Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
658/17.1T8STC.E1
Relator: MOISÉS SILVA
Descritores: AÇÃO DE RECONHECIMENTO DA EXISTÊNCIA DE CONTRATO DE TRABALHO
ACÇÃO DE SIMPLES APRECIAÇÃO
SECTOR EMPRESARIAL DO ESTADO
Data do Acordão: 02/01/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: REVOGADA
Sumário: i) A ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho é uma ação de simples apreciação positiva. Pretende pôr fim à situação de incerteza quanto a determinada situação de facto e de direito. É necessário apurar os factos e qualificá-los. A empregadora não é condenada. É apenas destinatária de uma declaração que torna certa uma questão de facto e de direito incerta.
ii) na ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, quando a empregadora é o Estado ou uma empresa pública, o único efeito jurídico que não pode ser produzido com a declaração de reconhecimento da existência de contrato de trabalho é a condenação da empregadora a admitir o trabalhador ao abrigo de um contrato de trabalho, por impedimento legal.
iii) quanto ao mais, a decisão proferida na ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho produz os seus efeitos normais, pelo que o processo deve prosseguir os seus termos a fim de que o seu objeto seja apreciado após a fixação dos factos provados e não provados.
(Sumário do relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 658/17.1T8STC.E1

Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO

Apelante: Ministério Público (autor).
Apelada: Rádio e Televisão de Portugal, SA (ré).

Tribunal Judicial da comarca de Setúbal, Juízo do Trabalho de Santiago do Cacém

1. O Ministério Público intentou ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho contra a ré, pedindo a final que seja declarada a existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado, com inicio a 07 de julho de 2014, entre a ré e o trabalhador BB, desempenhando este as funções de operador de produção, mediante a retribuição mensal de € 1 700 (mil e setecentos euros).
Na contestação, a ré invoca várias exceções e pugna pela inexistência de uma relação de trabalho subordinado.
No despacho saneador foram apreciadas as exceções invocadas pela ré, entre elas, a nulidade da contratação em face da existência de limitações ou proibições à constituição de relações de trabalho subordinado com entidades do sector público empresarial, como é o caso da ré; a impossibilidade de reconhecer eventuais situações de trabalho dependente e a impossibilidade do tribunal reconhecer eventuais situações de trabalho dependente celebradas pela empregadora, a qual foi julgada procedente e, consequentemente, a R. absolvida do pedido.

2. Inconformado, veio o Ministério Público interpor recurso de apelação que motivou e com as conclusões que se seguem:
1ª O Ministério Publico não se conforma com o entendimento perfilhado no douto despacho da Meritíssima Juíza do Tribunal a quo, que decidiu julgar procedente a exceção perentória deduzida pela ré/empregadora consistente na nulidade ab initio e insuprível da constituição do vínculo contratual entre o trabalhador BB e a ré/empregadora - Rádio e Televisão de Portugal SA, desde 07 de julho de 2014 e, por via de tal exceção, absolveu a ré/empregadora do pedido que contra ela formulara o Ministério Público e julgou improcedente a ação.
2.ª Salvo melhor opinião entende o M. Publico que só em sede de julgamento, a questão da nulidade da contratação, deveria ser apreciada.
3.ª Previamente a tal questão deveria o Tribunal ad quo qualificar o negócio jurídico que se encontra subjacente à situação dos autos, designadamente se tratando-se de uma ação de simples apreciação positiva, visa apenas obter uma declaração judicial que reconheça a existência de um contrato de trabalho.
9.ª E embora a empregadora não tenha liberdade, sem autorização governamental prévia, para celebrar contratos de trabalho - o que aqui não se discute - aos trabalhadores da mesma aplica-se, nos termos do artigo 17.º do Decreto-Lei 133/2013, de 3 de outubro e do artigo 40.º dos Estatutos da RTP, o regime jurídico do contrato individual de trabalho consagrado no Código do Trabalho e na demais legislação laboral.
10.ª O que aqui se pretende é regularizar a situação do trabalhador que, a coberto da celebração de contratos de prestação de serviços, vê a sua proteção jurídica diminuída. A RTP ainda que sujeita a restrições impostas pela Lei do Orçamento, pode contratar trabalhadores, desde que cumpra os requisitos previstos nas leis orçamentais, ou seja, mediante autorização prévia para recrutamento de novos trabalhadores.
11.ª Acresce que o programa de regularização extraordinária dos vínculos na Administração Pública regulado pela Portaria 150/2017 de 3 de maio, é um programa operacional, de natureza programática, que ainda não está integralmente consolidado, dele não podendo resultar que o Código do Trabalho tenha sido colocado em moratória de aplicação subsistindo a necessidade de constituição de vínculo laboral ou reconhecida a sua existência e, consequentemente, esse programa não pode obstar ao exercício das funções que lhes cabem quanto ao reconhecimento de relações jurídicas.
12.ª Em casos como o presente, quando uma empresa do sector empresarial do Estado contrata um trabalhador para este prestar a sua atividade, qualificando-se falsamente o contrato como de prestação de serviços, o contrato simulado é nulo.
13.ª Quanto ao contrato dissimulado (contrato de trabalho), deve concluir-se pela sua validade, face à presunção de que o legislador tomou as opções acertadas, por apelo à interpretação teleológica das mencionadas normas orçamentais e, acima de tudo, sujeitando essas mesmas normas a uma interpretação conforme à constituição, nomeadamente o direito à segurança no emprego - cfr. artigo 53.ª da CRP.
14.ª Caso assim não se entenda e se considere tal contrato nulo, invoca-se a inconstitucionalidade material das normas orçamentais que preveem tal invalidade, por violação do direito à segurança do emprego - cfr. artigo 53.º da CRP.
Nestes termos, e nos demais de direito aplicáveis, deverá ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência ser a douta decisão recorrida revogada e substituída por outra, que julgue improcedente a exceção perentória e determine o prosseguimento da presente ação instaurada contra a recorrida, em ordem ao reconhecimento do contrato existente como sendo de trabalho.

3. A R. respondeu e concluiu nos seguintes termos:
I. A sentença recorrida decidiu corretamente, ao concluir pela ocorrência da exceção de nulidade da contratação que conduz à absolvição do pedido, pois no caso concreto, não é legalmente admissível reconhecer a existência de um contrato de trabalho celebrado com a recorrida nem fixar a data de início da produção dos respetivos efeitos.
II. Assim o impede a lei orçamental, que expressamente comina a nulidade, originária e insuprível, de contratos de trabalho celebrados pela recorrida sem obtenção da prévia obtenção de autorização governamental, sendo que uma decisão judicial nunca seria suficiente para suprir tal nulidade.
III. Trata-se, aliás, da solução que tem sido seguida na generalidade das sentenças que têm julgado pleitos em tudo idênticos ao presente.
IV. A posição sustentada pelo recorrente assenta numa contradição insanável, na medida em que a legislação em vigor impede o que aquele pretende. Servindo a presente ação para declarar a existência de um contrato trabalho e fixar a data da constituição da relação laboral por ele instituída, não pode a mesma ter como resultado declarar que existe um contrato que a lei expressamente estabelece ser nulo, que, como tal, conduziria à imediata cessação do vínculo contratual e não à regularização da situação.
V. Além disso, a presente ação não visa o estabelecimento de quaisquer efeitos decorrentes do reconhecimento de um vínculo de natureza laboral, esgotando, ao invés, o seu efeito útil no tal reconhecimento, ou não, de uma relação de natureza laboral.
VI. As conclusões formuladas a final não foram suscitadas, em momento algum, perante o Tribunal a quo, sempre se dizendo que a legislação orçamental aplicável à recorrida não ofende, de forma alguma, nenhuma das dimensões em que se materializa o direito à segurança no emprego, consagrado no artigo 53.º da Lei Fundamental.
VII. O raciocínio interpretativo do recorrente não só se afigura contrário à lei, como consagra uma interpretação (teleológica) que defrauda os motivos e razões subjacentes à estipulação de tal quadro legislativo orçamental, sendo, por demais evidente, que a intenção do legislador foi abranger toda e qualquer situação que pudesse levar à admissão de trabalhadores ao serviço de tais entidades.
VIII. A exigência de autorização governamental para contratação de trabalhadores por parte do Sector Empresarial do Estado visa salvaguardar a prossecução de um interesse público, sendo notório que esta limitação à contratação e o regime de nulidade instituído, foram motivados e justificados pela necessidade de acautelar a viabilidade económico-financeira do Estado Português, isto é, por razões de “boa gestão pública na alocação de recurso públicos”.
IX. A regularização das situações de errado enquadramento contratual de vínculos estabelecidos com empresas do setor empresarial do Estado, onde se inclui a recorrida, só pode ser obtida através do PREVPAP, sendo precisamente para essas situações que tal programa foi estabelecido.
X. Foi o próprio Estado que, tendo instituído limitações à admissão de trabalhadores por empresas do setor empresarial público, criou o PREVPAP, ou seja, um mecanismo destinado a regularizar as situações de errado enquadramento contratual existentes no seu próprio seio e, por essa via, assegurar a regularização dessas situações, a qual não pode ser obtida pelos meios comuns, dada a nulidade dos contratos de trabalho celebrados sem prévia autorização governamental.
XI. Em bom rigor, não se compreende qual o interesse que, no entendimento do recorrente, deve ser acautelado e que subjaz e justifica a continuação da presente lide, na medida em que através desta jamais se logrará a regularização da situação contratual em apreço, sendo que o próprio Estado, que o recorrente representa, tem propositada e especificamente em curso um mecanismo que visa avaliar e regularizar essa mesma situação.
Nestes termos, e nos demais que doutamente se suprirão, devem as conclusões do recurso ser julgadas improcedentes, mantendo-se integralmente a sentença a quo.

4. Após os vistos, em conferência, cumpre apreciar e decidir.

5. Objeto do recurso

O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das alegações formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso.
As questões a decidir são as seguintes:
1 – Apurar se a eventual nulidade da contratação torna inútil o prosseguimento da ação para apreciar a existência de contrato de trabalho.
2 – A inconstitucionalidade material das normas orçamentais que preveem tal invalidade, por violação do direito à segurança do emprego.

II - FUNDAMENTAÇÃO
A) Os factos a considerar são os que resultam das alegações das partes e dos autos, nomeadamente dos articulados, donde resulta que:
a) A R. é uma empresa pertencente ao setor público empresarial do Estado Português.
b) A partir de 7 de julho de 2014, o prestador de atividade BB passou a prestar atividade para a R.
c) Para o efeito, entre a R. e o prestador de atividade foi subscrito acordo denominado contrato de prestação de serviços, com efeitos a partir de 7 de julho de 2014 e termo em 6 de janeiro de 2016, o qual foi assinado naquela data.
d) Com data de 6 de janeiro de 2016, entre a R. e o prestador de atividade foi subscrito convénio denominado aditamento a contrato de prestação de serviço, pelo qual, declararam prorrogar o contrato de prestação de serviços datado de 7 de julho de 2014, com início em 6 de janeiro de 2016 e termo em 7 de julho de 2017.
e) A referida prestação de atividade, bem como os referidos acordos não foram precedidos de qualquer autorização governamental.
f) O Ministério Público alega na petição inicial factos concretos tendentes a qualificar como contrato de trabalho a relação existente entre BB e a ré.

B) APRECIAÇÃO
As questões a decidir neste recurso são as que já elencamos:
1 – Apurar se a eventual nulidade da contratação torna inútil o prosseguimento da ação para apreciar a existência de contrato de trabalho.
2 – A inconstitucionalidade material das normas orçamentais que preveem tal invalidade, por violação do direito à segurança do emprego.

B1) Apurar se a eventual nulidade da contratação torna inútil o prosseguimento da ação para apreciar a existência de contrato de trabalho

O que está em causa na ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, prevista e regulada nos art.ºs 186.º-K a 186.º-R do CPT, é apreciar se a relação estabelecida entre o prestador da atividade e o beneficiário da mesma constitui uma relação de trabalho subordinado e não outra qualquer, nomeadamente de prestação de serviços.
O Ministério Público pretende que nesta ação sejam apreciados factos que, a provarem-se, em seu entender permitem qualificar como contrato de trabalho a relação estabelecida entre a ré e BB.
Trata-se de apurar matéria de facto que não tem a ver diretamente com a validade da relação jurídica, mas sim com a sua qualificação.
Só após se terem apurado factos quer permitam concluir pela existência de um contrato de trabalho é que se pode analisar se pode ser validamente convolado em contrato de trabalho e a ré condenada a admitir o trabalhador enquanto tal.
O art.º 10.º do CPC, aplicável subsidiariamente ex vi art.º 1.º n.º 2, alínea a), do CPT, prescreve que as ações são declarativas ou executivas (n.º 1).
As ações declarativas podem ser de simples apreciação, de condenação ou constitutivas (n.º 2).
As ações referidas no número anterior têm por fim: as de simples apreciação, obter unicamente a declaração da existência ou inexistência de um direito ou de um facto (n.º 3, alínea a).
A ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho é uma ação de simples apreciação positiva. Pretende pôr fim à situação de incerteza quanto a determinada situação de facto e de direito[1]. É necessário apurar os factos e qualificá-los. A empregadora não é condenada. É apenas destinatária de uma declaração que torna certa uma questão de facto e de direito incerta.
A decisão proferida nesta ação tem consequências jurídicas definitivas em relação à qualificação jurídica da situação de facto estabelecida entre o prestador de trabalho e o beneficiário da mesma e em relação a terceiros, na medida em que é comunicada oficiosamente pelo tribunal à ACT e ao Instituto da Segurança Social, I P, com vista à regularização das contribuições desde a data de início da relação laboral fixada (art.º 186.º-O do CPT) e após o seu trânsito em julgado levanta a suspensão do procedimento contraordenacional (art.º 15.º-A n.º 4 da Lei n.º 107/2009, de14 de setembro).
As entidades públicas referidas, após decidido definitivamente pelo tribunal que a situação factual consubstancia um contrato de trabalho, procedem em conformidade.
Todavia, estas consequências jurídicas não afastam a natureza declarativa de simples apreciação positiva desta ação especial. Estas entidades públicas são chamadas a atuar de acordo com o fim da incerteza definido na decisão judicial. Uma vez clarificada a situação de facto e de direito, aquelas entidades limitam-se a prosseguir os seus fins públicos balizadas pela declaração de simples apreciação proferida pelo tribunal na sequência de um processo democrático.
No caso concreto, a empregadora é uma empresa pertencente ao setor público empresarial do Estado Português, em que a admissão dos trabalhadores está sujeita a autorização governamental.
Todavia, tal não impede a apreciação da situação de facto existente entre o prestador da atividade e a empresa beneficiária e a sua qualificação jurídica.
Se a ação proceder, será declarada a existência de uma verdadeira situação de contrato de trabalho entre o prestador da atividade e a ré e constatar-se-á então que esta contratou um trabalhador a recibos verdes (foi celebrado um contrato de prestação de serviços), em situação precária, para o exercício de funções correspondentes a contrato de trabalho, em clara violação da lei.
Trata-se da constatação de uma ilegalidade e não da condenação da ré a admitir o trabalhador ao abrigo de um contrato de trabalho. O que fica definido é que, enquanto durar, esta relação de trabalho é de trabalho subordinado, sujeita ao regime contributivo aplicável aos trabalhadores por conta de outrem e às obrigações daí derivadas, nomeadamente em relação a acidentes de trabalho e doenças profissionais e à exigência de seguro de acidentes de trabalho.
Uma vez clarificada a situação concreta, após prova dos factos alegados pelas partes, aquele período de tempo em que durar a relação de trabalho, embora não possa ser convolada em contrato de trabalho, por impedimento legal, deve ser tratada pelo trabalhador, empregadora, comunidade e pelas entidades públicas como se fosse um contrato de trabalho. A transparência democrática a isso obriga.
O único efeito jurídico que não pode ser produzido com a declaração de reconhecimento da existência de contrato de trabalho é a condenação da empregadora a admitir o trabalhador ao abrigo de um contrato de trabalho.
Quanto ao mais, a ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho produz os seus efeitos normais.
O legislador, ao regular a ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, não limitou o seu âmbito aos trabalhadores a exercer funções em empresas privadas.
O seu âmbito de aplicação abrange todos os prestadores de trabalho, no setor público ou no setor privado, em que exista a fundada dúvida sobre a natureza da relação jurídica, tendo em conta as funções e o modo como são exercidas em concreto.
A entender-se de outro modo, o legislador estaria a permitir a si mesmo práticas ilícitas, que proíbe às entidades privadas, o que seria manifestamente não ético, imoral e chocaria fortemente o sentido de justiça da comunidade e as regras e princípios de Direito que subjazem ao Estado de Direito Democrático, expressamente inscrito no art.º 2.º da Constituição da República Portuguesa.
Note-se que nestas situações estão pessoas que prestam a sua atividade a um beneficiário sem ser ao abrigo de um contrato de trabalho em funções públicas ou privado. São casos em que prestam a atividade a um beneficiário em situações aparentemente semelhantes aos de um trabalhador por conta de outrem em funções privadas, mas de uma forma totalmente desprotegida e vulnerável.
Assim, nestes casos, nem sequer se verifica a eventual constrição derivada do beneficiário da atividade ser uma entidade pública. O prestador da atividade exerce-a de facto ao abrigo de um acordo de direito privado.
Neste contexto, concluímos que, mesmo que se conclua a final que a situação de facto consubstancia um contrato de trabalho que não pode ser convolado em contrato de trabalho, por força de impedimento legal, ainda assim existe interesse público em que tal seja declarado, pelo que a ação deve prosseguir os seus trâmites normais.
Continua a existir interesse em que seja proferida decisão de mérito, após a fixação dos factos provados e não provados.
Face ao assim decidido, fica prejudicado o conhecimento da inconstitucionalidade invocada pelo apelante.
Nesta conformidade, julgamos a apelação procedente, revogamos o despacho recorrido na parte impugnada e ordenamos que os autos prossigam os seus ulteriores termos.
Sumário: i) ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho é uma ação de simples apreciação positiva. Pretende pôr fim à situação de incerteza quanto a determinada situação de facto e de direito. É necessário apurar os factos e qualificá-los. A empregadora não é condenada. É apenas destinatária de uma declaração que torna certa uma questão de facto e de direito incerta.
ii) na ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, quando a empregadora é o Estado ou uma empresa pública, o único efeito jurídico que não pode ser produzido com a declaração de reconhecimento da existência de contrato de trabalho é a condenação da empregadora a admitir o trabalhador ao abrigo de um contrato de trabalho, por impedimento legal.
iii) quanto ao mais, a decisão proferida na ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho produz os seus efeitos normais, pelo que o processo deve prosseguir os seus termos a fim de que o seu objeto seja apreciado após a fixação dos factos provados e não provados.

III - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção social do Tribunal da Relação de Évora em julgar a apelação procedente, revogar o despacho recorrido na parte impugnada e ordenar que os autos prossigam os seus ulteriores termos.
Custas pela apelada.
Notifique.
(Acórdão elaborado e integralmente revisto pelo relator).

Évora, 01 de fevereiro de 2018.
Moisés Pereira da Silva (relator)
João Luís Nunes
Paula do Paço
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[1] Reis, José Alberto, Comentário ao Código do Processo Civil, vol. 1.º, segunda edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1960, pp. 19 e 20.