Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2715/19.0T8FAR.E1
Relator: JOSÉ ANTÓNIO MOITA
Descritores: DESPESAS DE CONDOMÍNIO
COMPARTICIPAÇÃO
Data do Acordão: 09/15/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1-O critério subjacente à norma constante do n.º 4 do artigo 1424.º do Código Civil relativa à comparticipação de condóminos nas despesas com ascensores, ou elevadores, prende-se essencialmente com a possibilidade de aceder à fracção através da utilização do elevador, independentemente de existir maior ou menor necessidade de tal utilização, ou de esse uso ser ou não efectivo por parte do condómino.
2-Não resultando em concreto demonstrada a possibilidade de tal acesso impõe-se reconhecer o condómino Apelante como desobrigado de comparticipar em tais despesas.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 2715/19.0T8FAR.E1
Comarca de Faro – Juízo Local Cível de Faro - Juiz 1
Apelantes: (…), (…), (…), (…), (…), (…) (…)
Apelada: Quinta do (…) – Construção Civil e Obras Públicas, Lda.
*
Sumário do Acórdão
(da exclusiva responsabilidade do relator – artigo 663.º, n.º 7, do CPC)
(…)
***
Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora no seguinte:
I – Relatório
Quinta do (…) – Construção Civil e Obras Públicas, Lda., com sede no (…), 8150-058, São Brás de Alportel, intentou contra Condomínio Quinta do (…), Lote 7, sito Rua do (…) de Faro, n.º 7, 8000-123 Faro, em representação dos condóminos presentes na Assembleia de Condóminos realizada em 12/07/2019 e que aprovaram as deliberações constantes da respectiva acta, (…), residente na Rua (…) de Faro, Lote 7, 1.º, esquerdo 8000-123 Faro, em representação da Fração designada pela letra “C”, (…), residente na Rua (…) de Faro, Lote 7, 1.º, direito, 8000-123 Faro, em representação da Fração designada pela letra “D”, (…), residente na Rua (…) de Faro, Lote 7 2.º, esquerdo, 8000-123, Faro, em representação da Fração designada pela letra “E”, (…), residente na Rua (…) de Faro, Lote 7, 2.º, direito, 8000-123, Faro, em representação da Fração designada pela letra “F”, (…), residente na Rua (…) de Faro, Lote 7, 3.º, esquerdo 8000-123, Faro, em representação da Fração designada pela letra “G”, (…), residente na Rua (…) de Faro, Lote 7, 4.º, direito 8000-123, Faro, em representação da Fração designada pela letra “I” e (…), residente na Praceta (…), n.º 4, 2.º, esquerdo, 8000-186, Faro, em representação da Fração designada pela letra “J” correspondente ao 4.º andar, direito, acção declarativa de condenação, com processo comum, pedindo, na qualidade de proprietária e condómina das fracções designadas pelas letras “A” e “B”, o seguinte:
a) A anulação da deliberação da assembleia de condóminos constante do ponto 3 da ordem de trabalhos, que decidiu aprovar por unanimidade o orçamento para o exercício do ano de 2019, com fundamento no facto de não ser mencionado o valor de quotização mensal imputável a cada fracção autónoma, acrescido do fundo reserva, na proporção do valor das fracções (permilagem constante no título constitutivo da propriedade horizontal);
b) A anulação da deliberação da assembleia de condóminos constante do ponto 4 da ordem de trabalhos, que decidiu manter a aplicação das “compensações aprovadas na Assembleia de Condóminos constante do ponto 2 da ata n.º 13”, com fundamento no facto de a deliberação tomada na assembleia referida, não expressar o valor do montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio, com a fixação da quota-parte devida por cada condómino/fracção, para que possa ser aplicável uma penalização que não exceda a quarta parte do rendimento coletável das frações “A” e “B”;
c) A anulação da deliberação da assembleia de condóminos constante do ponto 6 da ordem de trabalhos, com fundamento no facto de os valores em dívida pela Autora aí discriminados, relativo às duas fracções, se encontrarem erradamente calculados, uns por se encontrarem prescritos (os valores anteriores a Setembro de 2014), outros por se encontrarem com erro de cálculo e não se encontrar especificado nas actas o valor devido a título de quota parte e de fundo de reserva por cada fracção;
d) Ser declarado que, às fracções da Autora, “A” e “B”, não pode ser imputável pela Assembleia de Condomínio, todas as despesas devidas com os elevadores, limpeza, consumo de telefones, manutenção, do interior da propriedade horizontal, com fundamento no facto de, por serem lojas localizadas no rés-do-chão e com acesso directo pela via pública, não usarem ou fruírem os elevadores e o interior do edifício, e o acesso à arrecadação existente na cave ser feito por portão exterior.
Contestaram os Réus (…), (…), (…), (…), (…), (…) e (…), invocando, desde logo, a excepção dilatória de ilegitimidade passiva com referência ao Réu Condomínio e excepção dilatória de ilegitimidade passiva com referência ao restantes Réus por preterição de litisconsórcio necessário passivo assente no facto de a acção o não ter sido também contra os respectivos cônjuges.
No mais, impugnaram os factos alegados pela Autora e concluíram pela validade e eficácia das deliberações em causa, admitindo, porém, existir erro de cálculo quanto a “penas pecuniárias”, as quais são apenas devidas a partir da deliberação da Assembleia de Condomínio que as aprovara, ou seja, a partir de 12.06.2015.
No que respeita ao modo de repartição das despesas comuns, contra-alegaram com o facto de ambas as fracções da Autora (constituída a fracção “A” por loja, duas casas de banho, duas despensas e arrecadação na cave e a fracção “B” por loja, duas casas de banho e arrecadação na cave) terem acesso ao prédio quer pelo alçado principal através da porta de entrada do prédio que permite a utilização dos elevadores para descida à cave onde se encontra a arrecadação, quer pelo alçado posterior através do portão da garagem, o qual também permite a utilização dos elevadores para subida até ao piso principal, podendo por isso servirem-se dos elevadores e terem os contadores de gás instalados no interior do hall de entrada do prédio obrigando a aceder ao seu interior para respectiva leitura.
Acrescentaram que na cave – zona indubitavelmente usada pelas fracções “A” e “B” – existem sistemas de prevenção contra incêndios, fosso de drenagem de águas, áreas de circulação, portão automático de acesso à cave, redes de água e electricidade, elevador e escada de acesso ao hall de entrada do prédio, que servem a todos e carecem de manutenção e que as fracções “A” e “B” possuem uma conduta de uso exclusivo de exaustão de fumos que atravessa todo o prédio na vertical, com saída no terraço da cobertura do prédio sendo obrigatória a sua manutenção frequente obrigando isso ao acesso à cobertura (por elevador ou escadas interiores do prédio).
Findos os articulados, realizou-se audiência prévia, decidindo-se das excepções de ilegitimidade invocadas, com absolvição da instância do Réu Condomínio e julgando improcedente a invocada ilegitimidade dos restantes Réus por preterição de litisconsórcio necessário.
Na dita audiência prévia, foi assumido pelas Partes estarem de acordo quanto ao facto de a título de pena pecuniária (€ 30,00 por semestre) esta só ser devida a partir da deliberação referente à acta n.º 13, de 12.06.2015.
*
Oportunamente realizou-se a audiência final, a que se seguiu a prolação de sentença, da qual consta o seguinte dispositivo:
“V. DECISÃO
Pelo exposto, julgando-se a presente acção parcialmente procedente, decide-se:
a) Anular a deliberação constante no ponto 6 da ordem de trabalhos da Acta Número Dezassete, tomada na Assembleia de Condóminos referente ao prédio em regime de propriedade horizontal sito na Rua do (…) de Faro, n.º 7, 8000-123 Faro, realizada no dia 12 de Julho de 2019, na parte relativa ao valor imputado a cada uma das Fracções “A” e “B” a título de compensação, a qual deve ser alterada no sentido de passar a imputar aos condóminos incumpridores do pagamento das quotas a pena pecuniária fixada em € 30,00 por cada semestre e somente a partir de 12 de Junho de 2015;
b) Declarar que, com referência às fracções autónomas “A” e “B”, não pode ser imputável pela Assembleia de Condomínio a participação nas despesas dos elevadores;
c) Absolver os Réus do demais peticionado pela Autora.
Custas pela Autora (47,03%) e Réus (52,97%) na proporção do respectivo decaimento – cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Registe e notifique.”
*
Inconformados com a sentença os Réus apresentaram requerimento de recurso de apelação para este Tribunal da Relação alinhavando as seguintes conclusões:
“III. CONCLUSÕES:
1. O presente recurso recai, única e exclusivamente, sob a alínea b) do dispositivo da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, através do qual aquele Tribunal entendeu «Declarar que, com referência às frações autónomas “A” e “B”, não pode ser imputável pela Assembleia de Condomínio a participação nas despesas dos elevadores».
2. Através do presente recurso impugna-se quer a matéria de facto, quer a matéria de direito.
3. No que se refere à matéria de facto, os Recorrentes impugnam o ponto A do único facto considerado não provado, cuja eliminação se pretende e se requer a V. Exas..
4. As certidões de registo predial do prédio em questão, assim como as referentes às frações autónomas designadas pelas letras “A” e “B” impunham uma decisão diferente, cuja composição foi transcrita pelo Tribunal a quo e consta dos factos 19 e 20 considerados provados.
5. A composição daquelas frações autónomas refere expressamente que estas têm acesso pelo alçado principal e pelo alçado posterior, sendo compostas pela loja e por uma arrecadação na cave.
6. De acordo com o facto provado n.º 22 «As frações “A” e “B” acedem às arrecadações pelo alçado posterior através do portão da garagem, o qual também permite o acesso aos elevadores e escadas do prédio».
7. O facto dos arrendatários daquelas frações acederem às arrecadações pelo portão da garagem, não significa que não tenham, querendo, acesso às arrecadações através da porta de entrada do prédio.
8. O acesso a arrecadações na cave tanto pode ser efetuado pela porta principal - descendo à cave pelos elevadores ou por escadas – ou pelo portão da garagem – descendo a rampa de acesso aos estacionamentos.
9. Isto é um facto notório de conhecimento geral que impõe, também ele, a eliminação do ponto A dos factos não provados.
10. Por outro lado, em termos de matéria de direito, entendem os Recorrentes que o Tribunal a quo fez uma errada interpretação do artigo 1424.º, n.º 4, do Código Civil, o qual dispõe que «4. Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas.»
11. Apesar da clareza daquela norma legal, o Tribunal a quo entendeu declarar que não pode ser imputável às frações autónomas “A” e “B” as despesas dos elevadores, porquanto os arrendatários daquelas frações não utilizam os elevadores para aceder às respetivas arrecadações existentes na cave e, porquanto a utilização dos elevadores para manutenção e limpeza da conduta de exaustão de fumos existente no terraço de cobertura não é suficiente para os fazer incorrer em tal custo associado a razões de ordem técnico-construtiva.
12. Não conseguimos, de todo, acompanhar o Tribunal a quo na interpretação que fez desta norma legal.
13. O artigo 1424.º, n.º 4, do Código Civil apenas permite que os condóminos que não possam, de todo, objetiva e efetivamente, utilizar os elevadores para aceder às respetivas frações autónomas não sejam obrigados a suportar o custo de manutenção com aqueles, o que seria, por exemplo, o caso das frações autónomas serem constituídas apenas pela loja do rés- do-chão com acesso direto à via pública.
O que não é manifestamente o caso!
14. Conforme factos provados sob os n.º 19 e 20 e respetivas certidões de registo predial, as frações autónomas “A” e “B” possuem, cada uma delas, uma arrecadação na cave do edifício, a qual permite, nos termos do facto provado sob o n.º 22, o acesso aos elevadores e escadas do prédio.
15. Para aceder às arrecadações que fazem parte integrante das frações autónomas “A” e “B”, pode aceder-se quer pelo alçado principal – através da porta de entrada no prédio que permite a utilização dos elevadores para descida à cave onde se encontra a arrecadação – quer pelo alçado posterior – através do portão da garagem, o qual também permite a utilização dos elevadores para subida até ao piso principal.
16. O que quer dizer que, independentemente da sociedade Recorrida utilizar ou não os elevadores, podendo deles servir-se está obrigada a contribuir para o pagamento das respetivas despesas.
17. Acresce, ainda, que, conforme matéria de facto provada sob os n.º 24 e 25 da douta sentença recorrida, as frações autónomas da propriedade da sociedade Recorrida possuem uma conduta, de uso exclusivo, de exaustão de fumos que atravessa todo o prédio na vertical, com saída no terraço da cobertura. Estas condutas são usadas para exaustão de cozinha e churrasqueira, sendo necessária manutenção e limpeza.
18. Independentemente do número de vezes que aquelas condutas sejam limpas e/ou mantidas, para se aceder às mesmas tem que se subir ao terraço de cobertura do prédio, podendo tal trajeto ser efetuado por escadas ou através dos elevadores.
19. O artigo 1424.º, n.º 4, do Código Civil não exige – bem – que os condóminos utilizem efetivamente os elevadores para que sejam responsáveis pelo pagamento das respetivas despesas. Caso contrário, qualquer condómino (do 1.º andar ou de qualquer outro), poderia recusar-se no pagamento das despesas com os elevadores, a coberto da sua não utilização efetiva.
20. Aquela norma legal apenas exige que a utilização dos elevadores possa ser feita, de acordo com a propriedade horizontal e a composição da própria fração autónoma.
21. Concluindo-se do supra exposto que a sentença recorrida fez uma errada interpretação do artigo 1424.º, n.º 4, do Código Civil, impondo-se a respetiva revogação de molde a que as frações autónomas designadas pelas letras ”A” e “B” se mantenham responsáveis pelo pagamento das despesas de manutenção dos elevadores, porquanto deles se podem servir, não só para ter acesso às respetivas arrecadações existentes na cave, assim como para ter acesso à conduta de exaustão de fumos existente no terraço de cobertura do prédio.
Termos em que, nos demais de direito que V.
Exas. doutamente suprirão, se requer a V. Exas. Que se dignem considerar totalmente procedente o presente recurso e, consequentemente, se dignem revogar parte da sentença recorrida, eliminando o ponto A dos factos não provados e revogando a alínea b) do dispositivo da sentença recorrida, absolvendo os Réus de tal pedido, assim se fazendo a tão costumada justiça!”
*
A Apelada apresentou resposta ao recurso, alinhando extensas conclusões, pugnando pela total improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.
*
Foi proferido despacho que admitiu o recurso e ordenou a subida do mesmo a este Tribunal Superior para apreciação.
O recurso é o próprio e foi correctamente admitido quanto ao modo de subida e efeito fixado.
*
Correram Vistos.
*
II – QUESTÕES OBJECTO DO RECURSO
Nos termos do disposto no artigo 635.º, n.º 4, conjugado com o artigo 639.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recurso, salvo no que concerne à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas pertinentes ao caso concreto e quando se trate de matérias de conhecimento oficioso que, no âmbito de recurso interposto pela parte vencida, possam ser decididas com base em elementos constantes do processo, pelo que as únicas questões que enformam o objecto deste recurso são as seguintes:
1-Impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
2-Reapreciação de mérito, circunscrita a saber se a Apelada deve, ou não, comparticipar, juntamente com os restantes condóminos, nas despesas respeitantes á manutenção dos elevadores.
*
III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Consta do segmento atinente aos fundamentos de facto da sentença recorrida o seguinte:
Dos factos
“FACTOS PROVADOS
O Tribunal considera provados os seguintes factos com relevância para a decisão:
1. Encontra-se registada a favor da Autora, por Ap. (…), de 1994/04/14, a aquisição das fracções autónomas designadas pelas letras “A” e “B”, correspondente ao rés-do-chão esquerdo e rés-do-chão direito, respectivamente, do prédio constituído em propriedade horizontal sito na Rua (…) de Faro, n.º 7, denominado por Urbanização Quinta do (…), lote n.º 7, em Faro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro (Sé) sob o n.º (…).
2. Em 12 de Julho de 2019 reuniu a Assembleia de Condóminos do prédio identificado em 1.
3. Nessa reunião de condóminos, estiveram presentes e aprovaram por unanimidade, todos os pontos da ordem de trabalhos, os condóminos (…), (…), (…), (…), (…), (…), (…), os quais constam com registo de aquisição a seu favor das fracções autónomas correspondentes às letras “C”, “D”, “F”, “G”, “I” e “J”, respectivamente.
4. A Autora não esteve presente, nem se fez representar, na Assembleia de Condóminos aludida em 2.
5. Os administradores do condomínio são os condóminos e aqui Réus (…) e (…).
6. Foi enviada à Autora a acta referente à Assembleia de Condóminos aludida em 2., correspondente à Acta Número Dezassete, da qual constam as deliberações aí tomadas.
7. Por comunicação escrita datada de 01/08/2019, a Autora comunicou ao Administrador do Condomínio, a sua intenção de impugnar as deliberações tomadas na Assembleia de Condóminos aludida em 2, e solicitou a convocatória de assembleia extraordinária, para revogação das deliberações que considerava inválidas e ineficazes por contrárias à lei.
8. Da referida comunicação consta:
“(…) Carta registada c/ar
Faro, 01 de agosto de 2019.
Assunto: Impugnação das deliberações tomadas na assembleia de condóminos do dia 12/07/2019.
Exmos. Senhores
Os nossos cumprimentos.
A sociedade Quinta do (…) – Construção Civil e Obras Públicas, Lda., na qualidade de proprietária das frações “A” e “B”, do prédio constituído em regime de propriedade horizontal sito na Rua do (…), n.º 7, em Faro, tendo sido comunicada no passado dia 23/07/2019, das deliberações tomadas em 12/07/2019 e constantes na acta número dezassete, vem nos termos do artigo 1433.º, n.º 2, do Código Civil, solicitar a V. Exa. administrador do condomínio referido, para convocar assembleia extraordinária, para revogação das deliberações inválidas e ineficazes constantes na referida ata, e que são contrárias à lei, nomeadamente:
Ponto 3 da convocatória e constante na ata n.º 17, deliberação tomada em 12/07/2019:
Consta da deliberação quanto a este ponto o seguinte:
“(…) 3.- Relativamente ao enunciado no terceiro ponto da Ordem de Trabalhos foi aprovada por unanimidade a proposta de Orçamento para o exercício de 2019, previamente entregue aos condóminos e anexada à presente Acta dela fazendo parte integrante (…)”.
Consultado o mencionado orçamento, verifica-se que é feita a descrição das despesas previsíveis para o ano de 2019, com os respetivos montantes, sem que seja mencionado o valor de quotização mensal imputável a cada fração autónoma, acrescido do fundo reserva, de acordo com as regras estabelecidas no n.º 1 do artigo 1424.º do Código Civil, mormente, na proporção do valor das frações (permilagem constante no titulo constitutivo da propriedade horizontal).
De acordo com o disposto no artigo 6.º, n.º 1, do D-L n.º 268/94, de 25.10, a ata de condomínio tem de conter: deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio, fixação da quota-parte devida por cada condómino e fixação do prazo de pagamento respetivo.
Torna-se assim evidente, tal deliberação é inválida, por contrária à lei, pelo que deve ser revogada.
Ponto 4 da convocatória e constante na ata n.º 17, deliberação tomada em 12/07/2019:
Dispõe o n.º 2 do artigo 1434.º do Código Civil que:
“2. O montante das penas aplicáveis em cada ano nunca excederá a quarta parte do rendimento colectável anual da fracção do infractor.”
Das deliberações tomadas na assembleia referida, não consta o valor do montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio, com a fixação da quota-parte devida por cada condómino/fração, para que possamos concluir, que a penalização aplicável, ao invés da “compensação”, excede ou não a quarta parte do rendimento coletável das frações “A” e “B”, da qual somos proprietários.
Torna-se assim evidente, tal deliberação é inválida, por contrária à lei, pelo que deve ser revogada.
Ponto 6 da convocatória e constante na ata n.º 17, deliberação tomada em 12/07/2019:
No ponto 6 constante da ata é feita a descrição da dívida atinentes a várias frações, nomeadamente, às frações de que somos proprietários, respeitante aos anos de 2009 a 2018 Os valores mencionados e respeitantes aos anos 2009 a julho de 2014 encontram-se prescritos, nos termos da alínea g) do artigo 310.º do Código Civil, decorrente do prazo de cinco anos, uma vez que se tratam de prestações periodicamente renováveis.
No que respeita a descrição das dividas respeitante ao designado por “compensação” na mencionada deliberação, deve de existir erro, uma vez que o que foi deliberado na ata n.º 13, foi aprovação de aplicar uma “compensação” no valor de € 30,00 por cada semestre, sabendo que cada ano só tem dois semestres, dará um valor de penalização ao condómino faltoso de € 60,00 por ano e por fração.
Considerando que, e hipoteticamente assumindo que estaríamos em divida com responsabilidade, que não aceitamos, estaríamos em divida por cada ano € 60,00 X 10 anos (2009 a 2018), daria um valor de penalização por cada fração a quantia de € 600,00. Analisando a referida ata, consta da mesma a título de compensação a quantia de € 1.100,00 para cada fração em dívida, esquecendo-se a assembleia que tal deliberação só foi tomada em 2013, pelo que só poderá ser exigível a partir dessa data e nunca com efeitos retroativos como faz.
Não se esquecendo, tal como referido supra, que todas as quantias anteriores a agosto de 2014 se encontram prescritas, nada sendo devido pela proprietária.
Por outro lado, na referida deliberação não consta, e nem é feita essa descrição nas atas anteriores, de que forma é que foram imputadas as quotas partes a cada uma das frações, uma vez que as mesmas são lojas, com entrada direta pela via pública, não acedendo, nem utilizando o interior do edifício, e o acesso à arrecadação existente na cave é feito pelo portão exterior. Quer isto dizer, que as frações “A” e “B”, não utilizam e nem usufruem determinados serviços das partes comuns da propriedade horizontal, e como tal não lhe pode ser imputado, toda e qualquer despesa atinente a elevadores, limpeza, consumo de telefones, manutenção, em violação do estabelecido no artigo 1424.º, números 3 e 4, do Código Civil.
Torna-se assim evidente, tal deliberação é inválida, por contrária à lei, pelo que deve ser revogada.
Assim, em face do supra exposto, requer a V. Exa. a convocatória de uma assembleia extraordinária, a ter lugar no prazo de 20 dias, caso tal não suceda, será instaurada a competente ação judicial para anulação das deliberações tomadas na assembleia de 12/07/2019 e constantes na ata n.º 17, contra todos os condóminos que aprovaram as mencionadas deliberações. (…)”.
9. A comunicação enviada pela Autora foi recebida pelo Administrador do Condomínio e aqui Réu (…).
10. Não foi convocada a assembleia extraordinária de condóminos, tal como solicitado pela Autora.
11. Consta da Acta Número Dezassete referente à Assembleia de Condóminos aludida em 2.: “(…) A Ordem de trabalhos para a Assembleia de Condóminos é a seguinte:
1.- Aprovação do Relatório de Contas respeitante ao exercício de 2018. 2.- Eleição da nova Administração.
3.- Aprovação do Orçamento para o Exercício de 2019.
4.- Manutenção das compensações aprovadas na Acta n.º 13.
5.- Poderes à administração para a transferência de contas.
6.- Autorização para constituição de advogado e discriminação das dívidas.
7.- Outros assuntos. (…)
3.- Relativamente ao enunciado no terceiro ponto da Ordem de Trabalhos foi aprovada por unanimidade a proposta de Orçamento para o exercício de 2019, previamente entregue os condóminos e anexada à presente Acta dela fazendo parte integrante.
4.- Relativamente ao ponto quatro da ordem de trabalhos foi aprovado por unanimidade a manutenção das compensações aprovadas na Assembleia de Condóminos conforme consta no ponto dois da Acta n.º 13.
Pelo motivo desta assembleia se realizar muito próximo de 15 de Julho, é aprovada a excepção da data de 15 de Julho para liquidação de quotas definida na Acta n.º 13 ser estendida, só agora, para 15 de Agosto de 2019. (…)
6.- No período correspondente ao sexto ponto da Ordem de Trabalhos foram descritas aos condóminos as dívidas das fracções “A”, “B” e “G” seguintes:
Fracção “A” (51‰)
– O valor total da dívida em quotas de condomínio, fundo de reserva e compensação é de € 4.618,59, que se discrimina da seguinte forma:
Ano de 2009, conforme consta na acta n.º 9 de aprovação de orçamento datada de 13 de Abril de 2009.
- Valor da quota trimestral é de € 58,74
- Valor da quota anual é de € 234,96
- Valor pago no exercício 2012-2014 foi de € 112,20
- Valor total da dívida em 2009 é de € 122,76 correspondente a parte do 3.º trimestre e 4.º trimestre.
Ano de 2010, conforme acta n.º 10 de aprovação de orçamento datada de 28 de Maio de 2010.
- Valor da quota trimestral é de € 58,74
- Valor total da dívida em 2010 é de € 234,96 em dívida (1.º a 4.º trimestre)
Ano de 2011, conforme acta n.º 10 de aprovação de orçamento datada de 28 de Maio de 2010.
- Valor da quota trimestral é de € 58,74
- Valor da quota anual é de € 234,96 em dívida (1.º a 4.º trimestre)
- Valor de custos de Advogado é de € 150,00 em dívida
- Valor total da dívida em 2011 é de € 384,96
Ano de 2012, conforme acta n.º 11 de aprovação de orçamento datada de 02 de Março de 2012.
- Valor da quota trimestral é de € 58,74
- Valor total da dívida em 2012 é de € 234,96 (1.º a 4.º trimestre)
Ano de 2013, conforme acta n.º 11 de aprovação de orçamento datada de 02 de Março de 2012.
- Valor da quota trimestral é de € 58,74
- Valor total da dívida em 2013 é de € 234,96 (1.º a 4.º trimestre).
Ano de 2014, conforme acta n.º 11 de aprovação de orçamento datada de 02 de Março de 2012 e acta n.º 12 de aprovação de orçamento datada de 24 de Outubro de 2014
- Valor da quota trimestral é de € 58,74
- Valor total da dívida actual é de € 181,37 (1.º a 3.º trimestre) (€ 58,74 x quotas de 3 Trimestres)
Ano de 2014/15, conforme acta n.º 12 de aprovação de orçamento datada de 24 de Outubro de 2014 e acta n.º 13 de aprovação de compensações datada de 12 de junho de 2015.
- Valor da Quota trimestral é de € 58,74 (4.º Trim. 2014 + 1.º a 4.º Trim. 2015)
- Valor do Fundo de Reserva trimestral é de € 5,87
- Valor da Compensação é de € 390,00 (13 Semestres x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/07/2015)
- Valor Total da dívida actual em 2015 é de € 629,75 (1.º a 4.º trimestre) (€ 58,74 x 5 Trimestres + € 4,79 de Fundo de Reserva) + € 390,00 (compensação)
Ano de 2016, conforme acta n.º 14 de aprovação de orçamento datada de 09 de Junho de 2016 e acta n.º 13 de aprovação de compensações datada de 12 de junho de 2015
- Valor da Quota trimestral é de € 74,71
- Valor do Fundo de Reserva trimestral é de € 7,47
- Valor da Compensação é de € 870,00 (14 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/01/2016 + 15 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/07/2016)
- Valor Total da dívida em 2016 é de € 1.198,72 (1.º a 4.º trimestre) (€ 74,71 + € 7,47) x 4 Trim. + € 870,00 (compensação)
Ano de 2017, conforme acta n.º 15 de aprovação de orçamento datada de 23 de Junho de 2017 e acta n.º 13 de aprovação de compensações datada de 12 de junho de 2015
- Valor da Quota trimestral é de € 74,71 – Valor do Fundo de Reserva trimestral é de € 7,47
- Valor da Compensação é de € 990,00 (16 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/01/2017 + 17 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/07/2017)
- Valor Total da dívida em 2017 é de € 1.318,72 (1.º a 4.º trimestre) (€ 74,71 + € 7,47) x 4 Trim. + € 990,00 (compensação)
Ano de 2018, conforme acta n.º 16 de aprovação de orçamento datada de 23 de Junho de 2017 e acta n.º 13 de aprovação de compensações datada de 12 de junho de 2015
- Valor da Quota trimestral é de € 74,71
- Valor do Fundo de Reserva trimestral é de € 7,47
- Valor da Compensação é de € 1.110,00 (18 Sem. x € 30,00 /Sem. por cumprir em 15/01/2017 + 19 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/07/2017)
- Valor Total da dívida em 2018 é de € 1.438,72 (1.º a 4.º trimestre) (€ 74,71 + € 7,47) x 4 Trim. + € 1.100,00 (compensação)
Valor total em dívida em 31/12/2018 – € 6.033,47 Fracção “B” (80‰)
- O valor total da dívida em quotas de condomínio, fundo de reserva e compensação é de € 7071,00, que se discrimina da seguinte forma:
Ano de 2009, conforme acta n.º 9 de aprovação de orçamento datada de 13 de Abril de 2009.
- Valor da quota mensal trimestral é de € 92,14
- Valor da quota anual é de € 368,56
- Valor pago no exercício 2012-2014 foi de € 175,96
- Valor total da dívida em 2009 é de € 192,60 correspondente a parte do 3.º trimestre e 4.º trimestre.
Ano de 2010, conforme acta n.º 10 de aprovação de orçamento datada de 28 de Maio de 2010.
- Valor da quota trimestral é de € 92,14
- Valor total da dívida em 2010 é de € 368,56 em dívida (1.º a 4.º trimestre)
- Ano de 2011, conforme acta n.º 10 de aprovação de orçamento datada de 28 de Maio de 2010.
- Valor da quota trimestral é de € 92,14
- Valor da quota anual é de € 368,56 em dívida (1.º a 4.º trimestre)
- Valor total da dívida em 2011 é de € 368,56
- Ano de 2012, conforme acta n.º 11 de aprovação de orçamento datada de 02 de Março de 2012.
- Valor da quota trimestral é de € 92,14
- Valor do Fundo de Reserva trimestral é de € 9,22
- Valor total da dívida em 2012 é de € 368,56 (Quotas do 1.º ao 4.º trimestre). Em 09/06/2016 pagou Fundo de Reserva.
Ano de 2013, conforme acta n.º 11 de aprovação de orçamento datada de 02 de Março de 2012.
- Valor da quota trimestral é de € 92,14
- Valor do Fundo de Reserva trimestral é de € 9,22
- Valor total da dívida em 2013 é de € 368,56 (Quotas do 1.º ao 4.º trimestre). Em 09/06/2016 pagou Fundo de Reserva.
Ano de 2014, conforme acta n.º 11 de aprovação de orçamento datada de 02 de Março de 2012 e acta n.º 12 de aprovação de orçamento datada de 24 de Outubro de 2014
- Valor da Quota trimestral é de € 92,14 (três trimestres no exercício)
- Valor do Fundo de Reserva trimestral é de € 9,22
- Valor total da dívida actual em 2014 é de € 276,42 e (1.º a 3.º trimestre). Em 09/06/2016 e 22/06/2017 pagou Fundo de Reserva. € 92,14 x 3 Trim. = € 276,42
Ano de 2014/15, conforme acta n.º 12 de aprovação de orçamento datada de 24 de Outubro de 2014 e acta n.º 13 de aprovação de compensações datada de 12 de junho de 2015.
- Valor da Quota trimestral é de € 92,14 (cinco Trimestres no exercício) - Valor do Fundo de Reserva trimestral é de € 9,22
- Valor da Compensação é de € 390,00 (13 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/07/2015)
- Valor total da dívida actual em 2015 é de € 858,42 (4.º Trim./2014 + 1.º a 4.º Trim./2015). Em 22/06/2017 pagou parcialmente Fundo de Reserva (€ 92,14 x 5 Trim. + € 7,72 de F. Reserva + € 390,00 (compensação)
Ano de 2016, conforme acta n.º 14 de aprovação de orçamento datada de 09 de Junho de 2017 e acta n.º 13 de aprovação de compensações datada de 12 de junho de 2015
- Valor da Quota trimestral é de € 117,20
- Valor do Fundo de Reserva trimestral é de € 11,72
- Valor da Compensação é de € 870,00 (14 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/01/2016 + 15 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/07/2016)
- Valor total da dívida em 2016 é de € 1.385,68 (1.º a 4.º Trimestre) (€ 117,20 + € 11,72) x 4 Trim. + € 870,00 (compensação)
Ano de 2017, conforme acta n.º 15 de aprovação de orçamento datada de 27 de Junho de 2017 e acta n.º 13 de aprovação de compensações datada de 12 de junho de 2015.
- Valor da Quota trimestral é de € 117,20
- Valor do Fundo de Reserva trimestral é de € 11,72
- Valor da Compensação é de € 990,00 (16 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/01/2017 + 17 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/07/2017)
- Valor total da dívida em 2017 é de € 1.505,68 (1.º a 4.º trimestre) (€ 117,20 + € 11,72) x 4 Trim. + € 990,00 (compensação)
Ano de 2018, conforme acta n.º 16 de aprovação de orçamento datada de 27 de Junho de 2017 e acta n.º 13 de aprovação de compensações datada de 23 de Junho de 2017.
- Valor da Quota trimestral é de € 117,20
- Valor do Fundo de Reserva trimestral é de € 11,72
- Valor da Compensação é de € 1.110,00 (18 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/01/2018 + 19 Sem. x € 30,00/Sem. por cumprir em 15/07/2018)
- Valor total da dívida em 2017 é de € 1.625,68 (1.º a 4.º trimestre) (€ 117,20 + € 11,72) x 4 Trim. + € 1.100,00 (compensação)
- Valor total em dívida em 31/12/2018 – € 7.318,72 (…)”.
12. No orçamento anexo à Acta Número Dezassete, consta a descrição das despesas previsíveis para o ano de 2019 e os respectivos montantes. 13. No orçamento anexo à Acta Número Dezassete, consta previsto as quotizações das fracções autónomas e respectiva permilagem, sendo uma quotização trimestral no montante de € 82,18 e quota anual no montante de € 328,72 para a fracção autónoma designada pela letra A, com uma permilagem de 51; e uma quotização trimestral no montante de € 128,82 e quota anual no montante de € 515,68 para a fracção autónoma designada pela letra B, com uma permilagem de 80.
14. Nesse mesmo orçamento consta ainda expressamente que as quotas aí apresentadas incluem 10% para o fundo de reserva.
15. O orçamento aludido em 13 dos Factos Provados, não tem expresso o valor da quotização mensal.
16. Da Acta Número Treze referente à Assembleia de Condóminos realizada em 12.06.2015 consta: “(…) a seguinte ordem de trabalhos:
1. (…)
2. Compensações ao condomínio por incumprimentos de quotas; (…)
Relativamente ao segundo ponto da ordem de trabalhos foi aprovada por unanimidade dos presentes a compensação ao condomínio por incumprimento de quotas de acordo com o seguinte: como compensação aos condóminos cumpridores o acréscimo nas quotas dos condóminos não cumpridores de € 30,00 por cada semestre não cumprido até 15 de Julho e até 15 de Janeiro, imediatamente acrescidos às suas quotas, a vigorar a partir desta assembleia (…)”.
17. Em conformidade com a deliberação descrita em 16, à data da Assembleia de Condóminos aludida em 2, eram sete as “penas pecuniárias” no montante de € 30,00 relativamente a cada uma das fracções autónomas pertença da Autora.
18. O prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, identificado em 1, é composto de cinco pisos e cave e por dez fracções autónomas.
19. A fracção autónoma “A” corresponde ao Rés-do-chão Esquerdo, tem acesso pelo alçado principal e posterior, é destinada a comércio, indústria não poluente, serviços, restauração e bebidas e escritórios para profissão liberal, e composta por loja, duas casas de banho, duas despensas e arrecadação na cave com o n.º 11.
20. A fracção autónoma “B” corresponde ao Rés-do-chão Direito, tem acesso pelo alçado principal e posterior, é destinada a comércio, indústria não poluente, serviços, restauração e bebidas e escritórios para profissão liberal, e constituída por loja, duas casas de banho e arrecadação na cave com o n.º 10.
21. As fracções “A” e “B” acedem à loja pelo alçado principal através de porta que permite entrada directa pela via pública.
22. As fracções “A” e “B” acedem às arrecadações pelo alçado posterior através do portão da garagem, o qual também permite o acesso aos elevadores e escadas do prédio.
23. Os contadores de gás das fracções “A” e “B” estão instalados no interior do hall de entrada do prédio, aos quais é obrigatório aceder para respectiva leitura.
24. As fracções autónomas “A” e “B” possuem uma conduta, de uso exclusivo, de exaustão de fumos que atravessa todo o prédio na vertical, com saída no terraço da cobertura.
25. Estas condutas são usadas para exaustão de cozinha e churrasqueira, sendo necessária manutenção e limpeza.
*
FACTOS NÃO PROVADOS
Com interesse para a decisão o Tribunal considera não provados os seguintes factos:
A. Às fracções “A” e “B” acede-se através da porta de entrada no prédio.
*
Os restantes factos alegados na petição inicial e contestação deduzida não integram os factos provados ou não provados por se tratarem de matéria considerada irrelevante para a decisão, mera impugnação ou matéria conclusiva ou de direito”.

**
IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
1-Impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
Os Apelantes impugnaram no seu recurso o único ponto de facto considerado como não provado vertido sob a alínea A. pretendendo a sua “eliminação” do segmento da sentença recorrida atinente aos factos não provados, entendendo que a redacção do mesmo é contraditória com os factos elencados sob os pontos 19º a 25º do segmento da sentença recorrida atinente aos factos considerados como provados.
Sobre a reapreciação da matéria de facto e sua eventual modificabilidade estatuem os artigos 640.º e 662.º, ambos do Código de Processo Civil.
Dispõe o artigo 662.º, n.º 1, do CPC, que:
A relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes , a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Refere sobre este normativo o Conselheiro António Abrantes Geraldes (“Recursos no novo Código de Processo Civil”, 5ª edição, Almedina, pág. 287) , o seguinte:
“O actual artigo 662.º representa uma clara evolução no sentido que já antes se anunciava …através dos nºs 1 e 2, alíneas a) e b), fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do principio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia”.
Já no artigo 640.º, que se debruça sobre o ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, previu-se que:
1-Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
[…]”.
A este propósito sustenta o Conselheiro António Abrantes Geraldes (obra acima citada, a págs. 168-169), que a rejeição total ou parcial respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve ser feita nas seguintes situações:
“a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (artigos 635.º, n.º 4 e 641.º, n.º 2, alínea b));
b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (artigo 640.º, n.º 1, alínea a));
c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação”, esclarecendo ainda que a apreciação do cumprimento de qualquer uma das exigências legais quanto ao ónus de prova prevenidas no mencionado n.º 1 e 2, alínea a), do artigo 640.º do CPC deve ser feita “à luz de um critério de rigor”.
Baixando aos contornos do caso concreto percebemos que os Apelantes enquadraram erradamente o vício que alegam subsistir na matéria de facto descriminada na sentença recorrida.
Na verdade, ao pretenderem a pura e simples “eliminação” de um ponto de facto do segmento destinado aos factos considerados como não provados, conclui-se necessariamente que não cumprem devidamente o ónus de obrigatória especificação previsto na alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC, pois não especificam a decisão que no seu entender deveria ter sido tomada pelo Tribunal recorrido quanto ao ponto de facto impugnado.
Por outras palavras, se defendem que o facto, por tido como não demonstrado, foi incorrectamente julgado pelo Tribunal a quo para cumprirem na íntegra os pressupostos legais previstos no artigo 640.º do CPC, impunha-se que especificassem o que entenderam ter resultado demonstrado.
Ao invocarem a existência de contradição entre o facto censurado com outros considerados na sentença recorrida como provados pugnando pela pura e simples ablação daquele primeiro os Apelantes não lograram cumprir devidamente o ónus de obrigatória especificação que sobre si recaia, razão pela qual se rejeita a pretendida impugnação.
Sempre se acrescentará, ainda, que a existência de contradição na matéria de facto pode constituir fundamento para eventual anulação, ou modificação, mesmo oficiosamente, da decisão recorrida ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 662.º do Código de Processo Civil.
Sucede, porém, que no caso vertente não cremos que subsista a contradição apontada pelos Apelantes.
Na verdade, tal sucederia necessariamente se o mesmo facto fosse considerado simultaneamente como provado e como não provado.
Ora, o facto elencado como não demonstrado sob a alínea A do segmento atinente aos factos considerados como não provados não contradiz directa e flagrantemente qualquer um dos factos integrantes do segmento dedicado aos considerados como provados, mormente os vertidos sob os pontos 19 a 25.
Na verdade, atentando-se cuidadosamente na redacção conferida ao facto que resultou como não provado, ou seja que “Às frações “A” e “B” acede-se através da porta de entrada no prédio”, resulta não estar o mesmo a contrariar frontalmente qualquer um dos factos considerados demonstrados vertidos nos pontos acima indicados, mormente os descriminados sob os pontos 19 a 22, uma vez que nenhum destes alude expressamente a “porta de entrada no prédio” resultando até claro, por via da redacção conferida ao ponto de facto n.º 21, que o acesso às lojas integrantes das fracções “A” e “B” é realizado pelo alçado principal “através de porta que permite entrada directa pela via pública”, ou seja porta diferente da porta de entrada no prédio uma vez que esta última viabilizará certamente, como é de experiência comum, o acesso directo ao hall de entrada do dito prédio, ao passo que o acesso às arrecadações das ditas fracções “A” e “B” é feito pelo alçado posterior “através do portão da garagem”.
Falecendo a primeira questão objecto do presente recurso cumpre passar à análise da elencada sob o ponto 2 circunscrita a saber se a Apelada deve, ou não, comparticipar, juntamente com os restantes condóminos, nas despesas respeitantes á manutenção dos elevadores do prédio.
Dispõe o artigo 1424.º do Código Civil o seguinte:
1. Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e relativas ao pagamento de serviços de interesse comum são da responsabilidade dos condóminos proprietários das frações no momento das respetivas deliberações, sendo por estes pagas em proporção do valor das suas frações.
2. Sem prejuízo do disposto no número anterior, as despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum podem, mediante disposição do regulamento de condomínio, aprovada, sem oposição, por maioria dos condóminos que representem a maioria do valor total do prédio, ficar a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respetiva fruição, desde que devidamente especificadas e justificados os critérios que determinam a sua imputação.
3. As despesas relativas às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem.
4. Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas frações por eles possam ser servidas.
[…]”
No caso concreto a questão prende-se essencialmente com a melhor interpretação a conferir ao normativo constante do n.º 4 do artigo 1424.º do Código Civil, acima transcrito.
Na sentença recorrida o Tribunal a quo entendeu que a Apelada deveria ficar desobrigada de comparticipar nas despesas dos elevadores percebendo-se que erigiu como critério basilar para chegar a tal solução o da necessidade de utilização dos ditos elevadores por parte daquela Apelada, que é proprietária das fracções autónomas designadas pelas letras “A” e “B”.
Vejamos em concreto de que forma fundamentou o Tribunal a quo a posição a que chegou na sentença recorrida passando-se a transcrever esse segmento da fundamentação jurídica da sentença recorrida:
“Pergunta-se: as fracções “A” e “B” são servidas pelos elevadores?
É certo que, para aceder às fracções, não é necessário o uso dos elevadores. Para as lojas acede-se por directamente por porta que deita para a via pública; e para as arrecadações acede-se pelo portão da garagem, ao nível da cave.
A necessidade de manutenção da conduta de exaustão de fumos que desemboca no terraço da cobertura e a necessidade de leitura dos contadores do gás localizados no hall de entrada do prédio, serão realidade suficiente para se considerar que os elevadores servem as fracções?
A nossa resposta vai no sentido negativo.
Atente-se que o acesso através do elevador ao terraço para manutenção da conduta de exaustão de fumos servirá, somente, para isso mesmo: a manutenção e limpeza de “chaminé” que, por razões de ordem técnico-construtiva do edifício, vem a desembocar, para cumprimento da sua função de extracção dos fumos, na cobertura do prédio.
A ratio da norma é precisamente excluir os condóminos que não necessitam do elevador para aceder à sua fracção da obrigação de pagar as respectivas despesas.
No caso, as fracções “A” e “B” são compostas por loja, casas de banho e despensas ao nível do rés-do-chão e arrecadação na cave, portanto, sem necessidade de uso dos elevadores.
E o mesmo entendimento se tem, por maioria de razão, no que respeita ao contador do gás. São operações de consulta e/ou manutenção, as quais não se devem confundir com o acesso à fracção em si.”
Percebemos o entendimento sufragado pelo Tribunal recorrido ora acabado de transcrever.
Julgamos, todavia, que quer a mens legis, quer a mens legislatoris, subjacentes à norma plasmada no n.º 4 do artigo 1424.º do CC, não aponta inequivocamente para esse critério da necessidade até porque sendo o prédio em concreto, como qualquer outro, servido igualmente por escadas, que também permitem o acesso às frações, o uso dos elevadores, mesmo para pisos um pouco elevados, pode sempre ser substituído pela utilização das referidas escadas.
O critério subjacente ao normativo em causa prende-se essencialmente com a possibilidade de aceder à fracção através da utilização do elevador, independentemente de existir maior ou menor necessidade de tal, ou de o condómino usar efectivamente, ou não, o elevador.
No caso vertente afigura-se que a leitura dos contadores do gás poderá e será por princípio concretizada pelas pessoas encarregues de tal serviço através da introdução no hall de entrada do prédio servido pela respectiva porta de entrada, como tal ao nível do rés-do-chão, pelo que a questão da possibilidade de acesso aos contadores das fracções “A” e “B” por meio de elevador não se deve colocar.
De qualquer modo sempre se acrescenta que os ditos contadores não integram o conceito de fracção.
No tocante aos factos vertidos sob os pontos 24 e 25 do segmento dos factos considerados como provados na sentença recorrida percebemos que estão em causa condutas que pertencem e são de uso exclusivo das frações “A” e “B” “com saída no terraço da cobertura”.
Acontece, porém, que não resultou provado que os elevadores existentes no prédio sirvam essa zona de “terraço da cobertura” onde desembocam as saídas das condutas a partir das quais será certamente realizada a necessária limpeza e manutenção.
Por fim, resta apreciar o facto vertido sob o ponto 22 dos factos considerados como provados na sentença recorrida.
Da leitura atenta do mesmo percebemos que o acesso às arrecadações, que são parte integrante das fracções “A” e “B”, é feito pelo portão da garagem e que este também permite o acesso aos elevadores e escadas do prédio.
Porém, não resulta demonstrado nos autos que os elevadores em causa estejam em condições de servir as lojas das ditas fracções “A” e “B” uma vez que tal implicaria que tivesse resultado demonstrado ser possível aceder às mesmas pelo interior do prédio.
Provado ficou apenas e através do facto vertido sob o ponto n.º 21 do segmento respeitante à matéria de facto provada na sentença recorrida ser possível aceder às lojas das fracções “A” e “B” pelo alçado principal através de uma porta que viabiliza entrada directa a partir da via pública.
E assim sendo não existem elementos que permitam com a necessária segurança considerar que os elevadores possam servir as fracções “A” e “B”, designadamente as lojas que compõem as mesmas, pelo interior do prédio a partir do piso das arrecadações e garagens.
Destarte, embora com fundamentação não coincidente com a plasmada na sentença recorrida, entende-se não merecer esta última censura, sendo, assim, de manter o decidido.
*
*
V – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal em negar provimento ao presente recurso de apelação apresentado por (…), (…), (…), (…), (…), (…) e (…) e, em consequência, decidem:
a) Confirmar a sentença recorrida;
b) Fixar as custas a cargo dos Apelantes, nos termos do disposto no artigo 527.º, n.º 1 e 2, do CPC.
*
Évora, 15/09/2022
José António Moita (Relator)
Mata Ribeiro (1º Adjunto)
Maria da Graça Araújo (2º Adjunto)