Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2153/12.6TBLLE.E1
Relator: MANUEL BARGADO
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 03/09/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I - Servindo as conclusões para delimitar o objeto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objeto de impugnação. Já quanto aos demais ónus previstos no artigo 640º do CPC, é suficiente que os mesmos constem de forma explícita na motivação do recurso.
II - O dano biológico abrange um campo alargado de prejuízos que incidem na esfera patrimonial do lesado, desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, passando ainda pelos custos de maior onerosidade no exercício ou no incremento de quaisquer dessas atividades ou tarefas, com a consequente repercussão de maiores despesas daí resultantes ou a perda do nível de rendimentos expectáveis.
III - A partir do rendimento anual de € 10.000,00, atendendo à incapacidade permanente absoluta do autor para o exercício da sua atividade profissional, a uma taxa de juro nominal de 3%, a um período de vida ativa previsível de 28 anos e a uma redução de 1/3 do capital desse modo apurado, a título de compensação pelo benefício da antecipação do mesmo, achar-se-ia um capital na ordem dos € 200.000,00.
IV - Considerando o quadro de sequelas sofridas e o que, à luz das regras da experiência comum, é de supor que o autor pudesse desempenhar com utilidade económica, fora do seu giro profissional, e sobretudo nas suas tarefas pessoais, se não fossem tais lesões, tem-se por justificado um acréscimo de € 60.000,00, reportado à data da sentença recorrida, a título de indemnização pela perda da capacidade económica do autor fora da área da sua atividade profissional específica.
V - Tendo em conta a espécie das lesões sofridas pelo autor, o quadro de intervenções cirúrgicas e de tratamentos a que foi sujeito, as sequelas irreversíveis psicomotoras, mormente a perda de significativa autonomia e da sua sexualidade, considerando, em particular, os sofrimentos que, segundo as regras da experiência comum, aquelas sequelas são suscetíveis de produzir numa pessoa a partir da idade de 42 anos e que se tendem a agravar com a idade, não poderá deixar de se considerar esta como uma situação muito próxima do tipo daquelas que têm vindo a ser reconhecidas como de extrema gravidade, mostrando-se, portanto, justificada uma compensação na ordem de € 120 000,00.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO
JM instaurou a presente ação declarativa de condenação, com processo ordinário, contra Fundo de Garantia Automóvel e VP, pedindo que os réus sejam condenados no pagamento da quantia de € 661.521,96, sendo € 311,525,96 a título de danos patrimoniais e € 350.000,00 por danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal até integral e efetivo pagamento, bem como pelos danos que se venham a revelar no decurso da ação.
Mais peticionou o autor a condenação dos réus no pagamento do que se encontrar em dívida ao Hospital de Faro, Centro Hospitalar da Covilhã e CMR Sul resultante dos tratamentos médicos e afins recebidos naqueles estabelecimentos, na sequência das lesões que sofreu no acidente em causa.
Para tanto alegou, em síntese, que no dia 23 de Maio de 2011, o autor e um condutor cuja identificação desconhece, foram intervenientes num acidente de viação ocorrido na E.N. 125, ao Km 86,3, sendo que o autor conduzia o seu motociclo, com a matrícula ...-...-RM, e o dito condutor um veículo pesado de mercadorias, com a matrícula ...-...-FN, o qual provinha de uma estrada que entronca pelo lado Sul com a E.N. 125, cortando a linha de passagem do motociclo, tendo desrespeitando o sinal de Stop existente na estrada donde provinha e antes de entrar na E.N. 125, vindo o autor a embater com a parte frontal do seu motociclo e com o seu corpo na lateral direita junto à roda traseira do veículo pesado, resultando desse embate as inúmeras lesões que descreve e das quais se quer ver ressarcido. Mais alegou que o veículo pesado é propriedade do réu VP (2º réu), o qual, à data do acidente, não tinha seguro válido que garantisse a responsabilidade civil emergente da circulação desse veículo.
Contestaram ambos os réus.
O réu Fundo de Garantia Automóvel (FGA) afirmou desconhecer se são verdadeiros ou reais a maior parte dos factos alegados pelo autor, impugnando igualmente todos os documentos juntos com a petição inicial, alegando desconhecer a letra e assinatura dos mesmos, concluindo pela sua absolvição do pedido.
O 2º réu alegou ser ele o condutor do veículo pesado interveniente no acidente, o qual lhe foi emprestado pelo respetivo proprietário, mas que utilizava em seu exclusivo proveito, contrapondo ainda uma versão diferente da dinâmica do acidente, atribuindo a eclosão deste a culpa do autor, concluindo pela sua absolvição do pedido.
O réu FGA requereu a intervenção principal provocada do Hospital de Faro, EPE, tendo sido proferido despacho a ordenar o cumprimento do disposto no Decreto-Lei nº 218/99, de 15 de Junho, tendo esta entidade hospitalar sido citada para os termos da ação.
Foi realizada audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador tabelar, com subsequente identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, sem reclamação.
Instruído o processo, seguiram os autos para julgamento, sendo a final proferida sentença em cujo dispositivo se consignou:
«Em face de todo o exposto, o Tribunal decide julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência:
a) Condenar o Réu Instituto de Seguros de Portugal – Fundo de Garantia Automóvel a pagar ao Autor JM a quantia total de € 507.015,98 (quinhentos e sete mil e quinze euros e noventa e oito cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal dos juros civis, contados desde a data da citação até integral pagamento relativamente à quantia de € 11.878,78 (onze mil e oitocentos e setenta e oito euros e setenta e oito cêntimos), e desde a data da prolação da presente sentença até pagamento integral relativamente ao restante;
b) Absolver o Réu do demais peticionado; e
c) Condenar Autor e Réu Instituto de Seguros de Portugal – Fundo de Garantia Automóvel nas custas do processo, na proporção do respectivo decaimento.»
Inconformados, autor e réus apelaram do assim decidido, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:
Recurso do 2º réu:
«1.ª - Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pelo Meritíssimo Tribunal a quo que julgou a presente acção parcialmente procedente, condenando o Réu Instituto de Seguros de Portugal – Fundo de Garantia Automóvel a pagar ao Autor JM a quantia total de € 507.015,98 (quinhentos e sete mil e quinze euros e noventa e oito cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal dos juros civis, contados desde a data da citação até integral pagamento relativamente à quantia de € 11.878,78 (onze mil e oitocentos e setenta e oito euros e setenta e oito cêntimos), e desde a data da prolação da presente sentença até pagamento integral relativamente ao restante;
2.ª - Salvo o devido respeito por opinião contrária, considera o Apelante que a douta sentença apreciou erradamente a prova que lhe foi apresentada, devendo ter decidido de modo diverso.
3.ª - Houve um erro de julgamento quanto à dinâmica do acidente, tendo o Tribunal a quo dado importância apenas ao depoimento das duas únicas testemunhas presenciais, e não aos danos produzidos na viatura pesada, que infirmam o depoimento daquelas testemunhas.
4.ª As testemunhas M... e J... disseram ao Tribunal que o veículo pesado se atravessou à frente do veículo do A., que lhe cortou a linha de passagem, provindo de uma estrada que entronca pelo lado Sul com a E.N. 125, sensivelmente ao Km 86,3 desta última, vindo da direcção de Hortas de Quarteira, e circulava no sentido Sul-Norte.
5.ª - O R. VP, condutor da viatura, explicou n sua contestação que não vinha nesse sentido de trânsito, mas sim no sentido Faro/Albufeira, tendo dado o sinal de mudança de direcção para a direita e virado para uma estrada secundária à direita da E.N. 125.
6.ª - Os danos no veículo conduzido por VP são compatíveis com a versão apresentada ao tribunal, mas já não com a versão apresentada pelas duas testemunhas.
7.ª - O mecânico que reparou a viatura pesada, e que teve de ir ao local logo após o acidente para removê-la, Sr. G..., testemunhou explicando que os danos se situavam na traseira esquerda, e não na lateral do camião.
8.ª - Os danos da viatura são prova objectiva, ao passo que a prova testemunhal é subjectiva, e portanto falível.
9.ª - Os danos no veículo pesado mostram que a dinâmica do acidente não pode ter sido como as testemunhas M... e J...explicaram.
10.ª - Salva melhor opinião, o Tribunal a quo devia ter atentado na localização dos danos do veículo pesado e considerado que o acidente não podia ter ocorrido da forma descrita pelas testemunhas.
11.ª - O Tribunal recorrido faz uma errada apreciação da prova, sobrevalorizando o depoimento testemunhal face ao documental (fotos com a localização dos danos no veiculo pesado).
TERMOS EM QUE DEVERÁ SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO E REVOGADA A DOUTA SENTENÇA PROFERIDA, ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!»

Recurso do réu FGA:
A) A douta sentença recorrida fixou, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, o valor global de 507.015,98 €, que nos parece manifestamente exagerado, face á situação em apreço e consideravelmente desenquadrado dos valores apurados pela aplicação da Portaria n.º 377/2008 de 26.05 que tendencialmente se tem verificado cada vez mais a sua aplicação a todos os lesados de acidentes de viação.
B) A douta sentença recorrida violou, assim o disposto nos art.ºs 494º, 496º, 562º e 570º todos do Código Civil.
C) A douta sentença recorrida, ao não condenar o Réu VP solidariamente com o Fundo de Garantia Automóvel, violou assim, o disposto no art.º 62º do n.º 1 do D.L. 291/2007 de 11 de agosto.
Termos em que,
Revogando-se a douta sentença recorrida, no âmbito delimitado pelo objeto do presente recurso, se fará, como sempre,
JUSTIÇA!»

Recurso do autor:
«1- Por força do disposto no art.805º nº3 do Cód. Civil, a responsabilidade civil por factos ilícitos constitui o devedor em mora desde a citação.
2- Os juros de mora traduzem-se numa sanção pela mora do devedor visando o preceito referido no número anterior manter integra a indemnização a que o lesado tenha direito protegendo-o assim das vicissitudes das variáveis económicas.
3- Só não será assim, se a sentença proferida estiver actualizada no momento em que é proferida em obediência ao disposto no art.566º nº2 do Cód. Civil e ao AUJ nº4/2002 de 27 de Junho de 2002.
4- Não obstante a referência conclusiva feita na douta sentença recorrida relativamente a estarem actualizados os montantes indemnizatórios, (com excepção do valor de reparação do veículo), não existe qualquer fundamentação que sustenha tal conclusão, não tendo sido indicados os indicadores (económicos) e os critérios lógico-racionais que lhe subjaz, pelo que, não foi cumprido o dever de fundamentação que decorre do art.607º do Cód. de Proc. Civil.
5- Não se vislumbra do teor da sentença, sem qualquer margem para dúvidas, se o valor indemnizatório apurado teve em conta todos os factores que pudessem influenciar “o valor do dinheiro” à data da prolação da mesma, nomeadamente, a desvalorização monetária (actualmente por acção do mercado cambial), inflação, aumento do custo de vida, etc.
6- Por não resultar da douta sentença recorrida, sem qualquer margem para dúvidas, que os montantes indemnizatórios estão actualizados, não se deverá aplicar a orientação jurisprudencial resultante do acórdão uniformizador nº4/2002 de 27 de Junho de 2002, aplicando-se sim o art.805º nº3 do Cód. Civil.
7- Não se trata de contrariar a orientação jurisprudencial do referido acórdão uniformizador, com a qual se concorda, mas sim, de aplicá-la ou não, dependendo de no caso concreto subsistirem ou não duvidas relativamente à actualização da sentença proferida, sendo certo que, para que dúvidas não subsistam é necessário revelar os indicadores que concorrem para o estabelecimento do “valor do dinheiro” à data da prolação da sentença, como isso não se verificou na douta sentença recorrida, dever-se-ão contar juros moratórios desde a data da citação.
Nestes termos e nos melhores de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, requer que:
- Seja revogada a douta sentença recorrida na parte em que, com excepção dos juros de mora referentes à quantia de 11 878,78 €, condena o R. Instituto de Seguros de Portugal - Fundo de Garantia Automóvel no pagamento de juros de mora contados desde a prolação da sentença.
- Seja condenando o R. Instituto de Seguros de Portugal - Fundo de Garantia Automóvel no pagamento de juros de mora contados desde a citação relativamente à totalidade do montante indemnizatório de 507 015,98 €.
Com o que se fará Justiça.»

O autor apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência dos recursos dos réus.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO(S) RECURSO(S)
Sendo o objeto dos recursos delimitados pelas conclusões das alegações dos recorrentes, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), as questões a decidir consistem em saber:
No recurso do 2º réu
- se deve ser alterada a matéria de facto.
No recurso do réu FGA:
- se o 2º réu deve ser condenado solidariamente com o FGA.
- se deve ser reduzido o montante indemnizatório atribuído ao autor a título de danos patrimoniais e não patrimoniais.
No recurso da autora:
- se devem contar-se os juros desde a citação relativamente ao montante indemnizatório de € 507 015,98.

III – FUNDAMENTAÇÃO
OS FACTOS
A 1ª instância considerou provados os seguintes factos:
1- A 23 de Maio de 2011, pelas 10:15 horas, na E.N. 125, ao km 86,3 próximo da localidade de Vale Judeu, concelho de Loulé, o Autor conduzia um motociclo da marca Suzuki, modelo Intruder 1500 VL, com a matrícula ...-...-RM, que lhe pertencia, no lado direito da faixa de rodagem, no sentido Nascente – Poente.
2- Quando estava prestes a chegar ao cruzamento da referida estrada com a estrada que dá acesso à localidade de Vale Judeu, subitamente e sem que nada o fizesse prever, vindo do seu lado esquerdo, atravessou-se à sua frente um veículo automóvel pesado de mercadorias com a chapa de matrícula ...-...-FN, conduzido pelo Réu VP, que lhe cortou a linha de passagem.
3- O veículo pesado de mercadorias com a chapa de matrícula ...-...-FN provinha de uma estrada que entronca pelo lado Sul com a E.N. 125, sensivelmente ao Km 86,3 desta última, vindo da direcção de Hortas de Quarteira, e circulava no sentido Sul – Norte.
4- A referida estrada onde circulava o pesado tinha, à data do acidente, um sinal vertical de STOP no local em que entronca com a E.N. 125 destinado ao tráfego que circula no sentido Sul – Norte.
5- O Réu VP não parou o veículo que conduzia no referido sinal vertical de STOP, nem cedeu passagem ao veículo conduzido pelo Autor que se apresentou pela sua direita.
6- O Autor ainda tentou imobilizar o veículo que conduzia, fazendo uma travagem, porém, a manobra efectuada pelo Réu VP foi de tal modo inesperada e imprevisível para o Autor que este não teve tempo de imobilizar o veículo que conduzia e evitar embater no veículo pesado de mercadorias, tendo colidido com a parte frontal do veículo que conduzia, e ainda com o seu próprio corpo, na parte traseira do veículo pesado de mercadorias.
7- O estado do tempo apresentava-se quente e seco.
8- A estrada em que o Autor circulava era uma recta com boa visibilidade, com o piso regular e em bom estado de conservação.
9- Na sequência do embate, o Autor foi projectado e caiu desamparadamente no lado contrário da faixa de rodagem, ou seja, no lado esquerdo atento o seu sentido de marcha.
10- Após o embate, o Autor foi socorrido por operadores do INEM, que se dirigiram ao local, que lhe retiraram a roupa que trazia vestida e ataram as pernas uma à outra, pois estes membros encontravam-se deslocados da bacia, não tinham qualquer suporte, nem eram controláveis pelo Autor.
11- Após o que o Autor foi transportado para o Hospital Distrital de Faro, onde deu entrada no serviço de urgência apresentando as seguintes lesões: fracturas múltiplas da bacia; monoplegia inferior direita; amnésia para o acidente.
12- Cerca de uma hora e meia após a sua entrada no Hospital de Faro, o Autor foi operado de urgência, tendo-lhe sido aplicado um fixador externo de metal dinafix, com perfuração da carne, e aparafusado directamente aos ossos da bacia com 6 parafusos, 3 no lado esquerdo e os restantes no lado direito.
13- Nessa mesma data, o Autor foi submetido a mais duas intervenções cirúrgicas que consistiram em colocar pregos Steinmann em metal aplicados no Fémur de cada perna, trespassando-os de um lado ao outro e ligados a cabos com um peso de 6 kg em cada uma das extremidades, a fim de que os ossos das pernas que encaixam na bacia não fizessem pressão sobre a mesma e desse modo permitir que a bacia que estava fracturada pudesse mais facilmente consolidar-se.
14- Concluídas as intervenções cirúrgicas, o Autor foi transferido do serviço de urgência para o serviço de cuidados intermédios do Hospital de Faro onde permaneceu pelo período de 5 dias, e onde esteve permanentemente medicado com morfina, aplicada automaticamente através de um cateter que lhe injectava directamente na corrente sanguínea uma determinada dose.
15- Após esses 5 dias, o Autor foi transferido para os serviços de ortopedia do mesmo hospital, onde permaneceu internado até ao dia 13 de Junho de 2011, data em que foi transferido para o Centro Hospitalar da Cova da Beira na Covilhã.
16- No Centro Hospitalar da Cova da Beira, na Covilhã, o Autor foi submetido a vários testes médicos, os quais revelaram outras lesões para além das diagnosticadas no serviço de urgência do Hospital de Faro, nomeadamente: lesões múltiplas do nervo periférico grande ciático direito, femural direito, obturado direito; lesões radiculares sagradas altas; lesões ósseas concordantes com possível atingimento das raízes sagradas altas direitas, por traço de fractura sagrada direita; sacro desconcentrado e rodado, possibilitando lesões radiculares contralaterais; infecção urinária; depressão.
7- Na primeira semana de Julho de 2011, no Centro Hospitalar da Cova da Beira, foram retirados ao Autor os pregos metálicos Steinmann que tinha em cada uma das pernas, o que foi feito sem qualquer anestesia, tendo causado fortes dores ao Autor.
18- No dia 19 de Agosto de 2011, ainda no Centro Hospitalar da Cova da Beira, o Autor foi submetido a nova intervenção cirúrgica que consistiu em ser-lhe retirado o fixador externo que estava aparafusado aos ossos da bacia.
19- A 13 de Setembro de 2011, o Autor foi novamente transferido para o Hospital de Faro, onde foi submetido a exame radiográfico que revelou que as fracturas sofridas na bacia, na coluna e no sacro, ainda não estavam completamente consolidadas, pelo que teve de ficar internado até 16 de Novembro de 2011.
20- Tendo nesta data, 16 de Novembro de 2011, completado 5 meses e 24 dias ininterruptos de internamento hospitalar.
21- Data em que foi transferido para o centro de reabilitação CMR Sul, em São Brás de Alportel, onde permaneceu até ao dia 23 de Dezembro de 2011, tendo nesta data cumprido um total de 7 meses de internamento, cumulativamente entre hospitais e o centro de reabilitação CMR Sul.
22- Enquanto o Autor manteve o fixador externo na bacia, esteve obrigado a dormir sempre na posição de barriga para cima, pelo que desenvolveu uma ferida aberta na parte inferior das costas, o que lhe causava forte desconforto e intensa dor.
23- Ferida essa que se manteve por cerca de 6 meses, tendo tido início no final da primeira semana de internamento hospitalar e permanecido até finais de Novembro de 2011.
24- No CMR Sul, o Autor foi submetido a fisioterapia intensiva 6 horas por dia, 6 dias por semana, que consistia essencialmente em: choques eléctricos nos músculos da perna direita; exercícios físicos de alongamento e levantamento de pesos; exercícios de equilíbrio.
25- Tais terapêuticas causaram dor ao Autor ao longo da sua duração.
26- Na primeira semana em que permaneceu no CMR Sul, o Autor andava de cadeira de rodas, após o que passou para um andarilho, posteriormente para um par de canadianas e actualmente anda com um bastão.
27- O Autor enquanto esteve internado tinha muita dificuldade em dormir devido ao fixador externo dinafix que o obrigava a estar sempre deitado na posição de barriga para cima, o que perdurou por cerca de 4 meses.
28- Nesse período o Autor urinava através de uma algália colocada pelos enfermeiros do Hospital de Faro, o que era para si humilhante e angustiante.
29- Enquanto esteve internado nos hospitais o Autor padeceu, nos dois primeiros meses de internamento, de incontinência das fezes e incontinência urinária, o que era muito humilhante para si e lhe causava muita angústia.
30- Após ter sido submetido às intervenções cirúrgicas descritas no presente articulado, o Autor teve dores intensas nos joelhos, na coluna e na bacia, o que lhe causou grande sofrimento.
31- Por força das supra referidas intervenções cirúrgicas, o Autor passava os dias imediatamente a seguir à realização das mesmas impossibilitado de se mexer, pelo que, para ser feita a muda da roupa da cama onde se encontrava, tinha de ser levantado por 6 enfermeiros ao mesmo tempo, o que lhe causava grande dor.
32- Na mesma operação de levantamento, os enfermeiros procediam à limpeza do corpo do Autor, inclusive nas partes genital e anal, por força da sua incontinência das fezes, o que era muito embaraçoso para si e lhe causava angústia.
33- As sessões de fisioterapia a que o Autor teve de se submeter eram muito dolorosas, em especial os exercícios de alongamento e levantamento de pesos, o que lhe causou grande sofrimento tanto físico como psíquico, já que, mesmo antes de iniciar as sessões de fisioterapia, só o facto de saber que iria passar as próximas seis horas a sofrer fisicamente, era o bastante para lhe causar também sofrimento psicológico.
34- Ainda hoje, o Autor tem dores no pé direito, no joelho direito, na bacia e na coluna.
35- O Autor sente incómodo em estar muito tempo sentado, deitado ou de pé, estando obrigado a alternar posições em virtude das dores sentidas.
36- Devido à sua condição física, na sequência das lesões, o Autor tem dificuldade em subir e descer escadas e em caminhar, estando obrigado a utilizar permanentemente um bastão para se equilibrar e apoiar.
37- O Autor tem dificuldade em adormecer, estando obrigado a tomar medicamentos para o efeito, bem como tem dificuldade em dormir porque a imobilização na cama causa-lhe dores e faz com que acorde reiteradamente.
38- Em 29 de Março de 2012, o Autor foi submetido a exame médico promovido pela ARS Algarve, e realizado por uma junta médica presidida pelo Dr. …, do qual resultou a fixação da deficiência do Autor em 74% de incapacidade permanente global conforme.
39- O Autor era amante de motas, porém, por força da incapacidade de que padece em consequência das lesões, não consegue andar de mota, já que não tem sensibilidade suficiente no pé direito para accionar o travão da roda de trás, nem subir e descer da mota normalmente ou sequer manter o equilíbrio, em especial quando tem de curvar, o que lhe provoca desgosto.
40- Antes do acidente, o Autor praticava caça submarina, actividade de que era também um grande aficionado e que lhe dava muito prazer, sendo que após o acidente o Autor ficou completamente impedido de a praticar, quer por não conseguir vestir o fato de mergulho que é necessariamente muito justo, quer por não poder nadar, já que, a falta de sensibilidade no pé direito impede-o de o movimentar de forma a criar impulso para se deslocar na água, quer ainda por ter de levar consigo o saco de urina e o sistema “penrose”, que também são impeditivos de estar dentro de um fato de mergulho apertado ou mesmo em contacto com a água.
41- O Autor está também impedido de frequentar piscinas públicas devido ao saco de urina e ao “penrose”, o que lhe causa angústia, pois sempre gostou de nadar.
42- Como consequência do acidente e das lesões sofridas, o Autor ficou também com uma lesão no pénis e nos testículos, padecendo de impotência sexual total e não produção de quaisquer espermatozoides.
43- Por força disso, o Autor está impedido de ter uma relação sexual plena com outrem, o que lhe causa grande sofrimento psicológico.
44- A impotência sexual de que padece levou ao fim da relação amorosa que tinha com a sua namorada V…, por força de não poder ter relações sexuais plenas e sentir-se diminuído enquanto homem, o que lhe causa muita angústia e muita solidão, tendo passado a sofrer de depressão.
45- Na sequência do acidente, e das lesões que sofreu em virtude do mesmo, o Autor apresenta as seguintes sequelas:
a) Ráquis: deformidade a nível da prega inter nadegueira com cicatrização secundária de escara sagrada;
b) Abdómen: cicatrizes a nível das cristas ilíacas, em número de 3, bilateralmente, com 2 cm de diâmetro, disformes e deprimidas; assimetria da bacia com instabilidade da bacia e compromisso do anel pélvico;
c) Períneo: disfunção eréctil e vesical com “penrose” permanente;
d) Membro inferior direito: Limitação da mobilidade da anca e joelho direito com amiotrofia e encurtamento de 12 cm com o pé pendente (monoparesia crural com compromisso parcial de esfíncteres).
46- Na sequência do acidente, e das lesões do mesmo resultantes, o Autor sofreu:
i) um período de défice funcional temporário total de 215 dias;
ii) um período de repercussão temporária na actividade profissional total de 215 dias; e
iii) um quantum doloris fixado no grau 7/7.
47- Na sequência do acidente, e das lesões do mesmo resultantes, o Autor passou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 60 pontos, correspondente a: monoparesia do membro inferior direito com compromisso de esfíncteres (parcial); assimetria da bacia com compromisso do anel pélvico, com encurtamento do membro inferior direito de 12 cm e amiotrofia da coxa, marcha claudicante com apoio de ajudas técnicas; desconformidade a nível da prega inter- nadegueira com cicatrização secundária de escara sagrada; cicatrizes a nível das cristas ilíacas em número de 3 bilateralmente com 2 cm de diâmetro, disformes e deprimidas; disfunção eréctil.
48- As sequelas descritas são, em termos de repercussão permanente na actividade profissional, impeditivas do exercício da sua actividade profissional habitual e de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional.
49- O Autor passou também a padecer de um dano estético permanente fixável no grau 6/7, tendo em conta as cicatrizes e deformidades.
50- As lesões provocaram uma repercussão permanente na actividade sexual, fixada num grau 7/7, em virtude da disfunção eréctil permanente.
51- Em virtude de tais lesões, o Autor necessitará de realizar fisioterapia de modo regular, necessitará de usar canadiana para se movimentar, o seu domicílio terá de ser adaptado às suas lesões, concretamente a casa de banho, tal como o veículo em que seja transportado.
52- Ainda como consequência do acidente, o Autor ficou obrigado a tomar permanentemente e ao longo da vida a seguinte medicação: colector de urina, saco recuperador, torneira 2 L; Urimed Vision Preserv Urina 29 mm; Gabapentina Generis MG 300 mg (60 cáp.); Tofranil 25 mg (60 comprimidos); Prevecist carteira pó 3g (30 saquetas); Atarax 25 mg (20 comprimidos).
53- Medicação essa cujo preço de aquisição e utilização/toma diárias para o Autor é a seguinte:
Preço por embalagem Preço por unidade Toma diária
Colector de urina, saco recuperador, torneira 2 L 0,85 € Uma unidade (0,85€)
Urimed Vision Preserv Urina 29 mm 1,55 € Uma unidade (1,55 €)
Gabapentina Generis MG 300 mg (60 cáp.) 0,16 € Duas unidades (0,33 €)
Tofranil 25 mg (60 comprimidos) 0,04 € Duas unidades (0,08 €)
Prevecist carteira pó 3g (30 saquetas) 0,59 € Duas unidades (1,19 €)
Atarax 25 mg (20 0,12 € Uma unidade (0,12 €)
Num total diário de € 4,12, mensal de € 123,60 e anual de € 1.483,20, que o Autor tem suportado desde que terminou o internamento e terá de continuar a suportar durante a sua vida.
54- O Autor é cozinheiro de profissão, tendo trabalhado como cozinheiro durante 9 anos em New Jersey e Nova Iorque nos E.U.A, durante 4 meses na Inglaterra e entre outros no Hotel Q…, no restaurante G…, no snack-bar D… e no restaurante A…, todos em Quarteira.
55- Á data do acidente o Autor tinha acabado de gozar férias laborais no último restaurante onde tinha trabalhado e para onde não iria voltar, e ia começar a trabalhar no restaurante da academia de G…, cuja categoria desconhece, em Vilamoura, Quarteira, no dia 1 de Junho de 2011, para onde tinha uma proposta de trabalho a tempo inteiro, com uma retribuição de pelo menos € 750,00 brutos, podendo ser superior.
56- O Autor tem a categoria profissional de cozinheiro de segunda.
57- Por força das lesões sofridas, o Autor ficou impossibilitado de exercer a sua profissão de cozinheiro.
58- Desde a data da ocorrência do acidente até à presente, nunca mais o Autor desenvolveu uma actividade laboral.
59- O Autor nasceu a 28 de Janeiro de 1969.
60- Por força do acidente, o motociclo do Autor sofreu vários danos, nomeadamente: suspensão da frente partida; guiador partido; jante da frente partida; radiador partido; bateria partida; quadro desalinhado; depósito amolgado; farol dianteiro partido; pedais de apoio do condutor e do passageiro do lado esquerdo partidos.
61- A reparação de tais estragos no motociclo importa o dispêndio de € 11.878,78.
62- O veículo pesado de mercadorias com a chapa de matrícula ...-...-FN é propriedade do Réu VP, o qual, à data do embate não se encontrava coberto por um seguro válido e eficaz que garantisse a sua responsabilidade civil por danos causados por esse veículo a terceiros.
63- Após a colisão dos dois veículos, o Réu VP colocou-se em fuga, circulando pela estrada que dá acesso à localidade de vale Judeu e desapareceu sem prestar qualquer auxílio ao Autor.
64- O Réu VP abandonou o local, por não ter seguro obrigatório, mas, pouco tempo depois, o Réu apresentou-se voluntariamente na GNR de Loulé, onde participou que tinha sido interveniente em acidente de viação, ocorrido na E.N. 125, em Vale Judeu.
65- O Réu VP foi submetido a exames toxicológicos cujos resultados foram negativos.
66- Após o embate, o veículo pesado, conduzido pelo Réu VP estava danificado no farol traseiro do lado esquerdo.

E foram considerados não provados os seguintes factos:
1- O Réu VP conduzia o veículo pesado de mercadorias de matrícula ...-...-FN, na E.N. 125, sentido Faro / Albufeira, quando, ao Km 86,3 da referida via, fez sinal de que pretendia virar à direita, iniciando a manobra de alteração da sua trajectória para virar à direita e seguir para Norte;
2- Nessa sequência, iniciou a sua manobra de mudança de direcção, descrevendo lentamente uma curva para o lado direito.
3- Quando já se encontrava direccionado para a via por onde pretendia seguir, finalizando a sua manobra de mudança de direcção, o veículo conduzido pelo Réu VP foi abalroado pelo motociclo do Autor, que embateu na traseira do seu veículo.
4- O motociclo conduzido pelo Autor embateu na parte lateral direita do camião conduzido pelo Réu VP junto à roda traseira direita.
5- O sistema neurológico do Autor ficou danificado, por ter sido comprimido, contorcido e cortado ao nível do sacro, o que teve como consequência para o Autor perder parcialmente a sensibilidade da perna direita, do joelho para baixo, e perder totalmente a sensibilidade no pé direito.
6- Por força disso, o Autor tem de usar, permanentemente e ao longo da sua vida, um aparelho em fibra de carbono para manter o pé na horizontal, de modo a que, sempre que caminhar, poder pousar esse pé no solo, o mais próximo do que era para si natural fazer antes das lesões.
7- Por não ter qualquer sensibilidade no pé direito, quando caminha ou quando se quer pôr de pé, o Autor faz força essencialmente na perna esquerda, o que lhe causa dor na mesma.
8- O Autor tem espasmos no pé direito por força da ausência de comunicação neurológica entre o cérebro e o referido pé, o que lhe causa muita dor.

Da impugnação da matéria de facto
Ao impugnar a matéria de facto, deve o recorrente observar minimamente os ónus que lhe são impostos in casu pelo art. 640º do CPC.
Tais ónus consistem em[1]:
- especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados (aos quais deve aludir na motivação do recurso e sintetizar nas conclusões), mencionando o diverso sentido em que se impõe decidir quanto a cada um dos factos impugnados, por referência ao que foi julgado provado na decisão recorrida (ou seja, na indicação do sentido ou sentidos das respostas a dar, em substituição das consideradas);
- fundamentar as razões da discordância, especificando os concretos meios probatórios em que se funda a impugnação;
- quando se baseie em depoimentos testemunhais que tenham sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo da possibilidade de proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Escreveu-se a este propósito no Acórdão do STJ de 31-05-2016 (Ana Luísa Geraldes)[2]:
«(…), embora o Novo Código de Processo Civil exija o cumprimento do ónus de alegação a cargo do Recorrente, impondo a este, quando se trata de impugnação da decisão da matéria de facto, que proceda à especificação prevista nas alíneas do nº 1 do art. 640º, o exercício desse ónus, conforme se salientou em ponto anterior, não pode ser exponenciado a um nível tal que praticamente determine a reprodução, ainda que sintética, nas conclusões do recurso, de tudo quanto a esse respeito já tenha sido alegado na respectiva motivação.
A lei não exige essa reprodução (…).
O que verdadeiramente importa ao exercício do ónus de impugnação em sede de matéria de facto é que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham todos os requisitos que constam do art. 640º do Novo CPC.
A saber:
- A concretização dos pontos de facto incorrectamente julgados;
- A especificação dos meios probatórios que no entender do Recorrente imponham uma solução diversa;
- E a decisão alternativa que é pretendida.
Efectivamente, sendo as conclusões uma súmula e síntese da indicação dos fundamentos por que se deduz a impugnação relativa à matéria de facto, deixariam de ter esse cunho se a Recorrente tivesse que inserir e especificar detalhadamente, em sede conclusiva, todos os elementos que compõem a impugnação e que se mostram enunciados nas diversas alíneas do nº 1 do art. 640º do NCPC, com a repetição exaustiva da fundamentação desenvolvida ao longo do conteúdo das alegações.
Seguramente que nas conclusões o Recorrente deve indicar os pontos da matéria de facto que pretende ver modificados, ónus que verdadeiramente permite circunscrever o objecto do recurso no que concerne à matéria de facto» (negrito nosso).
No caso em apreço, o 2º réu/recorrente omite completamente nas conclusões os pontos da matéria de facto que pretende ver alterados, limitando-se a dizer de forma vaga e genérica que «houve um erro de julgamento quanto à dinâmica do acidente, tendo o Tribunal a quo dado importância apenas ao depoimento das duas únicas testemunhas presenciais, e não aos danos produzidos na viatura pesada, que infirmam o depoimento daquelas testemunhas» (conclusão 4ª); que «os danos no veículo conduzido por VP são compatíveis com a versão apresentada ao tribunal, mas já não com a versão apresentada pelas duas testemunhas» (conclusão 6ª); que os «danos na viatura são prova objectiva, ao passo que a prova testemunhal é subjectiva, e portanto falível» (conclusão 8ª); e que «os danos no veículo pesado mostram que a dinâmica do acidente não pode ter sido como as testemunhas M... e J...explicaram» (conclusão 9ª).
Ora, foram dados como provados na sentença vários factos referentes à dinâmica do acidente (vejam-se, nomeadamente, os pontos 2, 3, 4, 5, 6 e 9), e outros factos não provados (vejam-se os pontos 1, 2, 3 e 4 do elenco dos factos não provados), pelo que se impunha que o recorrente indicasse nas conclusões os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, o que não fez.
Ora, servindo as conclusões para delimitar o objeto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objeto de impugnação. Já quanto aos demais ónus previstos no artigo 640º do CPC, é suficiente que os mesmos constem de forma explícita na motivação do recurso, o que constitui entendimento pacífico do Supremo Tribunal de Justiça[3].
Mas a verdade é que, in casu, também outros ónus não foram observados pelo recorrente.
Com efeito, no corpo das alegações, além de não indicar os concretos pontos da matéria de facto impugnados, fazendo apenas referência «ao facto vertido no Ponto 1 dos “Temas da Prova”, também não especificou o recorrente a decisão que, no seu entender, devia ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, limitando-se a concluir que «face à prova produzida em sede de audiência e julgamento (…), devia ter sido proferida sentença absolutória do R., na medida em que a dinâmica do acidente, tal como os danos na viatura pesada comprovam, não podia ter sido aquela que o Tribunal entendeu dar como provada».
E de nada vale ao recorrente afirmar que «as fotografias tiradas ao veículo pesado após o acidente (…), demonstram que o veículo pesado não apresenta quaisquer danos na lateral direita, mas tão somente no farol traseiro do lado esquerdo», e transcrever partes do depoimento de uma testemunha que nem sequer assistiu ao acidente, para assim pretender que seja dada como provada uma versão do acidente que foi totalmente rejeitada pelo Mm.º Juiz a quo que, diga-se, motivou a decisão de facto relativa à dinâmica do acidente de forma exemplar, apreciando de forma crítica, conjugada e concatenada toda a prova produzida, valorando, nomeadamente, o depoimento de duas testemunhas que presenciaram o acidente, e por isso com conhecimento direto dos factos.
Seja como for, a inobservância, por parte do recorrente, dos aludidos ónus determina a imediata rejeição do recurso no tocante à impugnação da matéria de facto, pelo que nenhuma alteração será feita à decisão sobre tal matéria proferida pela 1ª instância, o que significa que a eclosão do acidente se deveu a culpa exclusiva do réu, com a consequente verificação in casu dos pressupostos da obrigação de indemnizar fundada na responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito, como acertadamente se concluiu na sentença recorrida.

Do montante indemnizatório fixado a título de danos patrimoniais e não patrimoniais.
O réu FGA entende ser exagerada indemnização global de € 507.015,98 a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, face à situação em apreço e por esse valor estar consideravelmente desenquadrado dos valores apurados pela aplicação da Portaria nº 377/2008, de 26.05. Propõe a recorrente um total indemnizatório de € 331.857,62.
O autor pediu a condenação dos réus a pagar-lhe uma indemnização no valor de € 661.525,96, acrescida de juros, correspondendo € 311.525,96 a danos patrimoniais e € 350.000,00 a danos não patrimoniais. Quanto aos danos patrimoniais, desdobrou-os do seguinte modo: € 12.743,98 a título de danos emergentes, que correspondem a € 865,20 relativos ao valor despendido em tratamentos e medicamentos e € 11.878,78 que constituem o valor que terá de despender para reparar o seu veículo; € 51.170,40 a título de danos futuros e que consistem no valor que terá de despender com medicamentos e tratamentos durante todo o seu período previsível de vida; € 247.611,58 relativamente aos rendimentos do trabalho que deixou e deixará de receber por força da incapacidade para o trabalho que lhe adveio com o acidente.
Na sentença recorrida, relativamente aos danos patrimoniais, considerou-se uma indemnização de € 360.000,00 a título de dano biológico, englobando na mesma «os lucros cessantes da incapacidade do exercício da profissão e os danos futuros»; uma indemnização de € 7.292,40 pelas despesas realizadas por causa das lesões sofridas pelo autor; uma indemnização de € 11.878,78 pela reparação do motociclo do autor; e uma indemnização pelo dano futuro de despesas com medicamentos e tratamentos que o autor terá necessariamente de ter durante a sua vida, no valor de € 57.844,80.
Quanto aos danos não patrimoniais fixou-se na sentença uma indemnização de 70.000,00.
Apenas há que apreciar os valores indemnizatórios referentes aos danos patrimoniais resultantes da perda da capacidade de ganho/dano biológico e os danos não patrimoniais, pois os demais danos (danos emergentes e dano futuro de despesas com medicamentos e tratamentos), foram fixados em conformidade com a factualidade provada, não havendo qualquer reparo a fazer.
Comecemos então a nossa análise sobre a justeza das indemnizações atribuídas pelo Tribunal a quo pelos danos patrimoniais pela perda de capacidade de ganho/dano biológico do autor.
No âmbito da responsabilidade civil extracontratual emergente de acidente de viação, no leque dos danos patrimoniais, destacam-se, no que aqui interessa, os resultantes das sequelas sofridas que impliquem perda de capacidade de ganho do lesado.
Com efeito, a lesão corporal sofrida em consequência de um acidente de viação constitui em si um dano real ou dano-evento, designado por dano biológico, na medida em que afeta a integridade físico-psíquica do lesado, traduzindo-se em ofensa do seu bem “saúde”. Trata-se de um “dano primário”, do qual podem derivar, além das incidências negativas não suscetíveis de avaliação pecuniária, a perda ou diminuição da capacidade do lesado para o exercício de atividades económicas, como tais suscetíveis de avaliação pecuniária[4].
Os nossos tribunais, com particular destaque para a jurisprudência do STJ, têm vindo a reconhecer o dano biológico como dano patrimonial, na vertente de lucros cessantes, na medida em que respeita a incapacidade funcional, ainda que esta não impeça o lesado de trabalhar e que dela não resulte perda de vencimento, uma vez que a força de trabalho humano sempre é fonte de rendimentos, sendo que tal incapacidade obriga a um maior esforço para manter o nível de rendimento anteriormente auferido. E que, em sede de rendimentos frustrados, a indemnização deverá ser arbitrada equitativamente, de modo a corresponder a um capital produtor do rendimento que o lesado não irá auferir, que se extinga no fim da sua vida provável e que é suscetível de garantir, durante essa vida, o rendimento frustrado[5].
Desenvolvendo esse entendimento, escreveu-se no acórdão do STJ de 10.10.2012 (Lopes do Rego)[6]:
«… a compensação do dano biológico tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou conversão de emprego pelo lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar; quer a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.
Na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado - constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades de exercício profissional e de escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável – e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição -, erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais …».
E, mais adiante, acrescentou-se:
«Nesta perspectiva, deverá aditar-se ao lucro cessante, decorrente da previsível perda de remunerações, calculada estritamente em função do grau de incapacidade permanente fixado, uma quantia que constitua junta compensação do referido dano biológico, consubstanciado na privação de futuras oportunidades profissionais, precludidas irremediavelmente pela capitis deminutio de que passou a padecer (o lesado), bem como pelo esforço acrescido que o já relevante grau de incapacidade fixado irá envolver para o exercício de quaisquer tarefas da vida profissional ou pessoal …».
Por sua vez, escreveu-se no acórdão do STJ de 02.06.2016 (Tomé Gomes) [7]:
«Assim, a este propósito podem projetar-se em duas vertentes:
- por um lado, a perda total ou parcial da capacidade do lesado para o exercício da sua atividade profissional habitual ou específica, durante o período previsível dessa atividade, e consequentemente dos rendimentos que dela poderia auferir;
- por outro lado, a perda ou diminuição de capacidades funcionais que, mesmo não importando perda ou redução da capacidade para o exercício profissional da atividade habitual do lesado, impliquem ainda assim um maior esforço no exercício dessa atividade e/ou a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, no decurso do tempo de vida expetável, mesmo fora do quadro da sua profissão habitual.
Em suma, o dano biológico abrange um espectro alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do lesado, desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, passando ainda pelos custos de maior onerosidade no exercício ou no incremento de quaisquer dessas atividades ou tarefas, com a consequente repercussão de maiores despesas daí advenientes ou o malogro do nível de rendimentos expectáveis».
No caso em apreço, resultou provada a seguinte factualidade:
- o autor nasceu no dia 28 de Janeiro de 1969:
- em consequência das lesões sofridas no acidente ocorrido em 23 de Maio de 20111, o autor foi submetido às intervenções cirúrgicas supra referidas;
- por causa das sequelas sofridas com o acidente em causa, o autor ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 60 pontos:
- as sequelas de que o autor ficou a padecer são, em termos de repercussão permanente na atividade profissional, impeditivas do exercício da sua atividade profissional habitual e de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional;
- O autor tem a categoria profissional de cozinheiro de segunda, tendo trabalhado como cozinheiro durante 9 anos em New Jersey e Nova Iorque nos E.U.A, durante 4 meses na Inglaterra e entre outros no Hotel …, no restaurante G…, no snack-bar D… e no restaurante A…, todos em Quarteira.
- à data do acidente o autor tinha acabado de gozar férias laborais no último restaurante onde tinha trabalhado e para onde não iria voltar, e ia começar a trabalhar no restaurante da academia de G…, cuja categoria desconhece, em Vilamoura, Quarteira, no dia 1 de Junho de 2011, para onde tinha uma proposta de trabalho a tempo inteiro, com uma retribuição de pelo menos € 750,00 brutos, podendo ser superior.
Da factualidade descrita retira-se, em síntese, que o autor, à data do acidente, contando então 42 anos de idade, exercia a profissão de cozinheiro, auferindo uma remuneração de base mensal de € 750,00 e que, em consequência das sequelas sofridas, ficou, desde logo, não obstante as diversas intervenções a que foi submetido, totalmente incapacitado para o exercício da sua atividade profissional e para qualquer outro trabalho ou tarefa na sua área profissional.
Ora, no que respeita à avaliação da perda de rendimentos provenientes da atividade profissional habitual, tem a jurisprudência[8] considerado como parâmetros a atender os seguintes:
a) – o capital produtor do rendimento que a vítima deixará de auferir e que se extinguiria no período de vida profissional provável;
b) – no cálculo a equacionar de forma equitativa, o relevo das regras da experiência que, segundo o curso normal das coisas, seja razoável atentar;
c) – as tabelas financeiras como mero instrumento auxiliar, sem substituição da equidade;
d) – o facto de ocorrer a antecipação, de uma só vez, do pagamento de todo o capital, o que permite ao beneficiário rentabilizá-lo financeiramente, introduzindo-se, para o efeito, uma dedução de forma a evitar um enriquecimento injustificado à custa de outrem e que se poderá situar entre 1/3 e 1/4.
No que respeita à taxa de capitalização, no quadro do atual mercado financeiro, tem-se admitido que ela se possa situar entre 3% e 4%.
Relativamente, ao limite de idade a ter em conta, convém notar que o artigo 7º, nº 1, alínea b), da Portaria nº 377/2008, de 26 de Maio, ainda que não tenha força vinculativa para os tribunais, manda presumir que o lesado se reformaria aos 70 anos de idade, não se vislumbrando aqui razões ponderosas para dissentirmos de tal critério, tanto mais que esse é ainda o horizonte da vida ativa.
Quanto ao rendimento anual a tomar em linha de conta, tem-se por adquirido que, logo a seguir à data do acidente, o autor ia auferir, na sua atividade profissional de cozinheiro, a remuneração-base mensal de pelo menos € 750,00, incluindo os subsídios de férias e de Natal, de que resulta um rendimento anual de € 10.500,00 (€ 750 x 14). Nesse rendimento anual não se mostra refletido o desconto para efeitos de imposto, mas, de qualquer modo, haveria, em contraponto, que ter em linha de conta algum ajuste desse rendimento em função da inflação e até de eventual evolução salarial, ao longo do período da atividade laboral previsível, pelo que se tem por adequado aquele rendimento.
Assim, a partir desse rendimento anual, atendendo à incapacidade permanente absoluta do autor para o exercício da sua atividade profissional, a uma taxa de juro nominal de 3%, a um período de vida ativa previsível de 28 anos (desde 2011 a 2039, ano em que o autor completará 70 anos) e a uma redução de 1/3 do capital desse modo apurado, a título de compensação pelo benefício da antecipação do mesmo, encontrar-se-ia um capital na ordem dos € 200.000,00. Esse capital, à aludida taxa de juro anual, começará por proporcionar à A. um rendimento anual na ordem dos € 6.600,00, portanto inferior em € 3.900,00 ao rendimento anual de € 10.500,00, para tal considerado à data do acidente, implicando assim uma redução do capital equivalente a essa diferença, o que se acentuará, gradativamente, nos anos subsequentes, de modo a consumir todo o capital antecipado. Este diferencial é, pois, a consequência lógica da redução feita por conta do benefício dessa antecipação.
Assim, tem-se por ajustado aos critérios acima apontados a fixação de um valor indemnizatório na ordem dos € 200.000,00 para compensar o autor pela perda de ganho que auferia, à data do acidente, no exercício da sua atividade profissional[9].
Sucede, porém, como acima se deixou dito, que em caso de incapacidade permanente para a profissão habitual, a consideração do dano biológico servirá para cobrir ainda, no decurso do tempo de vida expetável, a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, mesmo fora do quadro da profissão habitual ou para compensar custos de maior onerosidade com o desempenho ou suprimento dessas atividades ou tarefas, assumindo assim uma função complementar.
Escreveu-se no acórdão do STJ de 07.06.2011 (Granja da Fonseca)[10]:
«Na verdade, a força de trabalho de uma pessoa é um bem, sem dúvida capaz de propiciar rendimentos.
Logo, a incapacidade funcional importa sempre diminuição dessa capacidade, obrigando o lesado a um maior esforço e sacrifício para manter o mesmo estado antes da lesão e, inclusivamente, provoca inferiorização, no confronto do mercado de trabalho, com outros indivíduos por tal não afectados.
A repercussão negativa que a incapacidade funcional tem para o lesado centra-se, assim, na diminuição da sua condição física, resistência e capacidade de esforços, o que se traduzirá numa deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do corpo no desenvolvimento das actividades pessoais em geral e numa consequente e igualmente previsível maior penosidade na execução de diversas tarefas que normalmente se lhe depararão no futuro.»
Ora, no caso presente, verificamos que o autor, além da sua atividade profissional, se encontra também totalmente incapacitado para qualquer outro trabalho ou tarefa, tanto mais que evidencia uma significativa diminuição psico-somática para as tarefas pessoais do seu quotidiano[11].
Neste conspecto importa ainda considerar o quadro factual acima descrito, o qual nos diz que o autor sofrerá sempre de acentuadas restrições à sua mobilidade, provocadas, por um lado, pela assimetria da bacia com instabilidade desta e compromisso do anel pélvico, e, por outro lado, pela limitação da mobilidade da anca e joelho direito com amiotrofia e encurtamento de 12 cm com o pé pendente.
Tal terá, desde logo, como consequências, a necessidade de o autor usar canadiana para se movimentar, o seu domicílio ter de ser adaptado às suas lesões, concretamente a casa de banho, tal como o veículo em que seja transportado. Para além disso terá de realizar fisioterapia de modo regular.
São também evidentes tais limitações à sua mobilidade, no modo como não consegue estar grandes períodos de tempo de pé, sentado ou deitado, ou como não consegue praticar autonomamente um grande número de atividades, havendo outras para as quais precisa do auxílio de terceiros.
O autor ficou também a padecer de incontinência urinária, necessitando de recorrer ao sistema penrose e trazer sempre consigo um saco de urina. E ficou a padecer de impotência sexual, estando impedido de ter uma relação sexual plena.
À data do acidente, o autor tinha 42 anos de idade e era uma pessoa saudável e dedicava-se à prática de várias atividades desportivas e lúdicas.
Analisados todos estes factos, como bem se aduz na sentença recorrida, «verifica-se que o autor está num estado em que várias das suas funções biológicas foram fortemente atingidas, sendo que algumas funcionam com ajuda artificial ou de outras pessoas. O autor terá uma vida futura acentuadamente limitada por força de tais circunstâncias.»
Com efeito, a diminuição somático-psíquica e funcional do autor provocou uma repercussão na sua vida pessoal e profissional de grande dimensão, com também nas atividades da sua vida diária, incluindo as familiares e sociais de toda a ordem.
Assim, considerando o quadro de sequelas sofridas e o que, à luz das regras da experiência comum, é de supor que o autor pudesse desempenhar com utilidade económica, fora do seu giro profissional, e sobretudo nas suas tarefas pessoais, se não fossem tais lesões, tem-se por justificado um acréscimo de € 60.000,00, reportado à data da sentença recorrida, a título de indemnização pela perda da capacidade económica do autor fora da área da sua atividade profissional específica.
Temos assim como adequada no caso concreto, uma indemnização de € 260.000,00 a título de danos patrimoniais pela perda de capacidade de ganho/dano biológico do autor, em vez dos € 360.000,00 fixados na sentença recorrida, valor que se afigura algo excessivo.

Vejamos agora os danos não patrimoniais.
A obrigação de indemnização neste âmbito decorre do disposto no art. 496º, nº 1, do Código Civil que estabelece que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”.
No caso vertente é pacífico que, pela sua gravidade, os danos sofridos pelo autor, merecem ser indemnizados. Está apenas em causa o quantum indemnizatório fixado na sentença a este título.
Estabelece o art. 496º, nº 3, que “o montante da indemnização será fixado equitativamente, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494º”. Isto é, a indemnização por danos não patrimoniais, deve ser fixada de forma equilibrada e ponderada, atendendo em qualquer caso (quer haja dolo ou mera culpa do lesante) ao grau de culpabilidade do ofensor; à situação económica deste e do lesado e demais circunstâncias do caso, como por exemplo, o valor actual da moeda. Como dizem Pires de Lima e Antunes Varela, «o montante de indemnização deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas de criteriosa ponderação da realidade da vida»[12].
Como tem sido entendido de forma uniforme, o valor de uma indemnização neste âmbito, deve visar compensar realmente o lesado pelo mal causado, donde resulta que o valor da indemnização deve ter um alcance significativo e não meramente simbólico[13].
A indemnização por danos não patrimoniais é, mais propriamente, uma verdadeira compensação: segundo a lei, o objetivo que lhe preside é o de proporcionar ao lesado a fruição de vantagens e utilidades que contrabalancem os males sofridos, e não o de o recolocar “matematicamente” na situação em que estaria se o facto danoso não tivesse ocorrido; a reparação dos prejuízos, precisamente porque são de natureza moral (e nessa exata medida, irreparáveis) é uma reparação indireta, comandada por um juízo equitativo que deve atender às circunstâncias referidas no art. 494º.[14]
Este recurso à equidade não afasta, porém, «a necessidade de observar as exigências do princípio da igualdade, o que implica a procura de uma uniformização de critérios, naturalmente não incompatível com a devida atenção às circunstâncias do caso»[15].
A fundamentar a atribuição da indemnização de € 70.000,00 a título de danos não patrimoniais, escreveu-se na sentença recorrida:
«A simples leitura dos factos provados sob os nºs 10 a 33 é suficientemente ilustrativa das atrozes dores que o Autor sentiu ao longo de todo o período que decorreu desde o acidente até à consolidação dos tratamentos.
Tendo em conta todas as gravíssimas lesões sofridas pelo Autor na sequência do acidente, e todas as posteriores lesões e patologias que delas advieram, as cirurgias, tratamentos e internamentos a que foi sujeito – descritos nos factos provados –, é por demais evidente o sofrimento profundo que o Autor sentiu e tem sentido.
Mas o seu sofrimento não se reconduz apenas às dores, mas também à angústia, ao desespero, à frustração, ao incómodo, ao pudor, à vergonha que sentiu e que estão bem retratados em tais factos.
Tais sentimentos estão também evidenciados na incapacidade de manter um relacionamento sexual pleno e no sofrimento inerente, que em concreto já frustrou a possibilidade de manter uma relação amorosa com V… .
E também no facto de ter de urinar com o auxílio do sistema penrose e ter de transportar sempre consigo um saco de urina, com a tristeza, revolta e vergonha que tal lhe provoca.
E nas dores que sente e sentirá ao longo da vida, tal como nas cicatrizes e marcas físicas que terá de carregar.
Tal como na angústia de não poder trabalhar.
E na impossibilidade de se dedicar a actividades lúdicas que praticava, como praticar caça submarina ou andar de mota.
Na verdade, o profundo sofrimento sentido pelo Autor manifesta-se assim de vários modos e em várias dimensões da sua vida que ficaram irremediavelmente limitadas por força das lesões sentidas.»
Subscrevemos este enquadramento feito na sentença, que tem o devido respaldo nos factos provados, mas entendemos que a indemnização fixada a título de danos não patrimoniais fica aquém do que pode ser considerado como mais adequado e justo no caso concreto, considerando a gravidade das lesões sofridas pelo autor.
A este propósito, considerou-se no acórdão do STJ de 12.12.2013 (Lopes do Rego)[16], não ser excessiva uma indemnização de € 150.000,00 por danos não patrimoniais “decorrentes de lesões físicas gravosas e altamente incapacitantes” para qualquer trabalho, “com dependência de terceiros para a realização das atividades pessoais, envolvendo degradação plena e irremediável do padrão e qualidade de vida do lesado”.
Também no acórdão do STJ de 02.06.2016 acima citado, tendo em conta a espécie de lesões sofridas pelo autor, algo similares à dos presentes, «o quadro de intervenções cirúrgicas e de tratamentos a que foi sujeito, as sequelas irreversíveis psicomotoras, mormente a perda de sua autonomia e de funções essenciais ao nível da comunicação e da sua sexualidade, considerando, em particular, os sofrimentos que, segundo as regras da experiência comum, aquelas sequelas são suscetíveis de produzir numa pessoa a partir da idade de 50 anos e que se tendem a agravar com a idade, não poderá deixar de se considerar esta como uma situação do tipo daquelas que têm vindo a ser reconhecidas como de extrema gravidade, mostrando-se, portanto, justificada uma compensação na ordem de € 150 000,00.»
Concedendo que no caso concreto a situação não é exatamente igual àquelas que têm vindo a ser reconhecidas como de extrema gravidade, visto o autor ainda dispor de autonomia, embora bastante limitada, mas não estando muito longe desse tipo de situações, consideramos adequada e justa uma compensação na ordem dos € 120.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos pelo autor, ou seja, mais € 50.000,00 do que a indemnização arbitrada na sentença.
A consideração de um valor superior ao fixado na sentença a título de danos não patrimoniais não enfrenta qualquer obstáculo, pois sendo pacífico que este Tribunal da Relação não está vinculado aos montantes parciais de cada um dos tipos de danos, desde que se contenham globalmente no valor do pedido, e que por via do princípio da proibição da reformatio in mellius não podemos conceder ao autor mais do que aquilo que lhe foi concedido na sentença recorrida, o certo é que o direito de crédito deste é uno.
Assim, apesar de o autor não ter recorrido dos montantes fixados, ainda que subsidiariamente, aquilo que o réu FGA pede é a diminuição dos danos arbitrados, no que obteve parcial provimento, porquanto a indemnização agora fixada pela perda da capacidade de ganho/dano biológico foi reduzida em € 100,000,00 [330,000 – 260,000] e a indemnização pelos danos não patrimoniais foi aumentada apenas em € 50.000.00 [120.000 – 70.000], do que resulta uma indemnização global por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais de € 457.015,98 em vez da indemnização de € 507.015.98 fixada na sentença.
Neste mesmo sentido se pronunciou o acórdão da Relação de Coimbra de 21.03.2013 (Henrique Antunes)[17], onde se escreveu:
«(…), ainda que os danos revistam uma natureza diferenciada – como por exemplo, a decorrente da fundamental dicotomia entre dano patrimonial e não patrimonial – e, por isso, o cálculo da respectiva indemnização obedeça a parâmetros distintos, os recorrentes não ficam investidos em vários direitos de crédito – tantos quantas as parcelas em que, para a determinação do quantum indemnizatório, há que desdobrar o cálculo do dano – mas num único direito de crédito. É justamente isto que explica, v.g., que os limites da condenação, ditados pelo princípio da disponibilidade objectiva, se entendem referidos ao pedido global e não às parcelas em que, para a determinação do quantum indemnizatório, há que desdobrar o cálculo do dano (artº 661 nº 1 do CPC), e que a proibição da reformatio in mellius – que é um simples consequência da vinculação do tribunal ad quem à impugnação do recorrente, que vincula a que esse tribunal não pode conceder a essa parte mais do que ela pede no recurso interposto – não seja violada pela circunstância de o tribunal de recurso confirmar a procedência do quantitativo total do pedido do autor, ainda que com diferentes montantes de cada uma das parcelas. Se, por exemplo, o autor pede uma determinada indemnização para pagamento dos vários prejuízos decorrentes de um acidente de viação, o tribunal de recurso pode considerar a acção totalmente procedente, ainda que faça uma diferente avaliação de cada um desses prejuízos. Identicamente, o tribunal ad quem pode julgar o recurso procedente, quantificando diferentemente os diversos danos que devem ser reparados ou compensados».

Vejamos agora a questão da condenação solidária dos réus, segunda e última questão suscitada no recurso do FGA.
O FGA surge como mero garante do pagamento das indemnizações devidas a terceiros lesados em consequência de um acidente de viação, ficando sempre com a faculdade de reaver dos responsáveis principais as quantias que houver despendido e nessa medida fica legalmente sub-rogado nos direitos do lesado .
Como corolário lógico impõe-se o litisconsórcio necessário passivo entre o FGA e o responsável civil, quando este seja conhecido e não beneficie de seguro válido ou eficaz (art. 62º, nº 1, do Decreto-Lei nº 291/2007, de 21.08), visando-se facilitar e tornar célere a aplicação do direito, com a condenação solidária dos demandados.
Escreveu-se no acórdão do STJ de 12.07.2011 (Nuno Cameira)[18]:
«Existe uma “concorrência” de responsabilidades, podendo afirmar-se que estamos perante um caso de solidariedade imprópria, imperfeita ou “impura”. Isto porque, externamente, a responsabilidade dos obrigados é solidária, na verdadeira acepção da palavra: o lesado pode exigir de qualquer um deles – responsável civil e Fundo – a satisfação da totalidade do seu crédito (art. 519.º, n.º 1, do CC). Internamente, porém, as coisas são diferentes: se quem paga a indemnização devida for o responsável civil, nenhum direito lhe assiste perante o Fundo; se, pelo contrário, for este a pagar, fica sub-rogado nos direitos do lesado, podendo exigir do lesante aquilo que pagou, acrescido dos juros legais de mora e das despesas efectuadas com a liquidação e cobrança (…).»
Merece assim total provimento o recurso quanto a esta questão, impondo-se a condenação solidária nos réus no pagamento ao autor da indemnização fixada.

Resta analisar a questão relativa ao início da contagem dos juros de mora, fixada pela 1ª instância no momento da sentença, por ter sido feita a atualização a esse momento.
O autor sustenta que esse momento deveria ser o da citação da ré, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 805º do Código Civil, aduzindo ainda que «[n]ão obstante a referência conclusiva feita na douta sentença recorrida relativamente a estarem actualizados os montantes indemnizatórios, (com excepção do valor de reparação do veículo), não existe qualquer fundamentação que sustenha tal conclusão, não tendo sido indicados os indicadores (económicos) e os critérios lógico-racionais que lhe subjaz, pelo que, não foi cumprido o dever de fundamentação que decorre do art.607º do Cód. de Proc. Civil» (conclusão 4ª), não se vislumbrando assim do teor da sentença, «sem qualquer margem para dúvidas, se o valor indemnizatório apurado teve em conta todos os factores que pudessem influenciar “o valor do dinheiro” à data da prolação da mesma, nomeadamente, a desvalorização monetária (actualmente por acção do mercado cambial), inflação, aumento do custo de vida, etc.» (conclusão 5ª).
Mas sem razão, como resulta da aplicação da doutrina firmada pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 4/2002, de 9 de Maio de 2002 (Diário da República, I Série A, de 27 de Junho de 2002), segundo a qual “[s]empre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do nº 2 do artigo 566º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806º, nº 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação».
Com efeito, a sentença esclarece expressamente que o cálculo que efetuou para a determinação dos montantes indemnizatórios foi atualizado: «A tal montante[19] acrescem juros de mora, à taxa legal dos juros civis, contados desde a data da citação até integral pagamento, relativo à reparação do veículo, e contados desde a data da prolação da presente sentença relativamente aos demais montantes indemnizatórios fixados que se encontram actualizados à presente data …».
Se o autor/recorrente entende que os montantes indemnizatórios fixados não se encontram atualizados, então devia ter recorrido indicando quais os valores atualizados, e não dizer que isso não resulta da sentença, quando esta expressamente o refere.
Ademais, os juros de mora não podem transformar-se, nem numa elevação indireta dos montantes indemnizatórios, nem numa duplicação de indemnizações pela demora no pagamento da indemnização.
De facto, como se diz no acórdão do STJ de 25.10.2007 (Santos Bernardino)[20], «… se no momento da prolação da decisão, o juiz actualiza o montante do dano liquidado para reparar o prejuízo que o lesado efectivamente sofreu, os juros moratórios, a serem concedidos desde a citação para a acção, representarão uma duplicação de parte do ressarcimento, e este excederá o prejuízo efectivamente verificado.»
Não merece provimento, portanto, o recurso do autor.

Sumário:
I - Servindo as conclusões para delimitar o objeto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objeto de impugnação. Já quanto aos demais ónus previstos no artigo 640º do CPC, é suficiente que os mesmos constem de forma explícita na motivação do recurso.
II - O dano biológico abrange um campo alargado de prejuízos que incidem na esfera patrimonial do lesado, desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, passando ainda pelos custos de maior onerosidade no exercício ou no incremento de quaisquer dessas atividades ou tarefas, com a consequente repercussão de maiores despesas daí resultantes ou a perda do nível de rendimentos expectáveis.
III - A partir do rendimento anual de € 10.000,00, atendendo à incapacidade permanente absoluta do autor para o exercício da sua atividade profissional, a uma taxa de juro nominal de 3%, a um período de vida ativa previsível de 28 anos e a uma redução de 1/3 do capital desse modo apurado, a título de compensação pelo benefício da antecipação do mesmo, achar-se-ia um capital na ordem dos € 200.000,00.
IV - Considerando o quadro de sequelas sofridas e o que, à luz das regras da experiência comum, é de supor que o autor pudesse desempenhar com utilidade económica, fora do seu giro profissional, e sobretudo nas suas tarefas pessoais, se não fossem tais lesões, tem-se por justificado um acréscimo de € 60.000,00, reportado à data da sentença recorrida, a título de indemnização pela perda da capacidade económica do autor fora da área da sua atividade profissional específica.
V - Tendo em conta a espécie das lesões sofridas pelo autor, o quadro de intervenções cirúrgicas e de tratamentos a que foi sujeito, as sequelas irreversíveis psicomotoras, mormente a perda de significativa autonomia e da sua sexualidade, considerando, em particular, os sofrimentos que, segundo as regras da experiência comum, aquelas sequelas são suscetíveis de produzir numa pessoa a partir da idade de 42 anos e que se tendem a agravar com a idade, não poderá deixar de se considerar esta como uma situação muito próxima do tipo daquelas que têm vindo a ser reconhecidas como de extrema gravidade, mostrando-se, portanto, justificada uma compensação na ordem de € 120 000,00.

IV - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente o recurso do réu FGA e improcedentes os recursos do 2º réu e do autor e, em consequência, alteram a sentença nos seguintes termos:
a) condenam-se solidariamente os réus Fundo de Garantia Automóvel e VP, a pagar ao autor a quantia de € 457,015,98 (quatrocentos e cinquenta e sete mil e quinze euros e noventa e oito cêntimos) a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida dos correspondentes juros de mora, à taxa anual de 4%, a contar das datas consideradas na sentença.
b) manter no mais a sentença recorrida.
Custas pelas partes, na proporção do respetivo vencimento, tal como resulta deste acórdão, em ambas as instâncias, sem prejuízo do apoio judiciário concedido ao autor e ao 2º réu.
*
Évora, 9 de Março de 2017
Manuel Bargado
Albertina Pedroso
Tomé Ramião
__________________________________________________
[1] Cfr., na jurisprudência, inter alia, o Ac. do STJ de 15.09.2011, proc. nº 1079/07.0TVPRT.P1.S1, disponível, como os demais adiante citados, in www.dgsi.pt.; na doutrina, Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª ed., pág. 181 e Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014 - 2ª edição, pp. 132-133.
[2] Proc. 1184/10.5TTMTS.P1.S1.
[3] Cfr., além do mencionado Ac. do STJ de 31.05.2016, os acórdãos neles citados e cujos sumários aí se transcreveram.
[4] Cfr., a este propósito, as doutas considerações do Ac. do STJ de 21.03.2013 (Salazar Casanova), proc. 565/10.9TBVL.S1.
[5] Cfr., inter alia, o Ac. do STJ, de 07.06.2011 (Granja da Fonseca), proc. 160/2002.P1.S1.
[6] Proc. 632/2001.G1.S1.
[7] Acórdão do STJ de 02.06.2016 (Tomé Gomes), Proc. 3987/10.1TBVFR.P1.S1, que aqui seguimos de perto.
[8] Cfr., inter alia, o Ac. do STJ de 19.04.2012 (Serra Baptista), proc. 3046/09. 0TBFIG.S1.
[9] A sentença recorrida não fixou qualquer indemnização autónoma para a perda de capacidade de ganho, tendo considerado um valor global para o dano biológico em que incluiu aquela vertente.
[10] Proc. 160/2002.P1.
[11] É bom não esquecer que o autor ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 60 pontos.
[12] Ob. cit., pág. 474.
[13] Cfr., inter alia, o Ac. do STJ de 19.04.2012 (Serra Baptista), proc. 3046/09.0TBFIG.S1, in www.dgsi.pt.
[14] Cfr. Ac. do STJ de 14.09.2010 (Sousa Leite), proc. 267/06.0TBVCD.P1.S1, in www.dgsi.pt., citando o Ac. do STJ de 09.10.2008 (Proc. 2430/07).
[15] Ac. do STJ de 03.02.2011, proc. 605/05.3TBVVD.G1.S1 (Maria Beleza), in www.dgsi.pt.
[16] Proc. 105/08.0TBRSD.P1.S1.
[17] Proc. 793/07.4TBAND.C1.
[18] Proc. 5762/06.9TBMTS.P1.
[19] Ou seja, a quantia total de € 507.015,98 fixada a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais.
[20] Proc. 07B3026.