Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | PAULA DO PAÇO | ||
Descritores: | CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL CONDUTOR POR CONTA DE OUTREM REGISTO DO TEMPO DE TRABALHO DIAS DE TRABALHO SÓCIO GERENTE | ||
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Data do Acordão: | 09/14/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | I- A não apresentação das folhas de registo de tacógrafo do dia em curso e dos 28 dias anteriores, quando solicitada por agente encarregado da fiscalização, constitui contraordenação muito grave, nos termos previstos pelo artigo 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27/2010, de 30 de agosto, conjugado com o artigo 36.º, n.º 1, do Regulamento (UE) 165/2014, de 4 de Fevereiro. II- É a obrigação de apresentação que constitui o dever imposto pela norma. III- Não sendo apresentadas todas ou alguma(s) das aludidas folhas de registo, deve o condutor apresentar um documento comprovativo que justifique a ausência das folhas de registo em relação aos dias em falta, pois só por esta via, o agente encarregado da fiscalização pode concluir que todas as folhas existentes com referência ao período temporal imposto pela norma, lhe foram apresentadas ou não e, nesta última situação, autuar o agente infrator. IV- Mesmo que o motorista seja o sócio-gerente da sociedade proprietária do veículo, deverá fazer-se acompanhar das exigidas folhas de registo ou de “declaração de atividade” (ainda que por si assinada) ou de outro documento idóneo que justifique a não apresentação de algum ou alguns registos de tacógrafo. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] I. Relatório “Camionagem De Carga Sul Frio, Lda.” impugnou judicialmente a decisão da Autoridade Para As Condições de Trabalho (ACT), que lhe aplicou uma coima de € 2.900,00, pela prática de uma contraordenação laboral, em violação do artigo 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27 /2010, de 30 de agosto, com referência ao artigo 36.º, n.º 1, do Regulamento (UE) 165/2014, de 4 de Fevereiro. Foi igualmente aplicada a sanção acessória de publicidade e foi condenado o sócio gerente da sociedade, solidariamente, pelo pagamento da coima. A 1.ª instância julgou a impugnação procedente e absolveu a impugnante da prática da contraordenação imputada. O Ministério Público interpôs recurso da sentença, finalizando as suas alegações com as seguintes conclusões: «1. A ACT – Unidade Local de Portimão decidiu, em 29 de dezembro de 2022, condenar naquele processo a arguida "Camionagem de Carga Sul Frio, Lda.", na coima de 2.900,00 € pela prática de uma contraordenação laboral, por violação do disposto no artigo 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27 /2010, de 30 de agosto, em conjugação com o disposto no artigo 36º, n.º 1 do Regulamento (EU) 165/2014, de 4 de fevereiro. 2. A arguida impugnou judicialmente aquela decisão e, com a douta sentença de 12.04.2023, o Tribunal decidiu julgar procedente aquela impugnação, revogando a decisão recorrida e absolvendo a arguida/recorrente da contraordenação cuja prática lhe havia sido imputada. 3. No essencial, a factualidade que estava na base da decisão da autoridade administrativa, com apoio na qual foi imputada à arguida a responsabilidade pela prática da referida contraordenação, provou-se no julgamento, ficando designadamente assente que: 1. 1. A arguida desenvolve a atividade de transporte rodoviário de mercadorias desde 01-10-2007. 2. A arguida é legalmente responsável pelo seu sócio-gerente AA, que exerce tais funções desde 16-11-2017. 3. No dia 03-06-2019, pelas 08h20m, ao km 235,3, em Paderne, concelho de Albufeira, circulava o veículo pesado de mercadorias, com a matrícula 42-20-FZ, propriedade da arguida, que era conduzido por AA. 4. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, o condutor não se fazia acompanhar de todos os registos de tacógrafo dos últimos 28 dias. 5. Na verdade, o condutor apenas tinha em sua posse o registo/ disco referente à jornada em curso (03-06-2019). 6. Ao ser intercetado pela Guarda Nacional Republicana, o condutor da viatura identificada não apresentou, a pedido do agente fiscalizador, qualquer declaração de atividade ou outro documento, quer fisicamente quer em formato digital, para os dias em falta que antecederam o dia da fiscalização (03/06/2019). 4. A recorrente sustentou que não praticou a infração que lhe foi imputada, uma vez que o trabalhador fiscalizado (gerente) não efetuou a condução de qualquer veículo pesado de mercadorias nos 28 dias anteriores à fiscalização, razão pela qual não podia ter em seu poder as folhas de registo de atividade, circunstância que em seu entender deve afastar o cometimento da infração. 5. Efetivamente provou-se que «nos 28 dias anteriores à fiscalização AA não efetuou a condução de qualquer veículo pesado de mercadorias», razão pela qual não tinha registos de tacógrafo para apresentar relativos a esses dias. 6. Porém, o Tribunal considerou irrelevante a circunstância de o motorista não ter exibido ao agente fiscalizador qualquer documento que justificasse a não apresentação de registos de tacógrafos relativos aos mencionados dias, referindo que «dada a qualidade de sócio-gerente da arguida, exigir uma “declaração de atividade” ou um “documento idóneo” comprovativo da ausência de atividade de condução no período considerado, a nosso ver, constituiria uma absoluta redundância uma vez que tal “declaração” ou “documento idóneo” seria emitido pela mesma pessoa a quem se destinaria, por ocorrer uma absoluta coincidência entre o “sócio-gerente” da arguida a quem competiria emitir o documento, na qualidade de entidade empregadora, e o “condutor” visado, beneficiário dessa “declaração” e “trabalhador” da empresa». 7. Considerou, por isso o Tribunal que nestas situações particulares, para obstar à ilicitude da conduta infratora, será suficiente a declaração do próprio gerente a atestar a ausência de condução nos 28 dias anteriores e a demonstração efetiva de que tal atividade não ocorreu, como se verificou no caso vertente», razão pela qual absolveu a arguida da prática da contraordenação pela qual havia sido condenada. 8. Não concordamos com esta decisão do Tribunal “a quo”, pois entendemos que a não apresentação das folhas de registos do dia em curso da fiscalização e dos 28 dias anteriores deve ser justificada no ato da fiscalização, perante os agentes fiscalizadores, o que pode ser feito mediante a apresentação de uma declaração justificativa que confirme as razões dessa não apresentação, designadamente através da “declaração de atividade” ou com qualquer outro documento idóneo, sendo que o tipo objetivo da infração fica preenchido com a não apresentação imediata ao agente fiscalizador dos registos supra referidos. 9. E, mesmo que o motorista seja o gerente da sociedade proprietária do veículo, deverá fazer-se acompanhar da referida “declaração de atividade” (ainda que por si assinada) ou de outro documento idóneo que justifique a não apresentação dos registos de tacógrafo relativos aos 28 dias anteriores ao da fiscalização. 10. A exibição, no ato de fiscalização em estrada, dessa declaração justificativa do não cumprimento da referida obrigação é a única forma que permite a exclusão da ilicitude relativa à falta de apresentação dos registos exigidos pela lei. 11. A prova posteriormente apresentada pelo próprio motorista/gerente no sentido de que não conduziu nos mencionados 28 dias anteriores é irrelevante no sentido de excluir a responsabilidade da arguida. 12. Consequentemente, o Tribunal não devia ter considerado que se encontrava excluída a responsabilidade da arguida pela prática da contraordenação relativamente à qual havia sido condenada com a decisão da entidade administrativa competente. 13. Quando as contraordenações são praticadas pelos trabalhadores no exercício das respetivas funções, em princípio a responsabilidade é do empregador, conforme resulta do n.º 1 do artigo 551.º do Código do Trabalho, do n.º 1 do artigo 13º da Lei n.º 27/2010, de 30 de agosto, e do n.º 3 do artigo 10.º do Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15.03.2006, pelo que, tendo em consideração os factos provados, o Tribunal devia ter concluído no sentido de que a arguida cometeu a infração de cuja prática foi absolvida. 14. Pelo exposto, ao absolver a arguida, o Tribunal não decidiu em conformidade com os factos provados e com o direito aplicável, violando assim o disposto no artigo 551.º do Código do Trabalho, nos artigos 13.º e 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27 /2010, de 30 de agosto e no artigo 36.º do Regulamento (UE) n.º 165/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 04.02.2014. 15. Acresce que, de acordo com o n.º 3 do mencionado artigo 551.º do Código do Trabalho, quando o infrator é uma pessoa coletiva ou equiparada, respondem pelo pagamento da coima, solidariamente com aquela, os respetivos administradores, gerentes ou diretores, pelo que o sócio-gerente da arguida AA (o qual não impugnou a decisão administrativa) deve ser condenado no pagamento da coima como responsável solidário, tal como foi decidido pela autoridade administrativa - Autoridade para as Condições do Trabalho. 16. Apela-se, por isso, a V. Exas., Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Évora, no sentido de que revoguem a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que condene a arguida "Camionagem de Carga Sul Frio, Lda." na coima de 2.900,00 € e na sanção acessória de publicidade da decisão condenatória, pela prática de uma contraordenação laboral, por violação do disposto no artigo 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27 /2010, de 30 de agosto, condenando ainda como responsável solidário no pagamento da referida coima, o sócio-gerente da arguida AA.». A 1.ª instância admitiu o recurso, com subida imediata, nos próprios autos, atribuindo-lhe efeito meramente devolutivo. Não foi apresentada resposta ao recurso. O processo subiu à Relação e, na sequência da abertura de “Vista”, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso. Não foi oferecida resposta. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. * II. Objeto do recursoÉ consabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso – artigos 403.º e 412.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal, ex vi do artigo 41.º, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro (RGCO) e artigos 50.º, n.º 4 e 60.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro. Em função destas premissas, importa analisar se o recorrido praticou a infração que lhe havia sido imputada pela ACT, extraindo-se as devidas consequências do que se vier a decidir. * III. Matéria de FactoA 1.ª instância considerou provada a seguinte factualidade: 1. A arguida desenvolve a atividade de transporte rodoviário de mercadorias desde 01-10-2007. 2. A arguida é legalmente responsável pelo seu sócio-gerente AA, que exerce tais funções desde 16-11-2017. 3. No dia 03-06-2019, pelas 08h20m, ao km 235,3, em Paderne, concelho de Albufeira, circulava o veículo pesado de mercadorias, com a matrícula 42-20-FZ, propriedade da arguida, que era conduzido por AA. 4. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, o condutor não se fazia acompanhar de todos os registos de tacógrafo dos últimos 28 dias. 5. Na verdade, o condutor apenas tinha em sua posse o registo/ disco referente à jornada em curso (03-06-2019). 6. Ao ser intercetado pela Guarda Nacional Republicana, o condutor da viatura identificada não apresentou, a pedido do agente fiscalizador, qualquer declaração de atividade ou outro documento, quer fisicamente quer em formato digital, para os dias em falta que antecederam o dia da fiscalização (03/06/2019); 7. Nos 28 dias anteriores à fiscalização AA não efetuou a condução de qualquer veículo pesado de mercadorias. 8. A arguida apresentou um volume de negócios de O € no ano de 2018, possuindo 3 trabalhadores por conta de outrem ao seu serviço a 31-12-2018. 9. A arguida é reincidente e foi condenada por infração muito grave, praticada a 21-06-2012, no processo de contraordenação laboral n.º 201200602, com a referência n.0 201200941, com coima aplicada no valor de € 2.080,00. * IV. Enquadramento jurídicoConforme resulta do relatório desta peça processual, a ACT aplicou ao recorrido uma coima de € 2.900,00, pela prática de uma contraordenação laboral, em violação do artigo 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27 /2010, de 30 de agosto, com referência ao artigo 36.º, n.º 1, do Regulamento (UE) 165/2014, de 4 de Fevereiro. Analisemos. Estatui o mencionado artigo 25.º, sob a epígrafe “Apresentação de dados a agente encarregado da fiscalização”: 1-Constitui contraordenação muito grave a não apresentação, quando solicitada por agente encarregado da fiscalização: a) De folhas de registo e impressões, bem como de dados descarregados do cartão do condutor; b) De cartão de condutor, das folhas de registo utilizadas e de qualquer registo manual e impressão efetuados, que o condutor esteja obrigado a apresentar; c) De escala de serviço com o conteúdo e pela forma previstos na regulamentação comunitária aplicável. Este normativo conjuga-se com o artigo. 36. º do Regulamento (EU) n.º 165/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, que dispõe o seguinte: Registos que devem acompanhar o condutor 1. Se conduzirem um veículo equipado com tacógrafo analógico, os condutores devem apresentar, quando os agentes de controlo autorizados o solicitem:i) As folhas de registo do dia em curso e as utilizadas pelo condutor nos 28 dias anteriores; ii) O cartão de condutor, se o possuir; e iii) Qualquer registo manual e impressão efetuados durante o dia em curso e nos 28 dias anteriores, tal como previsto no presente regulamento e no Regulamento (CE) n.º 561/2006. 2. Se conduzirem um veículo equipado com tacógrafo digital, os condutores devem apresentar, quando os agentes de controlo autorizados o solicitem: i) O seu cartão de condutor; ii) Qualquer registo manual e impressão efetuados durante o dia em curso e nos 28 dias anteriores, nos termos do presente regulamento e no Regulamento (CE) n.º 561/2006; iii) As folhas de registo correspondentes ao período referido na alínea ii), no caso de terem conduzido um veículo equipado com tacógrafo analógico. 3. Os agentes autorizados de controlo podem verificar o cumprimento do Regulamento (CE) n.º 561/2006 através da análise das folhas de registo ou dos dados, visualizados, impressos ou descarregados registados pelo tacógrafo ou pelo cartão de condutor ou, na falta destes meios, da análise de qualquer outro documento comprovativo que permita justificar o incumprimento de quaisquer disposições, como as do artigo 29.º, n.º 2, e do artigo 37.º, n.º 2, do presente regulamento. De acordo com as aludidas normas legais, o condutor que conduza veículo equipado com tacógrafo deve apresentar, quando os agentes de controlo o solicitem, as folhas de registo do dia em curso e dos 28 dias anteriores (dias de calendário, subentenda-se). A não apresentação das folhas de registo, quando solicitada por agente encarregado da fiscalização, constitui contraordenação muito grave, nos termos previstos pelo artigo 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27/2010, de 30 de agosto. De modo reiterado, esta Secção Social vem considerando, unanimemente, que o artigo 36.º do Regulamento (UE) n.º 165/2014, pretende, essencialmente, assegurar a imediata apresentação aos agentes do controlo das folhas de registo utilizadas no dia em curso e nos 28 dias anteriores.[2] Nos termos legais, é a obrigação de apresentação que constitui o dever imposto pela norma. Não sendo apresentadas todas ou alguma(s) das aludidas folhas de registo, deve o condutor apresentar um documento comprovativo que justifique a ausência das folhas de registo em relação aos dias em falta, pois só por esta via, o agente encarregado da fiscalização pode concluir que todas as folhas existentes com referência ao período temporal imposto pela norma, lhe foram apresentadas ou não e, nesta última situação, autuar o agente infrator.[3] No caso que se aprecia, com arrimo nos factos provados, apurou-se que no âmbito de uma ação de fiscalização rodoviária, realizada no dia 03/06/2019, o socio gerente do recorrido, que conduzia um veículo pesado de mercadorias, propriedade do recorrido, não se fazia acompanhar de todos os registos de tacógrafo dos últimos 28 dias. Não está em causa a qualidade de “condutor” do sócio gerente para efeitos da referida legislação, pelo que não há necessidade de analisar essa matéria. O que sucedeu foi que o tribunal a quo considerou que o recorrido não praticou a infração contraordenacional com apoio na seguinte fundamentação: «Na situação em apreço, o condutor AA, conforme ficou provado, nos 28 dias anteriores à fiscalização não efetuou a condução de qualquer veículo pesado de mercadorias. Contudo, dada a qualidade de sócio-gerente da arguida, exigir uma «declaração de atividade» ou um «documento idóneo» comprovativo da ausência de atividade de condução no período considerado, a nosso ver, constituiria uma absoluta redundância uma vez que tal «declaração» ou «documento idóneo» seria emitido pela mesma pessoa a quem se destinaria, por ocorrer uma absoluta coincidência entre o «sócio-gerente» da arguida a quem competiria emitir o documento, na qualidade de entidade empregadora, e o «condutor» visado, beneficiário dessa «declaração» e «trabalhador» da empresa. Salvo melhor opinião, nestas situações particulares, para obstar à ilicitude da conduta infratora, será suficiente a declaração do próprio gerente a atestar a ausência de condução nos 28 dias anteriores e a demonstração efetiva de que tal atividade não ocorreu, como se verificou no caso vertente. Em suma, provando-se - como se provou - que o condutor não conduziu veículos equipados com tacógrafo no período identificado na decisão administrativa, conforme declarou, pelas razões que se vêm aduzindo, não incorre a empresa arguida em qualquer contraordenação por falta de apresentação dos registos tacográficos desse período, por se achar excluída a ilicitude da conduta. Por esse motivo, concede-se total provimento ao recurso, impondo-se a absolvição da arguida da prática da contraordenação imputada, em violação do artigo 25.º, n.0 1, da Lei n.0 27 /2010, de 30 de Agosto, com referência ao artigo 36.º, n.º 1, do Regulamento (UE) 165/2014, de 4 de Fevereiro.». Salvo o devido respeito, que é muito, afigura-se-nos que o entendimento manifestado pelo Meritíssimo Juiz a quo não tem fundamento legal. O que a legislação impõe é que, no ato de fiscalização, o condutor, independentemente de ser sócio-gerente, ou não, da empresa responsável pela circulação rodoviária do veículo, seja possuidor da totalidade das folhas de registos referentes ao dia em curso e aos últimos 28 dias de trabalho, ou de qualquer documento justificativo, declaração ou outro documento de atividade, que permita justificar os períodos sem registo ao agente de autoridade. O dever imposto pelos artigos anteriormente mencionados não se satisfaz através de qualquer declaração verbal que vise justificar a falta de algum ou de alguns registos e, muito menos, com a prova, em sede de julgamento, de que o condutor não conduziu nos 28 dias anteriores. Em suma, resultando dos factos apurados que o condutor não apresentou ao agente fiscalizador as folhas de registo dos últimos 28 dias, ou qualquer declaração ou outro documento de atividade, que permitisse justificar a omissão, entendemos que se mostra preenchido o elemento objetivo do ilícito em causa. Quanto ao elemento subjetivo do ilícito, o artigo 13.º da Lei n.º 27/20010, de 30 de agosto, estipula que a empresa é responsável por qualquer infração cometida pelo condutor, ainda que fora do território nacional, a não ser que demonstre haver organizado o trabalho de modo a que o condutor possa cumprir com as determinações legais Infere-se dos factos provados que o recorrido não logrou provar que organizou o trabalho de modo a que o condutor pudesse cumprir o disposto no artigo 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27 /2010, de 30 de agosto, com referência ao artigo 36.º, n.º 1, do Regulamento (UE) 165/2014, de 4 de Fevereiro. Logo, o recorrido atuou negligentemente por não ter agido com o dever de cuidado a que estava obrigado e de que era capaz. Destarte, a factualidade provada é suficiente para se concluir pela imputação (objetiva e subjetiva) do ilícito contraordenacional ao recorrido. Em face do exposto, e tendo-se concluído pela prática da infração contraordenacional, resta-nos aplicar a medida sancionatória concreta. Está em causa a prática de uma infração muito grave que, de acordo com o artigo 14.º, n.º 4, alínea a) da Lei n.º 27/2010, é punível com uma coima de 20 UC (€2.040,00) a 300 UC (€30.600,00). Sucede que o recorrido é reincidente – artigo 561.º do Código do Trabalho – pelo que os limites mínimo e máximo da coima se elevam em um terço do respetivo valor, não podendo esta ser inferior ao valor da coima aplicada pela contraordenação anterior desde que os limites mínimo e máximo desta não sejam superiores aos daquela. No caso dos autos, atento o disposto no artigo 559.º do Código do Trabalho e os critérios estabelecidos no artigo 18.º do Regime Geral das Contraordenações[4], afigura-se-nos que a ACT, pelos fundamentos que expôs na decisão administrativa, e que aqui se acolhem e se consideram reproduzidos, ponderou adequadamente sobre a justa medida da coima que aplicou, pelo que se confirma o valor € 2.900,00 aplicado por aquela entidade. Pelo pagamento desta coima é solidariamente responsável o sócio gerente do recorrido, AA, nos termos previstos pelo n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho. Acresce que, de acordo com o disposto no artigo 562.º do mesmo compêndio legal, por estar em causa uma contraordenação muito grave deverá ser aplicada a sanção acessória de publicidade da decisão condenatório. Concluindo, o recurso deve proceder, porquanto ficou demonstrada a prática da infração contraordenacional pelo recorrido, que deverá ser sancionado, nos termos anteriormente expostos, que abrangem a responsabilidade solidária pelo pagamento da coima pelo sócio gerente do recorrido. As custas devem ser suportadas pelo recorrido, fixando-se as mesmas em 4 UC. * V. DecisãoNestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso procedente, e consequentemente, revogam a decisão recorrida e condenam a sociedade “Camionagem De Carga Sul Frio, Lda.”, pela prática de uma contraordenação laboral, em violação do artigo 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27 /2010, de 30 de agosto, com referência ao artigo 36.º, n.º 1, do Regulamento (UE) 165/2014, de 4 de Fevereiro, na coima de € 2.900,00 e na sanção acessória de publicidade. Mais se condena, na qualidade de responsável solidário, o sócio-gerente da sociedade pelo pagamento da coima. Custas a cargo do recorrido , fixando-se a taxa de justiça em 4 UC. -------------------------------------------------------------------------------------------------------- Évora, 14 de setembro de 2023 Paula do Paço (Relatora) Mário Branco Coelho (1.º Adjunto) Emília Ramos Costa (2.ª Adjunta) __________________________________________________ [1] Relatora: Paula do Paço; 1.º Adjunto: Mário Branco Coelho; 2.ª Adjunta: Emília Ramos Costa [2] A título de exemplo, referem-se os Acórdãos de 13/01//2021, P. 1614/20.8Y2STR.E1, de 30/01//2020, P. 1399/19-0T8STR.E1 e de 27/06//2019, P. 2276/18.8T8EVR.E1. [3] Neste sentido, v.g. Acórdão da Relação do Porto de 05/12/2011, P. 68/11.4TTVCT.P1 [Paula Leal de Carvalho]; Acórdão da Relação de Guimarães, de 20/10/2016, P.1154/15.7T8BCL.G1 [Alda Martins]; Acórdão da Relação de Lisboa, de 16/03/2016, P. 196/15.7T8BRR.L1.4 [José Eduardo Sapateiro]. [4] Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro. |