Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
747/18.5T8STR.E1
Relator: VÍTOR SEQUINHO
Descritores: INSTITUIÇÃO BANCÁRIA
DEVER DE INFORMAR
Data do Acordão: 06/27/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Se um banco apresenta, a um cliente sem qualificações ou formação técnica que lhe permitam conhecer os vários tipos de produtos financeiros e avaliar os riscos de cada um deles e, por isso, sempre aplicou as suas poupanças em depósitos a prazo, um produto financeiro, que o mesmo acabou por subscrever, como sendo uma aplicação em tudo semelhante a um depósito a prazo, nomeadamente com a mesma garantia deste último, com capital garantido pelo banco, rentabilidade assegurada através de juros pagos semestralmente e possibilidade de disposição, total ou parcial e a todo o tempo, do capital e/ou juros, em vez de informar o mesmo cliente de que, na realidade, se trata de obrigações emitidas por uma sociedade comercial terceira, estará a violar o seu dever de, como intermediário financeiro, actuar de acordo com os ditames da boa-fé e com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, orientado no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes, prestando informação completa, verdadeira, clara, objectiva e suficiente para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada por parte do cliente, incluindo as respeitantes a riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar, dever esse decorrente dos artigos 7.º, 304.º e 312.º do Código dos Valores Mobiliários. (Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 747/18.5T8STR.E1

Relatório


(…) e (…), casados entre si, propuseram acção declarativa de condenação, com processo comum, contra o Banco BIC Português SA, formulando os seguintes pedidos:

1 – Condenação do réu a pagar aos autores a quantia global de € 112.000,00 acrescida de juros de mora, à taxa legal, vincendos e contados desde 08.03.2018, sobre a quantia de € 100.000,00 até integral pagamento;

2 – Subsidiariamente, declaração da nulidade de qualquer eventual contrato de adesão que o réu invoque para ter aplicado o valor de € 100.000,00 que os autores lhe confiaram, em “Obrigações SLN Rendimento Mais 2004”, sendo declarada ineficaz em relação aos mesmos autores a aplicação que o réu tenha feito desses montantes e, em consequência, ser o réu condenado a restituir aos autores a quantia de € 112.000,00 respectivos juros vencidos à taxa legal e juros moratórios legais vincendos desde 08.03.2018, inclusive, sobre a quantia de € 100.000,00 até integral pagamento;

3 – Em qualquer caso, condenação do réu a pagar aos autores a quantia de € 10.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros moratórios legais vincendos contados desde a data da citação até integral pagamento.

O réu contestou, invocando as excepções de incompetência territorial do tribunal e de prescrição e concluindo que a acção deve ser julgada improcedente.

Os autores responderam às excepções suscitadas pelo réu.

Foi proferido despacho saneador, no qual se julgou improcedente a excepção de incompetência territorial e se relegou para a sentença o conhecimento da excepção de prescrição. Procedeu-se à identificação do objecto do litígio e ao enunciado dos temas de prova.

Realizou-se a audiência final, na sequência da qual foi proferida sentença que condenou o réu a pagar aos autores a quantia de € 100.000,00 acrescida de juros de mora à taxa legal, calculados sobre essa quantia, desde 23.10.2014 até integral pagamento, e a quantia de € 7.000,00 a título de danos morais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, calculados sobre essa quantia, desde a data da citação até integral pagamento.

O réu recorreu da sentença, formulando as seguintes conclusões:

1 – Vem o presente recurso da sentença, aliás douta, que condenou o recorrente a pagar aos autores, (…) e (…), a quantia de € 100.000,00 acrescida de juros moratórios, à taxa supletiva legal em vigor desde a data da citação até integral e efectivo pagamento, bem como ao pagamento da quantia de € 7.000,00, a título de danos morais, acrescidos de juros de mora à taxa legal, calculados sobre aquela quantia desde a data da citação do réu até integral e efectivo pagamento.

2 – No entanto, por muito respeito que mereça o vertido na decisão a quo, com a mesma não se pode de modo algum concordar, sendo que a presente decisão veio surpreender sobremaneira o aqui recorrente, pois que, considerando o tribunal recorrido a presente acção procedente, não julgou correctamente.

3 – Com tal decisão, o juiz a quo violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos artigos 7.º, 290.º, n.º 1, al. a), 312.º a 314.º-D e 323.º a 323.º-D do CdVM; 220.º, 236.º e 595.º do C.C; artigos 607.º, n.ºs 4 e 5 e 615.º, n.º 1, al. b), do CPC.

4 – A presente acção não é mais do que a expressão do arrependimento dos autores num mau investimento, por outro lado, não nos podemos deixar guiar pela mais elementar simpatia por quem, de forma livre e consciente, contratou com o banco réu e vem agora, ao arrepio da verdade, deduzir uma pretensão insustentável.

5 – O banco réu, tal qual estava obrigado, prestou ao autor marido informações completas, verdadeiras, actuais, claras, objectivas e lícitas (nos termos e para os efeitos do artigo 7.º do Código de Valores Mobiliários), quanto às obrigações por estes subscritas, dando cumprimento não só à lei, mas também a uma política de transparência e de confiança pela qual sempre se pautou.

6 – Da prova produzida resulta, sem margem para dúvidas, que os autores sabiam perfeitamente o que estavam a subscrever, bem sabendo também das semelhanças e diferenças entre o instrumento financeiro subscrito e a figura do depósito a prazo (note-se que o próprio tratamento fiscal de um e de outro instrumento é inclusive diverso).

7 – Esta questão deve ser sempre apreciada à luz da cronologia em que se insere, relembrando que hoje são muitas as questões que se afiguram como óbvias e de essencial esclarecimento, mas que à data de 2004 não seriam imaginadas ou sequer colocadas prementemente pelas partes, nomeadamente as questões sobre um eventual incumprimento de obrigações de reembolso de qualquer aplicação financeira, e respectivas garantias.

8 – Por fim, vem o banco recorrente pronunciar-se no sentido de não se conformar com a matéria de facto dada como provada e descrita nos números 5, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 16, 17, 21 e 22, sustentando a consideração da mesma como não provada.

9 – Por outro lado, entende o recorrente que os factos dados como não provados nos números 2, 3, 4, 5, 6, 9, 10, 11 e 12 não deveriam constar do corpo da sentença nos termos ali propostos, em face da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento.

10 – Não foi sequer alegado pelos autores, e muito menos provado, que se tenha tornado impossível receberem (total ou parcialmente) o montante investido pelos autores na obrigação subscrita.

11 – A condenação do banco réu no pagamento da integralidade do valor desembolsado pelos autores é manifestamente excessiva e não cumpre com o critério teoria da diferença prevista no art. 566.º, n.º 2, do CC, na medida em que pode dar azo a uma cumulação de valores, entre aqueles que viessem a ser recebidos da emitente do título e os que já houvessem sido porventura pagos a título indemnizatório pelo réu.

12 – Contudo, o recorrente reitera aqui a sua discordância perante a douta sentença quanto ao incumprimento, nos termos do artigo 7.º do CdVM, dos deveres de informação, quanto aos princípios gerais da qualidade da informação: completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita.

13 – Os deveres de informação a prestar pelo intermediário financeiro, previstos no art. 312.º, n.º 1, do CdVM, são os deveres de informação relativos ao próprio contrato de intermediação financeira, v.g., ao negócio de cobertura! Já os artigos 323º, 323º-A, 323º-B e 323º-C do CdVM tratam dos deveres de informação próprios, relativos, inerentes ou decorrentes dos negócios de execução, levados a cabo ao abrigo dos negócios de cobertura, como aliás decorre das epígrafes dos artigos (por exemplo: deveres de informação no âmbito da execução de ordens, deveres de informação no âmbito da gestão de carteiras, etc.).

14 – O risco que a sentença associa maioritariamente a um fenómeno de incumprimento da obrigação assumida (neste caso incumprimento do reembolso da obrigação) ou até à insolvência do emitente, não é nem pode ser considerado um risco especial! O risco de incumprimento ou risco de insolvência de um devedor são riscos gerais de qualquer obrigação, precisamente porque são características nucleares de toda e qualquer obrigação.

15 – Assim, é evidente que a disposição do art. 312.º, n.º 1, alínea e), relativa aos “riscos especiais nas operações a realizar” em nada se relaciona com a matéria em crise nos presentes autos pois o que é invocado na P.I. é a prestação de uma informação falsa quanto ao instrumento financeiro em si e esta disposição, como vimos, diz respeito à prestação de informação acerca do negócio de intermediação ou de cobertura.

16 – Entendemos que nada ficou por dizer ou explicar quanto à natureza dos instrumentos financeiros.

17 – Nas quatro alíneas do n.º 2 do art. 312.º-E obriga a que a descrição dos riscos do tipo do instrumento em causa incluam. São estes e apenas estes os riscos do tipo do instrumento financeiro sobre os quais o intermediário financeiro tem que prestar informação!

18 – Não há necessidade de que a advertência do risco de perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso!

19 – A informação acerca do risco da perda do investimento tem que ser dada em função dos riscos próprios do tipo de instrumento financeiro, o que deve ser feito se e só se tais riscos de facto existirem!

20 – Em lado algum da lei resulta estar o intermediário financeiro obrigado a analisar ou avaliar a robustez financeira do emitente na actividade de intermediação financeira de recepção e transmissão de ordens. E também em lado nenhum da lei resulta a obrigação de prevenir o investidor acerca das hipóteses de incumprimento das obrigações assumidas pelo emitente do instrumento financeiro ou até da probabilidade de insolvência do mesmo.

21 – É que, se o intermediário financeiro estivesse obrigado a advertir o cliente do risco de incumprimento de terceiro, por maioria de razão, estaria também obrigado a advertir o cliente do risco de incumprimento (ou até de insolvência) dele próprio!

22 – Diga-se, até, que mesmo que se faça a comparação entre o instrumento financeiro e o depósito a prazo (que é o paradigma normalmente invocado de aplicação com capital e rentabilidade garantida), também não resulta das obrigações previstas no D.L. 430/91 de 02/11 a obrigação do banco advertir o seu cliente do risco da instituição não cumprir ou insolver!

23 – Mesmo nos regimes mais garantísticos do dever de informação dos clientes, como o são as regras relacionadas com o direito dos consumidores, nunca tais advertências são exigidas aos declarantes!

24 – O risco de incumprimento de uma obrigação de compra (subjacente naturalmente ao cumprimento da opção potestativa de venda) é um risco geral de qualquer obrigação! O incumprimento é uma caraterística latente a qualquer obrigação, que pode, ou não, vir a manifestar-se!

25 – A redacção do CdVM anterior à DMIF era muito mais ligeira na obrigação de informação do intermediário financeiro. E, então, não estava sequer tão densificado o dever de informação, conforme hoje resulta das disposições dos arts. 312.º-A a 312.º-G, que apenas foram aditadas com o já referido D.L. 357-A/2007 de 31/10. À data da contratação das aplicações não existia sequer qualquer dever de informação quanto aos riscos associados ao instrumento financeiro, ou quanto ao risco de perda da totalidade do investimento, conforme hoje decorre do art. 312.º-E n.º 2 alínea a)!

26 – A violação do dever de informação não implica qualquer presunção de ilicitude! E, portanto, tinham que ser os autores a alegar e provar que concretas informações é que o banco réu deveria ter dado, que não deu! Não o tendo feito, tem a presente acção necessariamente que claudicar!

27 – Os autores não alegaram nem provaram que se não fosse aquela putativa garantia de capital e juros, e a natureza subordinada das obrigações, não teriam subscrito as obrigações SLN 2004!

28 – Num primeiro momento é indispensável que o investidor prove que, sem a violação do dever de informação, não celebraria qualquer negócio, ou celebraria um negócio diferente do que celebrou. Num segundo momento é necessário provar que aquele negócio produziu um dano. E, num terceiro momento é necessário provar que esse negócio foi causa adequada daquele dano, segundo um juízo de prognose objectiva ao tempo da lesão. E nada disto foi provado!

29 – Não podendo, por fim, o Tribunal da Relação de Évora olvidar que a falta de reembolso ocorreu por efeito da insolvência da emitente e não por causa de qualquer deficiente informação ou actuação do intermediário financeiro.

30 – Não se verificando, assim, o nexo de causalidade adequada entre a actuação do recorrente enquanto intermediário financeiro e, o não reembolso, na maturidade, do capital investido.

31 – Parece-nos evidente e manifesto que os autores conheceram os termos em que o negócio foi concluído, designadamente a inexistência de garantia de capital e juros e a subordinação da obrigação aquando da recepção dos extractos bancários no seu domicílio, ou pelo menos em Novembro de 2008, data da nacionalização do recorrente! Data em que é facto público e notório que ocorreu uma corrida aos depósitos e levantamento dos mesmos. Não obstante, a acção apenas foi proposta em Março de 2018! E, portanto, já se encontrava prescrita qualquer putativa responsabilidade do banco réu!

32 – A sentença recorrida parece entender que a mera informação de capital garantido era suscetível de ser interpretada como uma vinculação do banco à obrigação de ele próprio garantir juridicamente o pagamento, ou em alternativamente, assumir ele próprio o pagamento em primeira linha.

33 – Diga-se antes de, mais que a teoria de impressão do destinatário vale para a interpretação de declarações negociais, mas já não para avaliar, por si só, da verdadeira existência de uma declaração negocial.

34 – Os autores parecem pretender valer-se de expressões soltas ditas a propósito da caracterização do instrumento financeiro objecto da intermediação para vir afirmar que, ao abrigo da impressão do destinatário, se convenceram que o banco assumiria obrigações a título principal.

35 – Sendo manifesta a falta de prova de que o banco, ou o seu funcionário em seu nome, se queria vincular a uma obrigação jurídica.

36 – As referências feitas pelo colaborador do banco sempre foram, só, de mera caracterização ou apresentação do produto, inexistindo qualquer declaração negocial, bem ou mal emitida, e, assim, qualquer obrigação jurídica – seja ela qualquer for - de fonte contratual.

37 – Não é porque foi afirmado ao recorrido que a aplicação financeira tinha “capital garantido”, que podemos legitimamente concluir que o banco assumiu a dívida da SLN.

38 – Em termos generalistas, poderá dizer-se que na fiança o fiador pretende responsabilizar-se acessória e, em geral, subsidiariamente, por uma dívida alheia; na assunção de dívida, o assuntor faz sua a obrigação que recaía sobre o devedor inicial, respondendo, assim, por dívida própria.

39 – Não se poderá deixar de concluir que não estaria certamente na mente do banco recorrente prescindir do direito de ficar sub-rogado nos direitos do credor, por qualquer pagamento que porventura fizesse em prol do emitente das obrigações, se tivesse assumido a dívida deste.

40 – Da conjugação do disposto nos artigos 628.º do Código Civil e 327.º do Código dos Valores Mobiliários, parece-nos manifesto que a garantia, para ser válida, teria necessariamente que constar do documento de subscrição.

41 – Não constando, mais não resta do que concluir que a mesma é nula, nos termos do art. 220.º do C.C.

42 – Além do mais, em lado algum invocam os autores a existência de uma garantia e exigem o cumprimento da mesma, logo, também por aqui uma tal condenação sempre seria nula por violação do disposto no art. 615.º n.º 1 alínea e) do CPC.

Termos em que deve dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença, e consequentemente, substituir-se por outra que julgue totalmente improcedente a acção proposta pelos recorridos.

Os recorridos contra-alegaram, pugnando pela improcedência do recurso.

O recurso foi admitido.


Objecto do recurso


As questões a resolver são as seguintes:

1 – Impugnação da decisão sobre a matéria de facto;

2 – Se o recorrente violou as suas obrigações enquanto intermediário financeiro e, na hipótese afirmativa, se se verificam os restantes pressupostos da responsabilidade civil;

3 – Se o recorrente prestou alguma garantia, em sentido técnico-jurídico, do cumprimento da obrigação de reembolso a cargo da SLN;

4 – Se se verifica a excepção de prescrição.


Factualidade apurada


Na sentença recorrida, foram julgados provados os seguintes factos:

1. O banco réu, até 2012 denominado BPN – Banco Português de Negócios, S.A. e daí em diante com a actual denominação, dedicava-se e dedica-se ao exercício da actividade bancária com intuitos lucrativos.

2. Os autores eram e são clientes da agência de (…) do banco réu, com a conta n.º (…), na qual movimentam, tanto a crédito, como a débito, parte do seu dinheiro e possuem as suas poupanças.

3. Através daquela conta os autores subscreveram duas Obrigações SLN Rendimento Mais 2004, no montante de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) cada uma, perfazendo o total de € 100.000,00 (cem mil euros), cujo reembolso deveria ter ocorrido em data não concretamente apurada do mês de Outubro de 2014, o que não se verificou, nem naquela data, nem até hoje.

4. As Obrigações SLN Rendimento Mais 2004 foram emitidas pela “SLN, SGPS, S.A.”, sociedade titular de 100% do capital social do BPN, participação que deteve de forma permanente até Novembro de 2008, altura em que foi nacionalizado.

5. Em data não concretamente apurada do mês de Outubro de 2004, mas que se situa entre o dia 11 e o dia 22, o gestor de cliente na agência de (…) do banco réu, (…), disse ao autor marido que tinha uma aplicação em tudo semelhante a um depósito a prazo, com capital garantido pelo banco e com rentabilidade assegurada.

6. O gestor de cliente da agência de (…) do banco réu, (…), sabia que o autor marido era uma pessoa que não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitisse saber os vários tipos de produtos financeiros e avaliar os riscos de cada um deles.

7. Motivos pelos quais sempre havia aplicado as suas poupanças em depósitos a prazo.

8. O autor marido é reformado por invalidez e emigrante há várias décadas em França.

9. Em data não concretamente apurada do mês de Outubro de 2004, mas que se situa entre o dia 11 e o dia 22, o autor marido aplicou a quantia de € 100.000,00 de que era titular juntamente com a autora, em Obrigações SLN Rendimento Mais 2004, sem que soubesse concretamente em que consistia tal produto financeiro.

10. O autor apenas autorizou a realização da aplicação porque o seu gestor de cliente na agência de (…) do banco réu lhe disse que o capital era garantido pelo mesmo banco, que os juros eram pagos semestralmente e que podia dispor total ou parcialmente do capital e/ou juros quando entendesse, bastando avisar a agência.

11. O autor marido agiu convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura em tudo semelhante a um depósito a prazo, cuja responsabilidade de reembolso era exclusivamente do banco réu.

12. Se o autor marido tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de Obrigações SLN Rendimento Mais 2004, produto financeiro de risco em que o capital não era garantido pelo banco réu, jamais o teria autorizado.

13. Nunca foi intenção do autor marido investir em produtos financeiros de risco, o que era do conhecimento do gestor de cliente na agência de Tomar do banco réu, estando o autor convicto de que aquele lhe restituiria o capital logo que o solicitasse.

14. O gestor de clientes na agência de (…) do banco réu assegurou ao autor que a aplicação que iria realizar tinha a mesma garantia que um depósito a prazo.

15. Donde a convicção do autor na segurança da aplicação cujos juros foram sendo semestralmente pagos, o que reforçou tal convicção e crença naquilo que lhe havia sido dito pelo gestor de clientes na agência de (…) do banco réu, situação que se manteve até o banco réu deixar de pagar os respectivos juros.

16. A direcção comercial do banco réu, anterior BPN, e os seus comerciais repetiam junto dos seus clientes, como fizeram com o autor marido, que se tratava de um investimento sólido, rentável e sem qualquer risco porque o banco garantia o reembolso do capital investido e dos juros.

17. O banco réu pretendia que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação destes produtos financeiros e passassem a ideia de que aos mesmos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e/ou juros, o que era garantido pelo próprio banco.

18. O gestor de clientes na agência de (…), (…), que lidava com o autor, sabia que este nunca havia em qualquer produto diverso de depósitos a prazo e nunca havia comprado ou vendido obrigações.

19. No mês seguinte ao da operação o autor recebeu por correio, em casa, um aviso de débito correspondente à subscrição efectuada, como também foi recebendo, desde então, um extracto periódico onde lhe aparecia essa obrigação como integrando a sua carteira de títulos.

20. Da mesma forma, quando eram creditados em conta os juros relativos aos cupões das obrigações, originava igualmente o competente registo no seu extractos e até a emissão de avisos de lançamento que lhe eram enviados para casa.

21. Na data do vencimento, o banco réu não restituiu ao autor o montante de € 100.000,00 que este lhe havia confiado.

22. A atitude do banco réu causou e continua a causar aos autores grande preocupação e ansiedade, com medo de não saber se e quando vão recuperar o seu dinheiro, bem como lhes acarretou tristeza uma vez que contavam com aquelas poupanças para poder passar uma velhice mais descansada e livre de preocupações económicas.

A sentença recorrida julgou não provados os seguintes factos:

1. O banco réu logrou recolher a assinatura do autor marido num “papel” que terá sido preenchido pelo gestor de clientes da agência de (…) sendo que a autora mulher nada assinou desconhecendo em absoluto a forma como foram adquiridas as Obrigações SLN Rendimento Mais 2004.

2. O investimento efectuado em Obrigações SLN Rendimento Mais 2004 era um investimento seguro e não um investimento em qualquer “produto de risco”.

3. Nesse momento não havia qualquer indicação de que a emissão pudesse vir a não ser paga ou qualquer ideia sobre o risco de insolvência do emitente.

4. Nunca o banco réu, através dos seus colaboradores, transmitiu aos seus clientes que garantia a emissão, até porque esse era um problema que não era sequer colocado pelos clientes ou imaginado pelos colaboradores.

5. O produto foi sempre apresentado com a obrigação de entrega do capital e dos juros ser da única e exclusiva responsabilidade da entidade emitente e não da entidade colocadora banco.

6. O banco réu, na pessoa dos seus funcionários, agiu de acordo com a vontade do autor marido.

7. O autor marido foi sempre uma pessoa informada, consciente, cuidadosa, que sempre investiu em produtos diferentes dos “normais” depósitos a prazo, como é o caso dos fundos de investimento.

8. O banco réu, tal qual estava obrigado, prestou ao autor informação completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita, quanto às obrigações por ele subscritas.

9. No momento da subscrição, o banco réu informou o autor marido de que as obrigações eram emitidas pela sociedade que detinha o banco réu – a SLN, Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.

10. E que o reembolso antecipado da emissão só era possível por iniciativa da SLN, Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., a partir do quinto ano e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal.

11. O autor marido foi, ainda, informado que a única forma do investidor liquidar este produto de forma unilateral seria transmitindo as suas obrigações a um terceiro interessado, mediante endosso.

12. O banco réu cumpriu então com todos os seus deveres de informação, designadamente informando o autor marido sobre todos os elementos que constavam da nota informativa do produto, que ademais se encontrava disponível para consulta pelo mesmo.


Fundamentação


1 – Impugnação da decisão sobre a matéria de facto:

O recorrente pretende a alteração da decisão sobre a matéria de facto no sentido de o conteúdo dos n.ºs 5, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 16, 17, 21 e 22 dos factos provados ser julgado não provado e de o conteúdo dos n.ºs 2, 3, 4, 5, 6, 9, 10, 11 e 12 dos factos não provados ser julgado provado. Contudo, não há razão para proceder a tal alteração.

O meio de prova fundamental sobre a matéria dos n.ºs 5, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 16, 17 e 21 dos factos provados e dos n.ºs 2, 3, 4, 5, 6, 9, 10, 11 e 12 dos factos não provados é o depoimento da testemunha (…), empregado do recorrente, gestor de cliente dos recorridos à data da subscrição das obrigações dos autos e interlocutor do recorrido Joaquim nessa subscrição. Resulta muito claramente desse depoimento que as coisas se passaram como o tribunal a quo julgou provado e que, consequentemente, a versão factual contrária, sustentada pela recorrente, tinha de ser julgada não provada. A fundamentação da convicção feita na sentença recorrida é certeira, completa e esclarecedora, pelo que a damos aqui por reproduzida, sem necessidade de repetições.

O recorrente centra a sua crítica na ausência de prova documental da prestação, por si, de uma garantia de reembolso do capital investido, pelo que, conclui, o tribunal a quo não podia ter julgado a mesma como provada. Porém, salvo o devido respeito, esta argumentação do recorrente não passa, aparentemente, de uma tentativa de desfocar a questão. Não é a prestação de uma garantia, em sentido técnico-jurídico, pelo recorrente, que está em discussão, nem foi isso que o tribunal a quo julgou provado. Aquilo que foi julgado provado, e bem, foi que o empregado do recorrente que levou o recorrido (…) a subscrever as obrigações em causa, ao descrever-lhe as características deste produto financeiro, afirmou que se tratava de capital “garantido” pelo recorrente no sentido corrente do termo, ou seja, que não existia o risco de perda desse capital, havendo reembolso do mesmo em qualquer caso. O referido empregado do recorrente, a testemunha (…), disse-o repetidamente ao longo do seu depoimento. Logo, carece de fundamento a crítica que o recorrente dirige, neste aspecto, à sentença recorrida.

Relativamente ao conteúdo dos n.ºs 11 e 14 dos factos provados, a crítica que o recorrente dirige à sentença recorrida é manifestamente improcedente, pois baseia-se em factos ocorridos no ano de 2008 quando está em causa uma subscrição efectuada no ano de 2004.

O mesmo se diga do apelo que o recorrente faz aos extractos bancários que remetia periodicamente aos recorridos, pois trata-se de factos posteriores à subscrição.

O recorrente invoca, por outro lado, o teor do boletim de subscrição das obrigações (documento esse que nem sequer consta dos autos) para tentar convencer que o recorrido (…) conhecia as características do produto financeiro que subscreveu, bem como a entidade emitente. Contudo, o depoimento da testemunha (…) não deixa margem para dúvidas sobre esta matéria. A forma como aquele produto financeiro foi apresentado ao recorrido (…) foi de molde a induzi-lo em erro acerca das referidas características e foi nessas circunstâncias que o boletim de subscrição terá sido assinado. Dizer-se, como o recorrente diz, que o boletim de subscrição foi “regular e conscientemente assinado pelo autor marido” é ignorar por completo o sentido do depoimento daquela testemunha. Atenta a forma como foi levado a subscrever as obrigações em causa, o recorrido (…) não estava consciente, mas sim completamente enganado acerca da natureza e características daquelas.

No que concerne ao conteúdo do n.º 22 dos factos provados, o recorrente, depois de tecer diversas considerações genéricas e sem relevância, afirma que não podia o mesmo ter sido julgado provado devido a ausência de qualquer tipo de prova. Porém, não é assim, porquanto os factos em questão foram confirmados pela testemunha (…), tal como se refere na sentença recorrida. Mais uma vez, a crítica que o recorrente dirige a esta última carece, em absoluto, de fundamento.

Concluindo, o tribunal a quo julgou correctamente a matéria de facto, pelo que inexiste fundamento para se proceder a qualquer das alterações pretendidas pelo recorrente.

2 – Se o recorrente violou as suas obrigações enquanto intermediário financeiro e, na hipótese afirmativa, se se verificam os restantes pressupostos da responsabilidade civil:

Inexiste controvérsia relativamente à qualificação da relação jurídica que se estabeleceu entre o recorrente e o recorrido (…) como sendo de intermediação financeira. Assim se julgou na sentença recorrida e, nessa parte, o recorrente não pôs esta última em causa.

Está em causa saber se, na qualidade em que interveio na subscrição das “Obrigações SLN Rendimento Mais 2004”, isto é, de intermediário financeiro, o recorrente incorreu em responsabilidade civil. Mais precisamente, está em causa saber se o recorrente violou culposamente os deveres que a lei põe a cargo do intermediário financeiro em matéria de prestação de informação ao subscritor, a qualificação dessa culpa, a verificação de um prejuízo na esfera do subscritor e a indagação da existência de um nexo de causalidade entre a referida violação de deveres e o prejuízo ocorrido.

Para a determinação dos deveres de informação a cargo do intermediário financeiro e das consequências jurídicas da sua violação, importa atentar no disposto nos artigos 7.º, n.º 1, 304.º, 312.º e 314.º do Código dos Valores Mobiliários (CVM). Uma vez que estamos perante factos ocorridos em 2004, teremos em consideração a redacção dos referidos preceitos legais então vigente.

O artigo 7.º, sob a epígrafe “qualidade da informação”, estabelecia, no seu n.º 1, na parte que nos interessa, que deve ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita a informação respeitante a valores mobiliários, a ofertas públicas, a mercados de valores mobiliários, a actividades de intermediação e a emitentes que seja susceptível de influenciar as decisões dos investidores.

O artigo 304.º estabelecia que os intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado (n.º 1), que, nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência (n.º 2), que, na medida do que for necessário para o cumprimento dos seus deveres, o intermediário financeiro deve informar-se sobre a situação financeira dos clientes, a sua experiência em matéria de investimentos e os objectivos que prosseguem através dos serviços a prestar (n.º 3) e que estes princípios e os deveres referidos nos artigos seguintes são aplicáveis aos titulares do órgão de administração do intermediário financeiro e às pessoas que efectivamente dirigem ou fiscalizam cada uma das actividades de intermediação (n.º 5).

O n.º 1 do artigo 312.º estabelecia que o intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efectivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo nomeadamente as respeitantes a riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar (al. a)). O n.º 2 do mesmo artigo dispunha que a extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente.

O artigo 314.º estatuía que os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua actividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública (n.º 1) e que a culpa do intermediário financeiro se presume quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação (n.º 2).

Analisemos, à luz destas normas, a actuação do recorrente que resulta dos factos provados.

Em Outubro de 2004, o recorrente, através de um seu empregado que sabia que o recorrido (…) não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitisse conhecer os vários tipos de produtos financeiros e avaliar os riscos de cada um deles e, por isso, sempre aplicara as suas poupanças em depósitos a prazo, prestou, àquele recorrido, a seguinte informação acerca do produto financeiro que o mesmo acabou por subscrever: tratava-se de uma aplicação em tudo semelhante a um depósito a prazo, com capital garantido pelo recorrente e rentabilidade assegurada; os juros eram pagos semestralmente; o subscritor podia dispor total ou parcialmente do capital e/ou juros quando entendesse, bastando avisar a agência; essa aplicação tinha a mesma garantia que um depósito a prazo.

Não foi apenas ao recorrido (…) que o recorrente prestou este tipo de informação relativamente ao produto financeiro em causa. A direcção comercial do recorrente e os seus comerciais repetiam, junto dos seus clientes, como fizeram com aquele recorrido, que se tratava de um investimento sólido, rentável e sem qualquer risco porque o recorrente garantia o reembolso do capital investido e dos juros. Mais, o recorrente pretendia que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação deste produto financeiro e passassem a ideia de que ao mesmo não estava associado qualquer risco quanto ao reembolso do capital e/ou juros, o que era por si garantido.

Aquilo que posteriormente se verificou foi precisamente o oposto do que fora garantido ao recorrido (…). O produto financeiro subscrito não era um depósito a prazo, não tinha qualquer semelhança com um depósito a prazo, não era seguro e tudo isso determinou que os recorridos, até hoje, não tenham sido reembolsados do capital investido.

É evidente que a informação prestada pelo recorrente foi, mais que incompleta, enganosa.

Foi enganosa, desde logo, porque as obrigações constituem um produto financeiro distinto de um depósito a prazo.

O n.º 1 do artigo 348.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC) estabelece que as sociedades anónimas podem emitir valores mobiliários que, numa mesma emissão, conferem direitos de crédito iguais e que se denominam obrigações. Uma obrigação é, pois, um título representativo de uma quantia emprestada a uma sociedade, de natureza diferente da dos depósitos a prazo em bancos, desde logo por envolver um risco significativo de perda do capital investido, indubitavelmente maior que nos referidos depósitos. Nomeadamente, a garantia do reembolso efectivo do capital emprestado está dependente da solidez da situação económica do emitente e não goza da protecção que a lei dispensa aos depósitos bancários.

A informação prestada pelo recorrente também foi enganosa no que concerne à identificação da entidade emitente das obrigações. Não ficou claro que não era o recorrente quem ficava obrigado ao reembolso da quantia entregue. Ao contrário, a forma como o empregado do recorrente que determinou o recorrido (...) a subscrever as obrigações da SLN apresentou este produto financeiro, afirmando que se tratava de uma aplicação semelhante a um depósito a prazo e com capital garantido pelo banco (entenda-se, cuja responsabilidade de reembolso era exclusivamente deste último, conforme n.º 11 dos factos provados), era de molde a induzir uma pessoa com as características deste último (cfr. n.ºs 6 a 8 dos factos provados) em erro acerca da própria entidade emitente. E foi precisamente isso que aconteceu, pois provou-se que o recorrido (…) subscreveu as obrigações da SLN sem saber concretamente em que consistia tal produto financeiro e, mais que isso, que, se ele conhecesse a verdadeira natureza deste último, jamais o teria subscrito.

Toda a descrita actuação do recorrente está nos antípodas das exigências, decorrentes das normas acima citadas, de que o intermediário financeiro tenha uma actuação de acordo com os ditames da boa-fé e com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, orientada no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes, prestando informação completa, verdadeira, clara, objectiva e suficiente para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada por parte do cliente, incluindo as respeitantes a riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar. A descrita actuação do recorrente foi, manifestamente, o contrário de tudo isto, induzindo dolosamente o recorrido (…) em erro sobre a natureza da aplicação financeira, a entidade emitente e o risco a ela associado. Ao descrever a aplicação financeira que determinou o recorrido (…) a subscrever nos termos que acima ficaram descritos, o recorrente prestou informação falsa, com o evidente intuito de o enganar. Assim o determinou a subscrever um produto financeiro com características diversas daquelas que lhe foram anunciadas. Tal actuação do recorrente foi, pois, ilícita e culposa, mais precisamente dolosa. O recorrente quis e conseguiu enganar o recorrido (…).

Carece, assim, de fundamento a interpretação dos preceitos do CVM que o recorrente propõe nas suas alegações, da qual resultaria a conformidade da descrita actuação do recorrente com os deveres de informação do cliente que decorrem daquele diploma legal, ainda que esse mesmo cliente tenha as características do recorrido (…). Saliente-se que o recorrente não se limitou a omitir informação relevante. O recorrente prestou, deliberadamente, informação falsa. A subscrição de uma obrigação de uma sociedade, mesmo se esta for a proprietária do recorrente, não é um depósito a prazo, não tem a mesma garantia que um depósito a prazo, não tem qualquer semelhança com um depósito a prazo e não tinha o seu reembolso garantido pelo recorrente. E o recorrente não podia deixar de saber perfeitamente tudo isto e que, ao dizer coisa diversa aos seus clientes com vista a levá-los a subscrever obrigações da SLN, estava a prestar-lhes informação falsa e a induzi-los em erro. Tal como o recorrente afirma nas suas alegações, não se espera que o intermediário financeiro seja “tutor do investidor”. Mas exige-se-lhe, seguramente, que não engane o investidor, levando-o a subscrever produtos financeiros mediante a prestação de informação deliberadamente falsa. É disto que verdadeiramente se trata neste processo.

O risco que a subscrição das obrigações da SLN envolvia concretizou-se, pois os recorridos nunca foram reembolsados do capital investido. Em consequência disso, o património dos recorridos sofreu uma diminuição de € 100.000,00 o que consubstancia um dano indemnizável. Além disso, os recorridos sofreram os danos não patrimoniais descritos no n.º 22 dos factos provados.

A existência de um nexo de causalidade entre a actuação ilícita e culposa do recorrente e os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelos recorridos também não oferece dúvida. Tais danos não teriam ocorrido se o recorrido (…) não tivesse subscrito as obrigações que o recorrente, através da dolosa prestação de informação falsa, o determinou a subscrever.

Verificam-se, assim, todos os pressupostos da responsabilidade civil estabelecida no citado artigo 314.º do CVM, tal como se decidiu na sentença recorrida, pelo que não merece crítica a condenação do recorrente a indemnizar os recorridos dos danos patrimoniais e não patrimoniais por estes sofridos em consequência da sua actuação.

3 – Se o recorrente prestou alguma garantia, em sentido técnico-jurídico, do cumprimento da obrigação de reembolso a cargo da SLN:

Nas conclusões 32 a 42, o recorrente, no aparente pressuposto de que o tribunal a quo o condenou na qualidade de garante da obrigação de reembolso a que a SLN se encontra vinculada, desenvolve uma argumentação tendente a demonstrar que tal garantia não foi por si prestada. Porém, aquele pressuposto não se verifica. O recorrente foi condenado com fundamento em responsabilidade civil decorrente da violação dos seus deveres como intermediário financeiro, por ter prestado informação falsa ao recorrido (…) acerca do produto financeiro que este último subscreveu, e não em qualquer garantia da obrigação de reembolso a cargo da SLN que tenha prestado. A sentença recorrida não suscita qualquer dúvida a este respeito. Sendo assim, a questão suscitada pelo recorrente não tem razão de ser.

4 – Se se verifica a excepção de prescrição:

O n.º 2 do artigo 324.º do CVM estabelece que, salvo dolo ou culpa grave, a responsabilidade do intermediário financeiro por negócio em que haja intervindo nessa qualidade prescreve decorridos dois anos a partir da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão do negócio e dos respectivos termos.

Concluímos anteriormente que o recorrente violou os seus deveres de informação dolosamente. Consequentemente, não se aplica o prazo de prescrição estabelecido na norma citada, mas sim o prazo ordinário de 20 anos, fixado no artigo 309.º do Código Civil. Logo, não ocorreu a prescrição.

Em conclusão:

O recurso deverá ser julgado improcedente, mantendo-se integralmente a sentença recorrida.

Sumário:

(…)


Decisão


Acordam os juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso improcedente, confirmando a sentença recorrida.

Custas a cargo do recorrente.

Notifique.

Évora, 27 de Junho de 2019

Vítor Sequinho dos Santos (relator)

José Manuel Barata

Conceição Ferreira