Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1523/15.2T8FAR.E1
Relator: MOISÉS SILVA
Descritores: CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
DECLARAÇÃO NEGOCIAL
DECLARAÇÃO RECEPTÍCIA
REVOGAÇÃO
Data do Acordão: 11/22/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: O comportamento da autora, consistente em solicitar a uma vizinha que entregasse o certificado de incapacidade temporária para o trabalho à empregadora e o envio de mensagem de telemóvel para o telemóvel da chefe de serviço da empregadora a informar que por motivos de doença não poderia comparecer no trabalho, imediatamente a seguir à declaração de revogação da resolução do contrato de trabalho por parte da empregadora, constitui um comportamento inequívoco da trabalhadora no sentido da aceitação tácita da repristinação do contrato de trabalho.
(Sumário do relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1523/15.2T8FAR.E1
Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

I – RELATÓRIO

Apelante: BB (autora).
Apelada: CC, Lda (ré).
Tribunal Judicial da comarca de Faro, Faro, Instância Central, 1.ª Secção de Trabalho, J1.

1. A autora intentou ação sob a forma de processo comum contra a ré, pedindo que se declare a ilicitude da cessação do contrato de trabalho promovida pela R. com efeitos a 07 de abril de 2015 e se condene a mesma a pagar-lhe a quantia de € 8 620,22, acrescida de juros a contar da citação e até efetivo e integral pagamento.
Alegou que, no dia 11 de fevereiro de 2015, foi admitida pela R. para, no prazo de um ano, sob as suas ordens, direção e fiscalização, lhe prestar funções correspondentes à categoria de empregada de limpeza, mediante a retribuição mensal de € 505, acrescida de subsídio de alimentação diário de € 2,74 por dia útil de trabalho.
Tal contrato ficou sujeito, por cláusula, a um período experimental de 90 dias.
Sucede que, em 30 de março de 2015, a A. ficou doente com baixa médica entre tal dia e 06 de abril de 2015 e em 02 de abril de 2015 a R. enviou-lhe carta comunicando-lhe a rescisão do contrato no período experimental. Em resposta, em 09 de abril do mesmo ano, remeteu carta à R., que esta recebeu a 13 de abril de 2015, informando-a que se tratava de despedimento ilegal porquanto o período experimental contratado violava a lei e que, por isso, solicitava o pagamento das retribuições de todo o contrato, de férias, subsídio de férias e de natal e compensação de 18 dias de salário.
Continua referindo que a R. em resposta, e dando-lhe razão quanto ao período experimental, revogou a denúncia, informou-a que o contrato se mantinha e solicitou-lhe a apresentação a 11 de fevereiro de 2015.
Angustiada com tal missiva a A. voltou a entrar de baixa médica entre 17 de abril e 28 do mesmo mês tendo solicitado a uma vizinha que entregasse o certificado de incapacidade temporária na R. o que foi feito.
Em 22 de abril de 2015 a mandatária da A. informou a R. que se estava perante despedimento ilícito pelo que solicitava o pagamento das retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao termo do contrato, créditos de formação não ministrada e compensação.
Acrescenta que com a revogação da denúncia se sentiu humilhada, nervosa e passou noites sem dormir pelo que pede o pagamento de indemnização por danos morais.
Em 11 de maio de 2015 a R. comunicou à A. que considerava que a mesma tinha abandonado o posto de trabalho por ausência desde 23 de abril de 2015 sem justificação para o efeito.
Contestando, a R. alegou que recebeu o certificado de incapacidade temporária da A. relativo ao período de 17 de abril de 2015 a 28 de abril do mesmo mês e que, ainda antes da entrega do mesmo a A., remeteu-lhe mensagem de telemóvel informando-a que, por motivos de doença, não poderia comparecer no serviço factos que demonstram aceitação da revogação da declaração emitida pela R..
Mais refere que, em 22 de abril de 2015, a A. foi convocada para verificação de incapacidade temporária que não subsistiu após as 13h18m desse dia.
Não obstante pugna pela existência de abuso de direito.
A A. respondeu alegando que a entrega do certificado de incapacidade temporária se ficou a dever à circunstância de ter julgado que este era o procedimento correto para poder beneficiar da segurança social.
Foi proferido despacho saneador que conheceu do mérito da causa com a seguinte decisão:
Em face do supra exposto, julgo improcedente a ação e, em consequência, absolvo a R. do pedido.
Custas pela A., sem prejuízo do apoio judiciário de que a mesma beneficia (cfr. art.º 527.º do CPC, ex vi art.º 1.º n.º 2 al. a) do CPT). Fixo o valor da ação em € 8 620,22.

2. Inconformada, veio a A. interpor recurso de apelação, motivado e com as conclusões seguintes:
A) A carta enviada pela ré, de 02 de abril de 2015, rececionada pela autora, em 07 de abril de 2015, constitui uma declaração de vontade da ré destinada a fazer cessar o contrato de trabalho celebrado com a autora.
B) A declaração de vontade que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder, ou é dele conhecida, e torna-se irrevogável a partir dessa ocorrência (artigos 224.° n.° 1 e 230.° n.° 1 do CC).
C) O caráter recetício da declaração de vontade de cessação do contrato enviada pela ré, que se tornou eficaz logo que chegou ao conhecimento da autora, impede que a mesma possa ser posteriormente e unilateralmente revogada pela ré.
D) A invocada revogação da comunicação de cessação do contrato de trabalho (14 de abril de 2015) foi posterior à data em que a primeira comunicação foi recebida pela autora (07 de abril de 2015), pelo que já a ré não a poderia emitir, uma vez que a primeira comunicação (declaração de cessação) havia já produzido os seus efeitos jurídicos, ou seja, o despedimento sem justa causa da autora, e portanto ilícito, nos termos do artigo 381.º do Código do Trabalho.
E) Mesmo que se possa considerar a revogação da declaração de cessação por parte da ré como proposta contratual para o restabelecimento da relação laboral nos exatos termos em que vigorou até à declaração de cessação do contrato (contrato de trabalho a termo certo - sujeito à forma escrita - cf. artigo 141.º n.º 1 do Código do Trabalho), a mesma careceria do acordo escrito da autora (o que não ocorreu no caso concreto) não bastando, por isso, uma mera aceitação tácita (como entendeu o tribunal recorrido ter ocorrido).
F) Requer-se pois, a V. Exas., Egrégios Desembargadores, a reforma da douta sentença recorrida, por outra que julgue a ação procedente, declarando ilícita a cessação do contrato de trabalho celebrado entra autora e ré, promovida por esta com efeitos a 07 de abril de 2015, condenando-se a ré nos termos peticionados.

3. A ré foi notificada e respondeu, com as conclusões seguintes:
A) A recorrente elencou como factos provados apenas os que entendeu pertinentes, omitindo, no nosso modesto entendimento, factos essenciais e que levaram à boa decisão da causa por parte do Douto Tribunal “a quo”.
B) A declaração de cessação do contrato de trabalho apesar de insuscetível de revogação unilateral, poderá ser revogada por acordo das partes.
C) Quer a recorrente fazer crer que não deu o seu acordo à revogação da cessação do contrato de trabalho.
D) O que não é verdade.
E) A recorrente aceitou o restabelecimento do vínculo laboral existente com a recorrida, pois que, no dia 17 de abril de 2015, contactou a sua chefe de serviço, a D. …, e informou que não poderia apresentar-se ao serviço, por motivos de doença, tendo entregue à recorrida o respetivo certificado de capacidade temporária para o trabalho (cfr. factos 11.º a 14.º dos factos provados).
F) A recorrente aceitou o restabelecimento do vínculo laboral e, consequentemente, a revogação da cessação do contrato pela recorrida.
G) Estamos perante uma declaração negocial tácita por parte da recorrente, demonstrativa da aceitação da revogação, nos termos do disposto nos artigos 217.º e 236.º do Código Civil.”
H) Pelo que, bem esteve o Douto Tribunal “a quo” ao considerar que “o comportamento que a A. adotou (após a receção da revogação da declaração), no dia 17 de abril de 2015 (ao enviar a mensagem telefónica e ao fazer entregar o certificado de incapacidade temporária na R., tudo já depois da R. ter revogado a declaração de cessação do contrato), à luz do entendimento de um declaratário normal, tem de ser interpretado como de aceitação tácita da proposta de restabelecimento da relação laboral.
I) E porque, no seguimento do que se vem afirmando, é de concluir que a confluência de vontades revogou o despedimento, não pode agora a A. pretender impugná-lo, configurando tal atitude “venire contra factum proprium” por estar em contradição com conduta anterior em que a outra parte tenha, de boa fé, confiado e, com base nela, programado a sua vida.”
J) É a própria recorrente que alega que só por seu acordo poderia operar a revogação, o que na realidade aconteceu, pois o comportamento da recorrida e da recorrente revelam uma revogação da declaração de cessação do contrato de trabalho por parte desta e o respetivo consentimento a essa revogação por parte da recorrente, e, consequentemente, o acordo no restabelecimento do vínculo laboral.
K) A invocação da ilicitude do despedimento pela recorrente traduz-se num exercício ilegítimo de um direito, por exceder os limites impostos pela boa-fé, pois que, a recorrida, em boa fé, retratou-se e reassumiu o vínculo laboral, com o qual a recorrente concordou, vindo depois, de má fé e com o intuito de obter indemnização a que sabia não ter direito, invocar o oposto. Termos em que, V. Ex.ªs. negando provimento ao recurso da recorrente e mantendo a douta sentença proferida farão como sempre boa justiça.

4. O Ministério Público junto deste tribunal emitiu parecer no sentido de ser julgado improcedente o recurso e confirmada a decisão recorrida.
O parecer foi notificado e não foi apresentada resposta.

5. Colhidos os vistos, em conferência, cumpre decidir.

6. Objeto do recurso

O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das alegações formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso.
As questões a decidir consistem em apurar se:
1.ª Ocorreu a revogação da decisão da ré em despedir a autora e se esta aceitou esta revogação.
2.ª A condenação da ré conforme é peticionado.

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
Por força do acordo das partes está provado que:
1. A autora foi admitida ao serviço da ré, por contrato de trabalho celebrado entre ambos no dia 11 de fevereiro de 2015, tendo aí ficado convencionado que aquela se obrigava a prestar a sua atividade correspondente à categoria de trabalhador de limpeza, debaixo das ordens, instruções e disciplina da ré e mediante a remuneração de € 505, por mês acrescido de subsídio de alimentação no valor de € 2,74 por dia útil de trabalho.
2. O contrato de trabalho celebrado entre autora e ré tinha uma cláusula de termo final de um ano a contar do seu início, tendo-se iniciado em 11 de fevereiro de 2015 e cessaria em 10 de fevereiro de 2016, renovável por igual período.
3. O contrato de trabalho foi celebrado entre autora e ré com a invocação de a atividade da empresa ré ter sofrido um acréscimo temporário de trabalho.
4. No dito contrato de trabalho ficou convencionado que o período normal de trabalho da autora seria de 40 horas semanais e de 8 horas diárias.
5. Nos termos da cláusula sétima do aludido contrato de trabalho a termo certo, este ficou sujeito a um período experimental de 90 dias.
6. Em 30 de março de 2015, a autora encontrando-se doente, dirigiu-se ao seu médico assistente que lhe emitiu um certificado de incapacidade temporária para o trabalho com início em 30 de março de 2015 e termo em 06 de abril de 2015.
7. Entretanto, em 02 de abril de 2015, a ré enviou à autora uma carta que foi rececionada pela autora, em 07 de abril de 2015, em cujo texto se dizia: “vimos pela presente comunicar que pretendemos rescindir o contrato de trabalho assinado no passado dia 12 de fevereiro de 2015, no período experimental”.
8. Perante isto, em 09 de abril de 2015, a autora enviou uma carta à ré com o seguinte conteúdo: “em referência à vossa de sete de abril de 2015, pela qual diziam rescindir o meu contrato de trabalho, no período experimental, venho informar que se trata de um despedimento ilegal, já que, de acordo com a alínea a) do n.º 2 do artigo 112.º do Código do Trabalho, em caso de contrato com duração igual ou superior a 6 meses, o período experimental é de 30 dias e não de 90 dias, como consta erradamente da cláusula sétima do contrato de trabalho. Aliás, de acordo com o n.º 5 do mesmo artigo, a duração do período experimental pode ser reduzida por acordo entre as partes. Assim é óbvio que o período experimental não pode ser aumentado, apenas reduzido. Assim, visto que se trata de um despedimento ilegal, terá essa empresa de me pagar todo o contrato, bem como férias, subsídio de férias e de Natal. Tenho ainda direito a uma compensação de 18 dias de salário.
Caso os créditos a que tenho direito não me sejam pagos, terei de recorrer ao tribunal do trabalho.
Solicito ainda, no prazo de cinco dias me enviem o Mod RP 5044 DGSS.”.
9. Tal carta foi recebida pela ré em 13 de abril de 2015.
10. A ré, em 14 de abril de 2015, remeteu nova carta à autora na qual se lê: “acusamos a receção da V. carta datada de 09 de abril de 2015, a qual mereceu a n/ melhor atenção.
Na sequência da mesma, somos a informar que efetivamente o período experimental é de 30 dias, pelo que, pela presente, damos sem efeito a carta remetida a V. Exas no dia 07 de abril de 2015, revogando assim a denúncia do contrato de trabalho efetuada.
Atento o exposto, informamos que se mantém em vigor o contrato de trabalho celebrado com V. Exa em 11 de fevereiro de 2015.
Pelo que, deverá, assim, V. Exa apresentar-se ao serviço no dia útil seguinte à receção da presente carta”.
11. Em 17 de abril de 2015 o médico assistente da A. passou-lhe certificado de incapacidade temporária para o trabalho, com início em 17 de abril de 2015 e termo em 28 de abril de 2015.
12. A autora solicitou a uma vizinha que entregasse o documento mencionado à ré.
13. O certificado de incapacidade temporária para o trabalho foi, efetivamente, entregue à ré por uma terceira pessoa, a qual entregou o certificado à D. …, funcionária da ré e chefe de serviço da autora, tendo informado que o estava a fazer em nome da autora e a solicitação desta.
14. No dia 17 de abril de 2015, e ainda antes da entrega do certificado de incapacidade para o trabalho, a autora enviou mensagem de telemóvel para o telemóvel da D. …, a informar que por motivos de doença não poderia comparecer no trabalho.
15. A autora, em face da referida incapacidade, foi convocada para uma verificação de incapacidade temporária, que ocorreu em 22/04/2015, e que, em face da referida verificação, a incapacidade para o trabalho não subsistiu.

B) APRECIAÇÃO
Como já referimos supra, as questões a decidir são as seguintes:
1.ª Ocorreu a revogação da decisão da ré em despedir a autora e se esta aceitou esta revogação.
2.ª A condenação da ré conforme é peticionado.

B1) A revogação da decisão da ré em despedir a autora e se esta aceitou esta revogação
A carta enviada à autora pela ré e onde esta comunica a cessação do contrato de trabalho durante o período experimental, constitui uma declaração negocial que se tornou eficaz logo que chegou ao seu poder ou foi conhecida daquela (art.º 224.º n.º1 do Código Civil).
Esta declaração da ré à autora é irrevogável depois de ter sido recebida por esta ou desta conhecida, como é o caso dos autos (art.º 230.º n.º 1 do CC).
Se, porém, ao mesmo tempo que a proposta, ou antes dela, o destinatário receber a retratação do proponente ou tiver por outro meio conhecimento dela, fica a proposta sem efeito (art.º 230.º n.º 2 do CC).
No caso, a retratação da empregadora ocorreu após a trabalhadora ter tido conhecimento da comunicação daquela e na sequência da invocação por esta de que a mesma configurava um despedimento ilícito e reclamava o pagamento dos créditos daí decorrentes, pelo que não é aplicável esta última norma jurídica que referimos.
A questão está em saber se o comportamento da trabalhadora, após a comunicação da empregadora a revogar a denúncia do contrato de trabalho, constitui aceitação expressa ou tácita desta declaração.
O art.º 235.º do CC prescreve que se o destinatário rejeitar a proposta, mas depois a aceitar, prevalece a aceitação, desde que esta chegue ao poder do proponente, ou seja dele conhecida, ao mesmo tempo que a rejeição, ou antes dela (n.º 1).
Está assente que: em 09 de abril de 2015, a autora enviou uma carta à ré com o seguinte conteúdo: “em referência à vossa de sete de abril de 2015, pela qual diziam rescindir o meu contrato de trabalho, no período experimental, venho informar que se trata de um despedimento ilegal, já que, de acordo com a alínea a) do n.º 2 do artigo 112.º do Código do Trabalho, em caso de contrato com duração igual ou superior a 6 meses, o período experimental é de 30 dias e não de 90 dias, como consta erradamente da cláusula sétima do contrato de trabalho. Aliás, de acordo com o n.º 5 do mesmo artigo, a duração do período experimental pode ser reduzida por acordo entre as partes. Assim é óbvio que o período experimental não pode ser aumentado, apenas reduzido. Assim, visto que se trata de um despedimento ilegal, terá essa empresa de me pagar todo o contrato, bem como férias, subsídio de férias e de Natal. Tenho ainda direito a uma compensação de 18 dias de salário; caso os créditos a que tenho direito não me sejam pagos, terei de recorrer ao tribunal do trabalho; solicito ainda, no prazo de cinco dias me enviem o Mod RP 5044 DGSS.”;
Tal carta foi recebida pela ré em 13 de abril de 2015; e a ré, em 14 de abril de 2015, remeteu nova carta à autora na qual se lê: “acusamos a receção da V. carta datada de 09 de abril de 2015, a qual mereceu a n/ melhor atenção; na sequência da mesma, somos a informar que efetivamente o período experimental é de 30 dias, pelo que, pela presente, damos sem efeito a carta remetida a V. Exas no dia 07 de abril de 2015, revogando assim a denúncia do contrato de trabalho efetuada; atento o exposto, informamos que se mantém em vigor o contrato de trabalho celebrado com V. Exa em 11 de fevereiro de 2015, pelo que, deverá, assim, V. Exa apresentar-se ao serviço no dia útil seguinte à receção da presente carta”;
Em 17 de abril de 2015 o médico assistente da A. passou-lhe certificado de incapacidade temporária para o trabalho, com início em 17 de abril de 2015 e termo em 28 de abril de 2015 e a autora solicitou a uma vizinha que entregasse o documento mencionado à ré, o qual foi, efetivamente, entregue à ré por uma terceira pessoa, a qual entregou o certificado à D. …, funcionária da ré e chefe de serviço da autora, tendo informado que o estava a fazer em nome da autora e a solicitação desta.
Resulta destes factos provados que a empregadora declarou que repunha em vigor o contrato de trabalho da autora após esta ter rejeitado a comunicação de denúncia efetuada, pelo que não pode aplicar-se ao caso concreto o regime jurídico prescrito no art.º 235.º n.º 1 do CC, que já citamos, quanto à aceitação da denúncia.
O comportamento da trabalhadora, consistente em comunicar à empregadora a situação de baixa médica, constitui um facto posterior à cessação efetiva do contrato de trabalho e poderá apenas ser apreciado como eventual aceitação posterior da proposta da empregadora em repristinar o contrato de trabalho que havia cessado.
Uma relação jurídica, sobretudo quando é duradoura, como ocorre com a que resulta da existência de um contrato de trabalho, está sujeita a vicissitudes, as quais importa interpretar e harmonizar a contento de ambas as partes.
Os sujeitos da relação jurídica praticam atos que têm consequências na mesma e que devem ser interpretados de acordo com os princípios das boa fé.
O comportamento da trabalhadora, consistente em solicitar a uma vizinha que entregasse o certificado de incapacidade temporária para o trabalho à empregadora e o envio de mensagem de telemóvel para o telemóvel da chefe de serviço da empregadora a informar que por motivos de doença não poderia comparecer no trabalho, imediatamente a seguir à declaração de revogação da resolução do contrato de trabalho por parte da empregadora, constitui um comportamento inequívoco da trabalhadora no sentido da aceitação tácita da repristinação do contrato de trabalho[1].
Um declaratário normal, de boa fé, colocado na posição da empregadora, assumiria que a trabalhadora aceitava que o contrato de trabalho continuava em vigor. Se não fosse este o entendimento da trabalhadora, não tinha que enviar a justificação da falta ao trabalho. Só se justifica a falta ao trabalho relativamente a um contrato de trabalho que está em vigor.
Os factos praticados pela trabalhadora após revogação da declaração de denúncia do contrato de trabalho apontam inequivocamente no sentido de que aquela aceitou esta última proposta declarativa da empregadora.
Nesta medida, não pode proceder a apelação quanto a esta questão.
Face à solução dada a esta questão, fica prejudicado o conhecimento da condenação da ré conforme é peticionado, pois esta dependia da solução positiva dada à primeira.
Nesta conformidade, julgamos a apelação improcedente e confirmamos a sentença recorrida.

Sumário: o comportamento da autora, consistente em solicitar a uma vizinha que entregasse o certificado de incapacidade temporária para o trabalho à empregadora e o envio de mensagem de telemóvel para o telemóvel da chefe de serviço da empregadora a informar que por motivos de doença não poderia comparecer no trabalho, imediatamente a seguir à declaração de revogação da resolução do contrato de trabalho por parte da empregadora, constitui um comportamento inequívoco da trabalhadora no sentido da aceitação tácita da repristinação do contrato de trabalho.

III - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção social do Tribunal da Relação de Évora em julgar a apelação improcedente e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela apelante, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.
Notifique.
(Acórdão elaborado e integralmente revisto pelo relator).

Évora, 22 de Novembro de 2016.
Moisés Silva (relator)
João Luís Nunes
Alexandre Ferreira Baptista Coelho
__________________________________________________
[1] Ac. STJ de 12.09.2013, processo n.º 605/09.4TTFAR.E1.S1, www.dgsi.pt/jstj.