Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
3399/16.3YIPRT.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: HONORÁRIOS DE ADVOGADO
PRESSUPOSTOS
Data do Acordão: 02/08/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I – É pressuposto do pedido de laudo a existência de conflito, expresso ou tácito, entre o Advogado e o constituinte acerca do valor dos honorários estabelecidos na conta apresentada ao mandante, a que se associa o requisito adicional da inexistência de uma prévia contratualização do preço dos serviços prestados.
II – A possibilidade de recurso ao laudo de honorários é afastada quando se demonstre que as partes ajustaram previamente a fixação da remuneração devida pela prestação de serviços forenses.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo nº 3399/16.3YIPRT.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Évora – Juízo Local Cível de Évora – J1
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório:
(…) e (…), na qualidade de únicos herdeiros da herança aberta por óbito de (…), intentaram a presente acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato contra “(…) – Cooperativa Agrícola do Concelho de (…), CRL”.
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Os Autores pediram que a Ré fosse condenada no pagamento da quantia de 5.978,00 €, acrescida de juros de mora vencidos até 14/01/2016 no montante de 268,60 € e de juros de mora vincendos, calculados à taxa legal, até efectivo e integral pagamento.
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Para tanto, a parte activa alegou que a falecida (…) prestou diversos serviços jurídicos à Ré, a solicitação desta, no valor de 5.978,00 €, que não foram pagos.
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Regularmente citada, a Ré deduziu a oposição de fls. 5 e no âmbito da mesma afirma que entre a falecida advogada e a “(…) – Cooperativa Agrícola do Concelho de (…), CRL” não foram acordados os valores que os Autores agora vêm exigir.
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Cumprido o contraditório, os Autores responderam nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 21 e seguintes. *
Realizada a audiência de discussão e julgamento, o Tribunal «a quo» decidiu condenar a Ré “(…) – Cooperativa Agrícola do Concelho de (…), CRL” a pagar aos Autores a quantia de 2.174,30 € (dois mil, cento e setenta e quatro euros e trinta cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a data de citação até efectivo e integral pagamento, absolvendo-a do demais peticionado.
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Os recorrentes não se conformaram com a referida decisão e na peça de recurso apresentaram as seguintes conclusões:
1 – O Tribunal de 1.ª Instância condenou a Rda. a pagar aos Rtes. a quantia de € 2.174,30 (dois mil, cento e setenta e quatro euros e trinta cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a data de citação até efectivo e integral pagamento, a título de honorários devidos e não pagos pelo cumprimento do contrato de prestação de serviços jurídicos que a Rda. concedeu à Dr.ª (…), Advogada, e da qual os Rtes. são os únicos e legítimos herdeiros.
2 – Aquela decisão redundou em procedência meramente parcial do pedido, que ascende a € 5.978,00 (cinco mil, novecentos e setenta e oito euros), acrescidos de juros de mora vencidos até 14/01/2016, no valor de € 268,60 (duzentos e sessenta e oito euros e sessenta cêntimos), e de juros de mora vincendos, calculados à taxa legal, até efectivo e integral pagamento.
3 – O aresto ora em crise alicerçou o respectivo dispositivo, no que à economia deste recurso aproveita, em dois factos, provados e não provados, respectivamente:
a) Que entre a Rda. e a falecida Dr.ª (…) existia um acordo de pagamento de honorários mediante o qual a Ilustre Causídica apenas cobrava 10% do valor que conseguisse recuperar no âmbito das Acções Especiais para Cumprimento de Obrigações Pecuniárias Emergentes de Contratos e Injunção (cfr. o disposto no n.º 7 dos Factos Provados da Fundamentação);
b) Que entre a Rda. e a Dr.ª (…) existia um acordo para pagamento de honorários.
4 – O Tribunal a quo não pode considerar nenhum destes dois factos, porquanto não foram alegados pela Rda.
5 – A propósito dos honorários devidos à falecida Advogada, tendo a Rda. alegado que:
a) Não acordou pagar o valor constante da nota de honorários;
b) Na impossibilidade de remunerar o trabalho empreendido pela Sr.ª Dr.ª (…), haveria que apurar quais as carga e tarifa horárias consideradas para efeito de determinação dos honorários relativamente aos processos referidos na nota de honorários;
c) Os Rtes. inviabilizaram a hipótese de as partes chegarem a um acordo quanto ao valor dos honorários a pagar;
d) Os Rtes. inviabilizaram a possibilidade de as partes determinarem, de acordo com os tempos de trabalho realizados e a tarifa profissional praticada pela Ilustre Causídica, qual o valor de honorários devidos;
e) Na falta de acordo quanto ao valor dos honorários e na impossibilidade de aplicação da correspondente tarifa profissional, deve recorrer-se aos usos profissionais e, na dúvida, a critérios de equidade;
f) Deve atender-se ao disposto no n.º 3 do artigo 105.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, que estabelece os critérios a observar na fixação de honorários;
g) Reputa como justo pagar aos Rtes. a quantia de € 1.750,00 (mil setecentos e cinquenta euros), I.V.A. incluído, valor que corresponde a 25 horas de trabalho à razão de € 70,00 (setenta euros) por hora;
h) O valor proposto é, do ponto de vista da Rda., justo do ponto de vista dos usos profissionais e do ponto de vista moral, atendendo ao ordenado mínimo nacional e ao rendimento mensal médio das famílias na cidade de (…);
a Rda. não alegou a existência de qualquer acordo de honorários previamente estabelecido com a Dr.ª (…).
6 – Por maioria de razão, do teor das referidas alegações não resulta a existência de qualquer acordo entre a Rda. e a Ex.ª Sr.ª Dr.ª (…) mediante o qual esta apenas cobrava, a título de honorários, 10% do valor que conseguisse recuperar no âmbito das acções destinadas ao cumprimento de obrigações pecuniárias intentadas em representação da Rda..
7 – Daquelas alegações resulta, outrossim, uma grosseira contradição com o facto n.º 7 dos Factos Provados e a alínea a) dos Factos Não Provados constantes da Fundamentação da sentença ora recorrida.
8 – É contraditório com ambos os factos as alegações segundo as quais as partes não haviam acordado pagar os valores peticionados na nota de honorários, porquanto essa alegação não permite a conclusão de que existiria algum acordo de honorários.
9 – Contradiz aqueles dois factos a alegação de que havia que determinar quais a carga e tarifa horárias subjacentes à prestação de serviços da Dr.ª (…), porque esse esclarecimento apenas tem préstimo não havendo qualquer acordo pré-estabelecido, conforme é o caso.
10 – Os dois factos supra referidos são igualmente contraditos com as alegações de impossibilidade de estabelecimento de um acordo sobre o valor a pagar a título de honorários, bem como a possibilidade de determinar qual o valor de honorários devido em resultado da multiplicação da tarifa horária pela carga horária, porque, uma vez mais, esse esclarecimento apenas tem préstimo não havendo qualquer acordo pré-estabelecido, conforme é o caso.
11 – Ao alegar que a justiça da nota de honorários constante deste processo deve ser alcançada com uma decisão judicial que lance mão dos usos profissionais e, na dúvida, de critérios de equidade, a Rda. contradisse notoriamente aqueles dois factos.
12 – São também contraditos ambos os factos na alegação da Rda. segundo a qual se propõe a pagar € 1.750,00 (mil setecentos e cinquenta euros), já com I.V.A., como resultado da multiplicação de um valor horário (cuja existência presumiu, bem como o respectivo valor) por um determinado número de horas, porque se fosse verdadeiro o facto dado como provado no n.º 7 dos Factos Provados da sentença do Tribunal de 1.ª Instância, o número de horas afectas à recuperação judicial de créditos e a tarifa horária a estas aplicada pela Sr.ª Dr.ª (…) seria indiferente.
13 – Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 5.º do Código de Processo Civil, que, ao estabelecer o princípio do dispositivo, determina que o julgador deve concentrar a decisão na estrita medida das alegações das partes, apenas podendo socorrer-se, além destas, dos factos instrumentais e dos factos notórios.
14 – Tendo já aflorado as alegações da Rda., importa salientar que os factos constantes do n.º 7 dos Factos Provados e da alínea a) dos Factos Não Provados da Fundamentação da Sentença não são instrumentais nem notórios.
15 – Os factos instrumentais são factos complementares ou esclarecedores dos factos principais, que não contraditórios com estes.
16 – Os factos constantes do n.º 7 dos Factos Provados e da alínea a) dos Factos Não Provados da Fundamentação da Sentença recorrida contradizem os factos alegados pela Rda..
17 – Os factos notórios são factos quando o juiz os conhece como tal, quando colocado na posição do cidadão comum, regularmente informado, sem necessidade de recorrer a operações lógicas e cognitivas nem a juízos presuntivos.
18 – Os factos constantes do n.º 7 dos Factos Provados e da alínea a) dos Factos Não Provados da Fundamentação da Sentença recorrida contradizem os factos alegados pela Rda. não se enquadram na definição constante do número anterior, pois resultam de uma nova alegação levada pela Rda. ao processo e da qual o Tribunal nunca poderia ter conhecimento pela experiência do cidadão comum nem sem necessidade de se socorrer de operações lógicas e cognitivas ou presuntivas.
19 – Assim sendo, estava vedado ao Tribunal de 1.ª Instância levar à Fundamentação de Facto da Sentença as declarações da testemunha Joaquim Maluco constitutivas destes novos factos.
20 – Por outro lado, o Tribunal a quo absolveu, ainda que tacitamente, o pedido na condenação da Rda. a pagar aos Rtes. por duas cartas de interpelação que não deram origem a quaisquer processos judiciais e cujos valores recuperados através da prestação de serviços da Sr.ª Dr.ª (…) não foram considerados nos € 21.743,04 (vinte e um mil, setecentos e quarenta e três euros e quatro cêntimos) sobre o qual incidiu a percentagem de 10% que o Tribunal considerou provado ser o valor a pagar a título de honorários aos Rtes..
21 – Na verdade, se se atentar no disposto no n.º 8 dos Factos Provados da Fundamentação da Sentença, nele se pode ler “Na sequência das acções propostas pela Dra. (…) em representação da Ré – declarativas e respectivas execuções – foi recuperado um total de (…)”, nada se dizendo neste número, nem nos restantes, a propósito da prestação de serviços jurídicos desenvolvida pela Ilustre Causídica que não culminou na propositura de acções judiciais e respectivas execuções.
22 – Assim sendo e porque a Rda. não fez contraprova quanto a esta matéria, há que condená-la ao pagamento de ambas as cartas, no valor de € 85,00 (oitenta e cinco euros) cada.
23 – Sendo procedente a fundamentação do presente Recurso, terá o julgador que atender ao laudo de honorários proferido no âmbito deste processo, bem como à força probatória do mesmo.
24 – O laudo de honorários solicitado ao Conselho Superior da Ordem dos Advogados Portugueses pelo Tribunal a quo foi “(…) favorável aos honorários apresentados pelos herdeiros da falecida Sr.ª Dr.ª (…), no valor de € 6.100,00 (seis mil e cem euros).”
25 – Os Tribunais Superiores têm vindo a adoptar uma corrente jurisprudencial segundo a qual o laudo de honorários, por ser proferido por um órgão que é composto por profissionais de reconhecido mérito para o efeito, e como parecer técnico que é, embora não fazendo prova plena, só deve ser afastado pelo Tribunal quando haja contraprova que fundamentadamente o possa pôr em causa.
26 – Exemplos da alegação contida no número anterior são-nos dados nas decisões vertidas nos Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, Processo n.º 313-C/1999.P2, de 20/12/2011, Relator Maria do Carmo Domingues, do Tribunal da Relação de Lisboa, Processo n.º 555/12.7TVLSB.L1.-2, de 25/06/2015, Relator Sousa Pinto, e do Supremo Tribunal de Justiça, Processo n.º 4538/09.6TVLSB-B.L1.S1, de 15/04/2015, Relator Oliveira Vasconcelos.
27 – Mesmo que se admitisse que os factos constantes no n.º 7 dos Factos Provados e na alínea a) dos Factos Não Provados da fundamentação da Sentença constituiriam contraprova que fundamentasse a desconsideração do laudo de honorários, certo é que, contraditos que estão, a decisão que agora há-de ser proferida terá, obrigatoriamente, que conferir procedência à acção, atendendo àquele laudo de honorários.
28 – À cautela, alega-se, finalmente, a nulidade do facto considerado provado sob o n.º 7 dos Factos Provados da Fundamentação da Sentença, porquanto o mesmo constitui um pacto de quota litis, conforme dispõe o artigo 106.º do Estatuto da Ordem dos Advogados.
29 – Sendo esse pretenso acordo nulo, o julgador deve apreciar a bondade da nota de honorários devida pela Rda. à luz dos critérios para a fixação de honorários previstos no artigo 105.º do Estatuto da Ordem dos Advogados.
30 – Uma vez que a Ordem dos Advogados já se pronunciou sobre aquela nota, ao proferir laudo de honorários favorável no valor de € 6.100,00 (seis mil e cem euros), e inexistindo contraprova que justifique a
Termos em que deve o presente Recurso ser merecedor de Decisão de Provimento e, em consequência, ser a Rda. condenada em conformidade, com o que se fará a acostumada Justiça!».
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A parte contrária não contra-alegou. *
Admitido o recurso, foram observados os vistos legais.
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II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigo 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do NCPC), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do NCPC). Acresce que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação de:
1) Existência de contradição entre factos.
2) Violação do ónus de cognição do Tribunal.
3) Existência de erro na apreciação do direito.
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III – Matéria de facto:
3.1 – Factos provados:
Discutida a causa e com relevância para a decisão o tribunal considerou prova a seguinte factualidade:
1 – Os requerentes são os únicos herdeiros da herança aberta por óbito de (…).
2 – O primeiro requerente é também cabeça-de-casal da referida herança.
3 – A falecida (…) era advogada de profissão e no exercício da sua actividade foi mandatada pela Ré para prestar serviços de âmbito jurídico, nomeadamente para, em sua representação:
a) Propor 8 acções especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato e, posteriormente à execução da formula executória conferida às mesmas;
b) Elaborar cartas de interpelação a clientes da Requerida.
4 – Em 29/09/2014 foi enviada à Ré, através de carta registada com aviso de recepção a comunicação cuja cópia faz fls. 26 e a nota de honorários no valor global de 5.978,00 € que faz fls. 26v cujo teor se dá por reproduzido.
5 – Em resposta a Ré remeteu em 09/12/2014 a carta cuja cópia faz fls. 9 e 10 dos autos questionando o valor dos honorários solicitados pela Autora e pedindo informação detalhada sobre a tarifa horária e as horas despendidas em cada processo.
6 – A Dra. (…), no âmbito do mandato que lhe foi conferido, apresentou as petições iniciais e os subsequentes requerimentos executivos e enviou as cartas de interpelação descritas nas alíneas a) e b) do artigo 3.º.
7 – Entre a Ré e a Dra. (…) existia um acordo de pagamento de honorários correspondente a 10% dos valores efectivamente cobrados quanto às acções para cobrança de dívidas.
8 – Na sequência das acções propostas pela Dra. (…) em representação da Ré – declarativas e respectivas execuções – foi recuperado um total de 21.743,04 € (vinte e um mil, setecentos e quarenta e três euros e quatro cêntimos).
9 – O mandato conferido pela Ré à Exma. Dra. (…) cessou em 06/05/2014 por óbito da mesma.
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3.2 – Factos não provados:
Com interesse para a decisão da causa ficou por demonstrar que:
a) Os valores ora peticionados pelos Autores não foram acordados com a Ré.
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IV – Fundamentação:
4.1 – Contradição entre factos:
Apenas ocorre um quadro de vício de contradição, quando, seguindo o fio condutor do raciocínio lógico do julgador, os factos julgados como provados ou como não provados colidem inconciliavelmente entre si ou uns com os outros ou, subsidiariamente, com a fundamentação da decisão de facto.
Na perspectiva dos recorrentes existe uma grosseira contradição entre o facto 7[1] dos factos provados e a alínea a)[2] dos factos não provados. Em abono desta tese, nas conclusões de recurso é dito que «é contraditório com ambos os factos as alegações segundo as quais as partes não haviam acordado pagar os valores peticionados na nota de honorários».
Em primeiro lugar, sendo trazidas aos autos duas versões do mesmo facto que se excluem – total ou parcialmente – mutuamente, a consagração de uma delas pressupõe a falta de demonstração da outra, sob pena de contradição insanável[3].
Depois, do ponto de vista da compatibilidade lógica, não existe qualquer contradição entre afirmar que existia um acordo de pagamento de honorários mas que o mesmo não tem as características e a dimensão quantitativa proposta pelos recorrentes.
No ordenamento jurídico português o Tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas em audiência. E, por conseguinte, neste campo, adicionalmente, ao valorar positivamente o testemunho de (…), o decisor «a quo» não proferiu qualquer decisão surpresa e o contraditório foi exercido pelas partes em sede da fase de julgamento.
E assim na hipótese vertente essa inconciliabilidade não existe, não se verificando o apontado vício no apuramento da matéria de facto.
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4.2 – Da violação dos poderes de cognição do Tribunal:
Esta segunda questão entrelaça os princípios do dispositivo e da controvérsia precipitados no artigo 5º do Código de Processo Civil com o alcance do ónus da substanciação e dos poderes investigatórios do Tribunal.
Prescreve o artigo 5º, nº 2, do Código de Processo Civil que, para além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo Juiz: a) os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; c) os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções[4].
O princípio da aquisição processual está precipitado no artigo 413º do Código de Processo Civil, sendo que, por essa via, «o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las».
O Tribunal, no julgamento da matéria de facto, deve procurar tomar em consideração e atender a todas as provas produzidas nos autos, mesmo que elas aproveitem à parte contrária, ou mesmo que respeitem a factos (instrumentais) que, não tendo sido expressamente alegados, resultem da instrução e do julgamento da causa[5].
Os factos essenciais devem ser alegados e provados pelas partes, mas o juiz pode atender aos factos notórios (artigo 512º do Código de Processo Civil) e aos factos instrumentais, não alegados pelas partes, que resultem da instrução e do julgamento[6] [7] [8].
Quanto aos factos instrumentais, o Tribunal pode não só investiga-los, como ordenar quanto a eles as actividades instrutórias que possam ser de iniciativa oficiosa; pelo contrário, quanto aos factos essenciais, o tribunal não possui poderes inquisitórios, pelo que, relativamente a eles, só pode ordenar as actividades oficiosas de instrução legalmente permitidas[9].
Neste sentido podem ser consultados Isabel Alexandre[10], Lopes do Rego[11], Teixeira de Sousa[12] e Lebre de Freitas[13]. Este autor é partidário da tese que «estes factos (probatórios e acessórios) são factos instrumentais, que como tais não têm de ser alegados pelas partes nem de ser incluídos na base instrutória, podendo surgir no decorrer da instrução da causa. O Juiz tem, portanto, de os considerar, independentemente da alegação das partes».
A grande diferença em relação ao anterior Código de Processo Civil é que a consideração dos factos essenciais que sejam complemento ou concretização dos alegados não depende já de requerimento da parte interessada nesse aproveitamento para que ele aconteça, como exigia o artigo 264º, nº 3, daquele diploma.
Presentemente, o juiz pode considerá-los mesmo oficiosamente, sem requerimento de nenhuma das partes, bastando que os sujeitos processuais tenham tido a possibilidade de se pronunciar sobre tais factos.
Aliás, recentemente, em comentário a Acórdão por nós subscrito (processo nº 232/10.3T2DLD.E1 do Tribunal da Relação de Évora, relatado em 03/11/2016), Miguel Teixeira de Sousa[14] escreve que «a circunstância de, no artigo 5º, nº 2, al. b), CPC, ter deixado de se exigir a concordância da parte quanto ao aproveitamento pelo tribunal do facto complementar adquirido durante a instrução da causa não foi acidental, nem é inócua. A solução é orientada pela busca da verdade em processo, entendendo-se que nada pode justificar que a parte possa impedir o tribunal de utilizar na sua actividade decisória um facto de que o tribunal tem conhecimento (…).
Uma coisa é a parte ter disponibilidade quanto aos factos que quer alegar; outra bem diferente é a parte ter disponibilidade sobre um facto que o tribunal apurou e poder impedir o tribunal de o considerar na apreciação da acção. O princípio dispositivo só respeita àquele primeiro aspecto, pelo que a consideração pelo tribunal de um facto apurado em juízo, mas não alegado pelas partes, nunca pode ser vista como uma violação daquele princípio».
Os factos essenciais numa acção de honorários devidos a advogado assentam na prestação dos serviços forenses e na falta de pagamento dos mesmos e todos os condicionalismos acessórios como os relativos à existência de acordos de pagamento ou ajuste prévio de honorários correspondem simplesmente a elementos instrumentais da causa de pedir.
Analisados o pedido e a causa de pedir e os factos de suporte discutidos a título constitutivo e impeditivo das pretensões em disputa verifica-se claramente que o julgador «a quo» não viola a disciplina contida no artigo 5º do Código de Processo Civil e que a factualidade apurada está objectivamente circunscrita no desenho jurisdicional apresentado pelas partes.
Em adição, não obstante não tenham contestado a factualidade assente de acordo com o ónus de impugnação da matéria de facto precipitado no artigo 640º[15] do Código de Processo Civil, os recorrentes vêm invocar a nulidade do ponto 7[16] dos factos provados. Porém, não existe qualquer vício da actividade probatória na fixação da factualidade em apreço. E, neste contexto, a existir qualquer conflitualidade operativa com qualquer disposição legal, a mesma corresponderia a um erro na aplicação do direito e não a uma nulidade na fixação dos factos.
Deste modo, os recorrentes carecem de razão também neste segmento.
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4.3 – Do erro de direito (Da remuneração do mandato):
O mandato é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra (artigo 1157º do Código Civil).
Prevaleceu assim a definição avançada por Galvão Telles em que definira que o objecto do mandato «tem de ser específico, em relação aos demais contratos de prestação de serviços, a natureza do seu objecto que é a prática de actos jurídicos»[17].
Na formulação de Menezes Cordeiro, «o mandato tem, porém, no âmbito dos contratos de prestação de serviços, uma posição especial, já que as suas disposições, (…), regulam, ainda, nos termos do artigo 1156º, mas com as necessárias adaptações, as modalidades do contrato de prestação de serviços que a lei não regule especificadamente. O mandato apresenta-se, assim, como o protótipo dos contratos de prestação de serviços»[18].
O contrato de mandato é um contrato típico ou nominado e, em virtude de serem frequentes no quotidiano judiciário e de levantarem alguns problemas específicos, a lei entendeu vantajoso atribuir aos contratos típicos regulamentação própria.
Trata-se, aliás, de institutos cujas linhas básicas se encontram marcadas por uma longa tradição doutrinal e legislativa. Todavia, para além das suas particularidades, há que ter em conta princípios comuns a todas as figuras contratuais e ainda relativas ao regime geral do negócio jurídico[19].
O mandato presume-se gratuito, excepto se tiver por objecto actos que o mandatário pratique por profissão; neste caso, presume-se oneroso (artigo 1158º, nº 1, do Código Civil).
Se o mandato for oneroso, a medida da retribuição, não havendo ajuste entre as partes, é determinada pelas tarifas profissionais; na falta destas, pelos usos; e, na falta de umas e outros, por juízos de equidade (artigo 1158º, nº 2, do Código Civil).
Pires de Lima e Antunes Varela ensinam que «casos correntes de mandato oneroso são os dos advogados e dos solicitadores»[20].
No caso em apreço, estamos perante um contrato de mandato oneroso, uma vez que o mesmo tem por objecto actos praticados no exercício da sua profissão de advogado.
A questão judicanda reporta-se exclusivamente à remuneração do mandato e existe uma prescrição normativa sediada no artigo 100º[21] do Estatuto da Ordem dos Advogados que estabelece os critérios a ponderar na fixação da remuneração.
Contudo, na situação sub judice não existem dados de facto que permitam densificar o tempo despendido no exercício do patrocínio, os estilos da comarca, as possibilidades económicas da Ré, a importância do assunto, os meios empregues e o esforço intelectual desenvolvido.
Além disso, como se compreende de todo o enquadramento existencial, existiu um ajuste prévio de honorários[22]. Efectivamente, como se pode ler no acto postulativo recorrido, que «a Ré alegou e logrou provar que foi acordado entre esta e a Drª. (…) que no que respeitasse a acções para cobrança de dívida, os honorários seriam pagos a final e corresponderiam a 10% do valor recuperado, sendo que o valor peticionado não corresponde ao valor efectivamente recuperado pela Ré por força das acções propostas pela Sra. Dra. (…)».
Os recorrentes impugnam este juízo prudencial com base em dois argumentos: o da proibição da quota-litis e o da existência de um laudo de honorários que deve superiorizar-se à avaliação efectuada pelo Juízo Local Cível de Évora.
Quanto ao primeiro fundamento é de sublinhar que não existe actualmente uma proibição absoluta da quota litis e o Estatuto da Ordem dos Advogados prevê as hipóteses em que é viável o ajuste prévio de honorários em percentagem ou com base em majoração em função do resultado obtido.
Aquilo que está na base da ratio legis é a independência do advogado[23] e a garantia de uma remuneração mínima em caso de insucesso no mandato. E essa situação não corresponde à imagem contratual aqui presente.
Na verdade, ao abrigo da disciplina contida no nº 3 do artigo 106º[24] do Estatuto da Ordem dos Advogados, como decorrência do princípio da autonomia privada e do primado da liberdade contratual[25], é lícito ao advogado a celebração de acordo que consista na fixação prévia do montante dos honorários, ainda que em percentagem, em função do valor do assunto confiado ao advogado ou pelo qual, além de honorários calculados em função de outros critérios, se acorde numa majoração em função do resultado obtido.
Orlando Guedes da Costa alerta que «a fixação, a título de honorários, de uma parte do resultado significa que, não havendo resultado, inexiste direito a honorários e, por isso, a proibição do acordo no sentido de os honorários consistirem numa parte do resultado envolve a proibição de se estabelecer que o direito a honorários fique dependente dos resultados da demanda ou do negócio»[26].
Sempre se entendeu que, na emissão do laudo, haverá que partir do pressuposto de que os serviços profissionais referenciados pelo Advogado como tendo sido prestados o foram efectivamente, uma vez que não é da competência da Ordem dos Advogados decidir, se, na verdade, tais serviços foram efectivamente prestados. Tal competência, sob pena de usurpação de poderes, cabe aos Tribunais enquanto órgãos de soberania a quem cabe a função jurisdicional e não à ordem dos Advogados[27]. E o mesmo se diga do prévio ajuste de honorários, sem embargo de aqui, em caso de manifesta desproporção ou de violação dos usos profissionais, se admitir a emissão de parecer da ordem dos Advogados sobre a nota remuneratória apresentada.
É assim pressuposto do pedido de laudo a existência de conflito, expresso ou tácito, entre o Advogado e o constituinte acerca do valor dos honorários estabelecidos na conta apresentada ao mandante, a que se associa o requisito adicional da inexistência de uma prévia contratualização do preço dos serviços prestados.
É indiscutível que os laudos emitidos pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados não têm um valor vinculativo e constituem meios de prova a apreciar livremente pelo Tribunal. Porém, como contrapeso, a credibilidade que merece o laudo de honorários só deve ser posta em causa quando ocorram factos suficientemente fortes que abalem aquela credibilidade.
No entanto, como pressuposto prévio, no que concerne a vinculatividade desse juízo pericial, o mesmo não tem aplicação quando se demonstre que as partes ajustaram previamente a fixação de honorários.
E esta ideia está devidamente expressa na sentença recorrida quando sustenta que «sendo certo que foi solicitado Laudo à Ordem dos Advogados que considerou que os valores peticionados são compatíveis com os praticados na comarca tal não afasta a possibilidade de a Ré poder invocar e provar que tais honorários não correspondem aos valores acordados entre as partes, o mandante e o mandatário e a Ré, o que de facto fez».
E esta realidade legítima o afastamento do juízo pericial efectuado pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados, pois o mesmo assenta num pressuposto não verificado (que as partes não tinha contratualizado o pagamento).
De maneira que, ao decidir que a Ré fosse condenada a pagar aos Autores a quantia de 2.174,30 € (dois mil, cento e setenta e quatro euros e trinta cêntimos), a Primeira Instância aplicou correctamente a lei e ajuizou bem a hipótese jurisdicional colocada à sua apreciação e, por isso, confirma-se a decisão recorrida.
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V – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas a cargo dos apelantes, atento o disposto no artigo 527º do Código de Processo Civil.
Notifique.
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(acto processado e revisto pelo signatário nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 138º, nº 5, do Código de Processo Civil).
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Évora, 08/02/2018

José Manuel Galo Tomé de Carvalho
Mário Branco Coelho
Isabel Matos Peixoto Imaginário


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[1] (7) Entre a Ré e a Dra. (…) existia um acordo de pagamento de honorários correspondente a 10% dos valores efectivamente cobrados quanto às acções para cobrança de dívidas.
[2] (a) Os valores ora peticionados pelos Autores não foram acordados com a Ré.
[3] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18/06/2013, in www.dgsi.pt.
[4] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15/09/2014, in www.dgsi.pt.
[5] Remédio Marques, Acção Declarativa à Luz do Código Revisto, Coimbra Editora, Coimbra 2007, pág. 162.
[6] Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Conceito e Princípios Gerais, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra 2006, págs. 150-152.
[7] Lopes do Rego, Comentário ao Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra 1999, pág. 200.
[8] Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil (Princípios Fundamentais, Fase Inicial do Processo Declarativo), Almedina, Coimbra 1988, págs. 53-54.
[9] Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, 1ª edição, Lex, Lisboa 1996, pág. 72.
[10] Isabel Alexandre, A Fase de Instrução no Processo Declarativo Comum, Aspectos do Novo Processo Civil, Lex, Lisboa 1997, pág. 280, que salienta que os factos que se pretendem provar podem ser factos instrumentais ou factos essenciais complementares ou concretizadores e, como tal, não terem sido alegados pelas partes nos articulados, atendendo a que o artigo 264º, nº 1 (a que corresponde actualmente o artigo 5º do Código de Processo Civil), apenas estabelece um ónus de alegação dos factos que integram a causa de pedir e daqueles em que se baseiam as excepções.
[11] Lopes do Rego, Comentário ao Código de Processo Civil, pág. 201, advoga que «factos instrumentais definem-se, por contraposição aos factos essenciais, como sendo aqueles que nada têm a ver com substanciação da acção e da defesa e, por isso mesmo, não carecem de ser incluídos na base instrutória, podendo ser livremente investigados pelo juiz no âmbito dos seus poderes inquisitórios de descoberta da verdade material», enquanto que «factos essenciais, por sua vez, são aqueles de que depende a procedência da pretensão formulada pelo autor e da excepção ou da reconvenção deduzidas pelo réu».
[12] Miguel Teixeira de Sousa, Introdução ao Processo Civil, pág. 52, que ensina que ensina que se tratam de factos que indiciam os factos essenciais. Por outras palavras, são factos secundários, não essenciais, mas que permitem aferir a ocorrência e a consistência dos factos principais.
[13] Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra 2014, págs. 15 e 16.
[14] Publicado no sítio do Instituto Português de Processo Civil.
[15] Artigo 640º (Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto).
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos nºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.
[16] (7) Entre a Ré e a Dra. (…) existia um acordo de pagamento de honorários correspondente a 10% dos valores efectivamente cobrados quanto às acções para cobrança de dívidas.
[17] In Contratos Civis, “Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, vol. IX, pág. 210-211.
[18] Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, vol. III, 2ª Ed., pág. 315.
[19] Almeida e Costa, "Noções de Direito Civil", 2ª ed., pág. 333.
[20] Código Civil Anotado, Vol. II, pág. 627.
[21] De acordo com o texto do artigo 100º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei nº 15/2005, de 26 de Janeiro [a que corresponde actualmente o artigo 105º da Lei nº 145/2015, de 09/09]:
“1 – Os honorários do advogado devem corresponder a uma compensação económica adequada pelos serviços efectivamente prestados, que deve ser saldada em dinheiro e que pode assumir a forma de retribuição fixa.
2 – Na falta de convenção prévia reduzida a escrito, o advogado apresenta ao cliente a respectiva conta de honorários com discriminação dos serviços prestados.
3 – Na fixação dos honorários deve o advogado atender à importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais».
[22] O ajuste poderia ser posterior à prestação dos serviços, tal como é defendido no Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 15/06/62, BMJ 118-547 e de 20/3/73, BMJ 225- 228.
[23] Jean Appleton, Traité de la Profession d`Avocat, Paris, 1928.
[24] Artigo 106.º (Proibição da quota litis).
1 - É proibido ao advogado celebrar pactos de quota litis.
2 - Por pacto de quota litis entende-se o acordo celebrado entre o advogado e o seu cliente, antes da conclusão definitiva da questão em que este é parte, pelo qual o direito a honorários fique exclusivamente dependente do resultado obtido na questão e em virtude do qual o constituinte se obrigue a pagar ao advogado parte do resultado que vier a obter, quer este consista numa quantia em dinheiro, quer em qualquer outro bem ou valor.
3 - Não constitui pacto de quota litis o acordo que consista na fixação prévia do montante dos honorários, ainda que em percentagem, em função do valor do assunto confiado ao advogado ou pelo qual, além de honorários calculados em função de outros critérios, se acorde numa majoração em função do resultado obtido.
[25] Artigo 405.º (Liberdade contratual):
1. Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver.
2. As partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei.
[26] Direito Professional do Advogado, Noções Elementares, 5ª edição, Almedina, Coimbra 2007, pág. 248.
[27] Orlando Guedes da Costa, Direito Profissional do Advogado – Noções Elementares, 5ª edição, Almedina, Coimbra, 2007, pág. 259.