Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
350/06-3
Relator: MARIA ALEXANDRA SANTOS
Descritores: DIREITO REAL DE HABITAÇÃO PERIÓDICA
TIME SHARING
Data do Acordão: 01/18/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO CÍVEL
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário:
I – O direito real de habitação periódica é um verdadeiro direito real menor de gozo sobre coisa alheia, correspondendo, essencialmente, a um regime de propriedade fraccionada por quotas-partes temporais, vulgar e internacionalmente conhecido por time sharing.

II – A constituição de direitos reais de habitação periódica não envolve qualquer transmissão de propriedade.
Decisão Texto Integral:
“A” intentou contra “B” e “C” a presente acção com processo ordinário, alegando, em resumo, o seguinte:
A 1ª Ré é proprietária do empreendimento turístico denominado "Hotel Apartamento …", tendo a 2a Ré que é Notária no Cartório Notarial de … realizado no dia 18/05/2001, escritura de constituição do direito real de habitação periódica relativamente àquele empreendimento turístico.
Tal escritura está porém ferida de nulidade por violar direito cogente, a saber: omite a existência de contratos-promessa de constituição e de transmissão de direito real de habitação periódica, constitui este direito sobre mais de 70% (96%) do total do empreendimento, consigna como pertencentes aos apartamentos mobiliário e equipamento pertencentes a terceiro, ignora a inexistência de licença de habitação (que aliás, fora recusada), sem referir sequer a licença de construção e bem assim ignora a ausência de classificação turística definitiva do empreendimento, que estava aberto havia mais de seis anos.
A A. é titular de hipoteca sobre o imóvel objecto da escritura, cuja eficácia prejudica a realização do seu crédito, subjacente à dita hipoteca, visto que o acto escriturado envolve disposição do bem, tal como oneração dele.
Termina pedindo se declare a nulidade do acto de constituição do direito real de habitação periódica consubstanciado pela escritura pública referida, por violação de normas imperativas relativas à constituição daquele direito e se ordene o cancelamento do registo da constituição do mesmo e bem assim de qualquer registo de transmissão de tal direito.

Contestou a Ré “C”, nos termos de fls. 490 e segs., excepcionando a ilegitimidade da A. e dela própria para ser demanda na presente acção e impugnando os factos alegados pela A. como fundamento do direito invocado.
Conclui pela procedência das excepções invocadas e pela improcedência da acção.

Contestou também a Ré “B” nos termos de fls. 539 e segs., concluindo pela improcedência da acção.

Houve réplica.

Foi realizada audiência preliminar e proferido o despacho saneador onde decidindo sobre a invocada ilegitimidade da A. e da Ré “C”, foi a primeira declarada parte legítima e a segunda parte ilegítima, tendo em consequência, sido absolvida da instância.
Foram seleccionados os factos assentes e organizada a base instrutória, sem reclamação.
Realizada a audiência de julgamento, o tribunal respondeu à matéria de facto pela forma constante de fls. 703, que não foi objecto de reclamação.
Foi, por fim, proferida a sentença de fls. 711 e segs. que julgando a acção improcedente absolveu a Ré “B”, do pedido contra ela formulado.

Inconformada apelou a A. alegando e formulando as seguintes conclusões:
1 - Não podem ser celebradas escrituras públicas que envolvam transmissão de propriedade sobre imóveis sem que se faça perante o notário prova da existência da correspondente licença de utilização.
2 - A apresentação da licença de utilização, caso tenha sido requerida e não emitida, pode ser substituída pela exibição do alvará de licença de construção, uma vez feita prova de que foi requerida a licença de utilização e feita a declaração que o pedido de licença de utilização não foi indeferido, deu entrada há mais de 50 dias e que não houve notificação para pagamento de taxas devidas.
3 - Tal obrigatoriedade decorre de lei imperativa - art° 2° do D.L. 231/99 de 26/07.
4 - Da certidão da D.G.T. não há qualquer referência à existência de licença de construção ou utilização.
5 - Na escritura pública em causa foi feita referência à exibição do pedido de emissão de licença de utilização turística com a data de 28/12/2000, mas não foi feita a declaração prevista no nº 2 do art° 2° do D.L. 281/99.
6 - O D.L. 281/99 encontrava-se em vigor à data da celebração da escritura e tem plena aplicação à constituição do direito real de habitação periódica, razão pela qual é a própria Notária a fazer referência ao requerimento da emissão da licença de utilização.
7 - Aliás, tal obrigatoriedade decorre ainda do disposto no art° 5 al. f) do D.L. 180/99.
8 - É o acto de constituição do direito real de habitação periódica que permite a transmissão (venda) das respectivas vendas temporais, razão pela qual é na escritura de constituição que deve ser feita prova da existência de utilização tendo em vista a situação que o legislador pretendeu acautelar.
9 - A obrigatoriedade prevista no art° 2 do D.L. 281/99 consubstancia preceito de interesse geral e ordem pública e, portanto, imperativo, sendo que a sua ofensa implica nulidade, nos precisos termos do art° 294° do C.C ..
10 - As contra-ordenações - art°s 5° e 6° - mencionadas na sentença recorrida, referem-se não à consequência atinente ao próprio acto relativamente ao qual foi violada lei imperativa, mas única e exclusivamente às falsas declarações prestadas pelo transmitente, declarações essas que, aliás, no caso dos autos nem sequer existiram.
11 - A Câmara Municipal de … comunicou à Ré, por carta registada com A/R remetida em 10/04/2001, que o pedido de licença de utilização havia sido indeferido - alínea F) da especificação.
12 - A sentença recorrida violou o disposto no art° 2° do DL 281/99 - não o considerando aplicável ao caso dos autos - padece de erro de interpretação atinente à consequência da violação do citado art° 2°, padecendo ainda de erro na determinação da norma aplicável ao não aplicar o art° 294° do C.C. - art° 690 n° 2 als. a), b) e c), respectivamente, todos do CPC.
13 - No que se refere à violação do art° 4° al. b) do D.L. 180/99, entende a sentença recorrida que a mesma consubstancia simples contra-ordenação punível com coima, nos termos do art° 54° nº 1.
14 - O art° 54° nº 1 al. b) diz respeito à aplicação de coimas à entidade que explora o empreendimento, pelo simples facto de o explorar, seja a proprietária do mesmo ou qualquer concessionária.
15 - Tal facto não implica que o respectivo acto constitutivo não seja considerado inválido.
16 - Aliás, a comercialização de DRHP, não validamente constituído, constitui, ainda de per si, contra-ordenação - art° 54° n° 1 al. a) do D.L. 180/99 - o que igualmente, não implica que o próprio acto constitutivo, se o foi sob violação de lei, não possa ser considerado inválido.
17 - Não tem qualquer fundamento a interpretação dada pela sentença recorrida ao art° 54 nº 1 al. a) no sentido de que não pode ser comercializado DRHP enquanto não esteja validamente constituído.
Na verdade,
18 - Antes de mais, não é essa a interpretação que decorre do teor do mesmo, a qual, já de si, não levanta quaisquer dúvidas: não pode ser comercializado DRHP se não validamente constituído.
19 - A própria interpretação dada pela sentença recorrida ao citado preceito sempre se encontraria em frontal oposição com o art° 17° e 19° do D.L. 180/99, nos termos dos quais pode ser comercializado DRHP antes da celebração do respectivo título constitutivo.
20 - A sentença recorrida considera haver violação do art° 4° nº 1 al. b) o que expressamente se aceita e não foi objecto de recurso (ainda que subordinado).
21 - Ao não considerar que a violação do art° 4° nº 1 al. b) tem como consequência a nulidade prevista no art° 294º do C.C., mas simples contra­ordenação, padece a sentença recorrida de erro na interpretação do art° 54° nº 1 als. a) e b) e de errónea aplicação do art° 54° n° 1 al. b) - art° 690 n° 2 als. a) e c) do CPC.
22 - Os móveis e equipamento existente no imóvel sujeito ao regime de direito real de habitação periódica têm de constituir propriedade do proprietário do imóvel.
Com efeito,
23 - O conceito de unidade de alojamento previsto no DL 180/99 engloba não apenas o imóvel/fracção em si mesmo considerado (paredes, portas, janelas) mas todo o equipamento e recheio que permite que aquele mesmo imóvel possa afinal ser considerado e usufruído como "unidade de alojamento".
24 - Todo o equipamento e recheio declarado existir no imóvel aquando da celebração da escritura, é propriedade da sociedade “D” - al. E) da especificação.
25 - O facto de a lei impor deveres de administração e conservação sobre o equipamento e recheio não é incongruente com a exigência de ser proprietário do mesmo. Aliás, o próprio proprietário é incumbido desses mesmos deveres quanto às unidades de alojamento - art° 25°.
26 - O caso dos autos não é comparável a qualquer contrato de aluguer de móveis ou equipamento celebrado entre proprietário do imóvel e sociedade locadora, através do qual são atribuídos direitos de uso e fruição de bens, prevenindo, assim, a situação pretendida acautelar pela lei.
27 - No caso dos autos, o equipamento e recheio é propriedade da sociedade terceira, relativamente ao qual não existe qualquer contrato de aluguer com o proprietário do imóvel, não possuindo este qualquer direito de uso, fruição ou sequer posse daquele recheio e equipamento.
28 - E é precisamente este facto que a lei que regula o direito real de habitação periódica - diploma de carácter imperativo - pretende evitar e acautelar.
29 - O legislador omitiu a sanção a aplicar ao próprio título constitutivo, quando o mesmo tenha sido constituído sem observância dos respectivos requisitos legais e, portanto, contra lei imperativa, razão pela qual há plena aplicação do art° 294° do C.C. ao caso dos autos.
30 - A legitimidade da A., ora recorrente, foi decidida no despacho saneador, já transitado em julgado, no qual foi decidido que "a constituição do direito real de habitação periódica sobre o imóvel diminuiu, na sua essência, o direito de propriedade depois de se constituírem direitos reais menores dentro desse direito" .
31 - Inexistem quaisquer factos provados ou não provados que viessem alterar a relação material controvertida, tal como foi configurada pela A., ora recorrente.
32 - Vem a sentença recorrida agora considerar que a constituição do direito real de habitação periódica não limita ou diminui o direito de propriedade.
33 - O conhecimento de tal questão pela sentença recorrida apenas faria sentido caso se destinasse a pronunciar acerca da legitimidade.
34 - Encontra-se a sentença recorrida em clara contradição com a matéria
decidida no saneador, com o que foi violado o instituto do caso julgado, constituindo a nulidade prevista no art° 668 n° al. d) do CPC.
35 - E se a questão da legitimidade não poderia, de novo, vir a ser decidida, também não poderia a sentença recorrida vir a tecer comentários relativamente a factos invocados única e exclusivamente para efeitos de legitimidade da aqui recorrente, com o que foi violado o disposto no art° 668 nº 1 al. d) do CPC.
36 - A constituição do DRHP - e inerentes consequências: venda de fracções temporais por simples averbamento - após o registo de hipoteca e penhora a favor da recorrente, diminuiu na sua essência, o direito de propriedade. Tal constatação é óbvia no plano jurídico.
37 - E tanto é quanto basta para se verifique diminuição da garantia do recorrente.
38 - Sempre se diga, as garantias da ora recorrente - hipoteca e penhora - se mostram registadas sobre o imóvel, não se encontrando em causa qualquer penhora sobre créditos da executada.
39 - Pelo que é, para além de aleatório, perfeitamente desenquadrado o argumento vertido na sentença recorrida que a constituição de DRHP traria claros benefícios para as perspectivas de lucro do proprietário, as quais aumentariam as garantias do credor hipotecário.

Não foram apresentadas contra-alegações.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Como é sabido, são as conclusões da alegação do recorrente que delimitam o âmbito do recurso, abrangendo apenas as questões aí contidas (art°s 684 n° 3 e
690 n° 1 do CPC).
Do que delas decorre verifica-se que são as seguintes as questões a decidir:
1 - Se ocorre a nulidade da escritura de constituição de direitos reais de habitação periódica por violação
- do art° 2° do D.L. 281/99 de 26/07;
- do art° 4° al. b) do D.L. 180/99 de 22/05
- do art° 4° n° 1 al. e) do D.L. 180/99
2 - Se ocorre a nulidade da sentença nos termos do disposto no art° 668 n° 1 al. d) do CPC.
*
São os seguintes os factos que foram tidos por provados na 1ª instância:
1 - No dia 18/05/2001, realizou-se no Cartório Notarial de … a escritura pública em que acordaram “E” e “F”, como gerentes e em representação da sociedade “B”, onde declararam o seguinte: "Que a sua representante é dona e legítima proprietária de todas as fracções que compõem o imóvel onde se encontra o empreendimento turístico denominado "Hotel Apartamento …", situado em …, freguesia e concelho de …, com a classificação provisória de "Hotel Apartamento, com categoria de três estrelas", dada pela Direcção-Geral de Turismo, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número zero, quatro mil seiscentos e oitenta e cinco barra oitenta e nove, zero dois, zero oito, onde se mostra registada a aquisição a favor da sua representada pela inscrição G-um e a propriedade horizontal pela inscrição quatro, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo número 16732. Que em 9 de Fevereiro de 2001 e nos termos do n° 2 do art° 60° e n° 3 do art° 5° do D.L. 180/99 de 22105, que altera o D.L. 275/93 de 5/08, a Direcção-Geral de Turismo emitiu uma certidão que arquivo e cujo conteúdo faz parte integrante desta escritura. Que face à referida certidão da Direcção-Geral de Turismo, vêm pela presente escritura e em nome da sociedade sua representada, constituir sobre as unidades descritas no primeiro documento complementar à presente escritura o direito real de habitação periódica, nos termos do disposto nos referidos Decretos-Lei, cuja regulamentação consta do segundo documento complementar também desta escritura, elaborado nos termos do nº 2 do art° 64° do Código do Notariado. Que o número de unidades de alojamento, sobre as quais se constitui o direito real de habitação periódica, é de cento e vinte e quatro, com cinquenta e duas semanas cada, correspondendo a seis mil quatrocentos e quarenta e oito direitos de habitação periódica, de duração perpétua. Que as semanas serão identificadas como semana um a semana cinquenta e duas e a semana um terá início no primeiro sábado do mês de Janeiro e a semana dois terá início no sábado subsequente, sendo as restantes semanas numeradas sucessivamente com início nos sábados seguintes. Os equipamentos desportivos, de animação e recreio existentes no empreendimento são os seguintes: - piscina para adultos, piscina para crianças, solário e zona de animação artística, junto ao bar. Data prevista para abertura do empreendimento: 1 de Maio de 2001. Que os apartamentos têm o mobiliário e equipamento constante do inventário que constitui o terceiro documento complementar anexo à presente escritura. Que o valor unitário de cada fracção temporal consta do quarto documento complementar, que também faz parte integrante desta escritura. E que o valor total do direito real de habitação periódica é de mil oitocentos e cinquenta e dois milhões e quatrocentos mil escudos (al. A) dos fa.)
2 - Exibiram: a) Certidão do Registo Predial de … emitida em 22 de Março de 2001; b) Certidão do teor matricial de 20 de Março de 2001, da Repartição de Finanças de …; c) Pedido de emissão do alvará de licença de utilização turística de 28 de Dezembro de 2000, data da entrada do original na Câmara Municipal de … (al. B) os fa.)
3 - A ora escritura em causa constitui direitos reais de habitação periódica sobre 124 fracções habitacionais do prédio constituído em regime de propriedade horizontal e composto por 133 fracções, o que viola o citado art° 4° al. b) do D.L. 180/99 de 22 de Maio (al. C) dos fa.)
4 - O empreendimento é constituído por 133 apartamentos (al. D) dos f.a.)
5 - O mobiliário e equipamento discriminados no documento complementar à escritura e referido em A), não são propriedade da Ré “B” (al. E) dos fa.)
6 - À data da realização da escritura, a Ré “B”, tinha sido notificada pela Câmara Municipal de … de que havia sido indeferido o pedido de licença de habitação (al. F) dos f.a.)
7 - O empreendimento está aberto ao público há mais de seis anos (al. G) dos f.a.).
8 - A Ré entregou na Direcção-Geral de Turismo, e antes da celebração da escritura de constituição do direito real de habitação periódica, um conjunto de contratos-promessa tendo por objecto a venda de direito real de habitação periódica sobre o empreendimento (resp. ques.º 1 ° da b.i.)
9 - Tratou-se de um conjunto de 460 contratos-promessa celebrados entre 1989 e 1991, nos quais outorgou como entidade construtora a “G” e a “H”, como entidade exploradora (resp. ques.º 2° da b.i.)
10 - O senhor engenheiro “I” é o engenheiro e técnico responsável pela construção do empreendimento (resp. ques.º 3° da b.i.)

Estes os factos com base nos quais o Exmo Juiz a quo julgou a acção improcedente.
Das conclusões formuladas pela apelante que limitam o objecto do recurso verifica-se, como supra se referiu, que a questão a decidir no presente recurso se reconduz, no essencial, a saber se o acto de constituição de direito real de habitação periódica, consubstanciado na escritura pública de 18/5/2001, sofre de vício que importe a sua nulidade, designadamente por violação de lei imperativa.
O direito real de habitação periódica, como verdadeiro direito real de gozo, corresponde, essencialmente, a um regime de propriedade fraccionada por quotas-partes temporais, vulgar e internacionalmente conhecido por time sharing.
O direito real de habitação periódica, foi instituído pelo DL 355/81 de 31/12, com vista a aumentar a protecção daqueles que investiam nos designados títulos de férias com apenas protecção legal precária do tipo obrigacionista, vindo a ser tal regime alterado pelo D.L. 130/89 de 18/04, e este posteriormente revogado pelo art° 62° do DL 275/93 de 5/08 (sem prejuízo das regras sobre a aplicação no tempo contidas no art° 60), cuja vigência anda se mantém, embora com as alterações introduzidas pelo DL 180/99 de 22/05 (diploma tido por necessário para garantir a transposição da Directiva nº 94/47/CE de 26/10 e para compatibilizar o regime do DL 275/93 de 5/08 com o regime jurídico de instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos, aprovado pelo DL 167/97 de 4/07) e mais recentemente pelo DL 22/2002 de 31/01.
Relativamente à aplicação da lei no tempo e no espaço rege o art° 60 do D.L. 180/99 que dispõe no seu n° 1 que "O presente diploma aplica-se aos direitos reais de habitação periódica constituídos, ficando ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que este se destina a regular" e no seu n° 2 que "Aos direitos reais de habitação periódica que tenham sido objecto de contratos­promessa de transmissão e não se encontrem constituídos ao tempo da entrada em vigor do presente diploma, aplicam-se quanto à escritura pública, ao registo e à emissão de certificados prediais, as disposições dos artºs 4°, 5° e 7° a 9° do D.L. 130/89 de 18 de Abril”.
Assim sendo, atenta a factualidade assente sob os pontos de facto 8 e 9 e a data da escritura, aplicam-se, relativamente a esta, as referidas normas do DL 130/89 e, no mais, as disposições do DL 275/93 de 5/08 com as alterações introduzidas pelo D.L. 180/99 de 22/05.
Não contendo a lei uma noção de direito real de habitação periódica, resulta, porém, da conjugação do art° 1° com o artº 21° do DL 275/93 que se configura como o direito de usar, por um ou mais períodos certos, em cada ano, para fins habitacionais, uma unidade de alojamento, integrada num empreendimento turístico, mediante o pagamento de uma prestação periódica ao proprietário do empreendimento ou a quem o administre.
Trata-se de um direito real, menor, de gozo, sobre coisa alheia, valendo erga omnes e que se constitui por negócio jurídico unilateral, sujeito a escritura pública (art° 6° n° 1 do DL 275/93 na redacção do DL 180/99 e 4° nº 1 do D.L. 130/89).
Analisando os citados art°s 4°, 5° e 7° a 9° do D.L. 130/89 de 18/04 que regem sobre a constituição do direito real de habitação periódica, verifica-se que são pressupostos da mesma: a) a prévia classificação do empreendimento turístico pela Direcção-Geral do Turismo ou por outra entidade competente (art° 4° n° 1 e 4); b) celebração de escritura pública - a qual só pode ser instruída com o documento que aprova e classifica o empreendimento; c) e que na escritura pública o proprietário identifique o imóvel ou imóveis ou as fracções autónomas, onde está instalado o empreendimento turístico e ainda as parcelas em que divide o respectivo uso e o período de tempo a que respeitam (art° 4° n° 1 ).
Os factos que o proprietário deve declarar na escritura pública por imperativo do nº 1 deste art° coincidem com os aspectos que obrigatoriamente devem constar do documento emitido pela Direcção-Geral de Turismo para provar e classificar o empreendimento o qual, deverá conter, para além daquelas, as outras indicadas nas várias alíneas daquele nº 4 do art° 4°.
O título constitutivo do direito de habitação periódica é, assim, a escritura pública da qual devem constar ainda as especificações obrigatórias indicadas nas várias alíneas do n° 1 do art° 5°. Essas especificações têm por finalidade determinar os poderes e os deveres do titular do direito de habitação periódica em relação à unidade de alojamento ou apartamento e sobre as partes do empreendimento que seja de uso comum. Tais menções obrigatórias visam completar o conteúdo do direito de habitação periódica através da fixação do estatuto jurídico do seu titular, admitindo-se para tal efeito a aplicação supletiva do regime da propriedade horizontal ou do usufruto (art° 5° n° 2).
Na escritura pública instruída com o documento emitido pela DGT, deve o notário mencionar que o seu conteúdo faz parte integrante da escritura (n° 2 do art° 6° do DL 180/99 de 22/05)
Feita esta breve resenha do regime de constituição do direito real de habitação periódica, impõe-se apreciar as questões suscitadas no presente recurso.
Insurge-se a apelante contra a sentença recorrida que decidiu que não se verificam os alegados fundamentos de nulidade do título constitutivo do direito real de habitação periódica por violação de lei imperativa, continuando a defender que os mesmos ocorrem.
Assim:

Relativamente à violação do art. 2° do D.L. 281/99 de 26/07.
Defende a apelante que não constando da escritura em apreço a declaração prevista neste dispositivo legal, em vigor à data da sua celebração, obrigatoriedade que ressalta também do disposto no art° 5 al. f) do DL 180/99, a escritura é nula nos termos do art° 294 do C.C.
Com efeito dispõe o nº 1 do art° 1º do referido DL nº 281/99 que "Não podem ser celebradas escrituras públicas que envolvam a transmissão da propriedade de prédios urbanos ou de suas fracções autónomas sem que se faça perante o notário prova suficiente da inscrição na matriz predial, ou da respectiva participação para a inscrição, e da existência da correspondente licença de utilização, de cujo alvará, ou isenção de alvará, se faz sempre menção expressa na escritura. 2 - Para efeitos do disposto no número anterior, nos prédios submetidos ao regime de propriedade horizontal, a menção deve especificar se a licença de utilização foi atribuída ao prédio na totalidade ou apenas à fracção autónoma a transmitir".
Afigura-se-nos, desde logo, que a exigência contida neste dispositivo legal se limita às escrituras que têm por fim a transmissão da propriedade de prédios urbanos ou de suas fracções, tal como decidiu a sentença recorrida.
Como é sabido e não obstante os doutos argumentos da apelante, a constituição de direitos reais de habitação periódica não envolve qualquer transmissão de propriedade, pois trata-se de um negócio jurídico unilateral que nasce da vontade do proprietário singular das fracções que pretende submeter a este regime de gozo do qual será lavrado título constitutivo por escritura pública.
O título constitutivo está sujeito a registo (art° 8° do D.L. 180/99), sem o qual não é possível alienar os direitos de habitação periódica.
O título é corporizado por um certificado predial que titula cada direito parcelar e vai servir de base à sua transmissão ou oneração (art° 10° do mesmo D.L.).
A transmissão ou oneração faz-se mediante mera declaração das partes no certificado predial, do qual deve constar, além do mais, o valor da prestação periódica se a transmissão for a título oneroso.
Sendo alienante o proprietário das unidades de alojamento, tem de prestar caução a favor do adquirente, para cobrir as obrigações identificadas no n° 1 do art° 15°.
Acresce que o direito de habitação periódica pode não ser perpétuo, sendo limitado a um período de tempo em cada ano que pode variar entre 7 dias seguidos e um máximo de 30 dias seguidos (art° 3° do diploma em apreço). Assim, não obstante a transmissão do direito de habitação periódica, o respectivo proprietário mantém a propriedade das unidades de alojamento, incumbindo-lhe (salvo se for um terceiro o responsável pelo funcionamento do empreendimento turístico) a administração, conservação e reparação das unidades de alojamento e ainda dos respectivos equipamentos e recheio (cfr. Artºs 25 n° 1, 26, 27 n° 1 do DL 275/93 de 5/08) 22 n° 2, 30° e 31 do D.L. 180/99).
De todo o exposto resulta que, efectivamente, não se verifica qualquer identificação entre as escrituras públicas que envolvem a transmissão da propriedade de prédios urbanos ou fracções autónomas a que se refere o D.L. 281/99 de 26/07 e a escritura de constituição de direitos reais de habitação periódica mesmo sendo este o acto que irá permitir a venda das respectivas fracções temporais já que esta não envolve a transmissão da propriedade das unidades de alojamento a que respeitam como supra se demonstrou.
Pretende ainda a apelante que a obrigatoriedade de exibição da licença de utilização ressalta, à contrário, do disposto no art° 5° al. f) do D.L.180/99 o qual dispõe que no caso do empreendimento ainda se encontrar em construção é necessária licença de construção emitida pela Câmara Municipal.
Ora, como já se referiu, por força do disposto no art° 60 nº 2 do D.L.180/99, à escritura pública em apreço é aplicável o disposto nos art°s 4° e 5° do D.L. 130/89 e não o art° 5° do D.L. 180/99, sendo certo que aquele art° 4° impõem no seu n° 4 al. b) que do documento emitido pela Direcção-Geral do Turismo conste "a data da aprovação do respectivo projecto e se a sua construção estiver prevista por fases, a identificação da fase a que respeita" (do projecto de construção do empreendimento).
Não obstante não constar da referida certidão da DGT, qualquer referência "à data de provação o projecto", o certo é que não decorria directamente daquele normativo a exigência da "licença de utilização".
De resto e como se ponderou na sentença recorrida, afigura-se-nos que a falta de menção da licença de utilização ou mesmo a sua inexistência não importaria a nulidade da escritura nos termos do art° 294° do C. Civil, já que o D.L. 281/99 não a prevê, sancionando-a antes com as coimas e sanções disciplinares previstas nos seus art°s 5° e 6°.
Por todo o exposto, improcedem, nesta parte, as conclusões da alegação da apelante.

Quanto à violação do art 4° n° 1 al. b) do D.L. 180/99
Insurge-se a apelante contra a sentença recorrida por entender que a violação do disposto naquele preceito não tem como consequência a peticionada nulidade da escritura de constituição dos direitos reais, mas apenas a aplicação da coima prevista no art° 54 nº 1 do mesmo diploma.
Com efeito, resulta daquele dispositivo legal como condição da exploração de um empreendimento sujeito ao regime do direito real de habitação periódica que "Sobre pelo menos 30% das unidades de alojamento afectas à exploração turística, não sejam constituídos direitos reais de habitação periódica ou direitos de habitação turística, mantendo-se a exploração turística integrada da totalidade do empreendimento".
Ora, face ao facto constante do ponto 3 dos factos provados, verifica-se que, efectivamente, houve violação do referido preceito legal.
A questão reside nas consequências de tal violação, pretendendo a apelante a aplicação do disposto no art° 294 do C. Civil, a nulidade do acto, sendo que a sentença entendeu apenas aplicável a coima prevista na al. b) do n° 1 do art° 54 do diploma em apreço.
Com efeito, dispõe esta última disposição que "constituem contra-ordenações puníveis com coima de 2.000.000$00 a 20.000.000$00", entre outras, "a infracção ao disposto no n° 1 do artº 4º”.
Verifica-se assim, que legislador sancionou, directamente aquela violação com uma contra-ordenação punida com a coima referida.
Mas será que tal facto não invalida que ao acto constitutivo em causa seja aplicada, também, a sanção prevista no art° 294 do C. Civil como pretende a apelante?
Dispõe este normativo que "Os negócios jurídicos celebrados contra disposição legal de carácter imperativo são nulos, salvo no caso em que outra solução resulte da lei".
Ora, ao estabelecer no art° 4° as condições de exploração do empreendimento no regime de direito real de habitação periódica, terá de se concluir que se não se observar ou satisfizer o aí consignado, não será legalmente possível a constituição dos direitos em causa, o que numa primeira aproximação parece que produziria a nulidade do negócio nos termos do art° 294 do C. Civil.
É que configurando-se tal norma de natureza imperativa (cfr. P. de Lima e A. Varela, C. Civil Anotado, voI. I, 4a ed., pág. 269) a nulidade tanto pode apresentar-se sob a forma textual ou expressa, como virtual ou tácita, como refere Mota Pinto (Teoria Geral do Direito Civil, 3° ed., pág. 61) e Rui Alarcão (A Confirmação dos Negócios Anuláveis, I, pág. 45, nota 41), na esteira do entendimento de Manuel de Andrade (Teoria Geral da Relação Jurídica, II, pág. 282, nota 1) pelo que o facto de aquele diploma não cominar expressamente a nulidade, não significa, em princípio, que ela não possa ser declarada.
Porém, o art° 294 contém uma restrição a tal comando, ao da nulidade, ali se referindo "salvo se outra solução resultar da lei" o que significa que deverá ter-se por excluída a nulidade se a sanção se mostrar pouco adequada ao caso concreto (cfr. Manuel de Andrade, ob. cit., pág. 335).
Ora, afigura-se-nos que no caso em apreciação ela se mostra não só pouco adequada como até repelida pelo diploma em apreço.
Com efeito, no art° 54 do D.L. 180/99 cominam-se com coimas a inobservância entre outros, do disposto no n° 1 do seu art° 4° ou seja, in casu, a efectivação da exploração de um empreendimento sujeito ao regime do direito real de habitação periódica em infracção ao disposto nas suas diversas alíneas, entre elas, no que ao caso interessa, a sua alínea b).
Sanciona-se assim, a referida infracção com uma sanção de natureza administrativa, naturalmente por o legislador haver então considerado que os bens jurídicos aí protegidos não eram valores ou interesses fundamentais da vida comunitária ou da personalidade ética do homem, mas simples valores da criação ou manutenção de uma certa ordem social (V. Eduardo Correia, Direito Criminal, I, 1971, págs. 28/29), para defesa dos quais se reputou suficiente a imposição de coimas.
A infracção a tal preceito, surge, pois, nesse diploma, como simples contra­ordenação com as coimas a serem impostas pela Direcção-Geral de Turismo ou pelo membro do governo com tutela sobre o turismo, de acordo com o disposto no art° 58, revertendo as respectivas importâncias para os cofres do Estado em 60% e para a Direcção-Geral do Turismo em 40% (art° 59°).
Tal como, de resto, previne como contra-ordenação sancionada com a mesma coima, "a comercialização de direito real de habitação periódica não validamente constituído" (art° 54 n° 1 al. a) do mesmo diploma).
Assim, entende-se que no caso em apreço, não tendo sido expressamente estabelecida pelo legislador a sanção da nulidade, naturalmente por não haver sido considerada necessária ou oportuna, ou haver sido considerada desajustada ou imprópria, não pode ter aplicação, estando assim, a sanção expressamente cominada exclusivamente integrada na esfera da tutela administrativa e não da tutela jurisdicional.
Este entendimento decorre ainda da própria lei de autorização legislativa - Lei nº 15/99 de 25/03 (DR 71/99 Série I-A, págs. 1677/1678) que no seu art° l° refere como seu objecto que "Fica o governo autorizado a estabelecer o regime contra-ordenacional à violação das normas que regem o direito real de habitação periódica e direitos análogos, designadamente os direitos de habitação turistica", prevenindo no seu art° 2° no que se refere ao sentido e extensão que no uso daquela autorização pode o governo "estabelecer contra-ordenações puníveis com coima cujo montante se poderá elevar a 20.000.000$00, visando sancionar", entre outras "a constituição, comercialização ou transmissão de direitos reais ou obrigacionais de habitação periódica, designadamente, direitos de habitação turística, em violação do disposto na lei".
De resto, quando legislador entendeu cominar com outro tipo de sanções, entre elas a nulidade, determinadas infracções previstas na lei, fê-lo expressamente, como nos casos dos art°s 12 nº 4, 17° n° 3, e art° 20 do diploma em apreço, também referidos na sentença recorrida.
Por todo o exposto, não assiste, também, razão à apelante no que respeita a esta questão, improcedendo, assim, as conclusões da sua alegação que a ela se referem.

Quanto à violação do disposto no artO 4 n° 1 a!. e) do D.L.180/99.
Pretende a apelante que tendo ficado provado que "o mobiliário e equipamento discriminados no documento complementar à escritura não são da Ré “B” verifica-se, mais uma vez, violação de lei imperativa (a referida disposição legal), o que tem como consequência a invalidade do título constitutivo do direito real de habitação periódica.
Mais uma vez não podemos aceitar a pretensão da apelante, desde logo por tudo quanto supra se expôs relativamente à intenção do legislador de cominar com coima a inobservância do disposto no art° 4° nº 1 do DL 180/99, pelo que, se infracção houvesse, a sanção não seria a peticionada nulidade.
Mas, sempre se dirá que também não subscrevemos a interpretação da apelante relativamente à exigência legal de que "o recheio e equipamento que compõem e constituem as unidades de alojamento, deverão pertencer a um único proprietário - o proprietário do empreendimento".
Com efeito, o art° 4 nº 1 al. e) do diploma em apreço estabelece que "as unidades de alojamento referidas na alínea c) devem ter um único proprietário e, quando o prédio estiver submetido ao regime da propriedade horizontal, o respectivo titulo constitutivo deve garantir a utilização das instalações e equipamentos de uso comum por parte dos titulares de direitos reais de habitação periódica".
Afigura-se-nos, ao contrário da interpretação defendida pela apelante, que o que a lei exige é que seja um só o proprietário das unidades de alojamento e não que o recheio e equipamento que compõem essas unidades de alojamento devam pertencer ao seu proprietário.
Na verdade, não só a lei não o impõe expressamente (veja-se que tal não resulta do art° 5° que apenas impõe ao proprietário do alojamento, na al. l) do seu nº 2 "a enumeração das instalações e equipamentos de uso comum e de exploração turística bem como dos equipamentos de animação, desportivos e de recreio do empreendimento", e na al. s) que indique "os poderes e deveres do proprietário do empreendimento nomeadamente em matéria de equipamento e mobiliário das unidades de alojamento e a sua substituição, de reparações ordinárias, de conservação e limpeza e os demais serviços disponibilizados") como até distingue "unidade de alojamento" e seu "equipamento e recheio", ao contrário do entendimento da apelante para quem o conceito de unidade de alojamento engloba, não apenas o imóvel/fracção mas todo o equipamento e recheio que permite que aquele mesmo imóvel, possa, afinal, ser considerado e usufruído como unidade de alojamento.
É o que resulta, designadamente, do art° 25 n° 1 relativamente às obrigações do proprietário, ao estabelecer que "a administração e conservação das unidades de alojamento objecto do direito real de habitação periódica, do seu equipamento e recheio e das instalações e equipamentos de uso comum do empreendimento incumbem ao respectivo proprietário", do art° 26 nº 1 "as unidades de alojamento objecto do direito real de habitação periódica, bem como os respectivos equipamento e mobiliário devem ser mantidos pela entidade responsável em estado de conservação e limpeza compatível com o fim a que se destinam ... ".
Assim, o que o proprietário tem é que garantir a "boa administração e conservação do empreendimento", para isso prestando uma caução (art° 31) e constituir e depositar um fundo de reserva, mediante a afectação de, pelo menos, 4% do valor da prestação periódica paga pelos utentes, para cobertura das despesas com obras de reparação e conservação de zonas comuns e das unidades de alojamento, seu mobiliário e equipamento (art° 30 na 1), não se vislumbrando na lei qualquer imposição de que seja igualmente o seu proprietário.
Improcedem, assim, também quanto a esta questão as conclusões 43a a 57a da alegação da apelante.

Por fim, pretende a apelante que se verifica a nulidade da sentença prevista no are.668 nº 1 al. d) do CPC por considerar agora que a constituição do direito real de habitação periódica não limita ou diminui o seu direito de propriedade quando o conhecimento de tal questão apenas faria sentido caso se destinasse a pronunciar acerca a legitimidade a qual já foi reconhecida e declarada em sede de despacho saneador.
Também aqui não podemos concordar com a apelante.
Com efeito, tendo a legitimidade da A. ora apelante sido declarada no despacho saneador não mais pode ser questionada, do que resulta reconhecido que tem interesse directo em demandar, o qual se exprime pela utilidade derivada da procedência da acção (art° 26 do CPC).
Trata-se da legitimidade processual da A. enquanto titular de um interesse relevante na relação material controvertida, tal como é por si configurada.
Ora, o Exmo Juiz ao abordar na sentença recorrida a questão de fundo suscitada pela apelante na presente acção, considerando que a constituição do direito real de habitação periódica não limita ou diminui o direito de propriedade pelo que do mesmo não resulta risco para o crédito da A., não está a conhecer de questão de que não podia tomar conhecimento pois, o que foi decidido e transitou em julgado foi, tão só, a legitimidade processual da A. na questão material controvertida tal como a configurou.
Mas tal questão, de índole intrinsecamente processual, não obsta a que o tribunal se pronuncie sobre a existência ou inexistência de fundamento da pretensão formulada que integra o mérito da causa.
Assim sendo, também não assiste razão à apelante ao pretender que se verifica a nulidade da sentença por excesso de pronúncia (art° 668 n° 1 al. d) do CPC).
A sentença encontra-se proficientemente elaborada com apreciação de todas as questões suscitadas no processo com correcta aplicação do direito, questões que são as mesmas trazidas a este tribunal em sede de recurso.
Improcedendo, in totum, as conclusões da apelação da A., impõe-se a confirmação da sentença recorrida cujos fundamentos inteiramente se subscrevem para os quais se remete também a apelante (art° 713 n° 5 do CPC)

DECISÃO
Nesta conformidade, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela apelante.
Évora, 18.01.07