Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
45/11.5GAORQ.E1
Relator: ALBERTO BORGES
Descritores: CONVICÇÃO DO TRIBUNAL
RELATÓRIO SOCIAL
VALORAÇÃO DAS DECLARAÇÕES DO CO-ARGUIDO
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
Data do Acordão: 01/28/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário:
I - Nada obsta a que a convicção do tribunal se baseie apenas nas declarações do(a) ofendido(a), desde que estas, em face das circunstâncias concretas em que são prestadas, sem olvidar o eventual interesse que tenha no desfecho do processo, lhe mereçam credibilidade, sendo que, nos casos de violência doméstica, os actos ocorrem normalmente no recato do ambiente familiar, sem a presença de terceiros
II – As reservas colocadas por técnica, em relatório social que elaborou, relativamente à veracidade/genuinidade de informações que recolheu, porque se trata de um juízo subjetivo, não é razão bastante para afastar a credibilidade que o tribunal confira às declarações em audiência da pessoa que as fornecera.
III – As cautelas na valoração a atribuir às declarações do co-arguido têm a ver, não com as situações em que no mesmo processo são acusadas diversos arguidos por condutas diferentes, mas quando são acusados diversos arguidos pela prática de factos em co-autoria.
Decisão Texto Integral:
Proc. 45/11.5GAORQ.E1

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

1. No Tribunal Judicial da Comarca de Ourique correu termos o Proc. Comum Singular n.º 45/11.5GAORQ, no qual foram julgados os arguidos A e B, ambos melhor identificados na sentença de fol.ªs 506 e seguintes, datada de 11.03.2013, pela prática dos seguintes crimes:
- O arguido, em autoria material, na forma consumada, dois crimes violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152 n.ºs 1 al.ªs a) e d), 2 e 4 a 6 do Código Penal;
- A arguida, em autoria material, na forma consumada, um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152 n.ºs 1 al.ªs a) e d), 2 e 4 a 6 do CP.
A final veio a decidir-se:
1) Absolver a arguida do crime que lhe vinha imputado;
2) Condenar o arguido:
- pela prática, como autor material, na forma consumada, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152 n.ºs 1 al.ª a) e 2 do CP, na pena de três anos de prisão;
- pela prática, como autor material, na forma consumada, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152 n.ºs 1 al.ª d) e 2 do CP, na pena de dois anos e dois meses de prisão;
- e, em cúmulo jurídico, na pena única de quatro anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sob a condição de nesse período pagar a cada um dos demandantes a quantia de 2.000,00 € e disso fazer prova nos autos.
3) Julgar procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pelos demandantes e, em consequência, condenar o arguido a pagar à demandante a quantia de 2.000,00 €, a título de indemnização por danos não patrimoniais, e ao demandante a quantia de 2.000,00 €, a título de indemnização por danos não patrimoniais (B, por si e em representação de seu filho menor, C, havia pedido a condenação do arguido no pagamento da quantia de 2.000,00 €, a título de danos morais, respetivamente).
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2. Recorreu o arguido dessa sentença, concluindo a motivação do recurso com as seguintes conclusões:
1.ª – O arguido considera:
- que não resultam da motivação da decisão de facto vertida na sentença factos que eram essenciais para a boa decisão da causa;
- que o tribunal não valorou convenientemente a prova produzida nos autos e em sede de audiência de discussão e julgamento;
- que o enquadramento jurídico que aos factos foi dado não foi correto, por se considerar que não estão reunidos os pressupostos da imputação ao arguido da prática do crime de que vem condenado.
2.ª - Em tempo apresentou o ora recorrente requerimento de prova, por considerar que os factos aí apresentados se revestem de uma enorme importância, no mínimo, quer para o julgamento da personalidade das partes, quer para as motivações inerentes à prática dos atos de que vinham acusados ambos os arguidos, referentes ao episódio ocorrido em 17 de maio de 2011 (a que se referem os n.ºs 14 e 15 da matéria de facto provada).
A junção de tal requerimento de prova foi, contudo, indeferida pelo tribunal, por via do despacho de 12-12-2012, não obstante a não oposição do próprio Ministério Público à junção aos autos do mesmo requerimento de prova.
Desse despacho interlocutório recorreu o arguido A.
A decisão recorrida não teve em conta tais factos, que se revestem da maior importância para o esclarecimento do ocorrido no dia 17 de maio, porquanto permitem perceber o móbil da atuação da arguida B, tal como vem descrito em 11 da acusação.
3.ª - Como refere a sentença recorrida, a pág. 6, “Na consideração da factualidade provada e não provada a convicção do tribunal baseou-se, fundamentalmente, na análise crítica das declarações dos arguidos e do demandante C, em conjugação com o depoimento das testemunhas (…)”
Ora, relativamente à valoração que fez das declarações de C, reputando-as como “convincentes”, não teve em conta o tribunal o teor dos relatórios sociais obtidos no âmbito do Processo de Regulação das Responsabilidades Parentais referentes ao mesmo C, juntos aos autos por determinação do Ministério Público.
1) Tais relatórios referem factos, a nosso ver, relevantes para a boa decisão da causa, porquanto importam para a valoração que foi feita da veracidade das declarações prestadas pelo C em audiência de julgamento, designadamente, os factos que a seguir se transcrevem:
- a pág. 6: referem os técnicos que, “pelo que nos foi possível perceber, o menor, sempre que relatava alguns dos acontecimentos “traumáticos” que alegadamente terá passado com o pai, não denotamos na sua expressão ou linguagem, uma reação emotiva ou a expressão de um sentimento de dor”;
- a pág. 6: “paradoxalmente, o seu comportamento educado e de imagem afável (…) não é a mesma que a escola retrata”…;
- a pág. 5: “… faz com que o mesmo seja um elemento perturbador em contexto de sala de aula (…)”; “o seu comportamento não é o mais correto para com os colegas, situação que já deu origem a três participações disciplinares”;
- a pág. 6: “não denotando fragilidades ou traumas que comprometam seriamente o seu desenvolvimento”;
- a pág. 6: “o menor parece manter uma relação afetiva mais sólida e próxima com a figura materna do que propriamente com o pai”;
- a pág. 7: “No entanto deixamos algumas reservas quanto à total veracidade/genuidade das informações que o menor, ao longo da entrevista nos facultou, acerca da sua vivência com os pais, nomeadamente, a relação entre si e o progenitor”.
2) Com interesse para boa decisão da causa, no que concerne concretamente ao arbitramento do montante indemnizatório civil, referem ainda tais relatórios, a pág. 3, que a arguida/lesada B afirmou auferir, a título de rendimento do trabalho, a quantia líquida de 1.000,00€ mensais.
No entanto, em sede de audiência de julgamento a mesma B declarou auferir um rendimento de apenas 400,00€ (cfr. pág. 5 da sentença).
Contradição evidente e de motivação óbvia na qual o tribunal não atentou ou/e não considerou, mas que releva, tanto para a avaliação da credibilidade daquela como para o arbitramento do montante indemnizatório civil.
3) Relativamente à testemunha D, refira-se que, dada a diminuta dimensão geográfica e populacional do meio social onde está inserida, onde todos se conhecem e, por essa razão, todas a questões, mesmo as de índole pessoal, e até íntimo, caem no domínio público, certamente o tribunal não ignora nem poderia ignorar - porquanto tal questão foi ainda suscitada pela defesa do ora recorrente em sede de alegações finais na fase de julgamento - que circunstâncias particulares e de saúde inerentes à testemunha em causa são susceptíveis de lhe provocarem algumas fragilidades emocionais ou de caráter suscetíveis, por sua vez, de influírem na veracidade ou credibilidade do seu depoimento.
Ao menos, atento tal facto, deveria o tribunal colocar algumas reservas acerca da idoneidade de tal testemunha para depor ou acerca da credibilidade do seu depoimento, ademais, atento o facto de a mesma depor sobre matéria não corroborada por qualquer outra testemunha e ter proferido afirmações contraditórias em relação ao depoimento da testemunha E.
De facto, a testemunha D refere no seu depoimento, referindo-se ao episódio de 17 de maio, que saiu em busca de auxílio, gritando: “acudam que ele mata-a”.
Reportando-se a esse mesmo episódio, a testemunha E refere o seguinte, nos termos que se transcrevem:
- E: “Fui mudar os pneus de uma carrinha que eu andava trabalhando (impercetível) e o rapaz estava a mudar os pneus na rua saiu a D lá de casa a gritar: «acudam que eles matam-se»”.
Mais tarde, a instâncias da defesa do ora recorrente, a mesma testemunha E confirmou que ouviu aquela D gritar: “acudam que eles matam-se” (e não “acudam que ele mata-a”).
A testemunha E deu ainda uma versão dos factos ocorridos nesse dia 17 de maio bem diferente daquela que foi relatada por D. Concretamente, referiu aquele que, quando entrou em casa, viu os arguidos “juntos, cara a cara um com o outro”, e que ao entrar na casa percebeu pelo ruído que emanava de dentro da habitação que “eram eles a discutir um com o outro”.
4) Neste ponto em concreto a mesma testemunha E contradiz também as declarações do demandante C, o qual referiu que a mãe (arguida B) apenas apanhava e era insultada “calada”, sem ripostar nem retorquir.
Acresce que, neste ponto, o tribunal teve uma prova viva de que a arguida B não tem perfil psicológico de cariz passivo, caraterístico da vítima indefesa que aguenta, ouve e cala, porquanto, por diversas vezes, em plena audiência de julgamento interrompeu as declarações que no momento eram prestadas pelo arguido A, manifestando-se verbalmente – o que lhe valeu a advertência do tribunal – e manifestando-se gestualmente e com sorrisos sarcásticos em reação às declarações que o arguido A ia prestando nessa ocasião.
5) Mais considerou o tribunal, a folhas 10 da sentença, que o depoimento da arguida B foi prestado “de forma espontânea, relatando os episódios ocorridos, com algum detalhe”.
Sendo certo que ao tribunal assiste alguma discricionariedade no que concerne à apreciação da prova, no caso concreto, porém, do registo fonográfico do depoimento da arguida B resulta claro que, salvo o devido respeito, na verdade, esta prestou declarações de forma pouco clara, não relatou os episódios de forma escorreita e encadeada logicamente, nem pormenorizada, sendo por demais evidente que, não fora o caso de o tribunal inquirir a depoente, desfiando, ponto por ponto, cada item constante da acusação, aquela pouco teria dito ao tribunal.
A esse propósito, cumpre lamentar que a gravação da prova se limite, legalmente, ao registo fonográfico, porquanto um registo vídeo demonstraria ainda que a mesma arguida B, ao descrever os acontecimentos “traumáticos” que alegadamente sofreu, não deixou transparecer na expressão do seu rosto, na sua postura corporal, no seu modo de olhar, no tom de voz, qualquer sentimento de mágoa, de dor ou emoção dolorosa, ao invés, quando referiu, por exemplo, que o marido lhe batia “quase todas as semanas”, anos a fio, chegou a esboçar um sorriso descontraído, pasme-se!
São estes factos e indícios que o tribunal ignorou, os quais, no entanto, pela lógica e experiência comuns, sempre são determinantes e não podem ser menosprezados ou mesmo ignorados por qualquer julgador no momento em que se trata de aquilatar da veracidade do depoimento de quem tem à frente a depor.
4.ª - O tribunal considerou como não provados os factos descritos na alínea H), portanto, que a arguida B não dirigiu ao seu marido as expressões “burro, malandro”.
Sucede que a própria arguida B confessou que tinha chamado ao marido A “malandro”, nos termos em que se transcreve esse trecho das declarações da arguida B:
M. Juiz - E chamou-lhe burro e malandro, dessa vez, já na presença da GNR?
Arguida B – A parte do burro não me lembro, malandro lembro, agora de burro não”.
Ignorou assim o tribunal tal declaração da arguida B, a qual constitui uma confissão dos factos nessa parte.
Termos em que tal facto deveria constar da matéria de facto provada e bem assim, consequentemente, o mesmo deveria suceder com os factos descritos na alínea L) da matéria de facto não provada, atento que não resultou provado que o arguido A não contribuía para as despesas do agregado familiar (vd. alínea B) do elenco dos factos não provados) e que portanto, este trabalhava, logo, não era “malandro”.
A esse propósito, diga-se que o tribunal igualmente não considerou o histórico de contribuições para a segurança social do arguido A, ora recorrente, correspondentes ao rendimento do seu trabalho ao longo da sua vida ativa profissional, os quais só por si constituem prova incontornável de que este sempre trabalhou e, portanto, sempre contribuiu para prover à satisfação das necessidades do agregado familiar, sendo ainda certo que a arguida B justificou a ocorrência de problemas conjugais com o facto de, alegadamente, o recorrente não querer trabalhar; ao considerar como não provado tal facto, deveria o tribunal ter daí retirado as devidas consequências quanto à veracidade das declarações da arguida B, ao menos, nessa parte.
5.ª - Na análise crítica que fez do depoimento da testemunha F, a páginas 14 e 15 da sentença, começa o tribunal por referir que esta terá deixado de ser cliente da arguida B, após a separação do casal, induzindo dessa forma a ideia de que a testemunha em causa terá alguma reserva mental em relação à arguida B, sendo certo que tal juízo sempre pesará na ponderação da credibilidade do depoimento da testemunha. Ignorou, no entanto, o tribunal a justificação, plausível, para tal facto, tal como o foi dada pela testemunha nos termos em que se transcreve:
M. Juiz – Porque é que deixou de ir… (ao cabeleireiro da arguida B)
Testemunha F: - Olhe por uma questão de funcionalidade, porque tenho uma cabeleireira quase mesmo…
M. Juiz: - Ao pé.
Testemunha F: - Exactamente!
6.ª - A arguida B declarou que, já depois da separação do casal, o arguido A lhe ligava para o telemóvel … nos termos que se transcrevem:
Arguida B - Ai isso ao telemóvel, depois chamava também nomes, sempre as mesmas coisas, tens amantes e que me ia fazer a vida negra”.
Por seu turno, o demandante C, reportando-se aos mesmos tempos pós separação do casal, i.é, depois de o próprio e a mãe terem saído de casa, refere o seguinte, nos termos em que se transcrevem:
M. Juiz - (depois de terem saído de casa, questionando se o arguido A…) Telefonava, mandava mensagens?
C – Não, ela nunca atendia o telemóvel, ela nunca atendia o telemóvel.
Ora, o tribunal ignorou o facto de as declarações da arguida B e do C serem contraditórias, neste ponto, entre si.
E mais refere, na circunstância, o C:
M. Juiz - Pronto, ela não atendia, então era só as mensagens? E pronto, procurar? Procurar a mãe no salão ou em casa, chegou a procurar a mãe ou também não?
C - Não, não.
M. Juiz - Não?
C - Nunca!
Ora, perante tal facto, e sendo certo que desde 27 de junho de 2011 não se verificaram quaisquer ulteriores desaguisados entre os intervenientes neste processo, só ignorando estes factos o tribunal poderá invocar razões de prevenção especial para aplicar pena tão gravosa ao arguido.
Assim sendo, estas circunstâncias integram, a nosso ver, o vício previsto no art.º 410.º do Código de Processo Penal, relativo à insuficiência da matéria de facto para a decisão, a impor o reenvio do processo e a repetição do julgamento.
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7.ª - Como refere a sentença recorrida, a pág. 6, “Na consideração da factualidade provada e não provada a convicção do tribunal baseou-se, fundamentalmente, na análise crítica das declarações dos arguidos e do demandante C em conjugação com o depoimento das testemunhas (…)”
Ora, em bom rigor, no que concerne aos factos considerados provados pelo tribunal, descritos, designadamente, no ponto 3, 4, 5, 7, 8, 9, 20, o tribunal baseou a sua convicção, apenas e só, nos depoimentos da arguida B e do demandante C.
Efetivamente, a ocorrência de tais factos não é corroborada por nenhuma testemunha ou outro tipo de prova.
Aliás, excetuando a testemunha D (a qual não sendo familiar é amiga e cliente da arguida, e cujo filho é ainda amigo do C), nenhuma outra testemunha afirmou ter presenciado quaisquer factos ou agressões, nem tão pouco as testemunhas G e H, respetivamente, mãe e pai da arguida B.
Ao invés, mais uma vez, excetuando a testemunha D, de entre amigos e clientes da arguida B, agentes da autoridade e até familiares da arguida B, que integravam o rol de testemunhas, nenhuma testemunha referiu ter visto tão pouco sequelas físicas decorrentes dos maus tratos que a arguida B afirmou ter sofrido durante cerca de … nove anos… Nenhuma testemunha vislumbrou tal tipo de coisas… nem mesmo durante os meses de verão, em que o calor tórrido que se faz sentir no Alentejo impõe o uso de indumentária de dimensões mais reduzidas, a qual não permitiria esconder nódoas negras, abrasões e/ou outras lesões habitualmente decorrentes de maus tratos reiterados e frequentes como a arguida B afirma ter sofrido.
Citando o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, referente ao processo 512/09.0PBAVR.C1, publicado em www.dgsi.pt, “como nos dá conta a doutrina e a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, embora as declarações de co-arguido não constituam prova proibida, exigem-se cautelas especiais na sua valoração que, de um modo geral, se reconduzem à exigência de corroboração, o mesmo é dizer, à existência de elementos provenientes de fontes probatórias diversas das declarações (…). Como é referido no ac. do STJ já citado, de 12-07-2006, «significa que as declarações de co-arguido só podem fundamentar a prova de um facto criminalmente relevante quando exista alguma prova adicional a tornar provável que a história do co-arguido é verdadeira e que é razoavelmente seguro decidir com base nas suas declarações». .Ou, noutros termos, a exigência de corroboração significa que as declarações dos co-arguidos nunca podem, só por si, e por mais inequívocas e credíveis que sejam, suportar a prova de um facto criminalmente relevante. Exige-se para tanto que as declarações sejam confirmadas por outro autónomo contributo que “fale” no mesmo sentido, em abono desse facto”
No caso sub judice, ao menos no tocante aos factos descritos nos pontos 3, 4, 5, 7, 8, 9, 20 da matéria de facto provada, as declarações da arguida B e do demandante C não foram corroborados por outros meios de prova.
Em conformidade, e reproduzindo o texto do supracitado acórdão da Relação de Coimbra, “a falta de corroboração, nesta parte”, ou nos pontos supra referidos da sentença, das declarações da arguida B e do demandante C “por qualquer outro meio de prova determina, mais não seja, por imperativo in dubio pro reo, que se erija à condição de não provados os pontos” 3, 4, 5, 7, 8, 9 e 20.
Cingindo-nos agora concretamente à apreciação do ponto 3 da matéria de facto provada, a acrescer ao que anteriormente se disse, apraz referir ainda que, além das declarações da arguida B e do demandante C, inexiste prova de que o arguido A agredisse a arguida B desde, “pelo menos, há cerca de 9 anos”. Na verdade, os únicos factos concretamente referidos por outros depoimentos ou provas reportam-se apenas e tão só aos factos alegadamente ocorridos nos episódios de 23 de abril, 17 de maio e 27 de junho, todos do mesmo ano de 2011.
Do mesmo modo, além das declarações da arguida B e do demandante C, nenhuma outra testemunha afirmou ter ouvido o arguido A dirigir à arguida B as expressões “puta” e “vaca”.
Dos depoimentos e declarações recolhidos em sede de audiência de julgamento igualmente não resulta provado que o ora recorrente questionasse a fidelidade conjugal da arguida B “desde há cerca de nove anos” atrás. Ao invés, resulta claro do depoimento das testemunhas I, F, J, e bem assim das próprias declarações do arguido A, que este só começou a duvidar da lealdade e fidelidade da esposa alguns poucos meses antes da relação conjugal chegar ao seu termo, ante as evidências claras nesse sentido, designadamente, pelo facto de o cônjuge mulher ter chegado ao ponto de se apresentar em público com o novo companheiro (vd. o depoimento das testemunhas I, F, J, K e L).
O que anteriormente se disse sobre o ponto 3 é válido para o ponto 4 da matéria de facto considerada provada.
No que concerne ao ponto 5 da matéria provada, é a própria arguida B quem declara que “sabia” que o arguido A, seu marido, ora recorrente, “ia ver o telemóvel mas não se importava que ele visse”; e mais declarou a mesma que o marido “não a inibia de fazer chamadas e ver mensagens” (no telemóvel).
No que concerne ao depoimento da testemunha F refira-se que a mesma respondeu a todas as questões relevantes para a boa decisão da causa de forma objetiva e credível. Não obstante, o tribunal refere, contudo, que a mesma revelou “alguma insegurança na resposta” à questão de saber a razão de o arguido A, a dada altura, ter alterado o rumo do seu percurso profissional, mudando de atividade profissional. Abstraindo do facto de que não releva para o objeto dos presentes autos a razão pela qual o arguido a dada altura alterou o seu percurso profissional, mudando de atividade profissional, pois que é certo que continuou a trabalhar e a contribuir para as despesas do agregado familiar (vd. alínea H) da matéria de facto não provada), refira-se que “alguma insegurança na resposta” da testemunha acerca dessa questão se prende, naturalmente, com o facto de o tribunal estar a inquirir a mesma sobre uma questão cuja resposta sempre será eminentemente subjetiva, porquanto, só o próprio arguido A poderia responder a tal questão com propriedade. Todavia, caso o tribunal considerasse relevante tal pormenor sempre podia ter inquirido o arguido A sobre tal matéria, o que não fez.
De referir ainda que o tribunal, salvo o devido respeito, inquiriu a arguida B e o demandante C, colocando, não raras vezes, as questões de forma conclusiva, como a audição do registo fonográfico deixa perceber.
8.ª - Afigura-se não estar preenchido o crime de violência doméstica imputado ao arguido A e pelo qual foi condenado em 1.ª instância.
Como se refere no acórdão da Relação de Coimbra supracitado, o artigo 152 do Código Penal “tutela a proteção da saúde, bem jurídico complexo que abrange a saúde física, psíquica e mental, o qual pode ser ofendido por toda a multiplicidade de comportamentos que afetam a dignidade pessoal da vítima”.
Assim, não é suficiente qualquer ofensa à saúde física, psíquica, emocional ou moral da vítima, para o preenchimento do tipo legal.
Para o preenchimento do tipo legal do crime haverá que verificar, por um lado, se o crime foi praticado de forma reiterada e, por outro lado, “se a intensidade dos episódios em causa assumem um grau de intensidade ou desvalor, da ação ou do resultado, incompatível com a dignidade da pessoa humana”.
No que concerne à reiteração, pese embora a alteração legislativa introduzida pela Lei n.º 59/2007, “de modo reiterado ou não”, cfr. o acórdão da Relação do Porto de 05-11-2003, “é o estado de agressão permanente que permite concluir pelo exercício de uma relação de domínio ou de poder, proporcionada pelo âmbito familiar (…), deixando a vítima sem defesa numa situação humanamente degradante”.
Ora, no caso em apreço, abstraindo das declarações da arguida B e do demandante C, os quais afirmaram ser vítimas de maus tratos com uma periodicidade “semanal”, toda a prova testemunhal e pericial apurada mais não refere do que três episódios em concreto, designadamente, os acontecimentos ocorridos em 23 de abril, 17 de maio e 27 de junho, todos do ano de 2011.
Atente-se, também no facto, não despiciendo, de que os episódios em causa têm uma proximidade temporal entre eles e que ocorreram imediatamente antes do termino da relação conjugal e familiar entre os intervenientes neste processo.
Cuidando agora de saber se os três episódios ora referidos assumem uma intensidade tal que deixaria as vítimas sem defesa de uma forma incompatível com a dignidade humana, diga-se que o próprio demandante C, referindo-se ao episódio de 17 de maio, declarou que “jogou-se às costas do pai”, “bateu-lhe com um ferro” e que foi ele quem “rasgou a camisa do pai”.
Por seu turno, referindo-se ao episódio de 23 de abril, a arguida B declarou que se dirigiu ao arguido A chamando-lhe “malandro”.
Acresce a constatação do facto, não despiciendo, no que concerne a tais episódios de 23 de abril, 17 de maio e 27 de junho - que ficou suficientemente demonstrado, quer pelas declarações dos arguidos e do demandante C, quer pelo depoimento das testemunhas - que os atos praticados surgiram na sequência de discussões generalizadas, onde intervieram os arguidos e o demandante C.
Senão vejamos:
No que concerne concretamente ao episódio de 23 de abril, terá despoletado a discussão o facto de o C ter insistido em apitar um apito, o que fez de forma reiterada, não obstante bem saber que estava a incomodar o pai, ora recorrente, o qual, querendo descansar de uma jornada de trabalho, lhe pediu para parar; mas alegadamente fê-lo - no dizer do próprio C e da arguida B - “para chamar a atenção do pai”.
Mesmo colocando reservas quanto à genuidade das declarações do C, pelo atrás exposto e pelo óbvio, pois que é demandante, transcreve-se o depoimento deste, nessa parte:
C - porque ele nunca me dava atenção depois arranjei um apito para ver se conseguia mais a atenção dele, para ir comigo brincar mas ele não queria.
M. Juiz - E o que é que ele te dizia?
C – Dizia que não queria, depois já estava farto…
M. Juiz - Mas não te tinha mandado parar?
C - Não!
M. Juiz - Não disse para tares calado, para tares quieto?
C - Disse para tar calado mas eu não parava.
M. Juiz - Mas tu não ficaste quieto?
C - Não, não fiquei.
M. Juiz – E depois dessa vez o que é que ele te fez?
C – Hum, deu-me pontapés.
M. Juiz - E depois como é que isso parou?
C - A mãe chegou e meteu-se no meio.
M. Juiz – E depois?
C – Depois ela fez com que ele parasse.
(A testemunha referiu que “a mãe fez com que o pai parasse”, mas não disse que a mãe fez com que o pai parasse pedindo verbalmente ao pai que parasse; impunha-se perguntar como é que a mãe fez com que o pai parasse… será que não se precipitou sobre ele tentando tirar desforço?)
M. Juiz – Foi, ela chegou lá e disse para ele parar e ele parou?
C - Não.
M. Juiz – Então?
C – Também levou um bocadinho.
M. Juiz – Levou um bocadinho como?
C - Ah, levou um bocadinho de puxões de cabelos.
M. Juiz – Olha e depois aconteceu mais alguma coisa nesse dia?
C - Não!
No que se refere aos factos reportados à data de 17 de maio, a contenda entre os arguidos terá começado por causa da posse de um telemóvel, propriedade do arguido A.
Na circunstância, note-se, mesmo tomando como verdadeiras as declarações da arguida B e do demandante C, registe-se que o arguido A também foi vítima de agressões recíprocas, nos termos em que é admitido pelo próprio C, nos termos em que se transcreve:
M. Juiz – E deste com um ferro nas costas do pai, não foi?
C- Sim
M. Juiz - Percebeste se lhe rasgaste a camisa, alguma coisa, não deste conta disso?
(Note-se que constava da acusação, ponto II - 11, que quem havia rasgado a camisa do co-arguido A foi a co-arguida B, donde se afigura de difícil entendimento que o tribunal tenha colocado a questão ao C nestes precisos termos).
C: Sim! Rasguei-lhe a camisa, rasguei-lhe a camisa!
M. Juiz - E deste-lhe com um ferro foi?
C – Sim.
(Nesta fase do seu depoimento o demandante C parecia orgulhoso daquela atuação, tal como a decreveu, e, estranhamente, não esboçava qualquer receio por admitir, perante um Juiz de um tribunal, ter agredido alguém, o que permite legitimamente inferir que o mesmo se encontrava bem ciente e informado da inocuidade de tal ato para a sua pessoa em razão da sua idade, ao contrário do que sucederia com a senhora sua mãe).
M. Juiz – Que ferro é que era?
C – Um ferro dos cortinados que estava lá solto.
M. Juiz – Sim senhor! E ele parou de bater na mãe?
C – Parou e foi-se embora.
Por seu turno, a factualidade descrita e situada temporalmente em 27 de junho terá tido como causa o facto de a arguida B, ao abandonar a residência da família, se ter locupletado com bens que iam muito além da parte que lhe caberia na sua meação dos bens comuns do casal (facto que motivou, aliás, a apresentação de uma queixa-crime por parte do ora recorrente, a qual correu termos nos próprios autos, mas que foi objeto de despacho de arquivamento por se considerar que os bens em causa não eram bens alheios, por também pertencerem àquela).
Ainda assim, e mesmo no dizer das sempre “partes interessadas”, que são a arguida B e o demandante C, os atos imputados ao arguido A resumem-se a ter “dado murros na montra do salão” e “a chamar nomes a ambos”.
C – Ah, ele foi lá ao salão, a mãe tava dentro e ele tava cá fora e ele deu muitos murros na montra e chamou-lhe nomes.
Ora, como se refere no acórdão da Relação do Porto de 28.08.2011, proferido no Processo 170/10.0GAVLC.P1 (citado na sentença recorrida), “não é por o agente ter atingido uma ou várias vezes o outro elemento do casal que, necessariamente, se configura uma situação de maus tratos que leve a condenação por crime do art.º 152 (…) A ocorrência deste crime pressupõe uma agressão capaz de afetar a dignidade pessoal do cônjuge enquanto tal”.
E “não é por a(s) agressão(ões) física tere sido praticada no seio da vida familiar/doméstica que, imediatamente, se mostra excedida a previsão do crime de ofensas à integridade física simples do art.º 143 do CP”.
O que conta é saber se a conduta do agente, pelo seu caráter violento ou pela sua configuração global de desrespeito pela pessoa da vítima ou de desejo de prevalência de dominação sobre a mesma, é susceptível de ser classificada como «maus tratos»”.
Atente-se ainda no seguinte: resulta claro, e sem margem para dúvidas - porquanto tal decorre das declarações da própria arguida B e do C (supra transcritas nessa parte) - que o ora recorrente também foi vítima de ato que integra a prática de crime de injúria quando aquela lhe chamou “malandro”.
Mas foi ainda o ora recorrente vítima de ato que consubstancia ofensa à integridade física no momento em que o C se “jogou às costas” e o “atingiu com um ferro” e lhe “rasgou a camisa”, como o mesmo C declarou em sede de audiência de julgamento, nos termos em que supra se transcrevem.
A este propósito refira-se que a sentença recorrida, a pág. 16, parece ter desconsiderado esse ato injurioso da arguida, fundamentando tal posição na consideração de que o “crime de violência doméstica não pode ser cometido em reciprocidade”, baseando-se para tanto numa citação do texto do acórdão da Relação do Porto de 28.09.2011 (Proc. 170/10.0GAVLC.P1). Porém, salvo lapso de leitura, não lográmos tão pouco encontrar tal citação no texto do mesmo acórdão, caso em que o lapso será do tribunal a quo.
Aqui chegados facilmente se conclui que os três episódios relatados nos factos provados da sentença recorrida não representam um potencial de agressão que supere ou transcenda a proteção oferecida pelos crimes de ofensa à integridade física e de injúria previstos nos art.ºs 143 e 181 do CP.
Acresce que, “além da pequena gravidade das ofensas (física e moral) cometidas, não podemos ignorar que as mesmas se enquadram num momento de rotura ou de pré-rotura da vida conjugal, momento esse que, por regra, introduz um elemento de tensão novo e compreensível”.
Acresce que, no caso em apreço, esse elemento de tensão foi potenciado pelo facto de o cônjuge mulher (atento o depoimento das testemunhas F, J, I, K e L) ter violado o dever de fidelidade conjugal, facto que aquela tão pouco se inibiu de esconder do próprio marido, ora recorrente, numa conduta que revela um total desrespeito pela dignidade pessoal do recorrente.
9.ª - Os crimes de ofensa à integridade física simples são punidos com pena de prisão até 3 anos ou pena de multa.
Sem olvidar que, pelo menos no episódio de 17 de maio, tal como supra descrito, o ora recorrente também sofreu agressões físicas perpetradas ou pela arguida B ou pelo demandante C, consoante a versão – mas é certo que as sofreu - e ofensas morais no episódio de 23 de abril, por parte da arguida B – a qual confessou ter-lhe chamado “malandro” - nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 3 do artigo 143 e 181, ambos do C. Penal, atente-se no disposto no artigo 70 do Código Penal, o qual orienta o aplicador da lei no sentido de dar preferência à pena de multa em detrimento da pena de prisão.
Seguindo o raciocínio jurídico explanado no supra citado acórdão da Relação de Coimbra, do qual se citarão alguns parágrafos mais, diga-se que o “critério a seguir é simplesmente este: o tribunal deve preferir à pena privativa de liberdade uma pena alternativa (de multa) sempre que verificados os respectivos pressupostos de aplicação, a pena se revele adequada e suficiente à realização das finalidades da punição.
O que o mesmo é dizer que a aplicação de uma pena alternativa à pena de prisão, no caso a pena de multa, depende tão somente de considerações de prevenção especial de socialização e de prevenção geral sob a forma de satisfação do «sentimento jurídico da comunidade»”
Cfr. Jorge de Figueiredo Dias, in As consequências jurídicas do crime, pág. 333: “o tribunal só deve negar a aplicação de uma pena alternativa quando a execução da pena de prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente do que aquela pena; coisa que raramente acontecerá se não se perder de vista o caráter criminógeno da prisão”. A prevenção geral “deve surgir aqui unicamente sob a forma do conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico”.
Ora, “no caso em apreço, o quadro factológico provado não aponta minimamente para o arguido, ora recorrente estar carecido de socialização, a concretizar através de aplicação de pena privativa da liberdade, e bem assim, na vertente da prevenção geral, também não se vislumbra que a preferência pela aplicação da pena de multa seja susceptível de abalar a consciência jurídica comunitária e o sentimento de segurança face à norma jurídica violada.
Crê-se, por isso, que a pena de multa realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
No que concerne à determinação da medida concreta da pena, à luz do disposto nos art.ºs 40 e 70, ambos do CP, diga-se que o limite máximo fixar-se-á atendendo à salvaguarda da dignidade humana do condenado, atendendo à medida da culpa revelada; o seu limite mínimo é dado pelo quantum da pena que, em concreto, ainda realize essa proteção dos bens jurídicos.
No caso em apreço haverá que considerar:
- a reduzida gravidade das lesões sofridas;
- que, pelo menos em dois dos três episódios (em 23 de abril e 17 de maio), o recorrente também sofreu agressões recíprocas de cariz verbal e físico, respetivamente;
- o motivo determinante das condutas, conexionadas com a degradação da relação familiar, num contexto de fim de relação entre os arguidos;
- a ausência de antecedentes pessoais do arguido;
- a condição pessoal do arguido e a situação económica.
Haverá ainda que ponderar, relativamente à personalidade do arguido:
- como refere o Prof. Figueiredo Dias na supracitada obra, se “o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência criminosa ou tão só a uma pluriocasionalidade”;
- o efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente.
Ora, no caso sub judice, o próprio tribunal, a pág. 16 da sentença, reconhece que não duvida que “o arguido é muito boa pessoa, calmo, trabalhador, (…) tendo sido referido o mesmo por algumas testemunhas de acusação”;
- as relações pessoais e familiares entre os intervenientes cessaram;
- reconhecem nas suas declarações - a própria arguida B e o demandante C - que não se verificaram ulteriores desaguisados entre os intervenientes desde a data de 27 de junho de 2011.
Termos em que os elementos conhecidos não permitem considerar que a conduta do agente radica numa personalidade manifestamente desconforme aos valores sociais que o direito penal tutela, ainda que no domínio da proteção da saúde e integridade física, pelo que se julgará adequada e justa a aplicação ao arguido de uma pena multa reduzida ao mínimo legal.
10.ª - Como inicialmente se referiu, encontram-se juntos aos presentes autos o teor dos relatórios sociais obtidos no âmbito do Processo de Regulação das Responsabilidades Parentais que envolveu os mesmos intervenientes deste processo.
É referido nesses relatórios, a pág. 3, que a arguida/lesada B afirmou auferir a título de rendimento do trabalho a quantia de líquida de 1.000,00€ mensais, quando nos presentes autos, em sede de audiência de julgamento, a mesma B declarou auferir apenas um rendimento de 400,00 € (cfr. pág. 5 da sentença).
No que concerne ao ressarcimento dos danos patrimoniais, refere a ora demandante B que se viu privada de poder trabalhar porque ficou privada do acesso às instalações físicas para o fazer, vulgo, ficou sem o “salão de cabeleireira”. No entanto, como refere a própria demandante B no artigo 10 do pedido civil que formula, no dia 27 de junho já estava a preparar o novo salão de cabeleireiro (note-se que havia saído de casa a 23 de junho). Mais refere a mesma que na data de 8 de julho já se encontrava a desempenhar a sua atividade profissional nas instalações sitas na (…).
Nesse mesmo sentido depuseram as testemunhas F e J, as quais tiveram conhecimento da mudança das instalações do cabeleireiro da demandante B, concomitantemente com o seu abandono do lar conjugal.
Ainda assim, refira-se, com relevo para a decisão da causa, que em caso algum o arguido A cerceou à demandante B o acesso ou a utilização do cabeleireiro no local onde este estava instalado inicialmente, i.é, no r/c da casa de morada de família, porquanto, existiram, inclusivamente, negociações entre as partes, envolvendo até os mandatários advogados (atuais e pretéritos) das mesmas, no sentido de haver a divisão equitativa do imóvel, ficando o arguido A a utilizar a parte habitacional e a arguida B a fruir a parte do imóvel onde estava instalado o salão de cabeleireiro, o que só não sucedeu porquanto tal proposta foi declinada pela ora demandante.
Termos em que fica por demonstrar a existência de danos patrimoniais contemporâneos dos episódios ocorridos ou danos emergentes ou futuros a título de lucros cessantes.
No que concerne à verificação dos danos morais cuja indemnização se requer, refira-se, quanto ao demandante C, o que já anteriormente se observou, citando os relatórios sociais juntos aos presentes autos, a pág. 6: “não denotando fragilidades ou traumas que comprometam seriamente o seu desenvolvimento”.
Acresce que a testemunha D (testemunha de defesa arrolada pelos ora demandantes) referiu no seu depoimento, referindo-se aos ora demandantes B e C e às alegadas sequelas que os mesmos terão sofrido em consequência da alegada conduta do Arguido A: “eles são muito fortes e têm conseguido dar a volta por cima”.
11.ª - Deve ser concedido provimento ao recurso e, consequentemente:
- Considerando-se resultar da própria decisão que não foram considerados factos importantes para a decisão, o julgamento anulado e o processo reenviado para que se proceda a novo julgamento relativamente à totalidade do seu objeto, nos termos dos artigos 426 e 426-A do Código de Processo Penal;
- Se não se entender viável esta solução, deve a matéria de facto fixada ser alterada no sentido sugerido no presente recurso;
- Ser alterada a qualificação jurídica dos factos imputados ao arguido, de violência doméstica para ofensas à integridade física, p. e p. nos termos do art.º 143 do Código Penal.
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3. Respondeu o Ministério Público ao recurso interposto, concluindo a sua resposta nos seguintes termos:
1 – Afirmar-se que a sentença enferma de insuficiência de matéria de facto provada para a decisão significa que os factos apurados e dados como provados mostram-se insuficientes para a decisão, porque o tribunal deixou de apurar ou de se pronunciar sobre factos relevantes alegados pela acusação ou pela defesa ou resultantes da discussão da causa, ou porque não investigou factos que deviam ter sido apurados em audiência, sendo relevantes para a boa decisão da causa.
2 - Quanto ao requerimento de prova que foi objeto de rejeição, consideramos – pelas razões expostas em sede de resposta ao recurso então apresentado – que essas provas, para além de não dizerem respeito ao objeto do processo fixado com a acusação, terão sido obtidas mediante intromissão na vida privada da visada sem o seu consentimento, concordando, assim, com a decisão do tribunal.
3 – A sentença recorrida, sob a epígrafe “fundamentação de facto”, descreveu os factos que deu como provados e não provados (fol.ªs 507 a 511) e, de seguida, na respetiva motivação, indicou as razões que justificaram a sua convicção.
4 – Mostra-se explicada a razão da convicção do tribunal e, como tal, não enferma a decisão recorrida de insuficiência da matéria de facto provada para a decisão.
5 – Não se divisa que a sentença enferme de erro na apreciação da prova produzida e, muito menos, notório ou evidente. Aliás, a factualidade considerada provada é a necessária e suficiente para se chegar à decisão absolutória (?) proferida, tendo o tribunal baseado a sua convicção nas regras da experiência comum e em critérios racionais, conjugados com a prova testemunhal, documental e pericial junta aos autos.
6 – Ao tribunal a quo não existiram dúvidas, muito menos razoáveis, para a condenação do arguido pelos factos descritos na acusação.
7 – No tipo de crime (violência doméstica) exige-se que o agente se encontre numa determinada relação com o sujeito passivo, designadamente, se encontre numa relação da coabitação conjugal ou análoga, ou de parentesco direto, ou seja, que agente e vítima sejam cônjuges ou se encontrem a viver em condições análogas às dos cônjuges, ou que agente e vítima sejam pai e filho menor.
8 – Este tipo de crime pressupõe efetivamente uma reiteração ou não das condutas por parte do agressor, bastando um ato isolado, de tal modo grave, perverso e censurável para integrar o crime de violência doméstica.
9 – Considerando os factos dados como provados e tendo presente, quer a reiteração dos seus comportamentos, que se estenderam em relação a ambas as vítimas por um longo período temporal (pelo menos cerca de nove anos, a primeira das quais quando a vítima cônjuge estaria grávida do filho C), quer a gravidade dos comportamentos em si adotados pelo arguido em relação às vítimas, não podemos deixar de concluir que tais condutas perpetradas pelo arguido consubstanciam a prática dos crimes de violência doméstica.
10 – Tais condutas assumem maior gravidade quando perpetradas na pessoa do seu cônjuge e na presença do filho menor de ambos, bem como no próprio menor, pelo que a lei consagra uma agravação da moldura penal abstratamente aplicável nestas situações (art.º 152 n.º 2 do CP).
11 – Assim sendo, e considerando a matéria de facto provada, as suas circunstâncias e demais considerações supra descritas, não podia outra decisão ter sido tomada que não fosse a de condenação do arguido no quantum das penas parcelares aplicadas e pena única.
12 – Não padece a decisão recorrida dos apontados vícios – ou quaisquer outros – pelo que deve ser negado provimento ao recurso e manter-se a mesma.
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4. Nesta instância o Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
5. Cumprido o disposto no art.º 417 n.º 2 do CPP e colhidos os vistos legais, cumpre decidir, em conferência (art.º 419 n.º 3 al.ª c) do CPP).
6. Foram dados como provados na decisão recorrida os seguintes factos:
01) O arguido e B casaram no dia 5 de junho de 1999, tendo vivido maritalmente até ao dia 23 de maio de 2011, data em que B se ausentou da residência do casal, sita na (…).
02) O casal tem um filho em comum, C, nascido em 16.05.2000.
03) Desde data não concretamente apurada, mas pelo menos há cerca de nove anos, que o relacionamento conjugal se deteriorou e o arguido vem agredindo física e verbalmente a sua esposa B, dirigindo-lhe, nomeadamente, as seguintes expressões: “puta, vaca”, e desferindo-lhe diversos pontapés, estaladas, empurrões, apertões de pescoço e puxões de cabelo, apontando-lhe várias relações conjugais com pessoas do sexo masculino.
04) Também desde data não concretamente apurada, o arguido vem agredindo o C e desferindo-lhe diversos murros, pontapés e apertões de pescoço, provocando vários hematomas na cabeça, pernas e pescoço.
05) Acresce que o arguido impedia B de contactar com amigos e terceiros e controlava os seus movimentos.
06) No mês de abril de 2011 levantou a quantia monetária que ambos possuíam na conta bancária proveniente de salários auferidos pelo arguido enquanto trabalhava na Islândia.
07) Em data não concretamente apurada, há pelo menos nove anos, no interior da residência do casal, após troca de palavras, o arguido desferiu um murro, atingindo a sua esposa na cabeça, fazendo-a cair inanimada no chão.
08) No dia 23 de abril de 2011, cerca das 21h30m, no interior da residência do casal, o C estava a brincar com um apito e o arguido, após lhe ter dito para parar, como a criança não obedeceu, agarrou-o pelos braços e sacudiu-o violentamente, desferindo-lhe pontapés e murros pelo corpo.
09) Por a esposa se ter interposto, o arguido empurrou-a contra a parede e, ato contínuo, apertou-lhe o pescoço e desferiu-lhe diversos murros, atingindo-a nas costas, ao mesmo tempo que lhe dirigia as seguintes expressões: “puta, vaca”.
10) Em consequência destas condutas, o arguido provocou dores em C, equimoses na face, região lombar, joelhos e face anterior da perna direita, não tendo necessitado de tratamento médico.
11) Tais lesões determinaram um período de 14 dias de doença, sem afetação da capacidade para o trabalho geral e profissional.
12) Em consequência destas condutas o arguido provocou dores em B, equimoses na região dorsal e braços, não tendo necessitado de tratamento médico.
13) Tais lesões determinaram um período de trinta dias de doença, sem afetação da capacidade para o trabalho geral e profissional.
14) No dia 17 de maio de 2011, no interior da residência do casal, após troca de palavras entre ambos, o arguido desferiu na sua esposa diversos puxões de cabelos, arrastando-a, ao mesmo tempo que a sacudia e empurrava.
15) Ato contínuo, o arguido apertou-lhe o pescoço e bateu várias vezes com a cabeça da esposa contra a parede e a porta do corredor.
16) Em consequência destas condutas o arguido provocou dores em B, equimoses nos braços e pernas e hematomas no couro cabeludo, região parieto occipital esquerda e parietal direita, tendo necessitado de assistência médica.
17) Tais lesões determinaram um período de 30 dias de doença, sem afetação da capacidade para o trabalho geral e profissional.
18) No dia 17 de junho de 2011, cerca das 18h00m, na (…), o arguido dirigiu-se junto de sua esposa, que estava no interior do seu salão de cabeleireiro, proferindo na sua direção as seguintes expressões: “puta, cabra, vaca”, ao mesmo tempo que desferiu um murro na montra do salão.
19) Ainda nessas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido dirigiu ao seu filho as seguintes expressões: “filho da puta, és igual à tua mãe, tens que me dizer porque é que não queres vir comigo”.
20) A partir de 23 de maio de 2011, data em que B saiu da residência do casal, o arguido tem telefonado para a esposa por diversas vezes e dirigido as seguintes expressões: “puta, vaca”, “nunca te hei-de deixar-te descansada. Vou fazer-te a vida negra para sempre”.
21) Com as referidas condutas o arguido quis, de modo continuado, molestar e humilhar física e psiquicamente a sua esposa B, bem sabendo que punha em causa a sua dignidade pessoal, seriedade e reputação.
22) Quis ainda, de modo continuado, molestar fisicamente o seu filho C, bem sabendo que punha em causa a sua dignidade pessoal, seriedade e reputação.
23) Mais sabia que as suas condutas eram adequadas e idóneas a provocar-lhes, como o fez, ferimentos físicos, medo, clima de terror, inquietação, sobressalto, tristeza, mágoa e desgaste psicossomático, para além de os atingir na sua honra e consideração, o que perturba o seu bem estar físico e psíquico, o que conseguiu.
24) O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
25) O arguido não tem antecedentes criminais conhecidos, trabalha como mineiro na Almina, em Aljustrel, onde aufere o salário médio mensal de 700,00 €, e vive sozinho, em casa arrendada, pela qual paga 200,00 € de renda mensal.
26) Tem um filho menor, C, a quem paga pensão de alimentos no valor de 100,00 € mensais, tem como habilitações literárias o 6.º ano de escolaridade e é pessoa considerada e respeitada por aqueles que consigo privam.
27) A arguida não tem antecedentes criminais conhecidos, trabalha por conta própria, como cabeleireira, tem um rendimento mensal médio de 400,00 € e suporta a renda do salão, no montante mensal de 200,00 €.
28) A arguida vive com o filho C, em casa arrendada, pela qual paga a renda mensal de 250,00 €.
29) É ajudada monetariamente pelos pais, de forma regular, pagando-lhe uma das rendas.
30) C frequenta o 5.º ano de escolaridade e recebe pensão de alimentos no montante de 100,00 € mensais.
31) A arguida tem o 12.º ano de escolaridade.
7. E não se provou:
A) Que, desde data não concretamente apurada, o arguido vem agredindo verbalmente o seu filho C, dirigindo-lhe, nomeadamente, as seguintes expressões: “és um burro, és um parvo, és um ignorante, és um estúpido”.
B) Que o arguido não contribuía para a despesas do agregado familiar.
C) Que, na situação referida em 8, o arguido apertou o pescoço de C.
D) Que, na situação referida em 14, o arguido suspendeu a B no ar.
E) Que as agressões referidas em 14 cessaram após a intervenção de D, que afastou o arguido.
F) Que, desde data não concretamente apurada, o relacionamento conjugal se deteriorou e a arguida vem agredindo verbalmente o arguido.
G) Que, no dia 23 de abril de 2011, durante a tarde, no interior da residência do casal, após desentendimento entre ambos, a arguida dirigiu ao seu marido as seguintes expressões: “corno, cabrão manso, filho da puta”, ao mesmo tempo que “tentava atingi-lo com as mãos, não o tendo conseguido”.
H) Que, já na presença de dois militares da GNR, a arguida dirigiu ao seu marido as seguintes expressões: “burro, malandro”.
I) Que, no dia 17 de maio de 2011, em hora não concretamente apurada, no interior da residência do casal, e após desentendimento entre ambos, a arguida desferiu uma palmada na mão do seu marido, que empunhava um telemóvel.
J) Que, ato contínuo, agarrou a mão do seu marido a fim de lhe retirar o aludido telemóvel, ao mesmo tempo que tentava atingi-lo com pontapé e o arranhava nas costas.
K) Que, com a conduta descrita, a arguida provocou dores e escoriações no seu marido, bem como lhe rasgou a camisa que este trazia vestida.
L) Que a arguida agiu com o propósito, de modo continuado, de molestar e humilhar física e psiquicamente o seu marido, bem sabendo que punha em causa a sua dignidade pessoal, seriedade, reputação e integridade física, o que conseguiu.
M) Que a arguida agiu deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
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8. O tribunal formou a sua convicção, de acordo com a fundamentação que apresentou, com base nos seguintes meios de prova:
1) Nas declarações do arguido, o qual, “no essencial, negou a prática dos factos…”, apresentando “sempre um discurso pouco claro, confuso, procurando sempre assumir o papel de vítima e negando qualquer tipo de agressão verbal ou física.
Explicou que tinham discussões frequentes porque a sua mulher implicava por tudo e por nada… referiu que sempre que discutiam ela o apelidava de malandro, filho da puta, cabrão manso e corno, mas que ele não lhe respondia nem lhe chamava nomes a ela… por regra o C assistia às discussões.
Referiu uma situação por volta de outubro de 2010 em que teve de segurar a B pelos braços e balançá-la porque estava descontrolada e atirava tudo ao chão, mas que não considera tal comportamento como agressão, pois até foi uma forma de a acalmar.
Quanto ao controlo de movimentos e do telefone referiu peremptoriamente que nunca o fez.
Quanto à situação ocorrida no dia 23 de abril de 2011 esclareceu que o C andava por casa a brincar com um apito e que, apesar de lhe ter pedido, por favor, para parar, porque queria descansar e dormir, o C não parou de apitar, até que o agarrou por um braço para o fazer parar de apitar. O C saiu da sala aos gritos e foi ter com mãe e esta veio até à sala «armar pé de vento», até que ele chamou a GNR e já na presença dos militares da GNR a arguida ainda o chamou de «burro» e «malandro», dizendo que ele não queria trabalhar. Esclareceu que a GNR esteve em casa até cerca da uma hora da madrugada…
No que concerne à situação ocorrida em 17 de maio de 2011, e em que discutiram por causa de um telemóvel, o arguido concretizou que, pelo menos desde o início desse ano, desconfiava que a B o traía com outra pessoa, Confrontou-a várias vezes com o facto de ela ter um amante e ela sempre negou.
Todavia, nesse dia 17 de maio teve a confirmação das traições da sua mulher, pois mandou arranjar um telemóvel antigo que ela usava e verificou que continha mensagens de texto (da B a marcar encontros com o amante, a descrever a lingerie que tinha vestida) e fotografias comprometedoras dela com outra pessoa.
Quando em casa confrontou a B com o telemóvel e ela se apercebeu que ele estava a funcionar, foi ela que o agrediu, estava munida de uma faca e tentou tirar-lhe o telemóvel, e que apenas se defendeu, segurando-a nos braços, pulsos e ombros e que conseguiu tirar-lhe a faca. O C estava presente e assistiu a tudo, e bateu-lhe nas costas com qualquer coisa, ao mesmo tempo que dizia para largar a mãe.
… referiu que durante este período apareceu a D (que já estava combinada com a B), entrou na sala e disse «larga a moça» e saiu logo. E que depois apareceram uns rapazes que estavam na oficina, mas não chegaram a entrar na sala onde estavam.
Por fim referiu que quando tudo terminou foi para o posto da GNR acolher-se.
No que concerne à situação ocorrida em 27 de junho de 2001… nega que tenha asa a B tinha «roubado» tudo, tinha levado toda a mobília de casa.
… desde que a B e o C saíram de casa nunca os ameaçou ou perseguiu.
Disse que aguentava toda esta situação para poder continuar ater acesso ao filho”.
2) Nas declarações da arguida, as quais se apresentaram ao tribunal como prestadas “de forma espontânea, relatando os episódios ocorridos com algum detalhe, não suscitando dúvidas ao tribunal quanto à veracidade das mesmas”.
E concretiza:
… esclareceu que a primeira vez que foi agredida pelo marido ainda estava grávida e que certa vez, tinha o C uns dois ou três anos, o arguido desferiu-lhe um murro na cabeça que a fez desmaiar.
Referiu que sempre discutiram muito porque o arguido tinha ciúmes e dizia que ela tinha amantes e porque ela dizia que ele não queria trabalhar a que não ganhava dinheiro para a casa.
No que concerne à frequência das agressões, referiu que pelo menos uma vez por semana o seu marido lhe batia, que ficava com hematomas nos braços, pernas, costas… sempre escondeu as marcas porque tinha vergonha de contar.
No que se refere à situação ocorrida no dia 17 de maio de 2011 a arguida referiu que encontrou o seu filho C na rua quando voltava do supermercado e que ele estava cabisbaixo porque tinha encontrado o pai e como se recusou a acompanhá-lo de carro este lhe disse que quando chegasse a casa «levava ele e a mãe».
… chegou a casa acompanhada do C, e tinha uma cliente à espera, que continuou no salão enquanto estes entraram em casa, e que aí chegados o arguido puxou-a pelos cabelos, arrastou-a pelo chão, desferiu-lhe murros nas costas, nas pernas, pescoço e cabeça.
O C, que assistiu a tudo, tentou defendê-la e chegou mesmo a bater no pai com um ferro, atingindo-o nas costas, e pedindo para parar de bater na mãe.
A arguida referiu que gritou por socorro e chamou pela D (cliente que estava à espera no salão contíguo à casa de habitação) que, passados uns instantes, apareceu em seu auxílio, pediu ao arguido para a largar, mas como ele a mandava calar, ela saiu de imediato e foi pedir ajuda a uns homens que se encontravam numa oficina de carros perto da casa, e quando estes chegaram o arguido mandou-os sair, mas acabou por ter terminar com a s agressões e ir embora… quando GNR chegou ele já não se encontrava no local.
Acrescentou ainda que o arguido sempre lhe controlou os movimentos, que era muito ciumento, que controlava o telemóvel, as listas de chamadas, as mensagens.

Esclareceu que aguentou tundo quieta e calada, por isso tem mazelas no corpo e na cabeça, e só agora saiu de casa porque tinha vergonha e porque se saísse não tinha forma de se sustentar porque o salão de cabeleireiro onde trabalhava era em casa.
Agora… arranjou força para sair, pois o C já é crescido, conta com o apoio dele e… dos seus pais.
Desde que saiu de casa o arguido segue-a na rua, telefona-lhe e chama-lhe nomes (puta e vaca), diz que tem amantes e que lhe vai fazer a vida negra.
Quanto à relação do C com o pai referiu que era algo distante e que por isso muitas vezes o filho tentava chamar a atenção do pai, tal como sucedeu na situação do apito, no dia 23 de abril de 2011, o arguido mandou-o estar calado com o apito e como o C não parou o pai apertou-o no pescoço e quando ela foi tentar defender o filho o arguido também a empurrou, causando-lhe hematomas nos braços e costas, e chamou-lhe os mesmos «nomes». Nesta ocasião o arguido chamou a GNR, sendo que no entender da arguida tal sucedeu para se fazer de «vítima»… admitiu que nesta ocasião se referiu ao arguido como sendo um malandro, no sentido de ser uma pessoa que nunca gostou de trabalhar.
No que se refere à situação ocorrida no salão, já foi depois de ter saído de casa com o filho. O arguido dirigiu-se ao salão e desferiu murros na montra (nem sabe como não a partiu), chamou-lhe nomes (puta) e ao C também, disse-lhe que era um filho da puta e que era igual à mãe.
O arguido começou a agredir o C por volta do quatro anos de idade, eram frequentes as bofetadas e os apertões no pescoço.
Atualmente o C tem alterações de humor e comportamento frequentes, chumbou o ano e desde que saíram de casa tem sido acompanhado por psicólogos da CPCJ, do centro de saúde e da escola”.
3) Nos depoimentos de M e N, militares da GNR “que foram a casa dos arguidos no dia 23 de abril de 2001, na sequência do episódio do apito.
Referiram… que na situação em apreço apenas constataram um casal muito exaltado, não tendo presenciado agressões físicas ou verbais. Pormenorizaram que o filho do casal estava presente… referiram que ficaram bastante tempo no local”.
4) No depoimento de O, militar da GNR, que foi chamado a intervir 2 ou 3 vezes junto do casal.
Uma quando o arguido fechou a porta do salão, impedindo a arguida de aceder ao mesmo.
Uma outra aquando das mudanças da arguida, em que o arguido se queixou que ela lhe tinha levado toda a mobília de casa.
E uma outra em que a arguida se queixou de agressões por parte do arguido.
5) No depoimento de P, militar da GNR, que referiu ter recebido uma queixa da arguida “por o arguido lhe ter chamado «nomes»… no verão de 2011”.
6) Nas declarações de C, o qual, “apesar da idade e da situação pouco confortável, prestou declarações de forma convincente, embora pouco à vontade, e demonstrando um pouco de nervosismo, o que, atendendo ao circunstancialismo, conferiu credibilidade às declarações prestadas.
… relatou a situação ocorrida a 17 de maio de 2011, esclarecendo que vinha da escola para casa e encontrou o pai, e como se recusou a ir para casa com ele o pai disse-lhe que quando chegasse a casa levava ele e a mãe… concretizou que o pai queria dizer que iam ambos levar «porradas».
No que concerne à situação em torno do telemóvel, no essencial confirmou a versão que a arguida apresentou, dizendo que o pais discutiu com a mãe por causa do telemóvel e que depois lhe bateu, que lhe puxou os cabelos, que a jogou ao chão e que ele, para defender a mãe, bateu nas costas do pai com um ferro. Disse ainda de forma peremptória que a mãe não tinha qualquer faca e que de forma alguma agrediu o pai. Acrescentou que entretanto apareceu a D e o levou com ela.
Relativamente à situação ocorrida em 27 de junho de 2011 disse que o arguidos desferiu murros na montra do salão, chamou nomes à mãe (puta e vaca) e que lhe disse a ele que era igual à mãe, que era um filho da puta.
… disse ainda que já depois de a mãe ter saído de casa por diversas vezes o pai os aborda e diz-lhes que lhes vai fazer a vida negra, que nunca os há-de deixar em paz.
… desde pelo menos os 5 ou 6 anos de idade que se apercebe de discussões entre os pais, que era frequente o pai bater na mãe (puxões de cabelos, murros) e chamar-lhe nomes.
… por diversas vezes o pai também lhe bateu, com chapadas, murros e pontapés… porque o chateava para brincar com ele. O mesmo sucedeu com a situação do apito, estava a brincar e não obedeceu ao pai quando o mandou estar calado e por isso apanhou pontapés e murros. Nesta situação a mãe defendeu-o e acabou por apanhar também (puxões de cabelos). Do que se recorda o pai chamou a GNR, mas depois de irem embora ainda voltou a bater na mãe.
… referiu que na sequência das agressões de que foi vítima por parte do pai ficou com nódoas negras, que sempre escondeu, e mentiu na escola para não ter de contar o sucedido, porque tinha vergonha”.
7) No depoimento de D, que explicou o que viu no dia 17 de maio de 2011, referindo que “estava à espera da arguida para se aconselhar sobre uma pintura de cabelo e que entrou com a B e o C no salão, onde ficou à espera, tendo os dois entrado em casa (concretizou até que o C antes de entrar espreitou para ver se o pai estava em casa, pois estava com medo que lhe batesse…). Instantes depois ouviu a arguida chamar pelo seu nome e entrou em casa, tendo visto o arguido a puxar os cabelos da B e a arrastá-la de um lado para o outro. O arguido quando se apercebeu da sua presença mandou-a embora, e ela como viu que nada podia contra ele, chamou o C (que tinha na mão um ferro ou um pau) e saíram, tendo-se dirigido a uma oficina ao lado do salão a pedir ajuda…
Mais tarde, e já depois de ir do posto da GNR para sua casa, acompanhada do C (que é colega de escola do filho), encontraram o arguido, que queria que o C fosse com ele, tendo dito que não lhe fazia mal, ao que C terá dito, tens-me feito pouco.
Noutra altura encontrou a B, que lhe disse que não podia trabalhar porque o arguido lhe tinha fechado a porta do salão…”.
8) No depoimento de E, que referiu ter ido a casa dos arguidos, a pedido de uma senhora que apareceu a pedir socorro, e “viu o C à porta, cabisbaixo, triste… entrou em casa e perguntou o que se passava, o arguido apontou-lhe o dedo e mandou-o pôr na rua. Viu que os arguidos… discutiam…”.
9) No depoimento da testemunha G, mãe da arguida, que “apenas soube das agressões no verão de 2011, quando a filha lhe mostrou as nódoas negras… e… lhe disse que era o marido que lhe batia…”.
10) No depoimento da testemunha H, pai da arguida, o qual disse que nunca viu maus tratos, mas “no dia em que a B fez as mudanças esteve a ajudar no salão e nesse dia o arguido apareceu lá e desferiu murros na montra e fez uma grande fita, chamou nomes à B (puta)…
Disse ainda que o C está muito afetado com a situação, apático e desgostoso, e que a B se sente humilhada”.
11) Nos relatórios periciais de fol.ªs 85/87, 176/178 e 180/182, e elementos clínicos de fol.ªs 54.
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E analisando criticamente tais provas escreveu-se:
Em face das declarações da arguida e do demandante C, conjugadas com os depoimentos das testemunhas da acusação e bem assim do pedido cível, não restam dúvidas que o arguido praticou os factos tal como se consideraram provados, no que concerne às agressões e expressões… tais depoimentos e declarações se mostram corroborados pela documentação clínica e pericial.
Muito embora as testemunhas de defesa tenham vindo a referir que o arguido é muito boa pessoa, calmo, trabalhador, do que não se duvida… o certo é que, como é sabido, este tipo de factos não são necessariamente praticados por pessoas notoriamente violentas ou agressivas, bem pelo contrário, até porque as vítimas são, regra geral, e como sucede no caso em apreço, mais frágeis e tudo se passa a coberto das paredes da residência.
… não é pelo facto de algumas testemunhas de defesa terem referido que era a arguida quem tinha comportamentos potenciadores das agressões, e sem cuidar de saber se a arguida violou ou não deveres conjugais, designadamente de fidelidade, pois não é isso que está em causa nestes autos nem tão pouco consta do objeto do processo, ainda que o tivesse feito não justifica o comportamento do arguido. O facto do arguido desconfiar (ou mesmo ter por comprovadas) das traições da sal mulher não constitui razão relevante ou minimamente razoável para a prática destes factos.
O arguido negou todos os factos, todavia, não apresentou uma versão ou explicação credível, vitimizando-se e caindo por várias vezes em contradição.
Quanto aos factos que vinham imputados à arguida, os mesmos resultaram não provados em face das suas declarações, que mereceram a credibilidade do tribunal, porquanto foram corroboradas pelas declarações do filho do casal e pelos militares da GNR e não foram contraditadas pelas testemunhas de defesa…”.
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9. É sabido que as conclusões do recurso delimitam o âmbito do conhecimento do mesmo e destinam-se a habilitar o tribunal superior a conhecer as pessoais razões de discordância do recorrente em relação à decisão recorrida (art.ºs 402, 403 e 412 n.º 1, todos do Código de Processo Penal, e, a título de exemplo, o acórdão do STJ de 19.06.96, in BMJ, 458, 98).
Elas devem conter, por isso, um resumo claro e preciso das questões que o recorrente pretende ver submetidas à apreciação do tribunal superior, sem perder de vista a natureza do recurso, que não se destina a um novo julgamento sobre o objeto do processo, mas a uma reapreciação da decisão recorrida por forma a corrigir os vícios ou erros de que a mesma enferme.
Não primam pela clareza as conclusões apresentadas pelo recorrente e não são, de facto, uma síntese da motivação, que reproduzem quase na íntegra.
Todavia, das mesmas se retiram as seguintes questões que o recorrente coloca à apreciação deste tribunal:
1.ª – A insuficiência da matéria de facto para a decisão (art.º 410 n.º 2 al.ª a) do CPP);
2.ª – A violação do princípio da livre apreciação da prova (art.º 127 do CPP);
3.ª – A qualificação jurídica dos factos: se a factualidada apurada não integra os crimes de violência doméstica pelos quais o arguido foi condenado;
4.ª – Se o arguido deve ser condenado numa pena de multa “reduzida ao mínimo legal”.
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9.1. - 1.ª questão
O arguido vem alegar que “não resulta da motivação da decisão de facto vertida na sentença factos que eram essenciais para a boa decisão da causa”, alegação que, tal como se apresenta, se entende como invocação expressa do vício da insuficiência da matéria de facto para a decisão.
E justifica a existência de tal vício, em síntese, pelas seguintes razões:
1) Os factos alegados no requerimento que apresentou (requerimento que foi indeferido pelo tribunal a quo) são “da maior importância para o esclarecimento do ocorrido no dia 17 de maio, porquanto permite perceber o móbil da atuação da arguida B, tal como vem descrito na acusação em 11”.
2) Os factos constantes dos relatórios sociais obtidos no âmbito do Processo de Regulação das Responsabilidades Parentais referentes ao menor C (“relevantes para a boa decisão da causa, porquanto importam para a valoração que foi feita das declarações prestadas pelo C em audiência de julgamento…” e no que respeita aos rendimentos auferidos pela arguida/lesada, onde afirmou auferir a quantia líquida de 1000,00 €, quando em julgamento declarou auferir um rendimento de 400,00 €).
3) Por divergir da credibilidade que mereceu ao tribunal o depoimento da testemunha D, que deveria merecer “algumas reservas…” acerca de matéria não corroborada por qualquer outra testemunha e por contraditório em relação ao depoimento da testemunha E, o qual, por sua vez, contradiz as declarações do demandante C.
4) Por divergir da credibilidade que mereceram ao tribunal as declarações prestadas pela ofendida, a qual, no seu entender, “prestou declarações de forma pouco clara, não relatou os episódios de forma escorreita e encadeada logicamente, nem pormenorizada…”.
Vejamos.
Relativamente à factualidade a que respeita o requerimento apresentado pelo recorrente – acima melhor identificado – foi o mesmo indeferido, por decisão transitada em julgado, pelo que, sob pena de contradição de julgados, aqui não cabe dele conhecer (veja-se que o arguido, tendo recorrido desse despacho, não manifestou interesse no prosseguimento do recurso, que subiu com o interposto da decisão final, quando oportunamente notificado para tal).
Relativamente ao mais, e atentas as razões em que o recorrente baseia a sua discordância quanto ao decidido, assim sintetizadas, resulta com clarividência que o arguido confunde insuficiência da matéria de facto provada para a decisão – enquanto vício da sentença, previsto no art.º 410 n.º 2 al.ª a) do CPP - com insuficiência de prova para o tribunal dar como provada a matéria de facto que deu como provada, ou seja, com erro de julgamento, por o tribunal, na análise que fez das provas, ter valorado determinadas provas (aí identificadas) em sentido diverso do pretendido pelo recorrente.
De facto, a insuficiência da matéria de facto para a decisão, enquanto vício da sentença, previsto no art.º 410 n.º 2 al.ª a) do CPP, existirá quando – apreciada a decisão recorrida, na sua globalidade – se chega à conclusão que existe uma lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para a decisão, seja porque o tribunal não se pronunciou sobre toda a factualidade – relevante - alegada em sede de acusação/pronúncia e contestação, enquanto peças delimitadoras do objeto do processo/julgamento (havendo, por isso, uma omissão de pronúncia sobre factos relativamente as quais o tribunal devia pronunciar-se), seja porque omitiu o dever de investigar determinados factos – de que lhe era lícito conhecer – essenciais para a decisão, não sendo os factos apurados, por isso, suficientes para a decisão.
Em síntese – e como se escreveu no acórdão do STJ de 24.07.98, Proc. 436/98, que mantém atualidade – “a insuficiência da matéria de facto provada não se confunde com uma suposta insuficiência dos meios de prova para a decisão tomada.
Para que exista aquele vício é necessário que a matéria de facto fixada se apresente insuficiente para a decisão proferida, por se verificar uma lacuna no apuramento da matéria de facto.
Não ocorre aquele vício quando o tribunal investigou tudo o que podia e devia investigar.
A demonstração dessa insuficiência não pode emergir da mera discordância em relação à forma como o tribunal recorrido terá apreciado a prova produzida, pois aí poderá haver erro de julgamento…”, que – repete-se – não se confunde com aquele vício.
Diga-se que tal vício terá de resultar do texto da decisão recorrida, na sua globalidade, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, como expressamente resulta do art.º 410 n.º 2 do CPP, sem o recurso a outros elementos que, constando eventualmente do processo, não constam da decisão, o que equivale a dizer que essa necessidade de averiguar outra factualidade há-de resultar da própria decisão.
No caso em apreço, e como acima se demonstrou – pela transcrição, em síntese, das razões em que o recorrente fundamenta a existência desse vício – o tribunal não só não omitiu o dever de pronúncia sobre toda a factualidade que constituía o objeto do processo/julgamento (veja-se que o arguido não concretiza qualquer facto, entre a factualidade alegada, sobre o qual o tribunal não se tenha pronunciado), como não omitiu o seu dever de averiguar qualquer facto – de que lhe fosse lícito conhecer e devesse averiguar – relevante para a decisão, quer para apurar os elementos constitutivos do tipo de crime que lhe era imputado, quer para aferir da sua responsabilidade e determinar as penas a aplicar; o que o recorrente questiona é forma como o tribunal apreciou e valorou as provas produzidas (as provas que identifica), questão que nada tem a ver com insuficiência da matéria de facto provada para a decisão.
Improcede, por isso, a invocada insuficiência da matéria de facto para a decisão.
9.2. - 2.ª questão
As razões invocadas pelo recorrente para fundamentar a insuficiência da matéria de facto para a decisão, pelas razões supra expostas, reconduzem-se a um erro de julgamento, pois que – em suma, como se retira do alegado - o tribunal não valorou corretamente as provas produzidas.
E, consequentemente, não devia dar como provados os factos descritos nos pontos 3, 4, 5, 7, 8, 9 e 20, cuja prova se baseou “apenas e só nos depoimentos da co-arguida e do demandante C… não foram corroborados por outros meios de prova”.
Consta desses factos:
03) Desde data não concretamente apurada, mas pelo menos há cerca de nove anos, que o relacionamento conjugal se deteriorou e o arguido vem agredindo física e verbalmente a sua esposa B, dirigindo-lhe, nomeadamente, as seguintes expressões: «puta, vaca», e desferindo-lhe diversos pontapés, estaladas, empurrões, apertões de pescoço e puxões de cabelo, apontando-lhe várias relações conjugais com pessoas do sexo masculino.
04) Também desde data não concretamente apurada, o arguido vem agredindo o C e desferindo-lhe diversos murros, pontapés e apertões de pescoço, provocando vários hematomas na cabeça, pernas e pescoço.
05) Acresce que o arguido impedia B de contactar com amigos e terceiros e controlava os seus movimentos”.
“07) Em data não concretamente apurada, há pelo menos nove anos, no interior da residência do casal, após troca de palavras, o arguido desferiu um murro, atingindo a sua esposa na cabeça, fazendo-a cair inanimada no chão.
08) No dia 23 de abril de 2011, cerca das 21h30m, no interior da residência do casal, o C estava a brincar com um apito e o arguido, após lhe ter dito para parar, como a criança não obedeceu, agarrou-o pelos braços e sacudiu-o violentamente, desferindo-lhe pontapés e murros pelo corpo.
09) Por a esposa se ter interposto, o arguido empurrou-a contra a parede e, ato contínuo, apertou-lhe o pescoço e desferiu-lhe diversos murros, atingindo-a nas costas, ao mesmo tempo que lhe dirigia as seguintes expressões: «puta, vaca»”.
“20) A partir de 23 de maio de 2011, data em que B saiu da residência do casal, o arguido tem telefonado para a esposa por diversas vezes e dirigido as seguintes expressões: «puta, vaca», «nunca te hei-de deixar-te descansada. Vou fazer-te a vida negra para sempre»”.
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Em primeiro lugar, diga-se que nada obsta a que a convicção do tribunal se baseie apenas nas declarações dos ofendidos, desde que estas, em face das circunstâncias concretas em que são prestadas, e sem olvidar o eventual interesse que tenham no desfecho do processo, lhe mereçam credibilidade, sendo que – como é sabido – estes crimes ocorrem normalmente no recato do ambiente familiar, sem a presença de terceiros, como no caso aconteceu.
Depois, as declarações dos ofendidos – como consta da fundamentação acima transcrita – mereceram credibilidade ao tribunal, pelas razões que da sentença recorrida constam, em suma, porque tais declarações se apresentaram ao tribunal como prestadas de forma espontânea e convincente, tendo a ofendida relatado “os episódios ocorridos com algum detalhe, não suscitando dúvidas ao tribunal quanto à veracidade das mesmas”.
Por outro lado, a credibilidade que mereceram as declarações dos ofendidos relativamente a tal factualidade não pode ser dissociada da demais factualidade dada como provada e das provas que lhe servem de fundamento, as quais reforçam a credibilidade que tais declarações mereceram ao tribunal (referimo-nos, concretamente, aos exames médico-legais relativos aos episódios de 23.04.3011 e 17.05.2011, à ficha clínica do Serviço de Urgência Básica de Castro Verde relativa ao episódio de 17.05.2011 e às declarações do próprio arguido – que reconheceu serem frequentes as discussões, a ocorrência dos episódios de 23.04 e 17.05.2011, a ocorrência de um outro por volta de outubro de 2010, em que “teve de segurar a B pelos braços…”, e que, pelo menos desde o início do ano de 2011, “desconfiava que a B o traía com outra pessoa, confrontou-a várias vezes com o facto de ela ter um amante…” – elementos que bem evidenciam que a versão apresentada pelos ofendidos é coerente, tem lógica e é corroborada, na sua generalidade, por outros elementos de prova).
Não afasta este entendimento o teor dos relatórios sociais juntos aos autos, concretamente, quanto à credibilidade que mereceram ao tribunal as declarações dos ofendidos.
1) O relatório social a que o recorrente faz referência, concretamente no que respeita à impressão que o menor deixou na técnica que o elaborou – que mereceu algumas reservas quanto à total veracidade/genuinidade das informações que menor prestou “acerca da sua vivência com os pais, nomeadamente a relação entre si e o progenitor” – não é razão bastante para afastar a credibilidade que as declarações deste mereceram ao tribunal, por um lado, porque se trata de um juízo valorativo, subjetivo, da técnica que elaborou tal relatório, por outro, porque o tribunal – que ouviu o menor – não teve dúvidas quanto à “forma convincente” e séria como o menor prestou declarações em julgamento (veja-se a análise do seu depoimento supra descrita), sendo que é ao tribunal que, na função de julgar, incumbe apreciar e valorar tal prova, nas circunstâncias concretas em que é produzida e como é produzida, circunstâncias que lhe permitem aferir da sua credibilidade;
2) Do mesmo modo a contradição (aparente) que resulta da matéria de facto dada como provada em julgamento e o teor desse relatório, quanto ao vencimento da ofendida, pois que, por um lado, aquele relatório foi elaborada cerca de um ano antes do julgamento, pelo que nada permite afirmar, de acordo com as regras da experiência comum e da normalidade da vida, que se mantenha aquela situação, o mesmo é dizer que aquele facto, só por si, não permite retirar qualquer credibilidade às declarações da ofendida, declarações que o tribunal considerou prestadas “de forma espontânea, relatando os episódios ocorridos com algum detalhe, não suscitando dúvidas quanto á veracidade das mesmas”.
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Não pode, por outro lado, deixar de se realçar que vigora entre nós o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no art.º 127 do CPP, de acordo com o qual as provas são apreciadas pelo julgador segundo as regras da experiência comum e a sua livre convicção, não uma convicção subjetiva, baseada em impressões ou conjeturas de difícil objetivação, mas uma convicção racional e crítica, baseada nas regras da experiência comum, da lógica e nos critérios da normalidade da vida.
Ora, a análise que o tribunal fez das provas, concretamente, das declarações da arguida e do demandante C, mas também dos depoimentos prestados que mereceram credibilidade por parte do tribunal – designadamente os depoimentos das testemunhas D e E - mostra-se coerente, lógica e racionalmente justificada, de acordo com as regras da experiência comum, da lógica e os critérios da normalidade.
Depois, vigorando entre nós o princípio da oralidade e da imediação – privilégio de que desfruta o tribunal da 1.ª instância perante o qual foi produzida a prova – e não dispondo este tribunal, que não contactou com tais provas, de elementos que permitam questionar a credibilidade que lhe mereceram tais declarações e depoimentos, a simples divergência do recorrente quanto à convicção assim formada – e, repete-se, racionalmente justificada – não é razão bastante para questionar a bondade da decisão recorrida.
De facto, como se escreveu no acórdão desta Relação proferido no Proc. 2698/97-1, que mantém atualidade, “… a prova gravada e em parcelas transcrita nunca poderá suprir a abundância de pormenores que a oralidade e a imediação proporcionam ao juiz quando aprecia a prova que, pela irrepetível primeira vez, se desenrola no tribunal. O modo como o arguido, o declarante, como as testemunhas depõem, as suas reações, as suas reticências, a sua mímica, são fatores decisivos na formação de uma convicção e não podem ser captados pela frieza assética de quaisquer meios mecânicos…”.
É que, como se escreve no acórdão da RP de 5.06.2002, in www.dgsi.pt, “a atividade dos juízes, como julgadores, não pode ser a de meros espetadores, recetores de depoimentos. A atividade judiciária há-de ter, necessariamente, um sentido crítico... há-de atender a uma multiplicidade de fatores que têm a ver com as garantias da imparcialidade, as razões de ciência, a espontaneidade dos depoimentos, a verosimilhança... as coincidências, as contradições, não raras vezes o julgamento da matéria de facto não tem correspondência directa nos depoimentos concretos, resultando antes da conjugação lógica de outros elementos probatórios que tenham merecido a confiança do tribunal...”.
Por isso se tem entendido (ver, v.g., o acórdão do STJ de 13.02.2003, in www.dgsi.pt) que, “se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis segundo as regras da experiência, ela será inatacável, já que proferida em obediência à lei, que impõe que ele julgue de acordo com a sua convicção. Isto é mesmo assim, quando… houver documentação da prova, de outra maneira seriam defraudados os fins visados com a oralidade e a imediação”.
No mesmo sentido pode ver-se o acórdão do TC de 30.03.2004, DR, II Série, de 2.06.2004, onde se escreveu que “a censura quanto à forma de formação da convicção do tribunal não pode… assentar de forma simplista no ataque da fase final de tal convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente, os dados objectivos que se apontam na motivação… doutra forma seria uma inversão das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem julga pela convicção dos que esperam a decisão”.
Por conseguinte – e concluindo – as provas em que o recorrente baseia a sua divergência quanto ao decidido (e a análise que delas faz, fora do contexto em que foram proferidas, pretendendo questionar a credibilidade que as mesmas mereceram ao tribunal) não só não impõem decisão diversa da recorrida (e note-se que ao recorrente que impugne a decisão recorrida não basta concretizar as provas que, de acordo com a sua análise permitiriam uma decisão diversa, antes têm que a impor, como expressamente se consagra no art.º 412 n.º 3 al.ª b) do CPP), como não há razões para este tribunal – a quem está vedado o contacto direto e imediato com as provas que a audiência de julgamento em 1.ª instância permitiu – questionar a credibilidade que ao tribunal mereceram as declarações da ofendida e do ofendido C, assim como o depoimento das testemunhas D e E (diga-se apenas, concretizando, quanto ao episódio de 17.05.2011, que é irrelevante que a testemunha tenha dito “acudam que ele mata-a” ou “acudam que eles matam-se”, que a testemunha E tenha visto os arguidos cara a cara um com o outro, que se tenha apercebido que ambos discutiam e que o menor tenha dito que a mãe apenas apanhava e era insultada, pois que tais provas, assim consideradas, não impõem decisão diversa quanto ao ocorrido nesse dia, em suma, que houve troca de palavras entre ambos, como se provou – o que é compatível com a existência de uma discussão – e que, como se provou, “o arguido desferiu na sua esposa diversos puxões de cabelos, arrastando-a ao mesmo tempo que a sacudia e empurrava… apertou-lhe o pescoço e bateu várias vezes com a cabeça da esposa contra a parede e a porta do corredor…”).
Apenas mais duas notas a este propósito.
Uma, para deixar claro que carece o arguido de legitimidade para questionar a prova (ou não prova) da factualidade imputada à arguida na acusação contra ela deduzida e da qual foi absolvida, pelo que não tem este tribunal que conhecer da mesma, designadamente das razões pelas quais foi dado como não provado que a arguida chamou “burro, malandro” ao arguido (al.ª H) da matéria de facto não provada), todavia, diga-se, a simples confissão da arguida, só por si, em circunstâncias que este tribunal desconhece, não impõe, necessariamente, a prova de tal facto, pois que aí se diz que ocorreu “na presença de dois militares da GNR”, quando estes afirmaram que não presenciaram quaisquer agressões físicas ou verbais, por outro lado, e ainda que tal matéria fosse dada como provada tal facto em nada relevaria quanto à responsabilidade criminal do arguido, por não ser possível estabelecer qualquer nexo de causalidade entre o mesmo e a conduta daquele.
Uma segunda nota para dizer que não tem aqui aplicação a jurisprudência invocada quanto ao valor a atribuir às declarações do co-arguido, quer porque as declarações da arguida foram corroboradas por outros elementos de prova, como acima se deu conta – seja quanto aos factos cuja prova é concretamente questionada, seja quanto aos concretos episódios de violência dados como provados – quer porque o que se visa com tais cautelas tem a ver, não com as situações em que no mesmo processo são acusadas diversos arguidos por condutas diferentes, mas quando são acusados diversos arguidos pela prática de factos em co-autoria, circunstância em que, pela conflitualidade de interesses, se justificam as cautelas a que aquela jurisprudência se reporta.
Improcede, por isso, a 2.ª questão supra enunciada.
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9.3. – 3.ª questão
Pretende o arguido que não se verificam os elementos que preenchem o crime de violência doméstica, porque não se demonstraram mais do que três episódios em concreto, os acontecimentos ocorridos em 23.04, 17.05 e 27.06.2011, que – no seu entender – “não representam um potencial de agressão que supere ou transcenda a proteção oferecida pelos crimes de ofensa à integridade física e injúria previstos nos art.ºs 143 e 181 do CP”.
Sem razão, pois que – contrariamente ao alegado – a conduta do arguido não se resume a três episódios, como da matéria de facto dada como provada bem se vê, o que seria bastante para considerar improcedente esta pretensão.
Por outro lado, atualmente, após a redação introduzida ao art.º 152 do CP pela Lei 59/2007, de 4.09, o crime em causa - de violência doméstica (art.º 152) – não supõe a repetição ou reiteração de condutas, ele pode revelar-se através de uma pluralidade de atos ou através de um único ato que atinja a saúde física, psíquica ou moral do cônjuge e afete a dignidade pessoal, bem jurídico tutelado pela incriminação, como nos dá conta a decisão recorrida.
De facto, como se escreveu no acórdão da RC de 28.01.2010, www.dgsi.pt, “não são os simples atos plúrimos ou reiterados que caraterizam o crime de maus tratos a cônjuge, o que importa é que nos factos, isolados ou reiterados, apreciados à luz da intimidade do lar e da repercussão que eles possam ter na possibilidade da vida em comum, coloquem a pessoa ofendida numa situação que se deva considerar de vítima, mais ou menos permanente, de um tratamento incompatível com a sua dignidade e liberdade, dentro do ambiente conjugal”.
As circunstâncias em que ocorreram tais episódios e as agressões perpetradas – o que aqui se afirma apenas para efeito de raciocínio, pois que outras condutas se mostram provadas – bem revelam, ainda que só estes fossem considerados, a especial censurabilidade associada a este tipo de comportamentos, seja pela relação que o arguido tinha com as vítimas (sua esposa e seu filho), seja pelo local onde ocorreram (duas na residência da família e uma no local de trabalho da esposa, onde no arguido se dirigiu), comportamento de todo incompatível com a dignidade da ofendida, enquanto sua esposa (que ainda o era) e mãe do seu filho, e do seu próprio filho, numa prolongada e contínua degradação da vida em comum e do respeito mútuo que é suposto existir no seio familiar.
Improcede, por isso, a 3.ª questão supra enunciada.
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9.4.ª – 4.ª questão
Os crimes pelos quais o arguido foi condenado são puníveis, em abstrato, com pena de prisão de 2 a cinco anos (art.º 152 n.ºs 1 al.ªs a) e d) 2 do CP), pelo que é destituída de fundamento a pretensão do arguido de ser condenado em pena de multa, “reduzida ao mínimo legal” (sic), pretensão que supõe a prática de crimes que, pelo que se deixou dito, não se verificam.
Acresce que o recorrente não concretiza quaisquer circunstâncias – dadas como provadas – que o tribunal não tenha ponderado ou que outras existam que justifiquem a alteração do decidido, pelo que não vê este tribunal – de acordo com os argumentos aduzidos – razões para censurar a decisão recorrida, no que à determinação da medida concreta das penas aplicadas respeita (note-se que não basta, quando o recorrente divirja da decisão proferida, manifestar a sua divergência quanto ao decidido, impondo-se que, até pela natureza do recurso, concretize as razões pelas quais o tribunal, na sua perspetiva, errou e as razões que fundamentem decisão diversa da proferida).
De facto, são bem elevadas as exigências de prevenção geral e especial que no caso se fazem sentir, pela premente necessidade de pôr cobro a este tipo de comportamentos (note-se que, como nos dá conta a Resolução do Conselho de Ministros n.º 88/2003, II Plano Nacional contra a Violência Doméstica, Introdução, Diário da República, I Série B, de 7 de julho de 2003, “… a violência contra as mulheres no espaço doméstico é a maior causa de morte e invalidez entre mulheres dos 16 aos 44 anos, ultrapassando o cancro, acidentes de viação e até a guerra. Este dado internacional, se relacionado com os indicadores disponíveis em Portugal (embora apenas indicativos e ainda a necessitar de confirmação mais rigorosa), que sugerem que semanalmente morrem mais de cinco mulheres por razões direta ou indiretamente relacionadas com atos de violência doméstica, dá-nos uma fotografia de uma realidade que nos ofende na nossa dignidade humanas enquanto pessoas e na nossa condição de cidadãos enquanto portugueses… Não podemos ignorar que a grande maioria das situações que prefiguram casos de violência doméstica são ainda as exercidas sobre mulheres pelo seu marido ou companheiro”.
Esta preocupação – escreve-se na decisão recorrida – “tem vindo a ser documentada nos diversos diplomas legais relativos à matéria, nomeadamente, no Regime Jurídico Aplicável à Prevenção da Violência Doméstica e à Proteção e Assistência das suas Vítimas, aprovado pela Lei 112/2009, de 16 de setembro”, pelo que urge “desincentivar eficazmente este tipo de comportamento, que causa alarme e insegurança na comunidade, por colocar frequentemente em causa valores de particular relevo como a vida ou a integridade física, revestindo-se, por essa via, de acentuada perigosidade”.
Por outro lado, relevam também as elevadas exigências de prevenção especial, pois que o arguido, não obstante a gravidade dos factos, tal como demonstrados ficaram – pelo período durante o qual se desenrolaram, pelas circunstâncias em que ocorreram e suas consequências - continua a vitimizar-se, a “mandar” as culpas para a ofendida e para o filho, circunstância que bem revela que não interiorizou o desvalor da sua conduta o que não pode deixar de relevar ao nível da necessidade da pena, enquanto meio de dissuasão da prática, no futuro, de novos ilícitos.
Perante tais exigências - sendo certo que, como supra se referiu, o arguido não questiona as penas concretamente aplicadas, mas antes os crimes pelos quais foi condenado - e ponderando a gravidade dos factos (tal como constam provados), o dolo direto com que o arguido atuou e as suas condições pessoais (veja-se que não obstante a ausência de antecedentes criminais e ser uma pessoa “considerada e respeitada por aqueles que consigo privam” – como se provou – o arguido continua a manter uma notória animosidade em relação à ofendida e a não reconhecer a gravidade dos factos, o que releva ao nível da necessidade da pena) temos que bem ponderadas se mostram as penas concretamente aplicadas.
Apenas mais duas notas finais:
Uma para dizer que não se percebe a que propósito e com que finalidade o arguido vem, na 10.ª conclusão, a questionar a existência de danos patrimoniais, uma vez que nenhum pedido foi formulado a esse propósito e não foi condenado, a esse título, no pagamento de qualquer quantia.
Uma segunda para dizer - no que respeita aos danos não patrimoniais, cuja existência questiona (nessa mesma conclusão), embora sem retirar nenhuma ilação concreta do alegado - que a decisão recorrida, nessa parte, não é passível de recurso, ex vi art.º 400 n.º 2 do CPP, uma vez que o pedido é inferior ao valor da alçada do tribunal recorrido, que à data do pedido era de 5.000,00 € (art.º 24 da Lei 3/99, de 13 de maio, na redação que lhe foi dada pelo art.º 5 do DL 303/2007, de 28.04, que entrou em vigor em 1.01.2008), pelo que nessa parte não se conhece do recurso.
10. Assim, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a 1.ª Subsecção Criminal deste tribunal em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido (no que respeita à matéria crime) e não tomar conhecimento do recurso no que respeita à matéria cível.
Custas pelo arguido, fixando-se a taxa de justiça em quatro UC, atenta a complexidade do processo e a sua situação económica (art.ºs 513 e 514 do CPP e 8 n.º 5 e tabela III anexa do RCP).

(Este texto foi por mim, relator, elaborado e integralmente revisto antes de assinado)

Évora, 2014/01/28

Alberto João Borges
Maria Fernanda Pereira Palma