Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
821/12.1TBPTM.E1
Relator: MATA RIBEIRO
Descritores: LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
CONDENAÇÃO EM QUANTIA A LIQUIDAR EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA
Data do Acordão: 03/12/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1 - Apesar da condenação em multa por litigância de má fé poder e dever ter lugar ex officio a apreciação da má fé e a condenação em multa e indemnização não pode o juiz relegá-las para depois da sentença, sendo esta o momento oportuno para a apreciação e decisão sobre tal matéria.
2 - O que pode e deve deixar para depois da sentença é a fixação do quantitativo indemnizatório, caso o processo, na altura da sentença, o não habilite a determiná-lo.
Sumário do Relator
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 821/12.1TBPTM.E1 (2ª secção cível)




ACORDAM 0S JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

Na ação declarativa, com processo sumaríssimo, que correu termos no Tribunal de Portimão, em que (…) - Telecomunicações (…) (…), SA demanda (…), invocando que celebraram um contrato de prestação de serviços para ativação dos serviços de internet móvel, serviço de voz fixa e serviço de internet fixa e que a ré não procedeu ao pagamento da quantia de 1.269,90 Euros acrescidos dos juros moratórios sobre tal quantia, foi proferida sentença em 12/12/2012, pela qual foi julgada improcedente a ação e a ré absolvida do pedido.
Nessa mesma sentença foi entendido que a conduta processual da autora não podia “deixar de ser apreciada à luz dos princípios da má-fé processual – artigo 456º do Código de Processo Civil,” mas por se tratar de pessoa coletiva deveria “ser pessoalmente notificado o representante legal/administrador da autora, a fim de lhe ser facultado o exercício do contraditório – artigo 458º do Código de Processo Civil”, notificação essa que foi determinada e veio a ocorrer.
Na sequência do referido veio a ser proferida, em 23/10/2014, decisão, pela qual se condenou a autora como litigante de má fé numa multa de 7 uc, bem como nas custas do incidente.
*
Inconformada com esta decisão, veio a autora interpor o presente recurso e apresentar as respetivas alegações, terminando por formular as seguintes conclusões, que se transcrevem:
I. O poder jurisdicional do Tribunal de 1.ª instância já se encontrava esgotado quando a Mm.ª Juiz, em 24.10.2014 condenou a autora em litigante de má-fé.
II. No nosso entender a sentença proferida em 12 de dezembro de 2012, já havia transitado em julgado, e formado caso julgado, há muito, quando foi proferida outra sentença, desta vez para condenar a autora em litigante de má-fé.
III. No momento processual em que a Mm.ª Juiz do Tribunal “a quo” proferiu sentença, datada de 12.12.2012, esgotou o seu poder jurisdicional.
IV. Após a sentença só era permitida a sua retificação se existirem erros materiais.
V. Assim sendo, a “sentença” recorrida que condena a autora em litigante de má-fé violou ostensivamente o disposto no art.º 620.º e 613.º, ambos do Código de Processo Civil.
VI. O poder jurisdicional do Tribunal de 1.ª instância já se tinha esgotado, pelo que a jurisdição posterior na condenação da autora, proferida em 24.10.2014, constitui uma inexistência jurídica e não deve produzir quaisquer efeitos.
VII. Do exposto, não se vislumbra que a ora Apelante tenha deduzido pretensão de, dolosamente, induzir em erro o Tribunal “a quo” violando gravemente o dever de cooperação com este.
VIII. Resulta antes que a Apelante agiu de boa-fé e com todo o respeito que é devido ao Tribunal, cooperando em abono da verdade.
IX. A condenação como litigante de má-fé implica uma abusiva utilização dos meios processuais e uma lide essencialmente dolosa, não podendo a condenação por litigância de má-fé estar à mercê de simples conjeturas do julgador, tal como se refere nos Acórdãos do S.T.J, de 17.11,72 e no da Relação de Lisboa de 14.11.80, in B.M.J. n.º 221, 164 e C.J., 1980, 5.º, 12.
X. Do espectro factual, não se conclui que a Apelante tenha agido com leviandade ou imprudência manifestas, de forma a ficarem preenchidas as condições previstas nos art.º 542.º e 543.º do C.P.C. e que justificou a sua condenação em litigante de má-fé e como tal condená-la na multa de 7 UCs. O que se revela manifestamente desproporcionado e imerecido.
XI. Ora, o Tribunal “a quo” condenou a Apelante, “(…), S.A.”, como litigante de má-fé, quando atenta a sua natureza de pessoa coletiva, não poderia ter sido, mas sim os seus representantes legais que supostamente estivessem de má-fé.
XII. Ora, in casu, o Tribunal “a quo” não identifica os representantes da Autora, que eventualmente estariam de má-fé.
*
Apreciando e decidindo

Como se sabe o objeto do recurso encontra-se delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso.
Assim, em síntese, do que resulta das conclusões, caberá apreciar se, se mostra adequada quanto ao momento em que ocorreu e quanto aos fundamentos a condenação da autora como litigante de má fé.
*
A matéria factual tida em conta pelo tribunal recorrido é a seguinte:
1) A Autora é uma sociedade anónima que tem por objeto a prestação de serviços de telecomunicações.
2) Entre a Autora e a Ré foi celebrado, em 20 de Outubro de 2010, um contrato para acesso à rede (…), mediante o qual a Autora se obrigava a prestar:
a) o serviço de internet móvel com um utilizador, com a atribuição do número (…);
b) o serviço de voz fixa , com a atribuição do número de (…);
c) o serviço de internet fixa, com o número (…);
3) A autora propôs à Ré a adesão aos seus serviços, através de subscrição de um serviço denominado de Office Box, pelo valor mensal fixo de € 75,96 a que acresce o respetivo IVA, durante o período mínimo de 3 anos.
4) As partes acordaram que a Ré no âmbito do contrato acima referido beneficiaria dos seguintes serviços:
a) No serviço de internet móvel, direito a 2 GB de plafond, sendo que, para além desse valor tinha que suportar os consumos extra - plafond;
b) No serviço fixo, gratuidade de chamadas telefónicas nacionais fixas;
c) No serviço ADSL, direito a downloads;
5) A Autora cedeu à Ré um equipamento para acesso à internet (Pen), com computador portátil de marca (…), e um router.
6) Os serviços foram instalados na morada indicada pela Ré, sita na Urbanização (…), Lote 21, Loja 7, em (…).
7) Foi criada a conta nº (…).
8) A Autora procedeu à instalação do equipamento e ativação dos serviços.
9) As partes acordaram que o pagamento da prestação mensal seria através de débito direto.
10) A ré procedeu ao cancelamento da autorização para débito direto em Dezembro de 2010.
11) Os serviços foram desativados pela autora em Dezembro de 2011.
12) A Ré é cliente da sociedade (…), S.A. com a qual, há já alguns anos, contratou o fornecimento de serviços telefónicos através de rede fixa ao qual está associado o nº (…), e bem assim um serviço de transmissão de dado via internet através de rede fixa, vulgarmente designado “ADSL”.
13) A este último está associada a conta nº (…).
14) A Ré é cliente da Autora com a qual, há já alguns anos, contratou o fornecimento de um serviço de transmissão de dados via internet em “banda larga”.
15) O preço de qualquer um dos sobreditos serviços variava mensalmente em função do número de horas de conversação ou do volume de tráfego de dados.
16) A Ré é técnica de contas de profissão exercendo esta atividade com carácter regular e lucrativo, tendo, para tal, estabelecimento aberto ao público.
17) Em 14 de Outubro de 2010 a Ré foi visitada no seu estabelecimento por um comercial da Autora que, após análise da faturação dos serviços telefónicos daquela, informou-a que poderia reduzir custos com os serviços telefónicos em rede fixa e a transmissão eletrónica via internet.
18) A adesão e subscrição daqueles serviços, naquela data, conferiria à Ré, nos termos que lhe foram transmitidos pelo comercial da Autora, os seguintes benefícios:
a) Instalação de uma linha de rede fixa analógica em substituição daquela que a Ré dispunha;
b) Instalação de todo o equipamento necessário à prestação dos serviços contratados;
c) Oferta de telefone sem fios, router e computador portátil marca Toshiba;
19) Era pressuposto e condição de tal subscrição que a Requerente efetuasse todas as diligências necessárias à rescisão de todos os serviços até então prestados pela (…), S.A. (serviços de telefone fixo e ADSL), bem como os então prestados pela Autora de internet em Banda Larga.
20) Com data de 14 de Outubro de 2010 Ré e Autora subscreveram um escrito designado “nota de encomenda”.
21) Em tal escrito, a Autora fez constar o seguinte: “ 1 Office box, voz fixa ilimitada + net fixa ilimitada + banda larga light, absorver /integrar fatura (…) conta nº (…) a instalar em linha nova analógica, oferta instalação + telefone sem fios + router consumíveis +computador Toshiba Portátil (…)”.
22) Na mesma data a Ré entregou à Autora o cheque nº (…), sacado sobre (…), no valor de € 181,50, a título daquilo que denominaram de “preço de adesão”.
23) A Autora apenas procedeu à instalação do router em 24 de Novembro de 2010.
24) Em Novembro de 2010 a Ré recebeu da Autora a fatura n.º (…) que titulava o valor de € 36,51, que liquidou.
25) No mesmo mês a Ré recebeu, também, duas faturas da Portugal Telecom uma relativa à rede fixa, outra relativa ao serviço ADSL e uma outra fatura da Autora relativa ao serviço de Banda Larga, nos valores unitários de, respetivamente, € 56,02, € 89, e € 10,82.
26) No mês de Dezembro 2010 a Ré recebeu da Autora a fatura nº (…) que titulava o valor de € 80,62.
27) No mesmo mês a Ré recebeu, também duas faturas da (…) uma relativa à rede fixa e outra ao serviço de internet ADSL no valor unitário de € 55,97 e de € 10,92, respetivamente.
28) No mês de Janeiro de 2011 a Ré recebeu da Autora a fatura nº (…) que titulava o valor de € 161,55.
29) No mesmo mês a Ré recebeu, também, duas faturas da (…), uma relativa à rede fixa e outra ao serviço de internet ADSL no valor unitário de € 58,03 e de € 10,89, respetivamente.
30) Desde o mês de Fevereiro de 2011 até Dezembro de 2011 a Autora emitiu e remeteu à Ré, com periodicidade mensal, faturas com o valor unitário de € 93,43.
31) Também desde o mês de Fevereiro de 2011 até à presente data a (…) tem vindo a emitir e a remeter à Ré, com periodicidade mensal, faturas relativas aos serviços de telecomunicações através de rede fixa e aos serviços de ADSL, em montantes variáveis.
32) A Autora não procedeu à migração/portabilidade do número de telefone fixo da Ré, conforme acordado.
33) A Autora não procedeu às diligências a que se obrigou perante a Ré para proceder à suspensão dos serviços de telecomunicações e transmissão eletrónica de dados, até então prestados pela (…), S. A.
34) A Autora, desde Janeiro de 2011, deixou de prestar à Ré os serviços de Internet Móvel.
35) A Ré procedeu, mensalmente e até à presente data, ao pagamento das faturas emitidas pela (…) pela utilização dos serviços Telepac ADSL, mesmo após a subscrição da proposta contratual supra.
36) A Ré não liquidou à Autora as faturas por esta emitida após Dezembro de 2010 e até Dezembro de 2011 relativas aos serviços “Office Box”.
37) No dia 29 de Dezembro de 2010 a Ré remeteu à Autora uma carta registada com aviso de receção com o seguinte teor: “venho por este meio solicitar a suspensão do contrato celebrado com a vossa empresa, conta n.º (…), pelos seguintes motivos:
1. Os serviços prestados pelo pacote Office Box não correspondem ao que foi apresentado pelo vosso comercial;
2. Foi-me dito que passaria a ter um serviço único com a (…), três serviços numa única fatura, rede fixa + adsl + banda larga, deixando de ter assinatura com a (…), o objetivo seria reduzir custos de papel para o grupo (…) e custos para a minha empresa;
3. A instalação do vosso router só ocorreu a 23/11/2010;
4. No mês de Novembro tenho a cobrança de duas assinaturas, uma da (…) e outra do Office Box;
5. Já reclamei junto da (…) para o serviço número (…), foi-me dito que todos os meses irei receber as duas assinaturas e que se não foi este o serviço combinado para falar com o comercial;
6. A minha empresa fica lesada com este serviço.
Informo ainda os vossos serviços de que o débito direto foi cancelado até resolução do problema.”
38) Com data de 29 de Janeiro de 2011 a Ré remeteu nova carta à Autora, desta vez com o seguinte teor: “Venho, por este meio solicitar uma resposta por parte da vossa empresa à minha reclamação refª 98/10, apresentada por carta registada datada de 29.12.2010. Já tentei saber pelo vosso número (…) em que situação se encontrava esta reclamação, foi dito que seria visitada por um comercial, as semanas vão passando e ate à data não houve qualquer visita de comercial, nem resposta da vossa empresa. Há um mês que aguardo a visita do comercial (…). Continuo a receber as faturas pelos dois serviços quando apenas tenho um.” Esta situação preocupa-me bastante, pois enquanto não estiver resolvida não liquido mais nenhuma fatura do serviço Office Box. Estou a cair numa situação de devedora por erro do vosso comercial”.
39) Com data de 09 de Fevereiro de 2011, a Ré remeteu nova carta à Autora, desta vez com o seguinte teor: “Venho por este meio, informar o vosso departamento de cobranças, de que as minhas faturas do serviço Office Box se encontram por liquidar, pelo facto de já ter sido apresentadas várias reclamações à (…) e até à presente data não ter qualquer resposta. Devo referir que as primeiras reclamações foram apresentadas por telefone no inicio de Dezembro de 2010. Em 29/12/2010 apresentei reclamação por escrito em carta registada. Fiz vários telefonemas ao vosso comercial (…) (telem. …), o que me foi apresentado pelo Sr. (…) não corresponde ao que estou a pagar. Desde Dezembro de 2010 que estou à espera da visita de um comercial vosso para a regularização desta situação. A última reclamação foi apresentada por escrito em C/R e A/R no dia 29/01/2011. Peço ao vosso departamento uma ajuda para a resolução deste problema. Estou a cair numa situação de devedora por um erro comercial vosso.”
40) Com data de 11 de Fevereiro de 2011, a Ré remeteu uma carta à Autora, com o seguinte teor: Venho por este meio, mais uma vez solicitar com urgência, a visita de um comercial vosso ao meu escritório, a fim de regularizar uma situação criada pelo vosso comercial (…) (telm. …). Devo referir que desde Dezembro de 2010 ando a reclamar e a solicitar a regularização desta situação. Não posso aceitar de modo algum ter de pagar duas mensalidades a duas empresas, (…) e (…), pelo mesmo serviço. Quando o vosso comercial me solicitou uma reunião no escritório disse-me que o objetivo seria reduzir custos. Em toda a nossa conversa foi-me dito que ficaria a pagar três serviços (rede fixa+adsl+banda larga) numa única fatura pelo valor total de 75,96 euros mais IVA. Não é o que está a acontecer. Estou a pagar duas mensalidades pelos mesmos serviços que tinha antes da visita do comercial. Em vez de uma redução de custo como prometido tenho um agravamento de custos. Junto em anexo um mapa onde podem comprovar. Não liquido mais nenhuma fatura do serviço Office Box até à regularização desta situação. Confiando na melhor atenção de V. Exas para o assunto, subscrevo-me apresentando os nossos melhores cumprimentos.
41) A Ré contactou a autora, por telefone, no período que mediou entre finais de 2010 e finais de Fevereiro de 2011, apresentando as reclamações com o mesmo teor das cartas enviadas.
42) A Autora nunca respondeu as comunicações escritas da ré.”.
*
Conhecendo da questão
Estamos perante um caso em que a litigância de uma das partes, em sede de ação, foi considerada de má fé tendo sido apreciada e decidida em momento muito posterior à data em que foi proferida a sentença referente à questão de fundo que se discutia na ação.
Defende a recorrente, e desde já diga-se, a nosso ver bem, que questão do conhecimento da má fé não podia ser relegada para momento posterior ao da sentença proferida sobre a questão de fundo, devendo ser apreciada e decidida concomitantemente.
Antes de mais, caberá notar que entre a prolação da sentença sobre a questão de fundo e a prolação da decisão que reconheceu a litigância de má fé da autora, deu-se a alteração da lei processual civil tendo a litigância, no caso em apreço, sido processualmente tramitada ao abrigo CPC de 95/96 bem como do novo CPC, sendo que no âmbito deste novo diploma são idênticos os pressupostos da responsabilidade por litigância de má fé das pessoas coletivas e sociedades e das pessoas singulares, sendo a má fé apreciada, sem necessidade de imputar subjetivamente idêntica atitude a qualquer dos representantes das pessoas coletivas ou sociedades como anteriormente acontecia na previsão do artº 458º do CPC de 95/96, o que terá motivado a notificação do legal representante da autora para se pronunciar sobre a questão da eventual litigância de má fé, sendo que, atendendo ao previsto o novo CPC, a decisão recorrida não teve em conta a responsabilidade do representante da autora que foi subtraída do âmbito da aplicação da norma que, presentemente, apenas, prevê a responsabilidade do representante de incapazes – artº 544º do NCPC - (não também de pessoas coletivas ou sociedades) condenando, por isso, a própria sociedade autora.
Mas, atendendo-se à lei antiga ou à nova lei, temos para nós que em nenhuma delas é configurada a possibilidade de ser relegada para momento posterior à sentença que decide a questão de fundo, quer em sede de ação, quer em sede de incidente, a apreciação e decisão sobre a litigância de má fé.
A condenação sobre a litigância de má fé deve, por isso, ser efetuada logo na sentença que decida ação ou que ponha termo a qualquer incidente da causa principal, quando o incidente assuma o aspeto de causa secundária só podendo relegar-se para momento posterior a fixação da indemnização decorrente da litigância de má fé desde que não haja elementos para fixar o seu quantitativo desde logo - v. artº 457º n.º 3 do CPC 95/96 e artº 543º n.º 3 do NCPC (cfr. Alberto dos Reis in Código de Processo Civil Anotado, vol. II, 1981, 280) .
Apesar da condenação em multa por litigância de má fé poder e dever ter lugar ex officio, “a apreciação da má fé e a condenação em multa e indemnização não pode o juiz relegá-las para depois da sentença; é nesta que há-de decidir se o litigante procedeu de má fé; é aí que, em caso afirmativo, há-de condená-lo em multa e indemnização; o que pode e deve deixar para depois da sentença é a fixação do quantitativo da indemnização, caso o processo, na altura da sentença, o não habilite a determiná-lo” – (v. Alberto dos Reis in Código de Processo Civil Anotado, vol. II, 1981, 281).
No caso em apreço o Julgador se entendia na fase do julgamento e perante os factos que haviam de ser dados como provados que a litigância efetuada pela autora se poderia integrar na litigância de má fé deveria abster-se de logo proferir sentença sobre a questão de fundo, devendo antes proporcionar o exercício do contraditório sobre a alegada litigância de má fé ao legal representante da autora e, só após ter ocorrido esse exercício ou ter decorrido o prazo para o efeito, proferir, então, sentença que conhecesse do mérito da causa e da litigância, que se tinha por ser de má fé, da autora.
Não tendo sido seguido este caminho, temos de considerar que com a prolação das sentença de 12/12/2012 sobre a questão de fundo se esgotou o poder jurisdicional do Julgador quer em termos de apreciação e decisão sobre a questão de fundo, quer sobre a apreciação e decisão sobre a questão da litigância de má fé, pois proferida a sentença fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa nela se integrando a matéria relativa à eventual litigância de má fé de qualquer das partes – art-.º 613º do NCPC (artº 666º do VCPC).
Deste modo não podia assim, cerca de 22 meses depois de ter sido proferida sentença, transitada em julgado, sobre a questão de fundo, vir no mesmo processo a ser proferida sentença sobre a questão da litigância da autora, que se considerou ser de má fé, por se mostrar esgotado o poder jurisdicional do Juiz.
De tal decorre que a prejudicialidade da apreciação da outra questão levantada nas conclusões relativa à verificação, ou não, dos requisitos legalmente exigidos para poder operar a condenação por má fé.
Impõem-se a procedência do recurso e a revogação da decisão recorrida.
*
DECISÂO
Pelo exposto, nos termos supra referidos, decide-se julgar procedente a apelação e, em consequência revoga-se a decisão impugnada.
Sem custas.
Évora, 12 de Março de 2015
Mata Ribeiro
Sílvio Teixeira de Sousa
Rui Machado e Moura