Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1142/11.2TBSTB.E1
Relator: PAULO AMARAL
Descritores: SEGURO AUTOMÓVEL
CARTA DE CONDUÇÃO
Data do Acordão: 01/21/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I- O seguro de automobilista, previsto no art.º 6.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 291/2007, abrange os riscos emergentes ou relacionados com a circulação de veículo ou veículos registados em nome do segurado, quando por ele conduzidos.
II- A restrição, constante de uma condição particular, de que o condutor de veículos isentos da obrigação de segurar não pode ser aceite por ir além do citado preceito legal e por a isenção da obrigação de seguro apenas se referir a Estados.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Évora

A intentou a presente acção declarativa de condenação contra a Ré Companhia de Seguros B, SA. pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de €59.467.25, acrescida de juros de mora, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento e ainda no que vier a ser liquidado em execução de sentença relativamente às diferenças salariais desde Outubro de 2010 até à data da alta, ao dano futuro em consequência da incapacidade parcial que lhe vier a ser atribuída, aos prejuízos decorrentes do não exercício da actividade de venda de lenha, aos danos não patrimoniais decorrentes de todos os tratamentos de reabilitação e eventuais intervenções cirúrgicas a realizar no futuro.
Alegou, no essencial, ter sofrido um acidente de viação, em Fevereiro de 2008 cujas consequências são da responsabilidade da R..
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A R. contestou negando a sua responsabilidade porque o acidente ocorreu fora do âmbito da actividade do segurado, o que exclui o dever de indemnizar com base no contrato de seguro de garagista.
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Foi deduzido o incidente de intervenção provocada do C e do Fundo. Tal chamamento foi admitido e o interveniente C não apresentou contestação.
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O Fundo apresentou contestação, na qual arguiu a sua ilegitimidade por não estar demonstrada a inexistência de seguro.
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A Companhia de Seguros D, SA., interveio espontaneamente nos autos, apresentando articulado no qual deduziu o pedido de reembolso da quantia de €51,324,30, relativa aos pagamentos efectuados em consequência do acidente de viação e simultaneamente de trabalho.
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O Fundo contestou o pedido de indemnização formulado pela D Companhia de Seguros, invocou a sua ilegitimidade, a prescrição do direito da demandante, alegou, por entre o mais, desconhecer as circunstâncias em que se verificou o acidente e salientou ser subsidiária a sua eventual responsabilidade.
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No saneador julgou-se improcedente a excepção invocada.
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O Autor requereu, entretanto, no 11/03/15, a ampliação do pedido, no sentido de condenação dos Réus na quantia de €1.296,00 relativa às diferenças salariais no período de Novembro a 2010 a Maio de 2011 e ainda da quantia de €30.895,69 devido à incapacidade para o trabalho que ficou a sofrer.
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Depois de realizado o julgamento, foi proferida sentença cuja decisão é a seguinte:
a) Condenar, solidariamente, o Fundo e o C a pagar ao Autor A, a quantia de €17.092,56 (dezassete mil noventa e dois euros e cinquenta e seis cêntimos) a título de indemnização pelo dano biológico, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, vencidos desde esta decisão até integral pagamento
b) Condenar, solidariamente, o Fundo e o C a pagar ao Autor A, a quantia de €22.000,00 (vinte e dois mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, vencidos desde esta decisão até integral pagamento.
c) Condenar, solidariamente, o Fundo e o C a pagar ao Autor A, a quantia de €1.763,25 (mil setecentos sessenta e três euros e vinte e cinco cêntimos) a título de danos patrimoniais acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, vencidos desde a data da citação até integral pagamento.
d) Condenar o C a pagar a D a quantia de €51,324,30 (cinquenta e um trezentos e vinte e quatro euros e trinta cêntimos) a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, vencidos desde a data da citação até integral pagamento.
e) Absolver os Réus do demais pedido.
f) Absolver a Ré Companhia de Seguros B, SA, dos pedidos.
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Desta sentença recorre o Fundo apresentando as seguintes conclusões da sua alegação:
O Tribunal a quo deveria ter entendido o contrato de seguro celebrado entre a Ré B e o Interveniente C, com a inclusão da cláusula 001- seguro automobilista porque expressamente mencionado nas condições da apólice com as suas legais consequências, ou seja, responsabilizando a Ré B riscos emergentes ou relacionados com a circulação de veículo ou veículos registados em nome do tomador do seguro, quando por ele conduzidos, incluindo o risco de responsabilidade civil inerente à qualidade de condutor, absolvendo o Fundo do pedido.
Ainda que se viesse a entender apenas como seguro de garagista, e este não cobrisse os riscos emergentes ou relacionados com a circulação de veículo ou veículos registados em nome do tomador do seguro, quando por ele conduzidos, incluindo o risco de responsabilidade civil inerente à qualidade de condutor, a Ré B nunca poderia opor esse facto ao lesado, pelo que teria que indemniza-lo não obstante o direito de regresso que lhe assiste contra o responsável civil.
A douta sentença recorrida violou, assim, o disposto no art.º 7.º do D.L. n.º 291/2007 de 21.08.
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A R. B contra-alegou defendendo a manutenção do decidido.
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Foram colhidos os vistos.
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A matéria de facto é a seguinte:
1 - No dia 11 de Fevereiro de 2008, pelas 17h10m, na E.N., ao km 56,700, ocorreu um acidente de viação, no qual foram interveniente o veículo de matrícula 00-00-PC, conduzido por C, o veículo de matrícula 00-BB-00, conduzido pelo Autor e propriedade de E, Lda., e o veículo de matrícula 00-37-00, conduzido por F e propriedade do Transporte G, Lda.
2 - Na data do referido acidente a propriedade do veículo de matrícula 00-00-PC, encontrava-se registada a favor do interveniente C desde 04/02/2008.
3 - Na data do referido acidente encontrava-se em vigor a apólice nº. AU22449034, celebrada pelo interveniente C e a Ré B, S.A., nos termos e condições constantes do documento junto de fls. 68 a 114, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
4 – Dessa apólice consta, além do mais, as seguintes menções «Nos termos das condições gerais, especiais e particulares, esta apólice garante o objecto seguro e as coberturas abaixo indicadas (…) condutor habitual – C; veiculo seguro (001 001/001 0001/00; marca/modelo: - garagista LG3500+tract desc; matricula: - indeterminada; coberturas – responsabilidade civil; enumeração das cláusulas especiais: 001 – seguro automobilista; 027 – exclusão serviço reboque».
5 – Das condições gerais desse contrato de seguro consta do art.º 3 sob a epigrafe Coberturas Facultativas que:
«1 – Mediante convenção expressa nas Condições particulares, poderão ser objecto do presente contrato outros riscos e/ou garantias de harmonia com as coberturas e exclusões constantes nas respectivas condições ou cláusulas especiais que tiverem sido contratadas.
«2 – A contratação das coberturas facultativas poderá ser feita, separada ou agrupadamente, com o alcance e amplitude definidas nas condições ou cláusulas especiais respectivas e nas condições particulares».
6 – Consta da Condição Especial Seguro de Garagista, sob a epigrafe Condições de Funcionamento do Seguro que:
«(…) 4. Complementarmente à cobertura deste seguro poderão ser garantidos outros riscos de cobertura facultativa desde que estipulados nas condições particulares, e nos termos e limites consignados na apólice».
7 – Por sua vez, consta da Condição Especial Seguro de Garagista sob a epigrafe Definições que:
«Para efeitos deste seguro entende-se por:
Seguro de garagista – seguro obrigatório por lei para os garagistas, bem como para qualquer pessoa ou entidades que habitualmente exercem a actividade de fabrico, montagem ou transformação de compra e ou venda, de reparação, de desempanagem ou de controlo de bom funcionamento de veículos, para garantia da responsabilidade civil em que incorrem quando utilizem, por virtude das suas funções, os referidos veículos no âmbito da sua actividade profissional».
8 – Por outro lado, consta da Condição Especial Seguro de Automobilista sob a epigrafe Definições que:
«Para efeitos deste seguro entende-se por:
Seguro de Automobilista – seguro efectuado para garantia da responsabilidade civil imputável ao condutor de veículos isentos da obrigação de segurar».
9 - Por sua vez, consta das Condições Especiais sob a epigrafe 001 Seguro Automobilista que :
«1 – Através da presente apólice, quando contratada e expressamente mencionada nas Condições Particulares da Apólice, a Seguradora garante a responsabilidade civil imputável ao titular da carta de condução indicada nas referidas condições Particulares, em consequência de acidente de circulação em que intervenha um veiculo por ele conduzido, no exercício da sua actividade profissional, desde que se trate de veiculo do tipo e cilindrada descritos na apólice. Ficam ainda abrangidos os riscos emergentes ou relacionados com a circulação de veículo ou veículos registados em seu nome, quando por ele conduzidos, incluindo o risco de responsabilidade civil inerente à qualidade de condutor».
10 - A Ré B, S.A. assumiu numa primeira fase a responsabilidade civil decorrente do acidente referido em 1), ao abrigo da referida apólice nº. AU22429034, tendo pago ao Autor a quantia de €13.046,56.
11 - No exercício da sua actividade a interveniente D, S.A. celebrou com a E, Lda., um contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho por conta de outrem, sob a modalidade de prémio fixo, titulado pela apólice nº. 0010.07.091283, junta de fls. 173, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, a qual se encontrava em vigor à data do acidente, nos termos da qual a responsabilidade civil infortunística do Autor, enquanto trabalhador, estava transferida para a referida interveniente.
12 - O local do acidente caracteriza-se por ser uma recta.
13 - No referido dia e hora os veículos intervenientes circulavam na EN.
14 - Ao Km 50,700 da EN, existiam obras de manutenção e conservação da via, fazendo-se a circulação alternadamente por uma via, através de sinalização semafórica.
15 - O sinal semafórico encontrava-se vermelho para os veículos que circulavam, razão pela qual se formou uma fila de veículos.
16- O condutor do veículo 00-00-HB ao ver que os veículos que o precediam se encontravam imobilizados reduziu a marcha e imobilizou o veículo.
17 – Por sua vez, o Autor ao ver o veículo 00-00-HB a reduzir a velocidade e a imobilizar-se, reduziu a velocidade do seu veículo e imobilizou-o à retaguarda do referido veículo.
18 - Quando o veículo do Autor se encontrava imobilizado foi embatido na traseira pela frente do veículo 00-00-PC.
19 - Projectando o veículo do Autor para a frente e indo este embater na traseira do veículo de matrícula 00-00-HB.
20 - O condutor do veículo 00-00-PC não conseguiu parar o veículo por si conduzido no espaço livre e disponível.
21 - E foi embater na traseira do veículo de matrícula 00-BB-00 conduzido pelo Autor.
22 - O condutor do veículo 00-00-PC ao aperceber-se dos veículos imobilizados ainda se desviou para evitar o embate.
23 - No entanto, a manobra evasiva e de recurso mostrou-se infrutífera.
24 - Após o acidente foram de imediato chamados ao local os Bombeiros Voluntários, que prestaram ao Autor os primeiros socorros.
25 - De seguida foi transportado em ambulância para o Hospital.
26 - À entrada no serviço de urgência da referida Unidade Hospitalar, o Autor apresentava queixas ao nível do ombro direito e escoriação no cotovelo direito.
27 - Perante as queixas apresentadas, o Autor foi sujeito a diversos exames de diagnóstico.
28 - Tendo-lhe sido diagnosticado, em consequência do acidente, contusão da região do ombro direito.
29 -Pelas 21horas desse dia foi dada alta hospitalar ao Autor, com indicação de recolher ao seu domicílio, tendo-lhe sido prescrito Benuron e Tenoxicam para as dores.
30 - No momento do acidente o Autor encontrava-se em trabalho, no horário de trabalho e durante o exercício das suas funções enquanto distribuidor ao serviço da E, Lda.
31 - E, por isso, no dia 12 de Fevereiro de 2008 foi participado à interveniente D, S.A., Seguros, o acidente.
32 - Em consequência da referida participação, o Autor passou a ser seguido pelos serviços clínicos da interveniente D, S.A, nomeadamente no Hospital.
33 - No dia 27 de Fevereiro de 2008, o Autor deslocou-se ao Hospital à consulta.
34 - Face às queixas apresentadas pelo Autor, em consequência das lesões sofridas no acidente, foi-lhe solicitada a realização de diversos exames clínicos.
35 - Face ao resultado dos mesmos e à sintomatologia apresentada pelo Autor decorrente das lesões, nomeadamente dores e traumatismo do ombro e cotovelo direito por rotura da coifa dos rotadores, no dia 2 de Abril de 2008 foi sugerido tratamento por via artroscópica.
36 – No dia 24 de Abril de 2008, o Autor foi admitido no Hospital para ser submetido a intervenção cirúrgica por rotura da coifa dos rotadores, conflito subacromial e bursite.
37 - A intervenção cirúrgica, com anestesia geral, consistiu numa bursectomia e acromoplastia para sutura e reparação da coifa dos rotadores.
38 - No dia 25 de Abril de 2008 foi-lhe dada alta hospitalar com indicação de efectuar pensos em dias alternados e retirar pontos passados 15 dias.
39 - O Autor saiu com o braço ao peito.
40 - Após a intervenção cirúrgica, o Autor continuou a ser seguido no Hospital.
41- Em 27 de Outubro de 2008, o médico ortopedista, atentas as queixas apresentadas na região posterior, em consequência das lesões sofridas no acidente, ordenou a reavaliação do Autor.
42- O Autor passou a ser seguido nos serviços clínicos em Lisboa.
43- No seguimento da reavaliação efectuada e do resultado da ressonância magnética mandada realizar, o Autor foi novamente operado, no dia 3 de Fevereiro de 2009, no Hospital em Lisboa.
44 - A intervenção cirúrgica, com anestesia geral, consistiu na realização de uma artroscopia.
45 - No dia seguinte à intervenção foi-lhe dada alta hospitalar com indicação de permanecer durante 29 dias com o braço totalmente imobilizado ao peito.
46 - O Autor após a intervenção prosseguiu a sua reabilitação no Hospital e acompanhamento clínico no Hospital de Lisboa.
47 - Contudo, em consequência das lesões, as queixas e dores persistiam, agudizando-se em certos momentos.
48 - Perante a continuação da sintomatologia apresentada, após a realização das intervenções cirúrgicas, foram novamente prescritos exames complementares de diagnóstico.
49 - O Autor, em 13 de Fevereiro de 2010 e 24 de Junho de 2010, realizou ressonâncias magnéticas ao ombro direito.
50 - Face aos resultados destes exames foi submetido a intervenção cirúrgica, com anestesia geral, à coluna cervical, na C5 e C6, no Hospital de Lisboa.
51- Desde a data do acidente e devido às lesões sofridas no mesmo, até à presente data, o Autor realizou durante vários meses sessões de fisioterapia no Hospital.
52 - O Autor sofreu um período de défice funcional temporário total de 6 dias.
53 - O Autor, no dia do acidente, vestia um casaco, uma camisa, umas calças e uma gravata que ficaram totalmente inutilizados em consequência do acidente, no seu valor total em 200€.
54 - O Autor calçava ainda uns sapatos que ficaram danificados em consequência do acidente, tendo adquirido posteriormente uns sapatos pela quantia de €114.
55 - O telemóvel do Autor sofreu igualmente estragos em consequência do acidente, em cuja reparação despendeu quantia de €33,25.
56 - Os óculos de sol que o Autor usava ficaram igualmente estragados, tendo este adquirido uns óculos novos pelo valor de €120.
57 - O Autor nasceu em 2 de Junho de 1962.
58- O Autor, em consequência das lesões, sofreu, sofre e continuará no futuro a sofrer muitas dores.
50 - Durante cerca de 6 meses, o Autor movimentava com grande dificuldade o braço direito.
60- Neste período sentiu-se uma pessoa inválida, totalmente incapaz, por não conseguir fazer algumas tarefas sem o auxílio de terceira pessoa.
61- Durante este período o Autor precisou de ajuda para se lavar, vestir, calçar, e alimentar.
62- As lesões físicas sofridas e o estado em que o mesmo se encontrava criaram no Autor um sentimento de ansiedade e incerteza quanto à sua situação clínica.
63 - Viveu a angústia da incerteza do êxito das intervenções cirúrgicas e dos diversos tratamentos a que foi submetido.
64- E sofreu a ansiedade natural pelos receios da evolução do seu estado de saúde.
65- Acresce ainda os maus momentos que o Autor passou quando se deslocava para as sessões de fisioterapia.
66 - O Autor actualmente, em virtude das lesões sofridas no acidente, ainda tem dores.
67 – Essas dores continuarão a persistir até ao fim da vida do mesmo.
68 - Dores estas que ainda persistem sempre que existe mudança de tempo, sobretudo no Inverno, bem como quando o Autor faz movimentos repetidos e esforços com o braço direito.
69 - Durante a noite o Autor, por vezes, não consegue estar muito tempo deitado sobre o lado direito, tendo muitas vezes dificuldades em adormecer por causa das dores.
70 - Continuando a recorrer frequentemente a medicação para alívio das dores.
71- O Autor consegue carregar em pesos, desde que não sejam muito elevados, com o membro superior direito.
72 - Em consequência das lesões sofridas o Autor viu limitadas, em parte, as actividades desportivas e de lazer que costumava assiduamente praticar.
73 - Em consequência das lesões sofridas no acidente, o Autor apresenta ainda cicatrizes operatórias na zona do pescoço, com cerca de 5 cm;
74 - Em avaliação médico-legal, efectuado no dia 24/9/2014, resulta ao nível das conclusões que:
- a data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 04/05/2011.
- O Défice Funcional Temporário Total fixável num período de 6 dias.
- O Défice Funcional Temporário Parcial fixável num período de 2693 dias.
- Período de Repercussão Temporário na actividade profissional total de 934 dias.
- Período de Repercussão Temporário na actividade profissional parcial de 112 dias.
- Um quantum doloris de grau 4 numa escala de sete graus de gravidade crescente.
- Um quantum estético permanente de grau 2 numa escala de sete graus de gravidade crescente.
-Repercussão permanente nas actividades desportivas e de laser fixável em grau 3 numa escala de sete graus de gravidade crescente.
- Défice Funcional Permanente da Integridade Físico – Psíquica fixável em 19 pontos.
- As sequelas descritas, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, são compatíveis com o exercício da sua actividade habitual, embora impliquem esforços suplementares.
75 - O Autor, à data do acidente, desenvolvia a actividade profissional de vendedor;
76- Desempenha essa actividade por conta da Empresa E, Lda.
77 - Auferindo a retribuição média mensal líquida de €735,00.
78 - Desde Outubro de 2010 a ora Ré não liquida ao A. as diferenças salariais.
79 - No âmbito da apólice referida em E), a interveniente D já liquidou a quantia de € 1.089,00, a título de despesas no Tribunal de Trabalho.
80 - E a quantia de € 621,75, a título de despesas de farmácias.
81 - E a quantia de € 7.785,23, a título de despesas com transportes.
82 - E a quantia de € 11.378,47, a título de tratamentos médicos e hospitalares.
83 - E a quantia de € 601,44, a título de despesas de alimentação.
84 - E a quantia de € 16.940,97, a título de salários ITA.
85 - E a quantia de € 12.907,44, a título de capital de remição.
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O problema é só um: a definição de quem deverá pagar a indemnização ao lesado: ou o Fundo ou a B.
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A argumentação do Fundo cinge-se ao seguinte:
A sentença deveria ter entendido o contrato de seguro celebrado entre a Ré B e o Interveniente C, com a inclusão da cláusula 001- seguro automobilista porque expressamente mencionado nas condições da apólice; mesmo que assim se não considere, e caso estejamos perante um seguro de garagista, a seguradora será responsável pelas consequências do sinistro sem prejuízo do seu direito de regresso.
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Da apólice nº. AU22449034 consta a enumeração das cláusulas especiais, designadamente esta: 001 – seguro automobilista.
Por seu turno, esta cláusula dispõe o seguinte:
«1 – Através da presente apólice, quando contratada e expressamente mencionada nas Condições Particulares da Apólice, a Seguradora garante a responsabilidade civil imputável ao titular da carta de condução indicada nas referidas condições Particulares, em consequência de acidente de circulação em que intervenha um veiculo por ele conduzido, no exercício da sua actividade profissional, desde que se trate de veiculo do tipo e cilindrada descritos na apólice. Ficam ainda abrangidos os riscos emergentes ou relacionados com a circulação de veículo ou veículos registados em seu nome, quando por ele conduzidos, incluindo o risco de responsabilidade civil inerente à qualidade de condutor» (negrito nosso).
A este respeito, a recorrida alega que o seguro de automobilista ainda não se encontra aprovado. Por isso tal cobertura, a ser contratada, só pode aplicar-se a veículos que não estejam abrangidos pelo regime do seguro obrigatório. É o que consta expressamente da cláusula descrita no n.º 8 da exposição da matéria de facto (definição do seguro de automobilista).
Se assim não fosse tal Condição Especial Seguro de Automobilista seria nula por manifesta e inequivocamente contrária ao regime legal em vigor.
A afirmação da não aprovação do regime de seguro de automobilista não é certa. O art.º 6.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 291/2007, limita-se a reproduzir o que já constava do diploma de 1985, no art.º 2.º, n.º 4, ou seja, não é nada de novo nem significa que tal regime nunca tenha sido aprovada (existe, por exemplo, uma Norma n.º 35/1979 sobre o assunto). Por outro lado, também existe a Norma Regulamentar n.º 4/2008 do Instituto de Seguros de Portugal [agora chamado, por força do Decreto-Lei n.º 1/2015, Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF)] que tem por objecto o conteúdo do certificado provisório e do certificado de responsabilidade civil relativos aos seguros de garagista e de automobilista. Embora se não tenha encontrado aquela Norma n.º 35/1979, não podemos deixar de notar que o seguro de automobilista existe e tanto assim que foram definidos o conteúdo do respectivo certificado provisório.
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A definição na apólice do que seja um Seguro de Automobilista é esta: seguro efectuado para garantia da responsabilidade civil imputável ao condutor de veículos isentos da obrigação de segurar. Mas a parte final desta definição não consta da lei (podem «ser celebrados seguros de automobilista com os efeitos previstos no presente decreto-lei») pelo que se deve entender que este tipo de seguro «cobre a responsabilidade civil emergente da utilização do veículo em qualquer circunstância» (usando a expressão usada no ac. da Relação de Coimbra, de 13 de Julho de 2005).
Como chama a atenção o recorrente, ao sublinhar a segunda frase da condição particular 001, ficam ainda abrangidos os riscos emergentes ou relacionados com a circulação de veículo ou veículos registados em seu nome, quando por ele conduzidos, ou seja, independentemente de ser ou não no exercício da actividade profissional (negrito nosso).
Acresce, como também chamou a atenção o recorrente, que não se provou que a segunda parte desta condição particular tivesse sido fruto de um lapso; a cláusula existe na sua totalidade e é fruto de negociação entre as partes do contrato; e que a seguradora a aceitou resulta do próprio facto de ser uma condição particular pois que se trata de um seguro facultativo. A seguradora podia não aceitar a cláusula em questão.
Em conclusão, a recorrida vinculou-se perante o segurado nos termos descritos pelo que não pode vir agora recusar a responsabilidade.
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A haver alguma nulidade ela não afecta a definição por inteiro mas apenas a parte que não está prevista na lei. Aliás, parece-nos não fazer sentido o acrescento que consta da cláusula uma vez que, se existe isenção da obrigação de segurar, esta isenção abrange qualquer tipo de seguro (e note-se que ela se refere só aos Estados).
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Concluímos que existe seguro facultativo válido pelo que a intervenção do Fundo não tem lugar, face ao disposto no art.º 47.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 291/2007.
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Uma vez que concordamos com a tese principal do recorrente (trata-se de um seguro de automobilista), é desnecessário analisar a tese com que avança subsidiariamente (mesmo se tratando de um seguro de garagista).
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Pelo exposto, julga-se procedente o recurso em função do que se revoga a sentença recorrida e
- absolve-se o recorrente Fundo;
- condena-se a recorrida B no pagamento das indemnizações ao lesado A que foram definidas na sentença.
Custas pela recorrida.
Évora, 21 de Janeiro de 2016

Paulo Amaral


Rosa Barroso


Francisco Matos