Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
326/17.4PALGS-A.E1
Relator: SÉRGIO CORVACHO
Descritores: REABERTURA DA AUDIÊNCIA
LEI MAIS FAVORÁVEL
Data do Acordão: 11/10/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Se, após o trânsito em julgado da condenação mas antes de ter cessado a execução da pena, entrar em vigor lei penal mais favorável, o condenado pode requerer a reabertura da audiência para que lhe seja aplicado o novo regime.

Não poderá falar-se em «lei mais favorável ao arguido», entendendo-se como tal, aquela cujo conteúdo normativo abra uma possibilidade de melhoria da situação jurídico-penal do condenado, assente na sentença transitada em julgado.

Decisão Texto Integral: ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

I. Relatório

No processo sumário nº 326/17.4PALGS, que corre termos no Juízo de Competência Genérica de Lagos do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, em que é arguido AMCF, pela Exª Juiz titular dos autos foi proferido, em 19/11/2019, um despacho do seguinte teor:

«Veio o arguido por requerimento de 10.09.2018 (fls. 205 a 210) requerer a reabertura da audiência, ao abrigo do art. 371.º A CPP, para aplicação do disposto no art. 43.º CP na redacção dada pela l. 94/2017, de 23.08, por entender que se trata de regime que lhe é mais favorável.

Em vista, o Digno Magistrado do Ministério Público pronunciou-se negativamente, com fundamento em que a norma cuja aplicação o arguido reclama como mais favorável já permitia anteriormente à alteração legislativa a aplicação ao caso do regime aí previsto, o que foi ponderado pelo Mm.º Juiz prolator da sentença. E entendimento diverso, dando razão ao arguido, importará modificação de decisão já transitada.

Vejamos.

RESULTA DOS AUTOS A SEGUINTE FACTUALIDADE, RELEVANTE PARA DECIDIR A QUESTÃO:

- o arguido foi condenado por sentença de 19.07.2017, entre o mais, na pena de 6 (seis) meses de prisão efectiva, aí se ponderando a possibilidade de substituição da pena por outras não privativas, concluindo-se pela essencialidade do cumprimento efectivo da mesma através de "reclusão do arguido em meio prisional".

- Admitido recurso interposto pelo arguido, foi proferido Ac. pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora em 10.04.2018, negando provimento ao recurso e mantendo a sentença recorrida, resultando da fundamentação, para o que importa, já a ponderação à luz do CP com as alterações introduzidas pela L. 94/2017, de 23.08, colocando-se expressamente a questão de saber se "justificar-se-á o cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação?", concluindo-se pela negativa, pois que "não tem justificação a mencionadas previsões dos arts. 43.°, 44.°, 50.° e 58, do CP.", acrescentando que "a prisão por dias livres foi abolida pela 1. 94/2017, de 23.08, conforme consta da previsão do seu art.Z.".".

- Foi interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, o qual não foi admitido

(fls. 116),

- o arguido apresentou reclamação que foi indeferida (fls. 180) e

- interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, que não foi admitido (fls. 189), tendo o acórdão transitado em 10.09.2018.

ENQUADRAMENTO JURÍDICO:

Veio o CP ser alterado pela L. 94/2017, de 23.08, designadamente, para o que nos importa, quanto à redacção dada aos arts. 43.°, passando este a prever:

"Artigo 43.°

Regime de permanência na habitação

1 - Sempre que o tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir, são executadas em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância:

a) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos; ( .. .)".

Sendo que o art. 44.° na redacção anterior à L. 94/2017, dispunha que "Artigo 44.°

Regime de permanência na habitação

1 - Se o condenado consentir, podem ser executados em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição:

a) A pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano;".

A L. 94/2017, de 23.08 entrou em vigor 90 dias após a sua publicação (art. 14.° do referido diploma), dela resultando no art. 12.° que "1 - O condenado em prisão por dias livres ou em regime de semidetenção, por sentença transitada em julgado, pode requerer ao tribunal a reabertura da audiência para que:

a) A prisão pelo tempo que faltar seja substituída por pena não privativa da liberdade, sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição; ou

b) A prisão passe a ser cumprida, pelo tempo que faltar, no regime de permanência na habitação introduzido pela presente lei.".

Por outro lado, resulta do disposto no art. 371.°A CPP que "Se, após o trânsito em julgado da condenação mas antes de ter cessado a execução da pena, entrar em vigor lei penal mais favorável, o condenado pode requerer a reabertura da audiência para que lhe seja aplicado o novo regime.".

Vistos estes considerando, atalhando caminho dir-se-á que o requerido pelo arguido está votado ao insucesso, sequer podendo ser respaldado pelo Ac. TRP no qual o arguido se estriba para sustentar o pedido.

Razões:

Note-se que se é certo que aquando da prolação da sentença em primeira instância ainda não se encontrava sequer publicada a L94/2017, de 23.08 que introduziu a alteração ao art. 43.° de cuja redacção o arguido se quer fazer valer, assim já não era aquando da prolação do acórdão em segunda instância, tendo o Tribunal de recurso apreciado o mesmo já à luz das alterações introduzidas pela L. 94/2017, ponderando em concreto, como resulta do que vai dito supra, se se "justificar-se-á o cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação?", concluindo-se pela negativa, pois que "não tem justificação a mencionadas previsões dos arts. 43.°, 44.°, 50.° e 58, do CP. ", acrescentando que "a prisão por dias livres foi abolida pela L. 94/2017, de 23.08, conforme consta da previsão do seu art.2º.", repete-se para avivar a memória.

Diz-se pois, como reapreciar, mesmo à luz do disposto no art. 12.° da L. 94/2017 ou do art. 371.°A CPP, o pedido ora deduzido pelo arguido sem violação do caso julgado? Não nos parece que tal tenha cabimento legal, tendo já transitado em julgado a sentença condenatória.

Ainda que assim não fosse, sempre se diria que não teria cabimento legal a reabertura da audiência ao abrigo do art. 12.° da L. 94/2017, pois que esta pressupõe que o arguido haja sido condenado em prisão por dias livres ou regime de semi detenção, o que não ocorre no caso em apreço em que o arguido foi condenado a pena de prisão efectiva.

Nem tem aplicação a abertura nos termos do art. 371º A CPP, pois que, na comparação entre o regime previsto no art. 44.º anterior às alteações da L. 94/2017 e o art. 43.º com as alterações desta Lei se constata que em abstracto não decorre qualquer benefício da lei nova para o arguido, condenado que foi em seis meses de prisão efectiva, pois que tanto aquando da prolação da sentença em primeira instância (à luz da redacção anterior à L 94/2017) como aquando da prolação do acórdão da Relação (já à luz das alterações da L. 94/2017) já seria possível a aplicação do regime que o arguido ora vem de reclamar, entendendo-se, porém, expressamente que no caso concreto em apreço, só o cumprimento em reclusão prisional cumpriria de forma suficiente e adequada as finalidades da punição.

Com efeito, diz-se mesmo no Ac. TRE, após ponderar os efeitos criminógenos das penas curtas de prisão: " ( ... )

Todavia, a pena privativa de liberdade de curta duração pode, para os infractores de tráfego rodoviário e para os de carácter económico, ter uma eficácia curativa, dado o seu cariz intimidatório sobre pessoas socialmente estabelecidas, com que se têm abonado algumas decisões, designadamente, do Supremo Tribunal de Justiça. Neste mesmo sentido, o Acórdão de 3-4-2003, Proc. 03P853 (www.dgsi.pt), na defesa de que "em matéria de crimes rodoviários, impõe-se hoje, como meio de tratamento penal preventivo mais adequado ao desenfreado e cada vez mais alarmante desregramento reinante nas estradas portuguesas, o recurso às penas de prisão, ainda que por vezes de curta duração, por terem uma especial eficácia curativa, dado o seu cariz intimidatório sobre pessoas socialmente estabelecidas".

E, efectivamente, no caso em análise, como já referido, a simples censura do facto e a ameaça da pena não realizam de forma adequada as finalidades da punição. É que, por um lado, o arguido revela um quadro de antecedentes criminais que dá nota de uma incontornável propensão para a prática de crimes relacionados com a condução de veículos automóveis em estado de alcoolémia, ou, como no caso "sub judice", com fuga ao controle da mesma.

Por outro lado, nada aponta, pois não revelou qualquer recuperação para que pretenda pôr cobro a um tal agir, e nem o facto de ter sido sucessivamente condenado, o determinou a agir por forma a conformar-se com os valores ético-jurídicos que violou com a sua conduta.

Portanto, está afastada a possibilidade de se aplicar ao arguido, quer a pena de suspensão de execução da pena, quer, pelas mesmas razões, para as quais se remete, o seu cumprimento em regime de permanência em habitação, ou a prestação de trabalho a favor da comunidade.

Pois que devido aos seus antecedentes criminais - as já mencionadas condenações anteriores ., no caso "sub Judice", o tribunal recorrido, entendeu, bem, que tendo, anteriormente, incorrido, na prática, por diversas vezes, de diversos tipos de crime, conclui-se que tais condenações não surtiram qualquer efeito., sendo óbvio que é notório, pois, que o comportamento que o arguido vem evidenciando não deixa dúvidas de que o mesmo não tem aproveitado para se auto-educar para o direito, sendo evidentes as prementes exigências em sede de prevenção especial, para além das exigências que se fazem sentir em sede de prevenção geral, tendo a final optado pela aplicação ao arguido de uma pena de prisão em detrimento da pena de multa, por apenas ser a resposta adequada e proporcional face às exigências de prevenção (geral e especial).

Em face do referido nos pontos anteriores, não tem justificação a mencionadas previsões dos arts. 43°,44°, 50° e 58°, do CP.

Por fim, dir-se-á que a prisão por dias livres, foi abolida pela Lei n.º 94/2017, de 23/08, conforme consta da previsão do seu art. 2°.

( ... )" - cfr. Ac. TRE de fls. 86 a 106 que no mais se dá por integrado e reproduzido. Pelo que, também não se vê como possa admitir-se a reabertura da audiência ao abrigo do disposto no art. 371.º A CPP.

Neste sentido, em situação similar, cfr. Ac. TRG de 10.07.2018, P. 1071l6.2GAVNC-A.G1, in www.dgsi.pt.

Assim e sem necessidade de mais considerandos, julga-se improcedente o requerido pelo arguido.

Notifique. DN»

Do despacho proferido o arguido AMCF interpôs recurso, devidamente motivado, formulando as seguintes conclusões:

1. O recorrente, foi julgado e condenado pela prática de um crime de desobediência, na pena de 6 meses de prisão efectiva, sem que o tribunal de julgamento tivesse ponderado a execução da pena fora do meio prisional.

2. Entretanto, foi publicada a Lei 94/2017, de 23 de Agosto, que introduziu alterações ao Regime de Permanência na Habitação, verificando-se que surge com esta alteração, lei penal mais favorável ao arguido condenado, fazendo assim aumentar as exigências de ponderação da sua aplicação ao caso sub judice.

3. Com as alterações introduzidas pela Lei nº 94/2017 de 23/8 o regime de permanência na habitação previsto no art. 43° CP passou a constituir não só uma pena de substituição em sentido impróprio, mas também uma forma de execução ou cumprimento da pena de prisão.

4. Cabia ao tribunal a quo decidir se tal pena é executada em estabelecimento prisional ou no regime de permanência na habitação, tendo como suporte a informação prévia que é solicitada aos serviços de reinserção sobre a situação pessoal, familiar, laboral e social do arguido ou condenado e a sua compatibilidade com as exigências da vigilância electrónica (artigos 370.° do Código de Processo Penal e 7°, nº 2, e 19° da Lei nº 33/2010).

5. Não o tendo feito na sentença condenatória, poderá e deverá fazê-lo agora (pois se trata de um poder-dever do juiz a quo), ordenando a reabertura da audiência para aplicação de regime mais favorável e, por essa via, determinar que seja solicitada informação prévia aos serviços de reinserção acerca a situação pessoal, familiar, laboral e social do arguido ou condenado e a sua compatibilidade com as exigências da vigilância electrónica, com vista a poder decidir da aplicabilidade ou não do regime de execução da pena em permanência na habitação.

6. Ao indeferir o pedido de reabertura da audiência, o tribunal a quo violou os arts. 371.º-A do CPP, 43.° do Código Penal e 19.°, n.º 2 da Lei n.º 33/2010, de 02 de Setembro.

Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, substituindo-a por outra que defira o requerido pelo recorrente.

O recurso interposto foi admitido com subida imediata, em separado, e efeito suspensivo.

O MP respondeu à motivação do recorrente, tendo formulado, por seu turno, as seguintes conclusões:

1. O recorrente vem interpor recurso do despacho que indeferiu o requerimento de reabertura da audiência, ao abrigo do disposto no artigo 317.º-A do Código de Processo Penal, com vista à aplicação de lei mais favorável ao arguido.

2. Fundamenta o seu recurso no facto de a publicação da Lei 94/2017, de 23/08, determinar que o Tribunal teria de ponderar se a pena de prisão a que o arguido foi condenado seria executada no estabelecimento prisional ou em regime de permanência na habitação, e não o fez.

3. Concluindo o recorrente que a decisão proferida violou o disposto no artigo 371.º-A do Código de Processo Penal, o artigo 43.º do Código Penal e o artigo 19.º, n.º 2 da Lei 33/2010, de 02/09, devendo ser revogada.

4. A sentença datada de 19.07.2017 condenou o arguido na pena de seis meses de prisão efectiva, tendo o Tribunal A Quo ponderando a possibilidade de substituição da pena de prisão por outras não privativas da liberdade, concluindo no entanto pela necessidade do cumprimento efectivo da pena de prisão, através de reclusão do arguido em meio prisional.

5. O arguido interpôs recurso dessa decisão, tendo o Venerando Tribunal da Relação de Évora, no acórdão proferido a 10.04.2018, avaliado se a pena de prisão a que o arguido foi condenado poderia ser cumprida em regime de permanência na habitação, concluindo que a execução da pena em regime de permanência na habitação não realizaria de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena, mantendo assim a decisão recorrida.

6. A disposição transitória constante do artigo 12.º da Lei 94/2017, de 23/08, consagra que pode requerer ao Tribunal a reabertura da audiência o condenado em prisão por dias livres ou em regime de semidetenção, o que não se verifica no caso sub judice, uma vez que o arguido foi condenado na pena de seis meses de prisão efectiva.

7. O disposto no artigo 371.º-A do Código de Processo Penal não é aplicável ao caso em apreço, pelo facto de a lei mais favorável que o arguido invoca, a Lei 94/2017, de 23/08, ter entrado em vigor antes do trânsito da decisão, a mesma já ter sido considerada no Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora e, efectuando a comparação entre o regime constante do artigo 44.º do Código Penal e do artigo 43.º, na redacção da Lei 94/2017, de 23/08, não nos permite concluir que seja mais favorável ao arguido.

8. Face ao exposto, a decisão recorrida não merece qualquer reparo, por não existir qualquer vício ou violação de qualquer norma, devendo julgar-se o recurso apresentado totalmente improcedente.

Pelo exposto, mantendo, na íntegra, a decisão recorrida farão V. Exas. JUSTIÇA.

Pelo Digno Procurador-Geral Adjunto junto desta Relação foi emitido parecer sobre o recurso em presença, no sentido da sua improcedência.

O parecer emitido foi notificado ao recorrente, a fim de se pronunciar, não tendo ele exercido o seu direito de resposta.

Foram colhidos os vistos legais e procedeu-se à conferência.

II. Fundamentação

Nos recursos penais, o «thema decidendum» é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, as quais deixámos enunciadas supra.

A sindicância da decisão recorrida, que transparece das conclusões do recorrente, resume-se à pretensão de reversão do juízo de indeferimento que recaiu sobre o pedido por ele formulado, no sentido da reabertura da audiência de julgamento, com vista à aplicação de lei penal mais favorável.

A reabertura da audiência de julgamento, para o efeito da aplicação de regime legal mas favorável ao arguido, vem prevista no art. 371º-A do CPP:

Se, após o trânsito em julgado da condenação mas antes de ter cessado a execução da pena, entrar em vigor lei penal mais favorável, o condenado pode requerer a reabertura da audiência para que lhe seja aplicado o novo regime.

O arguido mobiliza a seu favor a Reforma do Código Penal aprovada pela Lei nº 94/2017 de 23/8, a qual entrou em vigor 90 dias após a sua publicação, por força do disposto no art. 14º do diploma reformador, tendo em vista o cumprimento da pena de prisão em que foi condenado no processo principal, em regime permanência na habitação.

Na redacção do CP introduzida pela Lei nº 94/2017 de 23/8, o cumprimento das penas de prisão em regime de permanência na habitação vem previsto no art. 43º:

1 - Sempre que o tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir, são executadas em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância:

a) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos;

b) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos resultante do desconto previsto nos artigos 80.º a 82.º;

c) A pena de prisão não superior a dois anos, em caso de revogação de pena não privativa da liberdade ou de não pagamento da multa previsto no n.º 2 do artigo 45.º

2 - O regime de permanência na habitação consiste na obrigação de o condenado permanecer na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, sem prejuízo das ausências autorizadas.

3 - O tribunal pode autorizar as ausências necessárias para a frequência de programas de ressocialização ou para atividade profissional, formação profissional ou estudos do condenado.

4 - O tribunal pode subordinar o regime de permanência na habitação ao cumprimento de regras de conduta, suscetíveis de fiscalização pelos serviços de reinserção social e destinadas a promover a reintegração do condenado na sociedade, desde que representem obrigações cujo cumprimento seja razoavelmente de exigir, nomeadamente:

a) Frequentar certos programas ou atividades;

b) Cumprir determinadas obrigações;

c) Sujeitar-se a tratamento médico ou a cura em instituição adequada, obtido o consentimento prévio do condenado;

d) Não exercer determinadas profissões;

e) Não contactar, receber ou alojar determinadas pessoas;

f) Não ter em seu poder objetos especialmente aptos à prática de crimes.

Na versão imediatamente anterior, a mesma figura penal era tratada pelo art. 44º do CP:

1 - Se o condenado consentir, podem ser executados em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição:

a) A pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano;

b) O remanescente não superior a um ano da pena de prisão efectiva que exceder o tempo de privação da liberdade a que o arguido esteve sujeito em regime de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação.

2 - O limite máximo previsto no número anterior pode ser elevado para dois anos quando se verifiquem, à data da condenação, circunstâncias de natureza pessoal ou familiar do condenado que desaconselham a privação da liberdade em estabelecimento prisional, nomeadamente:

a) Gravidez;

b) Idade inferior a 21 anos ou superior a 65 anos;

c) Doença ou deficiência graves;

d) Existência de menor a seu cargo;

e) Existência de familiar exclusivamente ao seu cuidado.

3 - O tribunal revoga o regime de permanência na habitação se o condenado:

a) Infringir grosseira ou repetidamente os deveres decorrentes da pena; ou

b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado e revelar que as finalidades do regime de permanência na habitação não puderam por meio dele ser alcançadas.

4 - A revogação determina o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença, descontando-se por inteiro a pena já cumprida em regime de permanência na habitação.

Invoca ainda que o despacho recorrido violou o disposto no nº 2 do art. 19º da Lei nº 33/2010 de 2/9, que reza:

O tribunal notifica os serviços de reinserção social da sentença transitada em julgado que aplicar a pena referida no número anterior, devendo estes serviços proceder à instalação dos equipamentos de vigilância electrónica no prazo máximo de quarenta e oito horas.

A «pena», a que se refere o preceito agora citado, é a de prisão em regime de permanência na habitação, prevista, ao tempo, no art. 44º do CP.

Conforme se refere na fundamentação da sentença recorrida e pode inferir-se da certidão que instrui o presente recurso em separado:

a) O arguido foi condenado, no âmbito de processo principal, em pena de 6 meses de prisão efectiva, por sentença proferida em 19/7/2017 (fls. 2 a 5);

b) Da sentença condenatório, o arguido interpôs para esta Relação, sobre o qual recaiu acórdão proferido em 10/4/2018, que lhe negou provimento (fls. 6 a 16).

Nesta conformidade, quando é proferida a decisão final sobre a condenação aplicada ao arguido, já tinha entrado em vigor a redacção do CP introduzida pela Lei nº 94/2017 de 23/8, incluindo o novo texto do art. 43º.

Nesta perspectiva, a Reforma do CP, a que nos vimos referindo, não constitui «lei nova», para o efeito previsto no art. 371º-A do CPP, porquanto iniciou a sua vigência ainda antes do trânsito em julgado da decisão condenatória.

Além disso, afigura-se-nos que tão pouco poderá falar-se em «lei mais favorável ao arguido», entendendo-se como tal aquela, cujo conteúdo normativo abra uma possibilidade de melhoria da situação jurídico-penal do condenado, assente na sentença transitada em julgado.

Confrontando o teor do art. 43º do CP, na nova redacção, com o normativo equivalente (art. 44º do CP), verifica-se que texto legal mais recente veio ampliar de forma substancial as possibilidades de execução das penas de prisão em regime de permanência na habitação.

Contudo, a alteração normativa verificada é irrelevante para a situação concreta do arguido recorrente, já que este foi condenado numa pena de 6 meses de prisão, a qual, pela sua medida, podia já ser cumprida em regime de permanência na habitação, ao abrigo do nº 1 do art. 44º do CP, na versão anterior à Lei nº 94/2017 de 23/8.

Assim, também em razão do conteúdo dos regimes legais em confronto, não se justifica a reabertura da audiência de julgamento, prevista no art. 371º-A do CPP.

Por fim, a notificação prescrita pelo nº 2 do art. 19º da Lei nº 33/2010 de 2/9 tem como pressuposto que tenha sido proferida sentença, que tenha condenado o arguido em pena de prisão em regime de permanência na habitação, o que não aconteceu.

Tudo visto, terá o recurso de fracassar.

III. Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente, fixando-se em 3 UC a taxa de justiça.

Notifique.

Évora, 10/11/20 (processado e revisto pelo relator)

(Sérgio Bruno Povoas Corvacho)

(João Manuel Monteiro Amaro)