Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
115/21.1T8STR-A.E1
Relator: MARIA ADELAIDE DOMINGOS
Descritores: INVENTÁRIO
RECLAMAÇÃO CONTRA A RELAÇÃO DE BENS
PRINCÍPIO DA PRECLUSÃO
PRINCÍPIO DA CONCENTRAÇÃO DA DEFESA
ARTICULADO SUPERVENIENTE
DECLARAÇÕES DE PARTE
VALOR PROBATÓRIO
Data do Acordão: 05/11/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
1. No atual regime do inventário, aprovado pela Lei n.º 117/2019, de 13-09, encontram-se consagrados os princípios da concentração e da preclusão em relação à reclamação contra a relação de bens, pelo que os interessados diretos na partilha, devem apresentar a reclamação no prazo previsto no artigo 1104.º, n.º 1, do CPC, ficando precludida a possibilidade de reclamação posterior mesmo que esteja em causa o aditamento de outros bens.
2. Poderá, contudo, haver situações em que seja admissível a apresentação de um articulado superveniente com vista ao aditamento; nesse caso, impende sobre o reclamante o ónus de alegar e provar a superveniência objetiva ou subjetiva do fundamento do aditamento.
3. Os titulares ativos que podem reclamar bens nos termos do artigo 1088.º do CPC são os credores da herança pelos encargos da mesma, como previsto no artigo 2068.º do Código Civil.
4. As declarações de parte, porque submetidas ao princípio da liberdade de apreciação, podem e devem ser atendidas como meio de prova complementar em relação a outros meios de prova produzidos nos autos, não podendo, só por si, serem valoradas em benefício do próprio declarante, por serem naturalmente parciais e não isentas, provindo de quem tem interesse direto na causa.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Évora

I – RELATÓRIO
No processo de inventário para partilha da herança deixada por morte de DD[1], falecido em .../.../2018, no qual exerce as funções de cabeça de casal a viúva, CC, e são interessados os filhos do falecido, AA e BB, foi proferido despacho, em 19-11-2022, que analisando o Requerimento de 29-05-2022, com a Ref.ª 8746681, apresentado pelos filhos do falecido, através do qual invocaram que detinham créditos sobre a herança, não incluídos da relação de bens, decidiu não admitir aquele requerimento, determinando o seu desentranhamento.
Na mesma data (19-11-2022) também foi proferida sentença que decidiu as reclamações apresentadas contra a relação de bens, constando da sua parte dispositiva:
«A. Declaro a nulidade das seguintes doações efetuadas pelo Inventariado DD a favor da Interessada CC:
a. Doação do veículo automóvel de marca Peugeot, com a matrícula ..-GX-.., cuja aquisição se acha registada a favor da Interessada CC pela AP. ...95 de 29.04.2016, determinando-se o cancelamento deste registo; e
b. Doação realizada em 22.11.2017 da quantia pecuniária de € 13.140,00.
B. Condeno a Interessada CC a restituir à herança aberta por óbito do Inventariado DD (i) o veículo automóvel e (ii) a quantia pecuniária, ambos identificados na alínea anterior, esta última acrescida de juros moratórios, vencidos e vincendos, computados sobre o capital de € 13.140,00, à taxa supletiva legal de juros civis, desde 22.11.2017 até efetivo e integral pagamento.
C. Julgo parcialmente procedente a reclamação contra a reclamação de créditos apresentada pelos Interessados BB e AA e, em consequência, determino a inclusão no ativo da relação de bens dos seguintes bens:
a. veículo automóvel de marca Peugeot, com a matrícula ..-GX-.., no valor a apurar; e
b. crédito sobre a Interessada CC, no valor de € 13.140,00, acrescida de juros moratórios, vencidos e vincendos, computados sobre o capital de € 13.140,00, à taxa supletiva legal de juros civis, desde 22.11.2017 até efetivo e integral pagamento.
mantendo-se no mais a relação de bens de fls. 19 a 20.
D. Julgo verificado a favor da credora cabeça-de-casal um crédito sobre a herança aberta por óbito do Inventariado DD, no montante de € 1.008,30 (mil e oito euros e trinta cêntimos); e
E. Julgo totalmente improcedente o incidente de sonegação de bens deduzido pelos Interessados BB e AA e, em consequência, absolvo a Interessada CC do respetivo pedido.»

Inconformados, interpuseram recurso os interessados AA e BB em relação ao despacho que apreciou o seu Requerimento datado de 29-05-2022, bem como da sentença.
Também a cabeça de casal interpôs recurso da sentença.
Os recorrentes supra referidos apresentaram reposta ao recurso interposto pela cabeça de casal, pugnando pela sua improcedência.
O recurso dos interessados supra referidos foi tramitado no Apenso A e o da cabeça de casal no Apenso B, tendo este Apenso B sido incorporado no Apenso A e assim remetido a este Tribunal da Relação de Évora.
Os recursos foram admitidos como apelação, com subida imediata e em separado, com efeito suspensivo, nada havendo a alterar em relação ao modo como foram admitidos.

CONCLUSÕES da Apelação dos interessados AA e BB:
«Que seja dado provimento à presente apelação, revogando-se os pontos da sentença recorrida que aqui são objecto de recurso, devendo Vªas Exas :
a) decidir pela admissão do requerimento com a Refª 8746681 de 29/05/2022, revogando-se a decisão de não admissão e desentranhamento do mesmo.
b) Decidir a inclusão na Relação de Bens, do Tactor Marca Carraro no valor de 6.000,00€ revogando-se também neste particular a douta decisão recorrida.
c) Decidir pela atribuição do valor de 15.000,00€ ao veículo de Marca Peugeot com a matrícula ..-GX-.., incluído pela sentença a quo no Activo da Relação de Bens;
d) Decidir pela valoração das declarações do Interessado e consequentemente pela inclusão dos mencionados bens móveis na Relação de Bens devendo também a douta sentença neste considerando ser revogada.
e) condenar a Cabeça de Casal por sonegação dos mencionados bens móveis com que se locupletou, declarando a perda dos mesmos em benefício dos Reclamantes, do direito que competiria à Cabeça de Casal;».



CONCLUSÕES da Apelação da Cabeça de Casal CC:
«1 – A apelante não se conformando com o decidido na douta sentença, dela apresenta o presente recurso, impugnando a matéria de facto e colocando à apreciação: - saber se deve ser incluído no ativo da relação de bens o seguinte bem – “crédito sobre a Interessada CC, no valor de €13.140,00, acrescida de juros moratórios, vencidos e vincendos, computados sobre o capital de €13.140,00, à taxa supletiva legal de juros civis, desde 22/11/2017 até efetivo e integral pagamento.”; - saber se deve ser considerado que o trator da marca A. Carraro DI G., modelo Supertigre 4000, com a matrícula AI-..-.., foi vendido pela cabeça-de-casal por acordo verbal celebrado em 17/01/2018.
2 – Entende a apelante que a análise crítica dos documentos juntos aos autos, conjugados com a posição das partes manifestada nos articulados, impunha decisão diversa sobre a matéria de facto, considerando incorretamente julgados e em oposição com a prova produzida o ponto 4. e a al. b) do ponto 6 dos Factos Provados.
3 – Quanto ao facto dado como provado no ponto 4. dos Factos Provados, a apelante considera que nenhuma prova foi produzida.
4 – Na decisão recorrida foi considerado para a prova deste facto o teor do comprovativo de transferência bancária de fls. 60 e o teor da informação prestada pelo Banco Santander Totta, S.A. a fls. 98.
5 – Compulsados estes documentos não se consegue entender em que medida o teor dos mesmos permite concluir que o inventariado transferiu 13.140,00 € para a cabeça de casal.
6 – O documento comprovativo da transferência bancária de fls. 60 permite, apenas, concluir que em 22/11/2017, da conta com o nº ...00..., do Banco Santander, foi feita uma transferência para conta em que a cabeça de casal é titular.
7 – Mas nada diz sobre qualquer outro facto relativo a titularidade dessa conta.
8 – Deste documento não se pode inferir que a transferência foi feita, ou que apenas foi feita, para a cabeça de casal.
9 – Por outro lado, a conta bancária de onde o dinheiro foi transferido era da cotitularidade do inventariado e da apelante, conforme consta do documento emitido pelo Banco Santander e junto pela apelante com o requerimento apresentado em 09/05/2022 com a referência 42188690 (referência citius 8687278).
10 – Da conjugação deste documento com o documento nº 1 junto com a relação de bens – Informação de saldos de herança, emitido pelo Banco Santander Totta, em 12/04/2018, pode-se facilmente concluir que a referida conta tinha dois titulares e que um era o inventariado DD e o outro era a apelante.
11 – No documento entregue com o requerimento referência 42188690, consta que a apelante é titular da conta nº ...00..., do Banco Santander, do comprovativo de transferência bancária de fls. 60 consta que o inventariado era titular da mesma conta e do doc. 1 junto com a relação de bens consta que a conta tinha dois titulares.
12 – Acresce que é facto de conhecimento geral que nos documentos bancários, designadamente extratos, apenas aparece o nome do primeiro titular, assim como é facto de conhecimento geral que quando é feita uma transferência bancária para outra conta ou aparece o número desta conta ou o nome do primeiro titular da mesma.
13 – Pelo que, sem recurso a outro meio de prova, não se pode dizer que a transferência foi feita para a cabeça de casal.
14 – Nos autos, não existem elementos de prova que permitam afirmar que o inventariado transferiu a quantia de 13.140,00€ para a apelante, pelo que atenta a completa ausência de prova deverá ser julgado não provado que o inventariado transferiu para a cabeça de casal 13.140,00€, em 22/11/2017, devendo o facto 4. dos factos provados ser dado como não provado, eliminado dos factos provados e acrescentado aos factos não provados.
15 – Atendendo ao que se refere, importa saber se deve ser incluído no ativo da relação de bens o seguinte bem – “crédito sobre a Interessada CC, no valor de €13.140,00, acrescida de juros moratórios, vencidos e vincendos, computados sobre o capital de € 13.140,00, à taxa supletiva legal de juros civis, desde 22/11/2017 até efetivo e integral pagamento.”.
16 – Considera a apelante que não.
17 – Não sendo possível determinar se foi apenas a cabeça de casal quem recebeu a quantia de 13.140,00€, transferida de conta que era da cotitularidade daquela e do inventariado, não se pode afirmar que a cabeça de casal recebeu aquela quantia ou pelo menos toda aquela quantia.
18 – Não foram recolhidos factos que permitam afirmar que foi a cabeça de casal quem recebeu o dinheiro transferido e atenta a inexistência da sua prova, deveriam as partes ter sido remetidas para os meios comuns (artigos 1105º e 1093º, ambos do C.P.C.).
19 – Ao não remeter as partes para os meios comuns, foram violados na decisão recorrida os artigos 1105º e 1093º, ambos do C.P.C..
20 – Devem, por isso, quanto a esta questão, ser as partes remetidas para os meios comuns.
21 – Sem prescindir, mas se assim não se entender, dir-se-á que o crédito sobre a interessada CC será apenas metade do valor 13.140,00.
22 - A conta da qual foi feita a transferência da quantia de 13.140,00€ era da cotitularidade do inventariado e da cabeça de casal.
23 - Na conta solidária/conjunta e no que toca às relações entre os titulares e o banco vale a presunção do artigo 516 do Cód. Civil, no que respeita à repartição do saldo, presumindo-se que todos os titulares participam em partes iguais no saldo, sempre que da relação jurídica entre eles existente não resulte que são diferentes as suas partes, podendo a presunção ser ilidida nos termos gerais.
24 – Os reclamantes e interessados não lograram ilidir tal presunção.
25 – Por outro lado, o artigo 1736, nº2, do C.Civil, refere que, na dúvida da propriedade exclusiva de bens móveis, presume - se como pertencentes em compropriedade, no regime de separação de bens.
26 – Assim, caso se entenda ser de relacionar o crédito, no tocante ao valor transferido da conta bancária co-titulada pelo inventariado e pela cabeça de casal, por virtude de se encontrar nessa cotitularidade, deverá apenas ser relacionado como crédito sobre a apelante metade do valor da transferência, ou seja, a quantia de 6.570,00€.
27 – Ao decidir-se pelo relacionamento crédito sobre a Interessada CC, no valor de €13.140,00, violou a decisão recorrida o disposto nos artigos 516º e 1736º, nº 2, ambos do C. Civil.
28 – A apelante também considera incorretamente julgado os factos descritos no ponto 6. al. b) Dos Factos Provados.
29 – Embora na decisão recorrida se tenha entendido que relativamente ao trator, ante a transmissão a terceiro, não deve ser incluído na relação de bens, há que ter em conta que também se refere que podem os reclamantes interessados exigir a competente prestação de contas à cabeça de casal, pelo que não pode esta deixar de impugnar o facto dado como provado de que foi ela quem vendeu o trator após a morte do inventariado.
30 – Deu o tribunal recorrido como provado que foi a apelante quem, em 17/01/2018, vendeu o trator, ou seja, que foi a apelante quem vendeu o trator, após o óbito do dono.
31 – O único elemento de prova relevante quanto a este facto são os documentos remetidos pela Conservatória do Registo de Veículos do Porto constantes do ofício com a referência citius 8708166.
32 – Consta destes documentos como sujeito passivo, ou seja, como vendedor DD.
33 – Acresce que, depois do óbito do proprietário de um veículo a transmissão da sua propriedade só pode ser feita se todos os herdeiros assinarem a requisição de registo (modelo único).
34 - A resposta é dada pelo nº 3 do artigo 25º do Decreto nº 55/75 (Reg. Registo Automóvel).
35 - Caso os herdeiros pretendam vender o veículo a terceiro, para além da declaração modelo 1, relativa ao imposto de selo, desde que dela conste a indicação dos herdeiros e a identificação do veículo ou, caso não seja necessário provar o cumprimento das obrigações fiscais (por o óbito ter ocorrido há mais de oito anos), pode, em alternativa, fazer-se o registo com base na habilitação de herdeiros, são necessárias tantas requisições de registo (modelo único) quantos sejam os herdeiros, porque o modelo só permite que se coloque um sujeito ativo e um sujeito passivo (que será sempre o falecido em todas elas).
36 – Acresce que, que este tipo de registo não está e não estava à data do registo, disponível na plataforma do automóvel on line, mas apenas numa conservatória de registo automóvel.
37 – Pelo que, fácil é de concluir que nem os documentos da Conservatória nem as disposições legais, permitem concluir que a cabeça de casal vendeu o trator em 17/01/2018, ou seja, após o óbito do inventariado. Porque não o poderia ter feito e não fez.
38 – Aliás o documento da Conservatória permite concluir que não foi a cabeça de casal quem vendeu o trator, pois quem consta como sujeito passivo é o inventariado.
39 – Nos autos, não existem elementos de prova que permitam dar como provada a venda do trator pela apelante, antes pelo contrário, os documentos remetidos pela Conservatória do Registo de Veículos do Porto constantes do ofício com a referência citius 8708166, dizem que o vendedor foi o inventariado.
40 – Assim, deverá ser julgado não provado que a cabeça de casal vendeu o trator marca A. Carraro DI G., modelo Supertigre 4000, com a matrícula AI-..-.., no valor de € 6.000,00, devendo este facto descritos na al. b) do ponto 6 dos Factos Provados ser dado como não provado, eliminado dos factos provados e acrescentado aos factos não provados e deve a al. b) do ponto 6 dos Factos Provados ser alterada no seu conteúdo, ficando a constar como provado que “À data do óbito do Inventariado (12.01.2018): (…) b. o Inventariado era dono do trator da marca A. Carraro DI G., modelo Supertigre 4000, com a matrícula AI-..-...
41 – Impõe decisão contrária à tomada na decisão recorrida os documentos remetidos pela Conservatória do Registo de Veículos do Porto constantes do ofício com a referência citius 8708166 e o nº 3 do artigo 25º do Decreto nº 55/75 (Reg. Registo Automóvel).»

II- FUNDAMENTAÇÃO
A- Objeto do recurso
Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões apresentadas, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC), não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do CPC), as questões a decidir nos recursos são as seguintes:
1. Do despacho que não admitiu o Requerimento de 29-05-2022 e ordenou o seu desentranhamento (apelação dos recorrentes)
2. Impugnação da decisão de facto (nas duas apelações)
3. Inclusão na relação de bens do valor da venda do trator (questão suscitada na apelação dos recorrentes)
4. Determinação do valor do veículo de marca Peugeot (apelação dos recorrentes)
5. Inclusão na relação de bens dos bens móveis e determinação do seu valor (apelação dos recorrentes)
6. Sonegação de bens pela Cabeça de casal (apelação dos recorrentes)
7. Inclusão na relação de bens do crédito da herança sobre a Cabeça de Casal no valor de €13.140,00, mais juros moratórios vencidos e vincendos (recuso da recorrente)

B- De Facto
Na sentença, a 1.ª instância deu como provada a seguinte factualidade:
FACTOS PROVADOS
«1. Os Interessados BB e AA são filhos do Inventariado e de EE.
2. A cabeça-de-casal e o Inventariado casaram entre si em 20.03.2014 sob o regime imperativo da separação de bens.
3. Por escritura pública intitulada «doações», outorgada em 30.04.2012, no Cartório Notarial..., sito em Rio Maior, o Inventariado DD, à data casado com EE sob o regime da comunhão de adquiridos, declarou doar, com reserva de usufruto, livres de ónus ou encargos, dispensando-os de colação:
a. Ao Interessado BB, o prédio rústico identificado sob a verba n.º 4 e metade indivisa do prédio misto identificado sob a verba n.º 9, ambos da relação de bens; e
b. Ao Interessado AA, os prédios rústicos identificados sob as verbas n.ºs 5, 6, 7 e 8 e metade indivisa do prédio misto identificado sob a verba n.º 9, todos da relação de bens.
4. Em 22.11.2017, o Inventariado efetuou transferência bancária para a cabeça-de-casal no montante de € 13.140,00.
5. A aquisição da propriedade do veículo automóvel de marca Peugeot, com a matrícula ..-GX-.., acha-se registada a favor da cabeça-de-casal através da AP. ...95 de 29.04.2016, figurando como sujeito passivo o Inventariado.
6. À data do óbito do Inventariado (12.01.2018):
a. este e a cabeça-de-casal eram titulares de produto financeiro denominado «DEP TOP Multinacionais E:U.A 5», com o número de contrato ...69, no valor de € 5.000,00, constituído por ambos em 14.05.2015, associado à conta bancária aberta junto do Banco Santander Totta, S.A.; e
b. o Inventariado era dono do trator da marca A. Carraro DI G., modelo Supertigre 4000, com a matrícula AI-..-.., no valor de € 6.000,00, trator este que foi vendido pela cabeça-de-casal por acordo verbal celebrado em 17.01.2018; e
c. o Inventariado era titular da concessão das sepulturas identificadas sob as verbas n.ºs 2 e 3 da relação de bens.
7. Com o funeral do Inventariado, a cabeça-de-casal suportou despesas no valor de €2.295,00, tendo recebido um reembolso da Segurança Social no montante de €1.286,70.»
FACTOS NÃO PROVADOS
«A) Que, à data do óbito do Inventariado (12.01.2018):
a. os prédios identificados sob as verbas n.ºs 4 a 9 da relação de bens tinham, respetivamente, os valores seguintes: € 9.520,00, € 6.800,00, € 1.440,00, € 1.000,00, € 340,00 e € 150.000,00; e
b. o Inventariado era dono dos seguintes bens móveis: (1) móvel de sala de jantar, mesa e seis cadeiras, no valor de € 1.200,00; (2) móvel de televisão em acrílico, no valor de € 150,00; (3) mobília de quarto, no valor de € 100,00; (4) frigorífico, no valor de € 180,00; (5) arca congeladora, no valor de € 250,00; (6) banco com arrumação, no valor de € 100,00; (7) roçadoura a gasolina, no valor de € 320,00; (8) esmagador de uvas, no valor de € 100,00; (9) dois motores de rega, no valor de €600,00; (10) máquina de lavar roupa, no valor de € 200,00; (11) máquina de distribuidor de fertilizantes, no valor de € 320,00; (12) cuba em inox para o vinho, no valor de € 240,00; (13) bomba de vinho para depósito, no valor de € 200,00; e (14) louças de cozinha e de sala, no valor de € 800,00;
B) Que, em fevereiro de 2018, a cabeça-de-casal transportou para destino desconhecido os bens móveis aludidos na subalínea “b.” anterior, comportando-se a partir de então como se os mesmos lhe pertencessem;
C) Que o veículo automóvel identificado no ponto 5 dos factos provados tinha à data do óbito do Inventariado o valor de € 15.000,00;
D) Que a cabeça-de-casal adquiriu à mãe dos Interessados, EE, o veículo que antecede pelo preço de € 13.000,00, que aquela pagou; e
E) Que a cabeça-de-casal comunicou aos Interessados BB e AA que não tinha intenção de proceder a partilha por óbito do Inventariado, no que aqueles confiaram.»

C- Do Conhecimento das questões suscitadas nos Recursos

1. Do despacho que não admitiu o Requerimento de 29-05-2022 e ordenou o seu desentranhamento (apelação dos recorrentes)
No referido Requerimento aqueles interessados vieram, ao abrigo do artigo 1088.º do Código Civil, invocar que detêm créditos sobre a herança aberta por óbito do inventariado DD, não incluídos na relação de bens, assim discriminados:
«1. €2.757,20 de IMI, que suportaram entre 2013 e 2020 com os imóveis identificados sob as verbas 4 a 9 da relação de bens, doados àqueles Interessados pelo Inventariado;
2. €10.730,91 de despesas, que suportaram com a venda de tais imóveis a terceiros; e
3. Encargos fiscais, de valor não concretizado, que terão de suportar pelas mais-valias, no valor global de €103.262,13, obtidas com tais vendas.»

O despacho recorrido fundamentou o decidido, nos seguintes termos:
«Conforme decorre do disposto no art. 1104.º, n.º 1, alínea e) do Cód. Proc. Civil, o interessado pode impugnar os créditos e as dívidas da herança - acusando, designadamente, a sua omissão – no prazo de 30 dias a contar da sua citação. Estamos, com efeito, na presença de um prazo perentório que, uma vez esgotado, extingue o direito processual do interessado.
(...)
Ora, apesar de terem reclamado em tempo contra a relação de bens, os Interessados AA e BB nada disseram naquela mesma peça processual sobre a alegada omissão de dívidas da herança para consigo, como era seu ónus. Destarte, o requerimento ora em apreço foi apresentado vários meses após o termo do prazo supramencionado e consiste, na realidade, num verdadeiro aditamento à primeira reclamação, sendo assim manifestamente intempestivo e processualmente inamissível.
(…)
Esclareça-se que o regime previsto no art. 1088.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil não é aplicável aos interessados da herança citados nos termos e para os efeitos do supra aludido art. 1104.º, n.º 1 daquele Código. Antes abrange (tão-só) os credores da herança que, justamente por não terem sido citados, podem reclamar os seus créditos espontaneamente até à conferência de interessados.
Face ao exposto, decide-se não admitir o requerimento com a referência 8746681, determinando-se o respetivo desentranhamento.»

Discordam os Apelantes pelas razões que constam das conclusões do recurso, que passamos a analisar.
Estamos perante um processo de inventário facultativo destinado a fazer cessar a comunhão hereditária, ao qual se aplica o regime do processo de inventário aprovado pela Lei n.º 117/2019, de 13-09, encontrando-se a respetiva tramitação inserida no Código de Processo Civil (CPC), mormente nos artigos 1097.º e seguintes.
Não cabendo na economia deste acórdão escalpelizar as inovações introduzidas pelo legislador em relação ao processo de inventário com este diploma legal, é mister mencionar que o legislador introduziu regras de preclusão e de concentração no que diz respeito à alegação das questões relevantes e demonstração probatória do alegado, incrementando, assim, a autorresponsabilidade das partes na prática dos atos processuais (cfr. artigos 1097.º e 1099.º do CPC).
Em relação ao princípio da concentração, o legislador procurou concentrar os meios de defesa dos interessados (oposição, impugnação e reclamação), fixando o prazo de 30 dias, contados desde a citação para os termos da ação, estabelecendo o artigo 1104.º que, nesse prazo, deve ser deduzida oposição ao inventário, impugnar-se a legitimidade dos interessados citados ou alegar a existência de outros, impugnar a competência do cabeça de casal ou as indicações constantes das suas declarações e apresentar reclamação à relação de bens ou impugnar os créditos e as dívidas da herança.
No que diz respeito à relação de bens, prescreve o referido artigo 1104.º, n.º 1, alínea e), do CPC, que o interessado pode apresentar reclamação à relação de bens, prescrevendo o artigo 1105.º a sequência da tramitação da reclamação, ou seja, notifica-se a reclamação ao cabeça de casal, cabendo ao mesmo apresentar a respetiva resposta também no prazo de 30 dias.
Segue-se, no figurino da lei, a realização de prévias diligências probatórias que couberem ao caso, requeridas ou ordenadas oficiosamente (n.º 3, do referido artigo 1105.º), a eventual realização de uma conferência prévia (artigo 1109.º) ou o saneamento do processo (artigo 1110.º), decidindo-se, então, as questões suscitadas pelas partes, devendo ser elaborado um despacho, cuja finalidade e conteúdo decorre das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 1110.º do CPC, devendo o juiz, nesse despacho, resolver todas as questões suscetíveis de influenciarem a partilha e a determinação dos bens a partilhar, ordenando a notificação dos interessados (e do Ministério Público, sendo o caso) para, querendo, proporem a forma à partilha, designando dia para a conferência de interessados, seguindo-se a demais tramitação processual prevista nos artigos 1111.º e ss.
Esta tramitação evidencia, como faz notar LOPES DO REGO, que «(…) toda a defesa (incluindo a contestação quanto à concreta composição do acervo hereditário, ativo e passivo) deve ser deduzida no prazo de que os citados beneficiam para a contestação/oposição, só podendo ser ulteriormente deduzidas as exceções e meios de defesa que sejam supervenientes (isto é, que a parte, mesmo atuando com a diligência devida, não estava em condições de suscitar no prazo da oposição, dando origem à apresentação de um verdadeiro articulado superveniente), que a lei admita expressamente passado esse momento (como sucede com a contestação do valor dos bens relacionados e o pedido da respetiva avaliação, que, por razões pragmáticas, o legislador admitiu que pudesse ser deduzido até ao início das licitações) ou com as questões que sejam de conhecimento oficioso pelo tribunal.
Daqui decorre, por exemplo, que as reclamações contra a relação de bens tenham de ser necessariamente deduzidas, salvo demonstração de superveniência objetiva ou subjetiva, na fase das oposições – e não a todo o tempo, em termos idênticos à junção de prova documental, como parecia admitir o art. 1348.º, n.º 6, do anterior CPC.»[3]
No sentido da admissibilidade, embora sujeita a restrições, de nova reclamação posterior à fase dos articulados, referem os autores infra mencionados,[4] que «(…) a estruturação sequencial e compartimentada do processo de inventário envolve algumas cominações e preclusões, inexistentes no regime anterior, tendo o novo regime implícito um reforço da auto-responsabilidade das partes: o modelo consagra um princípio de concentração na invocação dos meios de defesa que é em tudo idêntico ao que vigora no artigo 573º: toda a defesa (incluindo a contestação quanto à concreta composição do acervo hereditário, activo e passivo) deve ser deduzida no prazo de que os citados têm para deduzirem oposição (artº 1104º). Assim, por exemplo, é no articulado de contestação que os interessados devem suscitar todas as impugnações, reclamações e meios de defesa, quer respeitem à oposição ao inventário, à legitimidade dos citados ou à competência do cabeça de casal, quer se refiram à relação de bens ou aos créditos e dividas da herança. Institui-se, assim, um efeito cominatório, já que a revelia conduz em regra, ao reconhecimento das dívidas não impugnadas (artº 1106º nº 1 do CPC). Posteriormente só podem ser invocados os meios de defesa que sejam supervenientes (isto é, que a parte, mesmo actuando com a diligência devida, não estava em condições de suscitar no prazo de oposição) ou que a lei admita expressamente passado o momento da oposição ou que se prendam com questões que sejam de conhecimento oficioso (artº 573º nº2). Em comparação com o modelo anterior verifica-se por exemplo, que as reclamações contra a relação de bens devem ser deduzidas na sub-fase da oposição (artºs 1104º nº 1 al. d) e 1105º nº 1) e não a todo o tempo como parecia admitir-se no CP/61»
E mais à frente em anotação ao artigo 1111.º do CPC, referem «(…) assim, por exemplo, pode algum dos interessados deduzir ainda reclamação contra a relação de bens, alegando e demonstrando que, no momento da oposição prevista no artº 1104º nº 1 al. d), não podia, mesmo agindo com a diligência devida, ter conhecimento do fundamento da reclamação que agora pretende deduzir».[5]
Neste sentido também a jurisprudência já se pronunciou como decorre, por exemplo, do Acórdão da Relação de Guimarães de 15-06-2021[6], e do Acórdão do Porto de 14-12-2022[7], lendo-se no sumário deste último:
«I - No âmbito do novo regime jurídico do inventário judicial (decorrente da Lei n.º 117/2019, de 13 de setembro), o acervo patrimonial a partilhar (ativo e passivo) deve, por regra, ser indicado na fase dos articulados e só em situações excecionais se admite que seja acusada a falta de bens ou dívidas que o integrem, em momento ulterior.
II - Entre essas situações, contam-se os casos de superveniência objetiva ou subjetiva de bens ou dívidas atinentes ao referido acervo.
III - Mas, no caso de superveniência subjetiva, aquele que a invoca tem o ónus de alegar e provar a sua falta de culpa na invocação fora de tempo, sob pena de rejeição do requerimento feito nesse sentido.»

Decorre, pois, que atual regime jurídico do inventário consagra os princípios da concentração e da preclusão, ou seja, e no que ora releva, a falta de reclamação contra relação de bens com fundamento na falta de relacionamento de ativo e/ou passivo, no prazo previsto no artigo 1104.º, n.º 1, do CPC, tem como consequência a preclusão da possibilidade de reclamação posterior de outros bens que compõem o acervo hereditário, sem prejuízo das situações em que seja admissível a apresentação de um articulado superveniente. O que pressupõe o preenchimento dos requisitos dos articulados supervenientes, adaptados à situação que se apresente em concreto (cfr. artigo 588.º, n.º 2, do CPC), impendendo sobre o reclamante o ónus de alegar e provar a superveniência objetiva ou subjetiva dos fundamentos do aditamento pretendido.
Deste modo, em nosso entender, a apresentação de nova reclamação, posteriormente ao esgotamento do prazo previsto no artigo 1104.º, n.º 1, do CPC, por parte dos interessados diretos na partilha (sendo que, no caso, os apresentantes da nova reclamação são interessados diretos na partilha dada a sua qualidade de herdeiros legitimários do de cujus (cfr. artigos 2030.º, n.º 1 a 3, e 2157.º do Código Civil), não se enquadra juridicamente na previsão do artigo 1088.º do CPC.
Este preceito, à semelhante do regime pretérito previsto no CPC 1961 ou na Lei n.º 23/2003, de 05-03, reporta-se aos encargos da herança e ao referir-se a «titulares ativos de encargos da herança» remete para as normas de direito material enunciadas no artigo 2068.º do Código Civil, estipulando este preceito legal que «A herança responde pelas despesas com o funeral e sufrágios do seu autor, pelos encargos com a testamentária, administração e liquidação do património hereditário, pelo pagamento das dívidas do falecido e pelo cumprimento dos legados».
Assim, os titulares ativos a que se reporta o artigo 1088.º do CPC são os credores da herança que detêm créditos sobre a mesma resultantes dos encargos previstos no artigo 2068.º do Código Civil.
São esses credores da herança que, por via do artigo 1088.º do CPC, mesmo que os seus créditos não tenham sido relacionados, podem reclamá-los até à conferencia de interessados (n.º 1), tenham ou não sido citados (sendo que só serão citados os conhecidos, naturalmente). A diferença entre uns e outros (citados e não citados) revela-se na questão da preclusão do direito de reclamar. Como estipula o n.º 2 do referido artigo 1088.º, se forem citados deixam de poder reclamar o seu direito através dos meios judiciais comuns.
Situação que é inovadora em relação ao regime pretérito, pois nesse a citação pessoal dos credores conhecidos não impedia que pudessem optar por reclamar o crédito, ou no processo de inventário ou nos meios judiciais comuns (cfr. artigo 10.º, n.º 2, da Lei n.º 23/2003, de 05-03, e artigo 1331.º do CPC 1961, na redação do Decreto-Lei n.º 227/94, de 08-09).
Ora, no caso, os interessados não reclamam créditos que correspondam aos encargos da herança previstos no artigo 2068.º do Código Civil, pelo que nunca poderia a sua reclamação ser juridicamente enquadrada na previsão do artigo 1088.º do CPC.
Consequentemente, sendo os mesmos herdeiros legitimários e tendo sido citados ao abrigo do disposto no artigo 1104.º, n.º 1, do CPC, tinham 30 dias a contar da sua citação (data da assinatura do aviso de receção, acrescida da dilação de 5 dias) para apresentar reclamação à relação de bens (alínea d) do n.º 1, do artigo 1104.º), aí reclamando os créditos de que se julgavam portadores em relação ao acervo hereditário.
A reclamação contra a relação de bens foi pelos mesmos apresentada em 07-12-2021 e o requerimento em apreço apenas em 29-05-2022, ou seja, quando há muito estava ultrapassado o prazo daquela reclamação.
Alegam, contudo, os apelantes (cfr. conclusões L) e M) do seu recurso) que, na data em que apresentaram a reclamação contra a relação de bens, ainda não tinham em seu poder todos os documentos comprovativos das despesas relacionadas com os mencionados bens, nomeadamente ainda não tinham efetuado o cálculo dos encargos fiscais devidos pelas mais valias com a venda dos imóveis.
Ora, como supra referido, a apresentação posterior de uma nova reclamação só tem cabimento legal no estrito cumprimento dos pressupostos do artigo 588.º do CPC (articulado superveniente).
Os créditos invocados pelos ora apelantes não são nem objetiva, nem subjetivamente supervenientes à data do termo da apresentação da reclamação à relação de bens, pois reportam-se ao pagamento de despesas de IMI dos anos de 2013 e 2020, despesas com a venda dos imóveis a terceiros, tendo as despesas ocorrido antes de 07-12-2021, e finalmente, encargos fiscais e liquidação de mais valias que já sabiam serem devidos desde o momento das vendas dos imóveis (registas com data de 04-03-2021 – cfr. certidões prediais juntas ao processo de inventário em 03-10-2021 – Ref.ª 40022787).
Sendo certo que, se em relação aos encargos fiscais e mais valias ainda não possuíssem valores concretos à data da apresentação da reclamação à relação de bens, nada impedia a apresentação da reclamação e a concretização posterior daqueles valores, à semelhança do que fizeram no requerimento de 29-05-2022 quanto aos encargos fiscais.
Em face de todo o exposto, nenhuma censura merece o despacho recorrido, que se confirma, improcedendo o segmento da sua apelação em relação a este despacho.

2. Impugnação da decisão de facto
Quer na apelação dos interessados, quer na interposta pela cabeça de casal, é impugnada a decisão de facto.
Importa, assim, estabilizar o quadro fáctico, procedendo-se, para o efeito, à apreciação das ditas impugnações nas duas apelações.
Na apelação da cabeça de casal é impugnada a decisão de facto em relação aos pontos 4. e 6., alínea b. dos factos provados.
Já na impugnação dos interessados é impugnada a decisão de facto em relação à alínea A), subalínea b., e alínea C) dos factos não provados.
Começamos a análise pela impugnação dos factos provados.
Assim:
Ponto 4. dos factos provados:
«Em 22.11.2017, o Inventariado efetuou transferência bancária para a cabeça-de-casal no montante de €13.140,00.»

Pretende a apelante que este facto seja dado como não provado.
Alega para o efeito que a conta bancária de onde foi transferido aquele valor era co titulada por ela e pelo de cujus como consta do documento que juntou com o requerimento de 09-05-2022, emitido pelo Banco Santander, bem como do doc. n.º 1 junto com a relação de bens (informação de saldos de herança emitido pelo mesmo Banco em 12-04-2018).
Na fundamentação da decisão de facto em relação ao ponto 4. dos factos provados (embora em conjunto com outros pontos), percebe-se que se faz referência ao comprovativo da transferência de fls. 60 e informação prestada pelo Banco Santander Totta, S.A. a fls. 98 (o que também se encontra confirmado pela alegação da recorrente).
Vejamos, então.
Com a relação de bens a cabeça de casal juntou um documento (doc. 1) do Banco Santander Totta, S.A, datado de 12-04-2018, referente à conta n.º ...01, ali sendo mencionado que a conta tem dois titulares, sendo o nome do cliente falecido «DD»; no mais, declara aquela entidade bancária quais os produtos/aplicações financeiras associados àquela conta e o saldo da conta à ordem à data do óbito. O documento encontra-se endereçado à ora apelante.
Não consta deste documento quem é o outro titular desta conta.
Com o requerimento de 09-05-2022 (ref.ª 42188690), a cabeça de casal juntou aos autos um documento alegando que visa com o mesmo comprovar que era titular da referida conta bancária.
O documento foi emitido pelo Banco Santander Totta, S.A., tem data de 28-04-2022, e é referente à conta ..., ali estando mencionado sob a expressão «Nome Interveniente», o nome da cabeça de casal. Mais consta que a referida conta bancária tem um titular (não identificado).
Ora, ser interveniente numa conta não é o mesmo que ser titular da conta, seja 1.º ou 2.º titular.
O interveniente é a pessoa autorizada a movimentar a conta, conforme as condições acordadas, mas não é proprietário dos valores depositados, ao contrário do titular da conta que é o proprietário dos mesmos.
Sendo o documento emitido por uma entidade bancária, os termos «interveniente» e «um titular» não podem ser interpretados com sentido diferente do acima referido e muito menos que designem o mesmo sujeito da relação jurídica estabelecida entre o banco e o cliente.
Conclui-se, assim, que deste documento não resulta comprovado que a cabeça de casal era titular da referida conta.
Por sua vez, os interessados juntaram com a reclamação à relação de bens um documento (doc. 2) do Banco Santander Totta, S.A. referente à conta n.º ..., titulada pelo falecido, comprovando que em 22-11-2017 foi realizada daquela conta uma transferência para FF, no valor de €13.140,00.
Em face da análise destes documentos, evidencia-se que a apelante não logrou provar que também era titular da conta bancária supra referida e, consequentemente, dos fundos da mesma, provando-se, ao invés, que dessa conta foi transferida pelo inventariante, para a apelante, a quantia de €13.140,00 no dia 22-11-207.
Nestes termos, improcede a impugnação em relação ao ponto 4. dos factos provados.

Ponto 6., alínea b. dos factos provados:
«6. À data do óbito do Inventariado (12.01.2018):
(…)
b. o Inventariado era dono do trator da marca A. Carraro DI G., modelo Supertigre 4000, com a matrícula AI-..-.., no valor de € 6.000,00, trator este que foi vendido pela cabeça-de-casal por acordo verbal celebrado em 17.01.2018(sublinhado nosso)

Alega a apelante que, embora a sentença tenha decidido que este bem ficava excluído da relação de bens por ter sido vendido a terceiro, também aquela decisão menciona que, em face do que ficou provado, poderão os interessados exigir a competente prestação de contas à cabeça de casal, razão pela qual vem impugnar que tenha vendido o veículo após a morte do inventariado.
Assim, pretende que se elimine o segmento sublinhado, alegando que os documentos da Conservatória de Registo de Veículos não comprovam que tenha vendido o veículo em 17-01-2018, constando do mesmo que o sujeito passivo da transação foi o inventariado.
Na fundamentação da decisão de facto quanto a este ponto consta a menção à certidão do registo automóvel de fls. 62.
Analisado o documento em causa constata-se que dele consta que foi registada a aquisição do veículo, em 18-01-2018, constando que o sujeito ativo da aquisição por compra foi GG, nada mencionando quanto ao sujeito passivo (vendedor), embora conste que o veículo se encontrava registado em nome do inventariado desde 29-11-2011, por o ter adquirido por compra.
Não tendo sido junto aos autos o documento de suporte ao registo da aquisição lavrado em 18-01-2018, nem tendo sido feita qualquer prova que a cabeça de casal o tenha vendido verbalmente, não se pode dar como provado que a mesma o vendeu e que o fez após o decesso do inventariado.
Consequentemente, a apelante tem razão quanto a esta questão. A prova não permite dar-se como provado que foi a cabeça de casal quem procedeu à venda verbal do veículo.
Nestes termos, procede a impugnação da decisão de facto quanto ao ponto 6., alínea b. dos factos provados, devendo a mesma refletir a prova existente nos autos, pelo que a mesma passa a ter a seguinte redação:
«6. À data do óbito do Inventariado (12.01.2018):
(…)
b. encontrava-se registado a favor do inventariado o trator da marca A. Carraro DI G., modelo Supertigre 4000, com a matrícula AI-..-.., no valor de €6.000,00, tendo sido registada a aquisição a favor de terceiro em 18-01-2018.»

Consequentemente, passa a constar dos factos não provados que «o trator da marca A. Carraro DI G., modelo Supertigre 4000, com a matrícula AI-..-.. foi vendido pela cabeça de casal por acordo verbal celebrado em 17.01.2018.»

Passamos, agora, à análise da impugnação da decisão de facto por parte dos apelantes em relação à alínea A), subalínea b., e alínea C) dos factos não provados.

Alínea A), subalínea b. dos factos não provados:
«Que, à data do óbito do Inventariado (12.01.2018):
(…)
b. o Inventariado era dono dos seguintes bens móveis: (1) móvel de sala de jantar, mesa e seis cadeiras, no valor de € 1.200,00; (2) móvel de televisão em acrílico, no valor de € 150,00; (3) mobília de quarto, no valor de € 100,00; (4) frigorífico, no valor de € 180,00; (5) arca congeladora, no valor de € 250,00; (6) banco com arrumação, no valor de € 100,00; (7) roçadoura a gasolina, no valor de € 320,00; (8) esmagador de uvas, no valor de € 100,00; (9) dois motores de rega, no valor de €600,00; (10) máquina de lavar roupa, no valor de € 200,00; (11) máquina de distribuidor de fertilizantes, no valor de € 320,00; (12) cuba em inox para o vinho, no valor de € 240,00; (13) bomba de vinho para depósito, no valor de € 200,00; e (14) louças de cozinha e de sala, no valor de € 800,00;».

Alegam os apelantes que esta matéria deveria ter sido dada como provada com base nas declarações de parte do interessado AA que tinha conhecimento dos móveis existentes na casa onde viveu com os seus pais, frequentando a casa até pouco antes do pai falecer.
Ademais, acrescenta, a testemunha HH prestou testemunho onde disse que, após a morte do inventariado, a cabeça de casal tinha feito mudanças.
Concluiu defendendo que a não valoração das declarações de parte violaram o disposto no artigo 466.º do CPC.
Na fundamentação da decisão de facto sobre esta factualidade pode ler-se o seguinte:
«Reputaram-se não provados os factos mencionados na subalínea “b.” da alínea A) e na alínea B) porquanto a testemunha HH – única prova testemunhal produzida sobre a matéria em causa – referiu que conhecia o recheio que existia na casa do Inventariado enquanto o mesmo ainda vivia com a sua anterior mulher. Todavia – disse – nunca mais frequentou aquela casa após o casamento do Inventariado com a aqui cabeça-de-casal. Assim, acabou por admitir desconhecer que bens é que efetivamente ali se encontravam à data do óbito de DD. Por maioria de razão, também não soube esta testemunha dizer se tais bens pertenciam ao de cujus ou à cabeça-de-casal. Ademais, disse que se apercebeu que a cabeça-de-casal estava a fazer mudanças, levando vários itens consigo. No entanto, não conseguiu concretizar com fiabilidade que objetos foram, nem – repita-se – a quem é que os mesmos pertenciam.
Restaram as declarações de parte do Interessado AA. Ora, em nosso entendimento, a prova dos factos que sejam favoráveis às partes depoentes sobre as quais recaia o ónus da prova, não pode assentar única e exclusivamente nas declarações das mesmas. Destarte, exige-se que tais declarações sejam corroboradas por algum outro elemento de prova, sob pena de saírem subvertidas as regras que disciplinam o ónus probatório (vide, em idêntico sentido, acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 18.01.2018, processo n.º 294/16.0Y3BRG.G1, relatora Vera Sottomayor, in www.dgsi.pt). E, quanto a estes factos específicos, nada mais há do que a palavra do próprio Interessado AA a apoiar a sua versão.»
Analisando a impugnação, verifica-se que os apelantes não questionam a falta de razão de ciência da testemunha HH, não contradizendo sequer a valoração que o tribunal a quo fez desse testemunho, no sentido de não ter valia probatória para o que se discuta.
Apreciação valorativa que merece a nossa concordância, uma vez que a testemunha disse que deixou de frequentar a casa do inventariado após o casamento com a cabeça de casal e, consequentemente, deixou de poder saber quais os móveis que ali se mantinham, para além do testemunho ser evasivo em relação à identificação dos móveis que a cabeça de casal terá retirado da casa após o óbito.
Na verdade, a impugnação centra-se na questão da valoração das declarações de parte.
Decorrendo das mesmas que não foram confessórias, pois não foram contrárias aos interesses do declarante (artigo 352.º do Código Civil), encontram-se sujeitas à livre apreciação do tribunal (artigo 466.º, n.º 3, do CPC).
É sabido que na doutrina e jurisprudência, no que concerne à valoração das declarações de parte como meio de prova, têm sido enunciadas várias teses como se refere no Acórdão do STJ, de 05-02-2019[8] e que se podem enunciar resumidamente nos seguintes termos: (i) tese do caráter supletivo e vinculado à esfera restrita de conhecimento dos factos; (ii) tese do princípio de prova; e (iii) tese da autossuficiência ou valor autónomo das declarações de parte.
A primeira defende que as declarações de parte têm uma natureza essencialmente supletiva, sendo insuficientes para fundamentar, por si só, um juízo de prova, salvo nos casos de prova única, em que inexiste outra prova.
A segunda defende que as declarações de parte não são suficientes, por si só, para estabelecer qualquer juízo de aceitabilidade final, sendo apenas coadjuvantes da prova de um facto desde que em conjugação com outros meios de prova, ou seja, as declarações de parte terão de ser corroboradas por outros meios de prova.
A terceira defende que as declarações de parte, pese embora a sua especificidade, podem estribar a convicção do juiz de forma autossuficiente, assumindo um valor probatório autónomo.
Temos para nós que a as declarações de parte, porque submetidas ao princípio da liberdade de apreciação, podem e devem ser atendidas como meio de prova complementar em relação a outros meios de prova produzidos nos autos, não podendo, só por si, serem valoradas em benefício do próprio declarante, por serem naturalmente parciais e não isentas, provindo de quem tem interesse direto na causa.
A jurisprudência tem assinalado de forma bastante alargada e consensual que a livre valoração deste meio de prova pode ajudar a suportar a formação da convicção do julgador, mas a mesma nunca poderá assentar, única e exclusivamente, nas declarações de parte, carecendo sempre de serem coadjuvadas e suportadas por outros elementos de prova.[9]
Alguma doutrina também tem defendido este modo de valorar as declarações de parte.
Veja-se, assim, os autores infra citados[10], em anotação ao artigo 466.º do CPC, quando escrevem:
«A apreciação que o Juiz faça das declarações de parte (se estas não constituírem confissão) é livre, nos termos do n.º 3; mas, como esta liberdade não equivale a arbitrariedade, a apreciação importará, as mais das vezes, apenas, como elemento de clarificação do resultado das provas produzidas…».
No mesmo sentido assinala a autora infra identificada[11]:
«(…)…não é material e probatoriamente irrelevante o facto de estarmos a analisar as afirmações de um sujeito processual claramente interessado no objeto em litígio e que terá um discurso, muito provavelmente, pouco objetivo sobre a sua versão dos factos que, inclusivamente, já teve oportunidade para expor no articulado.»
Não se pode deixar de ter como assertivo este modo de valoração das declarações de parte, pelo que, no caso sub judice, não havendo outra prova que complemente ou coadjuve as declarações de parte do interessado de DD, as mesmas não podem per se servir de fundamento probatório à matéria que os apelantes pretendem ver julgada como provada, improcedendo a respetiva impugnação da decisão de facto.

Alínea C) dos factos não provados:
«Que o veículo automóvel identificado no ponto 5 dos factos provados tinha à data do óbito do Inventariado o valor de € 15.000,00».

Defendem os apelantes que esta factualidade deve ser dada como provada por o valor do veículo não ter sido impugnado pela cabeça de casal, devendo seguir-se o mesmo critério da não impugnação do valor que foi o utilizado para a atribuição do valor do trator.
Em relação a esta matéria consta da fundamentação da decisão de facto:
«Considera-se não provado o valor do veículo mencionado em C) porquanto simplesmente nenhuma prova foi produzida a esse respeito.»
Analisando.
Na reclamação que deduziram contra a relação de bens, os ora apelantes requereram que fosse aditado à relação de bens o veículo de marca Peugeot 307 SW, de matrícula ..-GX-.., doado em vida do inventariado à cabeça de casal, em 29-04-2016, atribuindo-lhe o valor de €15.000,00.
Juntaram um documento (n.º 4) - uma certidão narrativa emitida pela Conservatória do Registo Civil, Predial, Comercial e Automóvel – onde é declarado que a propriedade do veículo foi objeto de registo de propriedade, em 28-01-2009, a favor de DD, e, em 29-04-2016, a favor de CC. Esta factualidade consta do ponto 5 dos factos provados.
Na resposta à reclamação a cabeça de casal alegou o seguinte:
«Quanto ao veículo de marca Peugeot com a matrícula ..-GX-.., foi o mesmo comprado pela cabeça de casal. Porque adquirido pelo inventariado ainda casado com a mãe dos interessados, esta para que a cabeça de casal pudesse comprar tal veículo exigiu-lhe o pagamento da quantia de 13.000,00 €, valor que atribuiu ao veículo, o que se verificou. O veículo não foi doado pelo inventariado à cabeça de casal, mas comprado por esta e pago o preço à mãe dos interessados.
Pelo que o veículo não faz parte da herança, não devendo ser relacionado.»

O teor desta alegação não corresponde a impugnação do valor atribuído ao veículo na referida reclamação, pois a cabeça de casal não toma posição definida quanto ao valor atribuído ao veículo, nem sequer o que alega está em contradição com aquele valor. Efetivamente, alegar que comprou por determinado valor não impede que o bem adquirido tenha valor diferente.
Sendo que também não provou que adquiriu o veículo pelo valor que mencionou.
Assim, nos termos do artigo 547.º do CPC, o valor atribuído pelos reclamantes, para efeitos de inclusão do bem na relação de bens, encontra-se não impugnado e deve passar a constar da relação de bens.
Procede, pois, a impugnação da decisão de facto quanto a esta alínea C) dos factos não provados, eliminando-se a mesma dos factos não provados, aditando-se aos elenco dos factos provados a seguinte factualidade:
«O veículo automóvel identificado no ponto 5 dos factos provados tinha à data do óbito do Inventariado o valor de € 15.000,00».
*
Decida a impugnação da decisão de facto, passamos, agora, à análise das demais questões suscitadas nas duas apelações.
*
3. Inclusão na relação de bens do valor da venda do trator (questão suscitada na apelação dos recorrentes)
Os apelantes alegam que existe uma manifesta contradição entre o facto provado 6., alínea b. e a decisão de não inclusão deste bem na relação de bens.
Resulta da reapreciação da impugnação da decisão de facto a alteração da redação do ponto 6., alínea b. dos factos provados nos termos supra decididos, bem como a inclusão nos factos não provados do segmento referente à venda pela cabeça de casal.
Estando, agora, estabelecido que não se provou que tenha sido a cabeça de casal a vender o veículo após o falecimento do inventariado, desconhecendo-se a data em que foi efetuada a venda, tendo-se apenas apurado a data do registo da aquisição a favor de terceiro posteriormente à data do óbito (tendo o registo da aquisição carácter meramente declarativo - cfr. artigo 1.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12-02), o bem não deve ser relacionado por não se encontrar devidamente apurado se à data do óbito o veículo já tinha sido vendido a terceiro.
Nestes termos, concluiu-se que a decisão de não inclusão na relação de bens do referido trator não merece qualquer censura, improcedendo, nesta parte, a apelação dos recorrentes.

4. Determinação do valor do veículo de marca Peugeot (apelação dos recorrentes)
Em relação a esta questão, a apelação dos recorrentes procede atenta a eliminação da alínea C) dos factos não provados, passando a mesma a constar dos factos provados, como supra decidido.
Nestes termos, impõe-se a revogação da sentença recorrida nessa parte, devendo a alínea C.a. do seu dipositivo refletir o valor (€15.000,00) atribuído pelos interessados na sua reclamação à relação de bens ao veículo automóvel Peugeot, com a matrícula ..-GX-...

5. Inclusão na relação de bens dos bens móveis e determinação do seu valor (apelação dos recorrentes)
Este segmento da apelação dos recorrentes improcede atenta a reapreciação da decisão de facto sobre a Alínea A), subalínea b. dos factos não provados, como supra analisado e decidido.

6. Sonegação de bens pela Cabeça de casal (apelação dos recorrentes)
Também improcede este segmento da apelação dos recorrentes atenta a reapreciação da decisão de facto sobre a Alínea A), subalínea b. dos factos não provados, como supra analisado e decidido, reiterando-se, sem necessidade de repetição, os fundamentos expressos na sentença recorrida no seu ponto 4.2.5. (fls. 17).

7. Inclusão na relação de bens do crédito da herança sobre a Cabeça de Casal no valor de €13.140,00, mais juros moratórios vencidos e vincendos (recuso da recorrente)
Improcede a apelação da recorrente quanto a esta questão por se manter nos factos provados a respetiva factualidade inserta no ponto 4. dos factos provados, cuja impugnação improcedeu como supra analisado e decidido.
*
Em face de todo o exposto e, em síntese, importa julgar improcedente a apelação dos recorrentes quanto ao despacho que apreciou o Requerimento de 29-05-2022, mantendo-o nos seus precisos termos.
Atenta a alteração da decisão de facto, julgar parcialmente procedente a apelação interposta pelos recorrentes em relação à sentença recorrida no que concerne ao valor do veículo Peugeot, que deve passar a estar incluído na relação de bens, mantendo-se a sentença no demais decidido.
Por sua vez, em relação à apelação da recorrente, uma vez que a alteração da decisão de facto quanto à venda do trator em nada altera a sentença proferida em relação a essa verba que já a tinha excluído da relação de bens, sendo que no demais também a apelação não procedeu, julga-se a apelação totalmente improcedente.

Responsabilidade por custas:
As custas devidas pela apelação dos interessados ficam a cargo dos mesmos, fixando-se o decaimento na percentagem de 85%, enquanto as custas pela apelação da cabeça de cabeça ficam a seu cargo na totalidade (artigo 527.º do CPC).

III- DECISÃO
Nos termos e pelas razões expostas, acordam em:
1. Julgar totalmente improcedente o segmento da apelação dos interessados interposta do despacho que apreciou o Requerimento de 29-05-2022, com a Ref.ª 8746681, mantendo o despacho recorrido;
2. Julgar parcialmente procedente a apelação dos recorrentes interposta da sentença recorrida em relação ao decidido na alínea C. a., da parte dispositiva, eliminando-se o segmento «no valor a apurar», passando a ali constar o valor «no valor de €15.000,00»; no mais improcede a apelação, mantendo-se a decisão recorrida;
3. Julgar improcedente a apelação da recorrente.

Évora, 11-05-2023
Maria Adelaide Domingos (Relatora)
José Lúcio (1.º Adjunto)
Manuel Bargado (2.º Adjunto)

__________________________________________________
[1] O processo de inventário foi remetido ao Tribunal Judicial da Comarca de Santarém provindo de Cartório Notarial, nos termos do artigo 12.º, n.º 2, alínea b), da Lei n.º 117/2019, de 13-09.
[2] Sem prejuízo de se atender a toda a alegação vertida nas conclusões do recurso, transcreve-se apenas a sua parte final, porque só esse segmento obedece ao disposto no artigo 639.º do CPC. Efetivamente, as conclusões vertidas sob tal epígrafe, submetida às letras do alfabeto (dão duas voltas ao abecedário) corresponde a uma mera repetição, quase decalque, do corpo da alegação, não sendo, pois, sintéticas como imposto pelo preceito supra mencionado.
[3] A Recapitulação do Inventário, Julgar on line, Dezembro 2019, p. 12 e 13.
[4] MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, CARLOS LOPES DO REGO, ANTÓNIO ABRANTES GERALDES e PEDRO LIMA PINHEIRO, O Novo Regime do Processo de Inventário e Outras Alterações na Legislação Processual Civil, Almedina, 2020, p. 9.
[5] Ob. cit, p. 104.
[6] Proferido no proc. n.º 556/20.1T8CHV-A.G1, disponível em www.dgsi.pt
[7] Proferido no proc. n.º 224/17.1T8GDM-B.P1, disponível em www.dgsi.pt
[8] Proferido no proc. n.º 13951/16.1T8LSB.L2.L1.S2, em www.dgsi.pt
[9] Neste sentido, e exemplificativamente, vejam-se os seguintes arestos: Ac. RG, de 18-01-2013, proc. n.º 294/16.0Y3BR.G1; Ac. RP, de 20-11-2014, proc. n.º 1878/11.8TBPFR.P2; RL, de 07-06-2016, proc. n.º 427/13.8TVLSB.L1-1 e de 13-10-2016, proc. n.º 640/13.8TCLRS.L1.-2, e da RE, 06-10-2016, proc. n.º 1457/15.0T8STB.E1, de 22-03-2018, proc. n.º 306/13.9TBGLG.E2; Ac. RP, 02-07-21, proc. n.º 1016/20.6T8PNF.P1, todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[10] LEBRE DE FREITAS e ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2.º, Almedina, 3.ª ed., p. 309 (4).
[11] CAROLINA HENRIQUES MARTINS, Declarações de Parte, Universidade de Coimbra, 2015, p. 58.