qual a decisão que deve ser proferida quanto a cada um dos pontos de facto que tiver impugnado.
(Sumário do relator)
Decisão Texto Integral: Proc. nº 366/13.2TTEVR

Acordam os juízes que compõem a Secção Social deste Tribunal da Relação de Évora:

No Tribunal do Trabalho de Évora, e em ação com processo comum, instaurada a 11/11/2013, BB, identificado nos autos, e patrocinado oficiosamente pelo MºPº, demandou CC, Lda., com sede em Evoramonte, pedindo a condenação da R. no pagamento da quantia total de € 7.290,25, acrescida de juros, e relativa a indemnização por despedimento ilícito, pela qual o A. desde logo optou, e a créditos remuneratórios decorrentes da cessação do contato, a que deverá ainda somar-se a compensação prevista no art.º 390º do Código do Trabalho (C.T.). Para o efeito, alegou em resumo ter sido admitido ao serviço da R. a 5/8/2008, para trabalhar como servente da construção civil, mediante o salário de € 500,00, e de € 4,27 de subsídio de alimentação por dia de trabalho prestado; a 2/8/2013, foi impedido de continuar a trabalhar para a R., pois esta mandou-o embora, dizendo-lhe que não queria que o A. continuasse a trabalhar para si, o que se traduz num despedimento ilícito.
Não tendo sido possível tentar a conciliação das partes na audiência prevista no art.º 54º do Código de Processo do Trabalho (C.P.T.), por a R. à mesma não ter comparecido, foi de seguida apresentada contestação, aí sendo excecionada a ineptidão da p.i., por ininteligibilidade de alguns dos pedidos formulados, o erro na forma do processo, por não ter sido seguida a ação especial de impugnação de despedimento, e a caducidade do direito do A., por terem sido excedidos os 60 dias previstos na lei para o efeito; por impugnação, alegou ainda a contestante que ao A. foi sim movido um processo de despedimento por extinção do posto de trabalho, donde concluiu pela improcedência da ação e consequente absolvição.
À contestação veio ainda responder o A., quanto às exceções deduzidas, sustentando serem as mesmas improcedentes.
Procedeu-se depois a nova audiência de partes, gorando-se a tentativa de conciliação então realizada, e sendo também nesse âmbito proferido despacho saneador, que negou procedência às exceções arguidas pela R., consignando-se ainda quais os temas de prova.
Teve depois lugar a audiência final, sendo de seguida proferida sentença, em cujo segmento dispositivo escreveu o Ex.º Juiz:
a) condeno a CC, LDA. a pagar ao Autor BB a quantia global de € 6.290,25 (seis mil duzentos e noventa euros e vinte e cinco cêntimos) respeitante a proporcionais de subsídio de férias e de Natal de 1 de Maio a 2 de Agosto de 2013 e de retribuição por férias pelo tempo trabalhado em 2013, férias não gozadas e não pagas do ano de 2012, salários e respectivo subsídio de alimentação de 1 de Maio a 2 de Agosto de 2013 direito a férias e respectivo subsídio vencidos em 1 de Janeiro de 2013 a que acresce a indemnização a que alude o artº. 391º.
b) mais vai a Ré CC, LDA. condenada a pagar ao Autor BB as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento (2 de Agosto de 2013) até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento e a liquidar em execução de sentença.
c) condeno a Ré CC, LDA. como litigante de má-fé na multa de 3UCs.
d) custas por ambas as partes na proporção do decaimento.
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Inconformada com o assim decidido, dessa sentença veio então apelar a R., formulando as seguintes conclusões na respetiva alegação de recurso:
A – Da nulidade do despacho
- Ocorrem nulidades da sentença, conforme prevê o art.º 615º, nº 1, al. d), do C.P.C., não só porque a sentença recorrida condenou a recorrente como litigante de má fé, sem que previamente fosse possibilitado a esta exercer os seu direito de pronúncia quanto à pretensão do tribunal recorrido (daí que tivesse a sentença recorrida decidido em questão na qual o não poderia fazer – sendo nula);
- mas ainda porque o tribunal recorrido tinha que se pronunciar – até mesmo oficiosamente – sobre a matéria referente às deduções a efetuar às quantias nas quais a recorrente foi condenada a pagar ao recorrido, e não o fez, e ainda sobre as concretas quantias que seriam devidas pela recorrente ao recorrido (face ao valor provadodo salário deste), inexistindo sustentação para a condenação em valores a liquidar previamente a execução de sentença;
- o despacho recorrido violou o disposto nos arts.º 195º/1 e 615º/1 d) do C.P.C., e 390º/c do C.T.
B – Do recurso
- da sentença recorrida resulta que a convicção do tribunal para a matéria de facto provada formou-se com o depoimento de parte do A. que disse que só não gozou e não lhe pagaram as férias de 2012 e os documentos juntos aos autos;
- não provam que as quantias reclamadas pelo A. tenham sido pagas, apesar da R. dizer que pagava por duodécimos e que estavam pagas todas as quantias reclamadas pelo A.;
- os sete factos considerados provados pela sentença recorrida, apenas poderão ter por base a prova documental junta aos autos, porque o A. não apresentou qualquer testemunha em julgamento;
- a prova dos pagamentos existe, e deve sim ser considerada;
- o recorrido não impugnou o alegado pela recorrente nos arts.º 34º a 40º, 46º e 54º da contestação da então R., havendo forçosamente que ter-se por provados esses pagamentos;
- se o recorrido invocou ter sido despedido verbalmente em determinada data, haveria que ter provado tal facto, e sem testemunhas, nem documentos que o sustentem, jamais se entende como pode a sentença recorrida ter dado como provado o facto vertido no ponto 2;
- em ação de impugnação de despedimento, com fundamento em despedimento de facto, incumbe à A., nos termos do art.º 342º, nº 1, do Código Civil, a prova dos factos que inequivocamente revelam a vontade de pôr termo ao contrato, bem como de que tais factos foram, por ela, como tal interpretados;
- o tribunal recorrido inverteu, indevidamente e sem fundamento, o ónus da prova;
- a ilicitude do despedimento, determina a dedução das importâncias que o trabalhador tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento;
- se o recorrido pretendia ver declarada a ilicitude do despedimento, teria que ter impugnado judicialmente esse despedimento, no âmbito do respetivo procedimento especial;
- o presente processo teria que observar a forma especial prevista nos arts.º 98º-B e ss. do C.P.t., e não a forma comum;
- em sede de depoimento de parte, afirmou o recorrido que não gozou e não lhe pagaram as férias de 2012, o que contraria o afirmado na petição inicial, e não foi sancionado como a R.;
- não se pode daí extrair que, como não provou determinado facto, a recorrente litigou de má fé;
- a sentença recorrida violou os arts.º 429º e 432º do C.P.C., 574º, nº 2, do C.P.C., e 60º, nº 4, do C.P.T., 342º, nº 1, do Código Civil, 390º, nº 2, do C.T., 3º, nº 3, do C.P.C., 609º, nº 2, do C.P.C., 542º, nsº 1 e 2, al. a), do C.P.C..
Terminou a recorrente pedindo a procedência do recurso, ‘declarando-se nula a sentença recorrida, com as forçosas consequências legais ou, assim não se entendendo, ser revogado o despacho recorrido proferido em audiência prévia de 24/2/2014, assim como a consequente e subsequente sentença recorrida, declarando-se o erro na forma do processo e consequente caducidade da ação especial de impugnação de despedimento, ou ainda assim se não entendendo, revogada a sentença recorrida’.
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Notificado da interposição do recurso, o A. veio apresentar a sua contra-alegação, aí pugnando pela improcedência da apelação.
O Ex.º Juiz indeferiu as nulidades invocadas pela recorrente, a admitiu o recurso.
Subidos os autos a esta Relação, veio o processo a depois ser redistribuído ao ora relator.
Dispensados que foram os vistos legais, cumpre decidir.
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E decidindo, recordemos antes de mais a matéria de facto dada como provada pelo tribunal recorrido, que foi a seguinte:
1 – O Autor em 5 de Maio de 2008 celebrou com a Ré, por escrito, contrato individual de trabalho nos termos do qual contra uma remuneração mensal de € 500,00 acrescida de € 4,27 de subsídio de alimentação por dia trabalhado se comprometia sob a direcção, fiscalização e autoridade da Ré a desempenhar as funções de servente de pedreiro, sempre em nome e no exclusivo interesse da Ré, nas obras da Ré com horário de trabalho de 40horas semanais.
2 – Em 2 de Agosto de 2013 a Ré mandou o Autor embora, dizendo-lhe que não queria que continuasse a trabalhar para si.
2-A (aditado infra)
3 - Em 11 de Setembro de 2013 a Ré pelo seguro do correio, respondeu ao Autor dizendo-lhe que ia iniciar o seu despedimento por extinção do posto de trabalho
4 – Em 4 de Outubro de 2013, via ACT, a Ré entregou ao A. a declaração de despedimento por extinção do posto de trabalho, com data de 2 de Agosto de 2013 para a cessação do contrato de trabalho.
5 - A Ré não pagou ao A. os proporcionais de subsídio de férias e de Natal de 1 de Maio a 2 de Agosto de 2013 e de retribuição por férias pelo tempo trabalhado em 2013.
6 - A Ré não pagou ao Autor as férias não gozadas e não pagas de 2012.
7 - A Ré não pagou ao Autor os salários e respectivo subsídio de alimentação de 1 de Maio a 2 de Agosto de 2013 e o direito a férias e respectivo subsídio vencidos em 1 de Janeiro de 2013.
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Sendo o objeto de um recurso delimitado pelas conclusões da respetiva alegação (cfr. arts.º 635º, nº 4, e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil – C.P.C.), podem no caso dos autos reconduzir-se as questões suscitadas pela recorrente às seguintes áreas temáticas:
- as nulidades da sentença;
- a matéria de facto dada como provada pelo tribunal recorrido;
- a forma do processo;
- as consequências da ilicitude do despedimento;
- a condenação por litigância de má fé.
Abordemos então, sucessivamente, os diferentes pontos que mereceram discordância por parte da apelante, sendo certo que a hipotética procedência de um deles poderá eventualmente prejudicar o conhecimento dos demais.
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No requerimento de interposição do recurso invocou a apelante ser nula a sentença recorrida, por três ordens de razões: por ter condenado a R. como litigante de má fé (i), sem ter permitido que a parte pudesse quanto a tal questão, e previamente a essa condenação, ter exercido o contraditório; por ter relegado para execução de sentença as quantias que foram objeto da condenação de mérito (ii); finalmente, e na sequência do já antes decidido no despacho saneador, por ocorrer erro na forma do processo (iii), em virtude de não ter sido observada a forma especial prevista nos arts.º 98º-B e ss do C.P.T..
Tendo as nulidades invocadas sido formalmente arguidas conforme o exige o art.º 77º do C.P.T., o Ex.º Juiz veio depois a sobre elas sucintamente pronunciar-se, limitando-se a propósito a referir que ‘entendo não existir nenhuma das nulidades suscitadas pela Ré’. O que, convenhamos, não parece constituir indeferimento convincente…
De qualquer forma, sobre tal matéria diremos apenas que as questões assim alegadas, e que a recorrente referenciou, todas elas, à previsão do art.º 615º, nº 1, al. d), do C.P.C., não traduzem propriamente vícios da sentença que importem em nulidade da mesma, e que nesse caso seriam supríveis por via formal, configurando antes uma impugnação de fundo, que traduz a discordância da recorrente quanto ao sentido condenatório da decisão proferida.
E que assim é comprovo-a desde logo o facto de as mesmas questões terem sido depois retomadas pela recorrente, em sede de alegação de recurso, para aí propugnar pela revogação da sentença, e não apenas pela sua correção formal.
Daí que concluamos não assistir, neste particular, qualquer razão à recorrente, o que obviamente não prejudica a abordagem que em seguida importa fazer quanto a cada uma das questões suscitadas, que como se disse a apelante de novo invocou quando impugnou o mérito da sentença recorrida.
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Por uma questão de sequência lógica, caberá antes de mais tratar da temática da forma do processo, que a apelante considera ser errada, por em seu entender haver sim lugar à forma de ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, a que se referem os arts.º 98º-B e ss. do C.P.T..
Certo é que, como sem margem para grandes dúvidas resulta do art.º 98º-C, tal processo especial apenas será de seguir nos casos em que o despedimento individual seja comunicado ao trabalhador por escrito, por facto a ele imputável, por extinção do posto de trabalho, ou por inadaptação.
Logo, vindo no caso dos autos desde logo alegado na p.i. ter o A. sido verbalmente despedido, à margem de qualquer documento escrito, a forma de processo correta a seguir seria necessariamente a da ação comum laboral, tal aqui o demandante a instaurou, e foi depois tramitada.
Não merece pois censura a decisão nesse sentido proferida no despacho saneador, improcedendo portanto as conclusões da alegação da recorrente que defendiam entendimento diverso.
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E que dizer da matéria de facto julgada provada pelo tribunal recorrido, que a apelante veio também questionar, em particular no seu ponto 2, onde se consignou que ‘a 2/8/2013 a R. mandou embora o A., dizendo-lhe que não queria que continuasse a trabalhar para si’?
A tal propósito, cumpre desde já referir que não se mostra devidamente observado, pela recorrente, o ónus de impugnação previsto no art.º 640º, nº 1, do C.P.C., em particular no que se refere à respetiva al. c).
Com efeito, negando ter havido qualquer despedimento verbal do A., mas sim uma cessação contratual por extinção do posto de trabalho, a R. acaba no entanto por não indicar, em alternativa, qual seria então o facto que concretamente deveria ser dado como provado, no que respeita ao modo como em seu entender terá cessado o vínculo laboral existente entre as partes.
Tal omissão traduz, a nosso ver, um manifesto incumprimento do referido ónus, acarretando a rejeição do recurso, nesta parte.
É certo que, ao abrigo dos poderes oficiosos que lhe são conferidos pelo art.º 662º, nº 2, do C.P.C., poderá sempre a Relação sindicar a decisão proferida sobre a matéria de facto, e se for caso disso alterá-la até, nos termos do nº 1 do mesmo art.º 662º.
E nesse sentido afigura-se ser importante aditar à factualidade relevante um facto que dela não consta, que está admitido por acordo nos articulados, e que sem dúvida permite compreender melhor a narração da realidade das coisas que consta da sentença recorrida, em particular o ponto 3 da decisão em causa.
Trata-se da carta que o A. enviou à R. a 24/8/2013, referida no art.º 7º da p.i., junta à mesma como doc. nº 3, e admitida como verdadeira no art.º 17º da contestação, em que o demandante alega ter sido verbalmente despedido a 2/8, solicitando outrossim a emissão do formulário necessário à atribuição de subsídio de desemprego.
É a existência dessa carta, e a referência que à mesma venha a fazer-se na decisão de facto, que poderá melhor explicar a resposta da R. a que se alude no referido ponto 3. E é também o conteúdo dessa carta que vem de algum modo corroborar a versão dos factos alegada pelo demandante, no que toca à forma da cessão do contrato. Nesse contexto, a posterior iniciativa da recorrente, no sentido de promover um despedimento por extinção do posto de trabalho, mais se perfila como um expediente tardio visando apenas formalizar uma rutura contratual já consumada.
O que já não será verosímil é a posição assumida pela recorrente na contestação, quanto à declaração por si subscrita para efeitos de subsídio de desemprego, pretendendo alhear-se do facto de em tal documento a data da cessação do contrato estar reportada a 2/8, tal como fora alegado pelo trabalhador.
Em face do exposto, e considerando também não haver motivos para alterar o ponto 2 da decisão sobre a matéria de facto, adita-se um novo ponto à mesma decisão, que nela passará a figurar sob o nº 2-A, com a seguinte redação:
2-A – O A. enviou à R., a 24/8/2013, a carta cuja cópia se acha a fls. 9 dos autos, nela designadamente referindo ter sido despedido verbalmente no dia 2/8/2013, e solicitando também a emissão do formulário necessário a requerer a concessão de subsídio de desemprego.
Em tudo o mais mantém-se o decidido pela 1ª instância quanto à factualidade relevante, cuja descrição se admite poder ter sido mais elaborada, mas que ainda assim traduz uma versão da realidade que é linear e minimamente percetível.
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Assente que está pois a existência de um despedimento verbal, as consequências jurídicas que decorrem da ilicitude dessa cessação, de facto, do vínculo laboral são as que genericamente foram assumidas na sentença recorrida: o trabalhador tem direito a receber a indemnização de antiguidade prevista no art.º 391º do C.T., pela qual o aqui A. logo optou na p.i., e bem assim as retribuições deixadas de auferir após o despedimento, nos termos do art.º 390º do mesmo código.
São dois os aspetos que neste particular mereceram a discordância da recorrente: a não dedução das importâncias previstas no nº 2 daquele art.º 390º, e o facto de se ter relegado para posterior liquidação a quantificação do montante das retribuições assim devido ao demandante.
Mas também aqui não parece assistir razão à apelante.
Com efeito, está em causa uma compensação que deverá ser computada até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento (cfr. nº 1 do mesmo art.º 390º), o que necessariamente impede que a mesma possa ser quantificada aquando da prolação da sentença em 1ª instância.
Por outro lado, decorrendo diretamente da lei a dedução que ao montante assim calculado deverá operar-se relativamente aos valores a que se referem as alíneas a), b), e c), do referido nº 2, será também o incidente de liquidação o momento processual adequado à efetivação dos cálculos que nesse âmbito se mostrem necessários.
Improcedem portanto, também nesta parte, as conclusões da alegação da recorrente.
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Resta-nos abordar a questão da litigância de má fé, que valeu a condenação da recorrente na multa de 3 UCs.
Para motivar semelhante decisão, foi a seguinte a justificação avançada pelo Ex.º Juiz na sentença recorrida:
‘Ao litigar pela forma como o fez juntando documentos que não provaram que estivessem pagas as quantias peticionadas pelo Autor apesar da testemunha da Ré dizer que estava tudo pago, o que veio a ser desmentido pela prova documental junta pela Ré deve a Ré ser condenada como litigante de má-fé na multa de 3UCs, artº. 542º nºs 1 e 2 a) in fine do C.P.C.
Para além de parecer algo contraditório nos seus próprios termos, este segmento da sentença também não fundamentará devidamente a condenação que a propósito foi proferida.
Litiga de má fé quem, com dolo ou negligência grave, e para além do mais, deduz oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar. Sendo obviamente censurável essa postura processual, a mesma não deverá no entanto confundir-se com a carência de prova de factos pela parte litigante que para tal está onerada, o que poderá até ocorrer, com alguma frequência, quando está em causa o cumprimento de obrigações pecuniárias.
Não logrando o devedor demonstrar em juízo o pagamento, cuja prova a ele necessariamente incumbe em face das regras dos arts.º 342º, nº 2, e 799º, nº 1, ambos do Código Civil, nem assim poderá desde logo concluir-se ter ele litigado de má fé, apesar de ter alegado estar cumprida tal obrigação.
Ademais, e no que respeita à concreta hipótese dos autos, a posição assumida pela R. na contestação foi a de os subsídios de férias e de Natal estarem a ser pagos em duodécimos, acrescendo ao salário mensal. Essa alegação não ficou provada, mas daí não decorre haver motivo bastante para a apelante ser sancionada, como o foi pela 1ª instância, como litigante de má fé.
Nesta parte assiste pois razão à recorrente, devendo por isso a sentença recorrida ser nesta parte revogada.
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Nesta conformidade, e pelos motivos expostos, acordam os juízes desta Secção Social em julgar a apelação parcialmente procedente, e em consequência decidem:
a) Revogar a sentença recorrida na parte em que condenou a R. por litigância de má fé.
b) Manter tudo o mais que foi decidido na mesma sentença, sem prejuízo da alteração da alteração da matéria do facto, nos termos supra indicados.
Custas pela recorrente.

Évora, 09-06-2016
Alexandre Ferreira Baptista Coelho (relator)
Joaquim António Chambel Mourisco
José António Santos Feteira
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