Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
255/10.2TBFAL.E1
Relator: ASSUNÇÃO RAIMUNDO
Descritores: EXPLORAÇÃO DE PEDREIRAS
RENDA
DESVALORIZAÇÃO DA MOEDA
Data do Acordão: 03/12/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Os coeficientes de atualização das rendas não habitacionais entretanto publicados não foram extensivos aos contratos dos autos - exploração de massas minerais-pedreiras – cujo regime especial refere expressamente a este respeito – art. 14 do DL. 270/2001, de 6 de Outubro –, que “o contrato pode inserir cláusulas de revisão da retribuição”, o que não aconteceu no caso em apreço.
Decisão Texto Integral: Proc. nº 255/10.2TBFAL.E1

ACÓRDÃO

Acordam os Juízes que compõem a Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
No Tribunal Judicial da Comarca de Ferreira do Alentejo a SOCIEDADE AGRÍCOLA E AGRO-PECUÁRIA (…), S.A., com sede no Monte dos (…), em (…), freguesia de (…), concelho de (…) moveu a presente ação com processo ordinário a (…), residente no Bairro do (…), 54, (…), pedindo a procedência da ação e, em consequência, que o valor da renda anual a pagar pelo R. à A. pela exploração da pedreira, com efeitos reportados a Março de 2002, seja fixado em 22.505,76 €; e que o R. seja condenado a pagar à A. a quantia de 180.046,08 €, já vencida pela utilização do imóvel desde Março de 2002 até Março de 2010, a que corresponde o valor anual de 22.505,76 €, acrescida de juros vencidos contados à taxa legal em vigor, pela ininterrupta exploração da pedreira durante esse período; condenar ainda o R. a pagar à A., anualmente, até Março de 2013, a quantia de 22.505,76 €, pela exploração da pedreira;
O réu contestou e em reconvenção pediu a condenação da autora a pagar ao R. a importância de € 347.528,00 (trezentos e quarenta e sete mil, quinhentos e vinte e oito euros), acrescidos dos legais juros de mora desde a data da notificação desta peça e até integral cumprimento.
Alegou a autora que é dona do prédio rústico situado na Herdade dos (…).
Que a anterior proprietária do aludido imóvel celebrou com o réu um contrato de exploração de pedreira, pelo prazo de 10 anos, pelo valor de 159.615,32 €.
Este contrato teve início em 9 de Março de 1992 e decorrido o aludido prazo a autora tentou cessar a relação contratual, o que não conseguiu, mantendo-se o contrato até 2013.
O arrastamento do contrato até à referida data causou prejuízos à autora.
Conclui pelo pedido.
Na contestação o réu impugnou os factos e acrescentou que também sofreu prejuízos por não ter conseguido usufruir da área objeto do contrato porque a autora foi ocupando a mesma com vedações e plantações impedindo que o réu extraísse 248.234 toneladas de inertes comerciais que poderiam ser vendidos com lucro para o reu.
Termina pedindo a improcedência da ação e a procedência do pedido reconvencional acima referido.
Após trâmites legais teve lugar a audiência de julgamento e a sentença proferida terminou com a seguinte decisão:
A- julgo parcialmente procedente a ação e
1- fixo em € 15.961,53 (quinze mil novecentos e sessenta e um euros e cinquenta e três cêntimos) o valor da renda anual a pagar pelo R. à A. pela exploração da pedreira, com efeitos reportados a Março de 2002;
2- condeno o R. a pagar à A. a quantia anual de € 15.961,53 pela utilização do imóvel desde Março de 2002 até Março de 2013, acrescida de juros moratórios contados desde a citação e até integral cumprimento.
3- Julgo improcedentes os restantes pedidos.
B- Julgo totalmente procedente a reconvenção condenando a autora a pagar ao réu a quantia de € 347.528,00 (trezentos e quarenta e sete mil, quinhentos e vinte e oito euros), acrescidos dos legais juros de mora contados desde a notificação do pedido reconvencional e até integral cumprimento.
Inconformada com a decisão recorreu a autora, apresentando as seguintes alegações de recurso:
1. Da fixação a renda devida (artigos 5º a 20º supra):
a)- A decisão que fixou em 15.961,53€ o valor de renda anual a pagar, desde 2002, pelo R. à A. pela exploração da pedreira/utilização do imóvel, resultante da divisão por 10 do valor de renda fixado em 1992 para os 10 anos de contrato de exploração, sem aplicar a esse valor qualquer correção em função da desvalorização da moeda entretanto verificada, equivale a fixar o direito da cedente da exploração a uma renda menor do que a fixada no contrato inicial, em 1992, beneficiando injustamente o R. cessionário da exploração, por efeito da desvalorização da moeda entretanto verificada.
b)- O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo somente se pronunciou sobre a aplicação ao valor da renda de coeficientes de atualização das rendas, que considerou não aplicáveis, tendo omitido a pronúncia quanto à aplicação ao valor da renda do coeficiente de desvalorização da moeda, aplicação também peticionada pela A..
c)- A decisão deverá fixar o valor da renda anual a pagar pelo R. à A. pela exploração da pedreira/utilização do imóvel em 22.505,76€ (com efeitos reportados a Março de 2002) por efeito da aplicação ao montante de 15.961,53€, fixado em 1992, do coeficiente de correção monetária, em função da desvalorização da moeda entretanto verificada, por via da Portaria 553/2002, de 3 de Junho, que estabelece o coeficiente de 1,41 para aplicar a direitos adquiridos no ano 2002, por referência ao ano 1992;
d)- O R. deverá ser condenado no pagamento desse montante anual, desde Março de 2002, acrescido de juros moratórios, contados desde a citação até integral cumprimento;
2. Da condenação da A. no pedido reconvencional (artigos 21º a 115º supra):
a)- A decisão que julgou totalmente procedente a reconvenção, condenando a A. a pagar ao R. a quantia de 347.528€, acrescidos de juros de mora desde a notificação do pedido reconvencional até integral cumprimento, padece de falta de fundamentação, de facto e de direito, pelo que deve ser revogada e substituída por uma decisão que julgue totalmente improcedente a reconvenção, absolvendo totalmente a A. de qualquer pagamento ao R., devido ao supra explanado, pois o R. explorou efetivamente toda a área que licenciou para exploração de pedreira, com realce especial e decisivo para que o R., em todo o período de duração do contrato, licenciou para exploração de pedreira tão só a área de 4,98 hectares e explorou quase o triplo dessa área, como expressamente consta do relatório pericial, não podendo ser aceite argumento noutro sentido, por carecer de fundamento de facto e de direito;
b)- A indemnização foi fixada para ressarcir o R. dos danos decorrentes do incumprimento do contrato de exploração pela A., designadamente por a A. ter impossibilitado o R. de explorar 28.000m2 da área licenciada da pedreira, sendo que a 46.000m2 de área licenciada previsivelmente corresponderiam 290.000m3 de inertes extraíveis e a 28.000m2 de área licenciada não explorada previsivelmente corresponderiam 176.522m3 de inertes extraíveis, estimando-se que, na sua composição, previsivelmente se inclua 6% a 6,5% de argila (o que daria 165.489m3), correspondendo cada m3 de inertes previsivelmente a 1,5 toneladas (o que daria 248.234 toneladas) e correspondendo cada tonelada previsivelmente a 7€/8€ e estimando-se e esperando-se obter um lucro de 20%, ou seja, 1,40€ por tonelada, chegando-se assim a 347.526€ (248.234 toneladas x 1,40€);
c)- Valor este que o Tribunal a quo validou e condenou a A. a pagar ao R., sem que tivesse ficado provado nenhum dos pressupostos que poderiam justificar e legitimar o direito do R. a uma indemnização, designadamente:
c1)- não existem quaisquer danos suportados pelo R. que só tinha licença para explorar 4,98 hectares e ficou provado nos autos (relatório pericial - resposta ao quesito 1) que efetivamente explorou 13,51 hectares, pelo que o que o R. teve foram lucros a mais e não lucros a menos, pelo que danos seguramente não teve e muito menos danos por não ter extraído os previsíveis 290.000m3 pois esta previsão era para 46.000m2 de área útil de exploração (como demonstrado também acessoriamente pela prova testemunhal, págs. 73 e 79 da transcrição junta), área que o R. excedeu, de modo inequívoco e justificado pelo relatório pericial, em 89.125m2;
c2)- o incumprimento do contrato pela A. (plantação de oliveiras na zona fixada como área de exploração de pedreira) foi plenamente legítimo pois só se verificou na sequência do incumprimento por parte do R. (não pagamento de rendas pelo R. à A. desde 2002), portanto plenamente justificado ao abrigo da exceção de não cumprimento do contrato;
c3)- em bom rigor, o R. nem sequer alguma vez ficou impedido de explorar a zona licenciada pois sempre pôde entrar na zona onde a A. plantou oliveiras, cujo acesso nunca lhe foi vedado, como demonstrado pela prova testemunhal produzida, nomeadamente discriminado nos artigos 45º-a a 45º-h supra;
c4)- o próprio R. induziu em erro a A. pois delimitou com estacas a zona de exploração, tendo a A. plantado as oliveiras somente até às estacas, partindo do princípio que a área licenciada para exploração era para lá das estacas, uma vez que o R. só podia explorar 4,98 hectares e tinha já explorado uma área superior a partir das estacas para norte (figura 4 do relatório pericial e como demonstrado pela prova testemunhal produzida e supra elencada nos artigos 45º-d, 45º-e, 45º-f e 45º-g;
c5)- não ficou provado que o R. só explorou 18.000m2 da área útil de 46.000m2 de exploração da pedreira (ponto a.3.c) da douta sentença), pelo que não se pode concluir que o R. não explorou os restantes 28.000m2 e fixar uma indemnização com base nos inertes que não pôde extrair dessa área, que foi o que o Tribunal a quo fez, sem fundamento e completamente ao arrepio do relatório pericial, sem cuidar da não integração processual do facto inelutável que o R. apenas licenciou para exploração como pedreira uma área de 4,98 hectares da propriedade;
c6)- não ficou provado que efetivamente o R. teria obtido um lucro de 347.528€, valor resultante de estimativas formais e expectativas virtuais (como demonstrado por via da prova testemunhal supra elencada nos artigos 45º-o e 45º-p) que, além de partirem de pressupostos não provados, como referido supra (28.000m2 não explorados), o mais provável é que nem sequer se concretizassem, dada a evolução do mercado que provocou, desde 2007, uma paragem total das obras e consequentemente das compras e vendas de inertes (como demonstrado pelo desempenho da prova testemunhal nos artigos 45º-m e 45º-n) e até dada a pouca qualidade do material extraível naquela zona (conforme demonstrou a prova testemunhal produzida e referenciada nos artigos 45º-c, 45º-f e 45º-o), pelo que algum lucro só se concretizaria se fosse possível extrair do terreno a quantidade de material previsível, se fosse possível colocar o material no mercado, se houvesse clientes compradores, se houvesse obras em curso, se houvesse encomendas, se pagassem o preço expectável, enfim se se tivesse feito prova de uma série de factos que ficaram por provar, mas que foram tidos como fundamento de sustentação da douta decisão proferida;
d)- Em qualquer caso, mesmo que considerando todos estes factos provados e não provados, o Tribunal ainda assim entenda que o R. mantém o direito a explorar mais área do que a que já explorou, sempre se dirá que o contrato de exploração não foi denunciado pela A., pelo que o que quer que o Tribunal venha a considerar que o R. ainda tenha direito a extrair dos previsíveis 290.000m3 para 46.000m2 de área útil de exploração poderá ser extraído pois o cálculo de extração era até final da vigência do contrato (ponto 5 da sentença do Tribunal a quo), sendo que o final não ocorreu por iniciativa da A. (pelo que, em bom rigor, não há incumprimento do contrato pela A.);
e)- Não havendo danos, não havendo incumprimento, não estando provado que o R. não explorou 28.000m2 da área licenciada (e tendo ficado somente provada uma expectativa de lucro, havendo até uma probabilidade muito séria de o lucro expectável nunca ser concretizável), salvo o devido respeito, não há qualquer fundamento para o direito a uma indemnização;
f)- Penalizar a A. com o pagamento ao R. de uma indemnização em dinheiro, que, em qualquer caso a A. considera não devida, conforme amplamente explanado, seria além do mais, contra legem, pois sempre seria de lançar mão da reconstituição natural perfeitamente possível, ao que a A. não se opõe;
g)- No entanto, reitera a A., por tudo o que ficou inequivocamente demonstrado nos autos, reconhecer ao R. um direito a ser indemnizado, mesmo que por via da reconstituição natural, seria não só legitimar uma ilegalidade praticada pelo R. ao longo dos anos, por ter explorado área muito superior à que estava licenciada e por isso legalmente inadmissível, e concomitantemente lucrado com a extração de material de 13,51 hectares, quando só poderia fazê-lo em 4,98 hectares, como “ainda por cima”, premiar e pagar ao R. a ilegalidade decorrente da ausência de licenciamento, não bastando o facto de nunca ter sido penalizado pelas entidades fiscalizadoras que o deveriam ter feito e ainda “oferecendo” ao R. 347.528€ (ou o equivalente em reconstituição natural) por não ter explorado ainda mais área além da que muita que já explorou a mais, o que consubstanciaria, além do mais, um manifesto abuso de direito e um flagrante enriquecimento sem causa e locupletamento indevido do R. à custa da A..
h)- Por todo o exposto, deverá a douta sentença do Tribunal a quo ser revogada, fixando-se o valor da renda anual a pagar pelo R. à A. pela exploração da pedreira/utilização do imóvel em 22.505,76€ (com efeitos reportados a Março de 2002), condenando-se o R. no correspondente pagamento, com juros de mora desde a citação até integral cumprimento e julgando-se totalmente improcedente a reconvenção, absolvendo totalmente a A. de qualquer pagamento ao R.
O réu contra-alegou e concluiu:
(1) Não tem razão a recorrente quanto à sua pretensão de que a renda anual de 15.961,53 €, fixada pelo Tribunal “a quo”, seja acrescida de uma “correção monetária”, desde logo porque a Portaria n.º 553/2002, de 3 de Junho, que a recorrente invoca como fundamento de direito dessa sua pretensão, é claramente inaplicável no caso em apreço.
(2) Acresce que do disposto no artigo 550.º do Código Civil extrai-se a impossibilidade legal da correção monetária, ou atualização, deste tipo de dívida de renda anual, por se tratar de uma verdadeira e pura obrigação pecuniária, só podendo, eventualmente, fazer-se essa atualização se existisse prévia convenção das partes ou estipulação legal nesse sentido – o que, no caso ora em apreço, não se verificou.
(3) Deve, pois, tal renda anual manter-se fixada nesse valor de 15.961,53 €, sem qualquer atualização ou “correção monetária”, sendo que, atendendo a que a citação do recorrido para este processo ocorreu em 05/11/2010, devem também as rendas anuais em dívida respeitantes aos anos de 2002 a 2005 (inclusive)ser declaradas prescritas, por força do disposto nos artigos 307.º e 310.º, alíneas b) ou g), do Código Civil (conjugado com o disposto no artigo 579.º do CPC) – tanto mais que o recorrido até invocou expressamente essa prescrição nos artigos 13.º e 14.º da sua contestação / reconvenção, apresentada nos autos em 10/12/2010.
(4) Não tem igualmente razão a recorrente quanto à sua pretensão de ser totalmente absolvida do pedido reconvencional no âmbito do qual foi condenada a pagar ao recorrido a quantia de 347.528,00 €, acrescida dos legais juros de mora, contados desde a notificação daquele pedido reconvencional e até integral cumprimento.
(5) E não tem razão a recorrente, designadamente, quando pretende que a douta sentença recorrida padece de diversas contradições; antes pelo contrário, tal sentença aplicou corretamente as normas jurídicas pertinentes à matéria de facto em julgamento, sem prejuízo do que aqui defendemos quanto à matéria da prescrição das rendas anuais respeitantes aos anos de 2002 a 2005 (inclusive).
(6) Outrossim, também não tem razão a recorrente quando pretende que o Meritíssimo Juiz “a quo” deveria, no seu julgamento da matéria de facto, ter aplicado o “instituto da exceção de não cumprimento do contrato, previsto no artigo 428.º e ss. do CC”, ou o “regime do direito de retenção, previsto nos artigos 754.º a 761.º do CC”, ou o “regime da compensação, previsto nos artigos 847.º a 856.º do CC”, ou mesmo a figura do “abuso do direito”. Além de não ter minimamente razão, a recorrente, mormente no que concerne ao alegado “abuso do direito”, está manifestamente, a incorrer num venire contra factum proprium.
O recorrido com as contra-alegações veio requerer, ao abrigo do art. 636 nº2 e 638 nº8 do Código de Processo Civil, a ampliação do objeto do recurso no sentido de que fosse apreciada a exceção perentória da prescrição das rendas respeitantes aos anos 2002 a 2005.
Alegou que tal exceção foi arguida na contestação e impugnada pela autora na réplica e que, em sede de saneador o seu conhecimento foi relegado para sentença final, conhecimento que o Exmº Juiz omitiu.
Admitida por despacho tal ampliação, a questão suscitada irá ser apreciada na sequência da apreciação do recurso da recorrente.

Foram dispensados os vistos ao abrigo do art. 657 nº4 do Código de Processo Civil.
Cumpre apreciar e decidir:
De acordo com a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça (cfr. a título de exemplo os Acórdãos do S.T.J. de 2/12/82, BMJ nº 322, pág. 315; de 15/3/2005, Proc. nº 04B3876; de 11/10/2005, Proc. nº 05B179; de 25-5-2010, Proc. nº 8254/09.0T2SNT.L1.S1; e de 30-6-11, Proc. nº 527/05.8TBVNO.C1.S1, todos publicados nas Bases de Dados Jurídicos do ITIJ), o âmbito do recurso determina-se em face das conclusões da alegação do recorrente pelo que só abrange as questões aí contidas, como resultava dos arts. 684 nº3 e 685-A nº1 do Cód. Proc. Civil e continua a resultar das disposições conjugadas dos arts. 635 nº 4, 637 nº2 e 639 do N. Cód. Proc. Civil.
Nesta conformidade, a recorrente coloca à apreciação deste tribunal as seguintes questões:
I - A decisão deverá fixar o valor da renda anual a pagar pelo R. à A. pela exploração da pedreira/utilização do imóvel em 22.505,76€ (com efeitos reportados a Março de 2002) por efeito da aplicação ao montante de 15.961,53€, fixado em 1992, do coeficiente de correção monetária, em função da desvalorização da moeda entretanto verificada, por via da Portaria 553/2002, de 3 de Junho, que estabelece o coeficiente de 1,41 para aplicar a direitos adquiridos no ano 2002, por referência ao ano 1992; e ainda juros moratórios, contados desde a citação até integral cumprimento (?)
II - A indemnização fixada para ressarcimento do R. dos danos decorrentes do incumprimento do contrato de exploração, designadamente por a A. ter impossibilitado o R. de explorar 28.000m2 da área licenciada da pedreira, o Tribunal a quo validou e condenou a A. a pagar ao R., sem que tivesse ficado provado nenhum dos pressupostos que poderiam justificar e legitimar o direito do R. a uma indemnização (?)

A sentença recorrida assentou na seguinte matéria de facto:
A- Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de (…), sob o nº …/198610, o prédio rústico situado na Herdade dos (…), inscrito na respetiva matriz rústica sob o artigo (…), secção DD1, composto por cultura arvense, arrozal, prado natural, montado de azinho, solo subjacente a cultura arvense, sobreiros, montado de sobro, pinhal e leito de cursos de água, com uma área de 757,3ha, confrontando a norte com o (…), a sul com a Herdade da (…) e a nascente com a Herdade da (…).
B- Através da Ap. 2 de 1996/11/06 foi inscrita a aquisição do prédio referido em A. a favor da Sociedade Agrícola e Agro-Pecuária (…), Lda., por compra à Cooperativa de Produção Agro-Pecuária (…), CRL.
C. Por escrito datado de 11 de Abril de 1991 e denominado “contrato de exploração de pedreira, areias e saibro”, a Cooperativa de Produção Agro-Pecuária (…), CRL, na qualidade de primeira outorgante, e o R. (…), na qualidade de segundo outorgante, declararam celebrar um contrato de exploração de pedreira para extração de cascalho, areias e saibro do prédio rústico descrito em A., excluindo as várzeas de arroz e pomares.
D. No âmbito do escrito referido em C. declaram também ambas as partes o seguinte:
“TERCEIRA – A exploração resultante deste contrato será efetuado pelo 2º outorgante que extrairá, do imóvel atrás identificado na cláusula primeira deste contrato, todo o material existente no referido prédio, cascalho, areias e saibro.
QUARTA – Como contrapartida devida pela exploração da pedreira (…) o 2º outorgante pagará ao 1º a quantia total de Esc. 32 000 000$00 (trinta e dois milhões de escudos), pagamento que será efetuado da seguinte forma: 4000 000$00 como sinal já recebido e, após obtenção do licenciamento pelas entidades competentes e no prazo máximo de oito dias a contar da data do licenciamento o 2º outorgante pagará ao 1º a quantia de 14 000 000$00 e passados 30 a 45 dias os restantes 14 000 000$00, o que perfaz o total do pagamento de 32 000 000$00.
(…)
SEXTA – A exploração da pedreira a que se refere o presente contrato terá a duração de 10 anos, contados a partir da data do licenciamento.
(…)
DÉCIMA NONA – Tudo o que estiver omisso neste contrato, reger-se-á pela regulamentação em vigor para contratos deste tipo.”
E. Em 9.03.1992 foi emitido a favor do Réu o alvará nº 1/92 para exploração de pedreira, numa área de 4,98 hectares do prédio referido em A..
F. O Réu só começou a explorar industrialmente a pedreira existente no prédio referido em A. a partir de meados de 2003.
Factos provados resultantes da audiência de julgamento
1. Desde 2007 que a Autora instalou vedações e plantações de oliveiras no prédio referido em A. impedindo o Réu de extrair o material (cascalho, areias e saibro) nas áreas plantadas com olival.
2. A Autora plantou oliveiras na área de 4,98 hectares que estava licenciada pela Câmara Municipal de (…) para a atividade de extração de inertes pelo Réu.
3. A área útil da exploração da pedreira é de 46.000m2.
4. O olival plantado pela Autora ocupou pelo menos 28.000m2 da área útil da exploração da pedreira.
5. Na área útil da exploração foi calculado extrair 290.000m3 de inertes (cascalho, areias e saibro) até ao final do prazo de vigência do contrato de exploração da pedreira.
6. O volume de inertes inclui 6 a 6,5 % de argila.
7. Cada m3 de inertes “comerciais” pesa 1,5 toneladas.
8. Cada tonelada de inertes possui um valor de mercado entre € 7,00 a € 8,00.
9. A margem de lucro nesta atividade de venda de inertes é de 20%.

I - A primeira questão suscitada pela recorrente tem de ser enquadrada na decisão proferida no Acórdão deste Tribunal da Relação de 21-4-2010, no âmbito do Proc. nº ../08.4TBFAL.E1, junto a estes autos a fls. 27 e segs..
Com efeito foi por decisão deste acórdão que o contrato dos autos mereceu a prorrogação obrigatória até 8-3-2013, a terceira prorrogação legalmente imposta, sendo que no termos do mesmo acórdão a eventual denuncia ter-se-ia de operar até ao dia 8-2-2012.
Tendo sido no âmbito do referido processo alegado e provado, como no agora em apreço, que em 9.03.1992 foi emitido a favor do Réu o alvará nº 1/92 para exploração de pedreira, entendeu-se que de acordo com o contrato celebrado, o primeiro período decorreu até 8-3-2002.
A primeira renovação ocorreu entre 9-3-2002 e 8-3-2006; a segunda renovação entre esta ultima data e 8-3-2010; e a última renovação (a terceira renovação obrigatória) entre 9-3-2010 e 8-3-2013.
Pretende agora a recorrente que a atualização que propugna se aplique e vença deste o princípio da primeira renovação – Março de 2002
Ora o contrato dos autos – junto a fls. 18 e segs. - mereceu a apreciação do acórdão em referência, tendo sido classificado como um contrato típico celebrado ao abrigo do regime jurídico então em vigor em matéria de exploração de massas minerais-pedreiras, verificando-se que na “cláusula 10ª” os contraentes estipularam que “Tudo o que estiver omisso neste contrato, reger-se-á pela regulamentação em vigor para os contratos deste tipo”.
Ora à data de celebração do contrato em apreço encontrava-se em vigor, o DL. 89/90, de 16 de Março, que estabeleceu o regime jurídico em matéria de exploração de massas minerais-pedreiras, dando cumprimento ao mandato contido no Decreto-Lei n.º 90/90, que estabelece o regime geral dos recursos geológicos, remetendo, no seu artigo 51.º, para legislação própria a fixação de disciplina específica aplicável a cada tipo de recurso.
Desde então o Decreto-Lei n.º 89/90 passou a ser a lei das pedreiras, na qual se baseou a exploração desta atividade.
Nos termos deste diploma legal - Artigo 6.º “Retribuição devida ao proprietário” - 1 - A retribuição devida ao proprietário do prédio é fixada no contrato e consiste obrigatoriamente numa renda anual fixa, acrescida de uma retribuição variável, designada por «matagem», segundo o volume da produção, salvo se outra forma for expressamente aceite pelas partes 2 - O contrato pode inserir cláusulas de revisão da retribuição.
Também o DL. 270/2001 de 6 de Outubro, que revogou o referido decreto-lei, dispôs nesta parte que 1 - A retribuição devida ao proprietário do prédio é fixada no contrato e consiste numa renda anual fixa, acrescida de uma retribuição variável, designada «matagem», segundo o volume da produção, salvo se outra forma for expressamente acordada pelas parte 2- O contrato pode inserir cláusulas de revisão da retribuição – cfr. Artigo14º “Retribuição devida ao proprietário”.
Porém o contrato dos autos, na cláusula 4ª, fixou o preço a pagar pelo réu em 32.000$00, ou seja, 159.615,30 €, pelo período de 10 anos, sem acrescentar qualquer outra adenda ou cláusula sobre a revisão da retribuição.
Efetivamente nada impede que assim tivesse sido. Nos termos do art. 405 nº1 do Código Civil “Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos … ou incluir nestes as clausulas que lhes aprouver.”
Como entendeu recentemente o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7-10-2014, Proc. nº 5908/10.2TBCSC.L1.S1, em www.dgsi.pt, “… perante os critérios de interpretação da lei fixados no art.º 9º do Cód. Civil, e atendendo a que as pedreiras se encontram fora do domínio público do Estado, pertencendo ao domínio privado do proprietário da superfície (como já referia o art.º 3º, n.º 1, daquele Dec. – Lei n.º 227/82), e podendo, quando devidamente licenciadas para o efeito, ser objeto de exploração meramente particular para proveito do seu proprietário e do explorante, estes têm, por aplicação do princípio da liberdade contratual, nos termos do art.º 405º, n.º 1, do Cód. Civil, a faculdade de fixarem livremente o conteúdo dos contratos, embora dentro dos limites da lei. E, sendo tal princípio da liberdade contratual um princípio geral, essencial no nosso sistema jurídico, imperioso se torna, para ser derrogado, que a lei o faça clara e expressamente, o que aqui não sucede.”
Nesta conformidade, a redação dada à aludida cláusula e fazendo apelo à disposição do nº1 do art. 236 do Código Civil, as partes não quiseram mais do que a renda que fixaram e aceitaram, não obstante a lei lhes permitir inserir cláusulas de revisão da retribuição.
Sendo assim quid júris quanto à renda nas renovações obrigatórias que se seguiram.
Cremos que o valor inicial se mantém.
Com efeito a renovação do contrato não constitui um novo contrato. Ele prossegue igual a si próprio pelo período inicialmente fixado ou, como no caso, pelo período então fixado na lei – DL. 270/2001, de 6 de Outubro, mediante os fundamentos do Acórdão deste Tribunal da Relação de 21-4-2010, no âmbito do Proc. nº 75/08.4TBFAL.E1, a que inicialmente fizemos referência.
Alega a recorrente que “A decisão deverá fixar o valor da renda anual a pagar pelo R. à A. pela exploração da pedreira/utilização do imóvel em 22.505,76€ (com efeitos reportados a Março de 2002) por efeito da aplicação ao montante de 15.961,53€, fixado em 1992, do coeficiente de correção monetária, em função da desvalorização da moeda entretanto verificada, por via da Portaria 553/2002, de 3 de Junho, que estabelece o coeficiente de 1,41 para aplicar a direitos adquiridos no ano 2002, por referência ao ano 1992”.
Com o devido respeito, a aludida Portaria não tem qualquer aplicação à situação em apreço.
Aliás também esta afirmação havia sido dada na sentença recorrida, muito embora a recorrente tivesse alegado que houve omissão sobre tal pronúncia – cfr. conclusão 1.b) e 4º § da sentença a fls. 372.
Ora a Portaria nº 553/2002, de 3 de Junho a que a recorrente faz referência, como resulta do seu preâmbulo, não tem a finalidade que alega.
Ela foi criada para ser aplicada aos bens e direito alienados durante o ano de 2002, cujo valor deva ser atualizado nos termos dos arts. 44º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas e 50º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares para efeitos de determinação da matéria coletável dos referidos impostos: “O artigo 44.o do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC), aprovado pelo Decreto-Lei n.o 442-B/88, de 30 de Novembro, e o artigo 50.o do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), aprovado pelo Decreto-Lei n.o 442-A/88, de 30 de Novembro, preveem a atualização anual dos coeficientes de desvalorização da moeda para efeitos de correção monetária dos valores de aquisição de determinados bens e direitos. Manda o Governo, pela Ministra de Estado e das Finanças, que os coeficientes de desvalorização da moeda a aplicar aos bens e direitos alienados durante o ano de 2002 cujo valor deva ser atualizado nos termos dos artigos 44.o do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas e 50.o do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares para efeitos de determinação da matéria coletável dos referidos impostos sejam os constantes do quadro anexo.”
Por outro lado, os coeficientes de atualização das rendas não habitacionais entretantos publicados não foram extensivos aos contratos dos autos - exploração de massas minerais-pedreiras – cujo regime especial refere expressamente a este respeito – art. 14 do DL. 270/2001, de 6 de Outubro –, que “o contrato pode inserir cláusulas de revisão da retribuição” o que não aconteceu no caso em apreço.
Nesta conformidade a operação aritmética levada a efeito na sentença recorrida para apuramento da renda anual não merece qualquer reparo.

Acontece porém, conforme já se expressou no despacho de fls. 733 a 735, o elenco de factos provados descritos na sentença não incluiu o facto: “Desde Março de 2002 que o réu não paga à autora qualquer contrapartida pela exploração da pedreira”, facto que admitido por confissão e não incluído na matéria de facto fixada, acabou por ser considerado para a determinação da indemnização devida à autora.
Por outro lado, como também já se deu conta às partes, a sentença recorrida enferma da nulidade prevista no art. 615 nº 1 al. d) do Código de Processo Civil, por não se pronunciar, como devia, sobre prescrição das rendas, tal como havia sido excecionado pelo réu na sua contestação.
Contudo, contendo os autos elementos suficientes para que este tribunal superior possa suprir as omissões referidas, ao abrigo do disposto no art. 665 nº2 do Código de Processo Civil, procede-se ao seu conhecimento.
O réu na contestação – cfr. fls. 44 – e em sede de contra-alegações -, argui, ao abrigo do art. 310 al. b) do Código Civil, a prescrição das rendas vencidas desde 2002 a 2005 de que a autora pretende ser paga.
A autora, na réplica, refutou a prescrição das aludidas rendas sob o argumento de que ao caso dos autos se aplica o prazo geral de prescrição previsto do art. 309 do Código Civil.
Vejamos se assim é:
Como temos vindo a expor, estamos perante um contrato de exploração de pedreira.
A primeira prorrogação ocorreu entre 9-3-2002 e 8-3-2006; a segunda renovação ocorreu entre 9-3-2006 a 8-3-2010; e a terceira renovação ocorreu entre 9-3-2010 e 8-3-2013.
A autora pediu a condenação do réu no pagamento da renda anual fixada desde Março de 2002 até Março de 2010. O réu ao defender-se por exceção, alegou a prescrição das rendas vencidas desde Março de 2002 a Março de 2005.
Encontra-se provado que “Desde Março de 2002 que o réu não paga à autora qualquer contrapartida pela exploração da pedreira”.
Nos termos da al. b) do art. 310 do Código Civil, prescrevem no prazo de 5 anos as rendas e alugueres devidos pelo locatário, ainda que pagos por uma só vez.
A razão essencial desta prescrição de curto prazo é evitar que o credor deixe acumular excessivamente os seus créditos, para proteger o devedor contra a acumulação da sua dívida, que, de dívida de mensalidades ou de anuidades, pagas com os seus rendimentos, se transformaria em dívida de capital suscetível de o arruinar, se o pagamento pudesse ser-lhe exigido de um golpe ao cabo de um número demasiado de anos – cfr. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 4-10-2000, em Col. Jurisp. Do S.T.J. Ano VIII, Tomo III, pág. 60.
Também em relação ao referido prazo de prescrição Manuel de Andrade – Teoria Geral da Relação Jurídica, II, 1972, pág. 452 - ensinava que “a lei funda-se no intuito de evitar que o credor deixe acumular os seus créditos a ponto de ser mais tarde ao devedor excessivamente oneroso pagar”.
Perante este introito e regressando aos autos, estamos perante um contrato de exploração de uma pedreira contra a retribuição anual de um montante certo e determinado.
Ora esta prestação, periódica e renovável, constitui uma renda de natureza locatícia com total integração na al. b) do art. 310 do Código Civil, segundo o qual prescrevem no prazo de 5 anos as rendas e alugueres devidos pelo locatário, ainda que pagos por uma só vez.
Correndo o prazo de prescrição desde o momento em que o direito puder ser exercido, art. 306 nº1 do Código Civil, constata-se que tendo a presente ação dado entrada em Tribunal em 25-10-2010, é seguro que as rendas vencidas de Março de 2002 a Março de 2005 se encontravam já prescritas.
Nesta conformidade na procedência da exceção perentória arguida pelo réu na sua contestação, na determinação das rendas a pagar pelo réu à autora, ter-se-á em devida conta a prescrição das aludidas rendas.

II - Quanto à indemnização fixada para ressarcimento do R. dos danos decorrentes do incumprimento do contrato de exploração, designadamente por a A. ter impossibilitado o R. de explorar 28.000m2 da área licenciada da pedreira, alega a recorrente que a mesma padece de falta de fundamentação de facto e de direito.
Na impugnação de facto, a recorrente, não obstante ter junto a transcrição da prova, não cumpre a exigência do art. 640 do Código de Processo Civil.
Nos termos desta disposição legal, “1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
E o nº 2 refere: “No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;”
Ora a recorrente ao infirmar os factos que foram considerados provados em julgamento, não identifica os depoimentos produzidos que atestem essa realidade nem as eventuais passagens da gravação que os sustentam.
Porque a função do Tribunal da Relação na apreciação do recurso da matéria de facto é proceder essencialmente à aferição da razoabilidade da convicção probatória do julgador, censurando os casos mais flagrantes, como sejam aqueles em que o teor de algum ou alguns dos depoimentos prestados no tribunal “a quo” lhe foram indevidamente indiferentes ou eram de todo inidóneos ou ineficientes para suportar a decisão a que se chegou, não dispõe o recurso da identificação desses depoimentos
Na verdade é entendimento dominantemente aceite que não basta a mera alegação “de que decorre da prova testemunhal…” para fundamentar que certos factos devem integrar ou não o elenco dos factos provados (nem sequer mesmo uma indiscriminada transcrição de depoimentos) para fundar uma pretensão de impugnação da matéria de facto (cfr. Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, vol. 3º, Coimbra Editora, Coimbra, 2003, pág. 53-55). “É necessário que haja uma indicação especificada dos pontos de facto a alterar – i.e., tem de haver uma indicação ponto por ponto (facto a facto/quesito a quesito) do que deve ser alterado, em que sentido (resposta positiva, negativa ou restritiva) e com que particular fundamento”. A lei impõe ao recorrente que indique (concretamente) o porquê da discordância, e os concretos meios probatórios que contrariam a conclusão.
Por estas razões e em bom rigor não deveria este Tribunal conhecer da pretendida alteração da decisão de facto. Em todo o caso e para que não subsistam dúvidas sobre o acerto da decisão de facto, sempre se dirá que a mesma fez uma correta aplicação dos princípios legais em matéria de direito probatório.
Analisando a motivação da matéria de facto, encontramos na mesma uma coerência irrepreensível. E os factos que a recorrente pretendia ver alterados, foram dados como provados com base no relatório pericial efetuado, sendo certo que as testemunhas que o Exmº Juiz identifica na motivação em nada contrariaram o mesmo.
Atuou no âmbito da faculdade concedida pelo art. 607 nº 5 e, através da fundamentação que apresentou, cumpriu na íntegra a imposição do nº 4 do mesmo artigo.
Face ao exposto, improcede a impugnação feita pelo recorrente.

A sentença recorrida fundamentou a procedência do pedido reconvencional nos seguintes termos:
“ … o réu alegou que a autora impediu-o de utilizar esse bem, de explorar a massa mineral para uso industrial, a que tinha direito nos termos contratuais.
Provou-se que o Réu só começou a explorar industrialmente a pedreira existente no prédio a partir de meados de 2003; que a área útil da exploração da pedreira é de 46.000m2.
Mais se provou que desde 2007 a Autora instalou vedações e plantações de oliveiras no prédio referido em A. impedindo o Réu de extrair o material (cascalho, areias e saibro) nas áreas plantadas com olival. A Autora plantou oliveiras na área de 4,98 hectares que estava licenciada pela Câmara Municipal de (…) para a actividade de extracção de inertes pelo Réu. Tal olival plantado ocupou pelo menos 28.000m2 da área útil da exploração da pedreira.
Esta atitude da autora, somada às ações judiciais que os autos dão conta demonstram, à saciedade, que efetivamente impediu o réu de explorar as massas de inertes.
Provou-se, igualmente, que teria sido possível extrair 290.000m3 de inertes (cascalho, areias e saibro) até ao final do prazo de vigência do contrato de exploração da pedreira.
Ou seja, não fora a atitude da autora e o réu podia ter extraído 290.000m3 de inertes. Sabemos, também, que o volume de inertes inclui 6 a 6,5 % de argila; cada m3 de inertes “comerciais” pesa 1,5 toneladas, cada tonelada de inertes possui um valor de mercado entre € 7,00 a € 8,00; e que a margem de lucro nesta atividade de venda de inertes é de 20%.
Ou seja, se a autora tivesse cumprido o contrato (art.º 406º, n. 1, do Código Civil) o réu podia ter realizado a quantia de cerca € 1,40 por cada uma das 248 234 toneladas de inertes aproveitáveis da exploração. Ou seja, um valor de € 347 528 (este valor pela impossibilidade de apuramento exato terá sempre que ser aproximado).
Do que já referimos supra entendíamos que o réu não estava obrigado ao pagamento da totalidade das rendas pedidas, por não ter podido realizar a sua prestação contratual por culpa da autora (art.º 428º, n. 1, do Código Civil). Atendendo, contudo, ao pedido reconvencional, em que o réu demonstrou os proventos que retiraria se o contrato tivesse sido integralmente cumprido, entendemos que, deste modo, cabe-lhe realizar a contraprestação a que estava obrigado, ou seja, pagar a renda devida.
Em conclusão, o réu tem que pagar à autora a quantia de € 15.961,53 por cada ano de vigência do contrato – que ainda se mantém.
A autora tem que pagar ao réu a quantia de € 347.528,00 a título de indemnização pelo incumprimento contratual.
São devidos juros moratórios contados unicamente desde a citação (art.º 805º, n. 3, do Código Civil).”
Assenta tal raciocínio/entendimento no facto de se ao réu cabe pagar todas as rendas vencidas por via da renovação do contrato e prolongamento do mesmo, cabe à autora, em contrapartida, restituir-lhe aquilo que ele poderia usufruir caso o terreno a que tinha direito por força do contrato, estivesse livre e desocupado para a exploração a que se propunha.
Alega a recorrente que “ … Tribunal a quo validou e condenou a A. a pagar ao R., sem que tivesse ficado provado nenhum dos pressupostos que poderiam justificar e legitimar o direito do R. a uma indemnização”.
Cabe em primeiro lugar notar que estamos no âmbito da responsabilidade contratual e não extra-contratual.
E, no âmbito da primeira, a sentença recorrida foi clara em justificar que o réu demonstrou os proventos que retiraria se o contrato tivesse sido integralmente cumprido pela autora. Ou seja, a renda estipulada teria como contrapartida a exploração de uma dimensão que não foi respeitada pela autora – arts. 406 nº 1 e 428 nº 1 do Código Civil.
Nada há apontar, nesta parte, ao decidido.

Decisão:
Nos termos expostos
A – Nega-se provimento ao recurso da autora.
B - Revoga-se parcialmente a sentença, pelo que se decide
i) aditar à matéria de facto o seguinte facto: “Desde Março de 2002 que o réu não paga à autora qualquer contrapartida pela exploração da pedreira”;
ii) declarar prescritas as rendas vencidas de Março de 2002 a Março de 2005.
iii) Condenar o réu a pagar à autora a quantia anual de 15.961,53€ pela utilização do imóvel desde Março de 2006 até Março de 2013, acrescida de juros moratórios contados desde a citação até integral pagamento.
C – No restante confirmar a decisão recorrida.

Custas da ação na proporção do vencimento das partes.
Custas do recurso pela recorrente.
(Texto escrito e revisto pela relatora, que assina e rubrica as restantes folhas)

Évora, 12-03-2015
Assunção Raimundo
Sérgio Abrantes Mendes
Luís Mata Ribeiro