Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
588/08.8PBBJA-B.E1
Relator: MARIA LEONOR ESTEVES
Descritores: COMPETÊNCIA MATERIAL
PENA DE PRISÃO
LIQUIDAÇÃO
Data do Acordão: 02/03/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: O tribunal materialmente competente para proceder à liquidação da pena de prisão aplicada ao arguido, em caso de cumprimento sucessivo de penas de prisão, é o Tribunal de Execução das Penas.
Decisão Texto Integral:


Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

1. Relatório
No processo comum com intervenção de tribunal singular nº 588/08.8PBBJA que corre termos na Instância Local, Secção Criminal, J1 da comarca de Beja foi proferido despacho que declarou materialmente competente o tribunal da condenação para proceder à liquidação da pena única de prisão aplicada ao arguido FMMC, devidamente identificado nos autos.
Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso o MºPº, pretendendo que seja revogada e substituída por outra que atribua ao T.E.P. a competência para efectuar o cômputo de penas de prisão de execução sucessiva, para o que formulou as seguintes conclusões:
Vem o recurso interposto do despacho judicial proferido a fls. 1025 a 1027 dos autos que correm termos em Beja - Instância Local – Secção Criminal – J1 sob o n.º 588/08.8 PBBJA, no qual a Mm.ª Juiz se declarou materialmente competente para proceder à liquidação da pena única de prisão aplicada ao arguido FMMC, posição que não acolhemos.
A questão objecto deste recurso é a de saber qual o Tribunal materialmente competente para a contagem da referida pena de prisão e subsequente homologação, nos casos de execução sucessiva de penas.
Para dirimir essa questão a jurisprudência não tem produzido argumentos decisivamente convincentes. Há que ponderar, por isso, os parcos elementos disponíveis no ordenamento, integrando-os no sistema, e dando primazia àquele que a melhor doutrina considera o elemento decisivo da interpretação jurídica – o elemento teleológico, também chamado lógico ou racional.
Mas nenhuma interpretação pode prescindir, até por razões metodológicas, da análise do elemento literal e até do histórico, que no caso em apreço é um tópico muito poderoso na interpretação do sentido do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas de Liberdade que foi aprovado.

Do cotejo literal, sistemático, teleológico e histórico de todos os instrumentos legislativos disponíveis, incluindo a Proposta de Lei n.º 252/X, que originou a Lei n.º 115/2009, de 12 de Outubro (que aprovou o Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade), resulta terem sido introduzidas alterações significativas em matéria de competência dos tribunais da condenação e de execução das penas, incrementando significativamente a deste último, ao ponto de se defender que a intervenção do Tribunal da condenação cessa, com o trânsito em julgado da sentença que decretou o ingresso do agente do crime em meio prisional para cumprir medida privativa de liberdade.

Do confronto do preceituado nos arts. 470º, n.º1 e 474º, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Penal, e nos arts. 138º, n.ºs 2 e 4 e 141º, al. i) do C.E.P.M.P.L., parece resultar, sem grande esforço interpretativo que, tendo o condenado iniciado o cumprimento de uma pena de prisão e operada a sua liquidação e homologação pelo Tribunal da condenação, as ulteriores interrupções que se registem ao nível do seu cumprimento por iniciativa e determinação do Tribunal de Execução das Penas, visando a concessão de liberdade condicional, desloca para a esfera da competência material deste último Tribunal a contagem/recontagem da(s) pena(s) a cumprir.
Crê-se que a razão está do lado dos que defendem a exclusiva competência do Tribunal de Execução das Penas para toda e qualquer decisão no processo que se prenda com a liberdade do arguido, a tomar após o trânsito em julgado da decisão condenatória, no caso de penas de execução sucessiva.
O legislador, deliberadamente, atribuiu ao Tribunal de Execução das Penas a competência para liquidar as penas de prisão de cumprimento sucessivo, por se encontrar, no confronto com o Tribunal da condenação, numa posição particularmente adequada para executar essa operação, em face dos elementos privilegiados de que dispõe e da sua competência especializada na matéria.
Não teria nenhuma lógica que a Lei atribuísse ao Ministério Público junto do Tribunal de Execução das Penas competência para fazer o cômputo das penas de cumprimento sucessivo, para efeitos de concessão de liberdade condicional, se o Ministério Público do Tribunal da condenação tivesse previamente de o fazer, ainda que fraccionadamente em relação a cada uma delas. É que, nestes casos, a liquidação de pena da 1.ª instância é de todo inoperante perante o somatório das penas de execução sucessiva da competência exclusiva do Tribunal de Execução das Penas.
10°
Deste modo, só há uma conclusão lógica a retirar – é ao Tribunal de Execução das Penas que deve ser exclusivamente atribuída a competência para o cômputo de penas de execução sucessiva.
11°
O despacho recorrido violou o disposto nos arts. 470º, n.º 1 do Cód. Proc. Penal e 138º e 141º, alínea i) do C.E.P.M.P.L., pelo que deve ser revogado e substituído por outro que atribua ao Tribunal de Execução das Penas competência para o cômputo de penas de prisão de execução sucessiva.

O recurso foi admitido.
Não foi apresentada resposta.
Nesta Relação, o Exmº Procurador-geral Adjunto, para além de ter considerado existirem irregularidades na instrução do recurso e entender deverem as mesmas ser sanadas com a inclusão das peças processuais em falta, limitou-se a apor visto.
Foi ordenado o cumprimento do disposto no art. 417º nº 2 do C.P.P., não tendo sido apresentada resposta.
Entendendo dispensável a solicitação dos elementos aludidos pelo Exmº PGA, por virem expressamente mencionados na certidão que consta dos autos, determinámos a apresentação dos autos à conferência após recolha dos vistos.
Cumpre decidir.


2. Fundamentação
Dos autos retiram-se os seguintes elementos, com interesse para a decisão do recurso:
- o arguido foi condenado nos autos principais, por sentença transitada em 31/10/11, pela prática dos crimes de furto qualificado e consumo de estupefacientes, na pena única de 3 anos e 1 mês de prisão ( fls. 18-30 )
- para além desta, sofreu mais sete condenações no âmbito de outros tantos processos, sendo 3 delas em pena de prisão cuja execução ficou suspensa (tendo uma delas sido posteriormente revogada) e as restantes 4 em penas de prisão efectiva, tendo algumas delas sido englobadas em cúmulo jurídico noutros processos;
- por acórdão proferido em 27/2/13 foi decidido não realizar o cúmulo jurídico entre a pena aplicada nestes autos e as demais acima mencionadas, aplicadas nos procs. nºs 134/07.0GAFAL, 159/07.6GJBJA, 804/08.6TABJA e 30/07.1GJBJA, por se ter concluído que elas não se encontravam entre si em situação de concurso, devendo, por isso, serem cumpridas sucessivamente ( fls. 31-33 );
- e, assim, o início do cumprimento da pena única de 3 anos e 1 mês de prisão foi relegado para o momento considerado como oportuno pelo TEP de Évora que, nessa sequência, informou que a execução dessa pena só se iniciaria quando o arguido completasse metade daquela que cumpria à ordem do proc. comum singular nº 804/08.6TABJA ( do entretanto extinto 1º juízo do Tribunal Judicial de Beja ), prevendo-se que tal viesse a ocorrer em 26/8/14 ( fls. 33 );
- posteriormente o Sr. Juiz do TEP de Évora, proferiu despacho no qual, considerando que a pena que havia sido aplicada no referido proc. nº 804/08.6TABJA, que o arguido estava a cumprir, e a que foi aplicada nos autos principais eram de cumprimento sucessivo, determinou, ressalvando alteração da situação jurídico penal do recluso e para efeitos do disposto nos arts. 63º nº 1 e 61º nº 2 do C. Penal, que “oportunamente, se interrompa a execução da primeira das referidas penas, passando o recluso a cumprir a segunda pena em que foi condenado, com efeitos a partir de 26/8/2014”, com a oportuna passagem dos competentes mandados de desligamento/ligamento, e “solicitando também ao proc. 588/08.8PBBJA do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Beja a oportuna liquidação da pena” ( fls. 34 );
- aberta que foi vista ao MºPº, logo este deixou consignado o entendimento de que a liquidação da pena a cumprir após aquele desligamento “é da competência do Ministério Público junto do Tribunal de Execução de Penas, nos termos do art. 141º, al. i) do C.E.P.M.P.L, uma vez que estamos perante penas de cumprimento sucessivo, conforme o próprio TEP reconhece (…)” ( fls. 35 );
- na data prevista, por determinação da Srª Juiz do TEP de Évora, foi o arguido desligado do mencionado proc. nº 804/08.6TABJA e ligado aos autos principais, iniciando, então, o cumprimento da aludida pena única de 3 anos e 1 mês de prisão ( fls. 36-37 );
- determinada a abertura de vista ao MºPº, por este foi reiterada a posição já antes manifestada, recusada a efectivação da liquidação da pena e promovido que fosse excepcionada a incompetência material do tribunal da condenação para tal efeito ( fls. 38-40 )
- foi, de seguida, proferido o despacho recorrido, que, na parte que interessa, é do seguinte teor:

Tendo sido aberta vista a fim de proceder à liquidação da pena aplicada ao arguido FMMC, veio a Digna Procuradora do Ministério Público promover que seja excepcionada a incompetência material deste Tribunal para o efeito.
Para tanto alega que, tratando-se de pena de cumprimento sucessivo em relação às demais em que o arguido foi condenado, a referida liquidação de pena é da competência do Tribunal de execução de Penas, atento o disposto no artigo 141º, nº 1, alínea i) do Código da Execução das penas e Medidas Privativas da Liberdade.
Cumpre decidir.
Segundo o disposto no artigo 477º, nºs 1, 2 e 4, do Código de Processo Penal, quando num determinado processo é aplicada pena de prisão, o Ministério público procede à liquidação dessa pena (indicando as datas calculadas para o seu termo e, nos casos de admissibilidade de liberdade condicional, para os efeitos previstos nos artigos 61º e 62º e no nº 1 do artigo 90º do Código Penal).
Por seu turno, estipula a alínea i) do artigo 141º Código da Execução das Penas e medidas Privativas da Liberdade que, sem prejuízo de outras disposições legais, em caso de execução sucessiva de penas compete ao representante do Ministério Público junto do tribunal de execução das penas proceder ao respectivo cômputo, para efeitos de concessão da liberdade condicional.
Na senda das decisões proferidas pelo Tribunal da Relação de Évora em 28.01.2014 e 13.05.2014, disponíveis em www.dgsi.pt, entendemos que da interpretação conjugada dos preceitos supra citados, resulta que, a competência atribuída ao representante do ministério público junto do Tribunal de Execução de Penas restringe-se ao computo do somatório das penas de execução sucessiva para efeitos de concessão da liberdade condicional (cf. artigo 63º do Código penal) e não exclui a competência do Tribunal da condenação, nomeadamente do representante do Ministério público e do juiz do processo para os efeitos prevenidos no artigo 477º do Código de Processo penal, quando num determinado processo é aplicada pena de prisão, o ministério Público procede à liquidação, ou seja, o computo inicial da pena aplicada ao condenado nesse processo e o cumprimento das demais obrigações decorrentes de tal preceito.
Termos em que, decide-se declarar este tribunal materialmente competente para proceder à liquidação da pena aplicada ao arguido FMMC.
Notifique.
**
FMMC foi condenado, por sentença deste Tribunal, transitada em julgado em 31.10.2011, pela prática de um crime de consumo de estupefacientes e um crime de furto qualificado, na pena única de prisão de 3 anos e 1 mês de prisão.
Como se colhe de fls. 1020 e 1021, o arguido encontra-se preso à ordem destes autos, em cumprimento da pena em que foi condenado, desde 26 de Agosto de 2014.
Assim, passa-se a proceder á contagem do tempo de prisão, de acordo com os critérios previstos no artigo 479º do Código de Processo penal, fixando-se:
O meio da pena em 12.03.2016;
Os dois terços da pena em 15.09.2016;
O termo da pena em 26.09.2017.

Homologo a liquidação da pena que antecede (cfr. Artigo 477º, nº 4, do Código de Processo penal).
Notifique da presente contagem de tempo de prisão, o arguido, o(a) Ilustre Defensor(a)/Mandatário e o Estabelecimento Prisional onde este se encontra recluso.
*
Dê-se cumprimento ao disposto artigo 477º, nºs 1 e 2 do Código de Processo penal, a efectuar nos termos do artigo 35º da Portaria nº 28072013 de 26 de Agosto, remetendo ao tribunal de Execução de Penas, à Direcção Geral dos Serviços Prisionais, e ao Instituto de Reinserção Social, cópia da presente decisão.


3. O Direito
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar[1], sem prejuízo das de conhecimento oficioso.
No caso dos autos, face às conclusões da motivação do recurso, a questão essencial que importa decidir é a de determinar qual o tribunal materialmente competente para proceder à liquidação da pena de prisão aplicada ao arguido, em caso de cumprimento sucessivo de penas de prisão.

Com a Lei nº 115/2009, que aprovou o Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, pretendeu o legislador pôr fim à incerteza quanto à repartição de funções entre o tribunal da condenação e o TEP relativamente ao acompanhamento e fiscalização da execução das medidas privativas da liberdade, após o trânsito da sentença que as aplicou.
No entanto, se, em face das alterações legislativas, se alcançou uma uniformização jurisprudencial relativamente à competência ( do TEP ) para o acompanhamento das vicissitudes que as penas daquela natureza sofrem após o início do respectivo cumprimento e até à sua extinção, ainda vão subsistindo divergências no que concerne à liquidação inicial[2] da pena, atribuindo-a uns ao tribunal da condenação[3] e outros, considerando que a intervenção deste cessa após o trânsito em julgado da decisão condenatória, ao TEP[4].
Admitindo que o caso se revista de contornos diferentes quando em causa esteja o cumprimento de uma única pena de prisão, e reconhecendo que o quadro legislativo não é tão claro e exaustivo que arrede todas as dúvidas, encontramos argumentos, nomeadamente de ordem prática, que nos fazem propender no sentido de que, quando se perfile o cumprimento sucessivo de várias penas de prisão, e tal como sucede quanto a eventuais recontagens que possam vir a tornar-se necessárias, a competência para a liquidação inicial da pena pertença ao TEP, como defende o recorrente.
Há que ter em atenção que a liquidação da pena é instrumental em relação à determinação de dois momentos cruciais, a decisão sobre a liberdade condicional e a extinção da pena, ambas inquestionavelmente da competência do TEP ( cfr. art. 138º nº 4 als. c) e s) do C.E.P.M.P.L. ( Lei nº 115/2009 de 12/10, com as alterações introduzidas pelas Leis nº 33/2010 de 2/9 e 40/2010 de 3/9 ). Por outro lado, nos casos de cumprimento sucessivo de penas privativas da liberdade, a intervenção de cada um dos tribunais das respectivas condenações sempre que chegasse o momento de proceder à liquidação das penas que haviam aplicado, e de cuja determinação sempre estariam dependentes do TEP, redundaria numa inútil multiplicação de actividades que o TEP está em melhores condições de executar por dispor do conhecimento da globalidade das penas a cumprir sucessivamente e, assim, dos elementos necessários para a determinação dos momentos em que tem de apreciar a concessão da liberdade condicional em função das regras que o art. 63º do C. Penal estabelece para os casos de execução sucessiva de penas.
Acompanhamos, pois, a argumentação expendida pelo recorrente, não só quando faz apelo ao argumento literal que retira da inovação introduzida pela al. i) do art. 141º do C.E.P.M.L.P. para concluir que “o legislador, deliberadamente, atribuiu ao Tribunal de Execução das Penas a competência para liquidar as penas de prisão de cumprimento sucessivo, por se encontrar, no confronto com o Tribunal da condenação, numa posição particularmente adequada para executar essa operação, em face dos elementos privilegiados de que dispõe e da sua competência especializada na matéria, como também, e mormente, quando convoca em abono da posição que defende um argumento teleológico, considerando que “não teria nenhuma lógica que a Lei atribuísse ao Ministério Público junto do Tribunal de Execução das Penas competência para fazer o cômputo das penas de cumprimento sucessivo, para efeitos de concessão de liberdade condicional, se o Ministério Público do Tribunal da condenação tivesse previamente de o fazer, ainda que fraccionadamente em relação a cada uma delas. É que, nestes casos, a liquidação de pena da 1.ª instância é de todo inoperante perante o somatório das penas de execução sucessiva da competência exclusiva do Tribunal de Execução das Penas”. Assim, “a partir do momento em que se conclui pela existência de um conjunto de penas a cumprir sucessivamente, cessa imediatamente a intervenção do Tribunal da condenação, passando a ser o Tribunal de Execução das Penas que assume exclusivamente o comando das operações aritméticas, para definir a pena que deva ser cumprida em primeiro lugar, bem como o momento em que as restantes têm de ser cumpridas e interrompidas, visando sempre e só a tomada de decisão sobre a liberdade condicional no momento em que possa fazê-lo, de forma simultânea, relativamente à totalidade das penas (art. 63º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Penal)” pois, nestes casos, de nenhuma utilidade se revestiria a contagem de penas feita pelo MºPº do tribunal da condenação ( e subsequente homologação pelo respectivo juiz ), na medida em que “só a liquidação (somatório) das penas de execução sucessiva feita pelo Tribunal de Execução das Penas é que opera para efeitos de concessão de liberdade condicional”.
Resta, apenas, reforçar esta conclusão recordando que a lei proíbe a prática de actos inúteis e que, tendo o legislador que procedeu à alteração em matéria de execução de penas, pretendido clarificar a repartição de funções entre o tribunal da condenação e o TEP e pôr termo à sobreposição prática das mesmas, em ordem a favorecer a eficácia do sistema, como se extrai da Proposta de Lei nº 252/X, que originou a Lei nº 115/2009, não terá certamente pretendido consagrar uma solução que, no caso concreto em apreciação, iria afrontar abertamente esses propósitos.
Em decorrência, é forçoso concluir que, o despacho recorrido, ao liquidar e homologar a liquidação da pena aplicada ao arguido, incorreu na nulidade prevista na al. e) do art. 119º do C.P.P., pelo que deve ser revogado e substituído por outro que decline a competência para aquele efeito e a defira ao TEP de Évora.


4. Decisão
Nos termos e pelos fundamentos expostos, julgam o recurso procedente e, porque ferido de nulidade insanável, revogam o despacho recorrido, determinando que seja substituído por outro que defira a competência material para a liquidação da pena aplicada ao arguido nos autos principais, e subsequente homologação, ao TEP de Évora.
Sem tributação.

Évora, 3 de Fevereiro de 2015

Maria Leonor Esteves

António João Latas





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[1] ( cfr. Prof. Germano Marques da Silva, "Curso de Processo Penal" III, 2ª ed., pág. 335 e jurisprudência uniforme do STJ (cfr. Ac. STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, p. 196 e jurisprudência ali citada).
[2] Porque em relação a eventuais ulteriores reformas da contagem da pena, a competência do TEP é aceite mesmo pela, ao que sabemos, única voz dissonante a nível da jurisprudência da 2ª instância ( o Exmº Sr. Presidente da secção criminal da RE ) que entende que a liquidação inicial da pena compete sempre ao tribunal da condenação. ( cfr. Dec. conflito RE 19/8/14, proc. nº 83/14.6YREVR, no qual se salientou que a questão em apreciação era diversa daquelas que haviam sido objecto das Decs. Conflitos 28/1/14 e 13/5/14, respectivamente nos procs. nºs 144/13.9YREVR e 41/14.0YREVR ).
[3] Neste sentido as Decs. Conflitos RE nos procs. nº 144/13.9YREVR ( “Mesmo em caso de execução sucessiva de penas de prisão, compete ao MP junto do tribunal da condenação a contagem da pena de prisão aplicada ao condenado e ao juiz do processo a respetiva homologação, em conformidade com o disposto no art. 477.º do CPP” ) e 41/14.0YREVR (“I - Mesmo em casos de cumprimento sucessivo de penas de prisão, compete ao MP junto do tribunal da condenação efectuar o cômputo da pena aí aplicada, que se visa executar, e ao juiz do processo a homologação dessa contagem, nos termos do ar. 477.º do CPP. II - Esta livre escolha do legislador tem razão de ser, na medida em que o arguido está adstrito a um processo devendo ser o juiz titular a decidir sobre o cômputo da pena de prisão para efeitos da sua execução.” ), a que já acima aludimos.
[4] Neste sentido, Dec. conflito RC 8/5/13, proc. nº 113/11.3GDAND-A.C1 ( que, pronunciando-se a respeito da competência para a extinção de pena de substituição, em sentido impróprio, de prisão por dias livres, mencionou que “o legislador quis claramente estabelecer um verdadeiro sistema de cesure total, com a separação absoluta entre o tribunal da condenação e o da execução” )
Dec. conflito RL 12/6/13, proc. nº 102/06.0PFPDL-B.L1-5 ( que, debruçando-se em concreto a respeito da competência para declarar extinta a pena, acrescentou que “a intenção do legislador é a de fazer cessar a intervenção do tribunal da condenação após o trânsito em julgado da decisão condenatória” ),
Dec. conflito RP 4/6/14, proc. nº 406/12.2PFVNG-A.P1 ( que, resolvendo a competência para efectuar o cômputo da pena de prisão por dias livres, se colocou do lado dos que “defendem a exclusiva competência do TEP para toda e qualquer decisão no processo, que se prenda com a liberdade do arguido, a tomar após o trânsito em julgado da decisão condenatória, cessando aí a competência do Tribunal da condenação”, concluindo que “o legislador quis, de forma inequívoca, por um lado, que a intervenção do tribunal da condenação cesse com o trânsito em julgado da sentença que decretou o ingresso do agente do crime num estabelecimento prisional, a fim de cumprir medida privativa da liberdade; e, por outro, que no Tribunal de Execução das Penas se organize “um processo único” no qual se decidam todos os incidentes relativos à execução da pena” )