Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1287/11.9TBPTM-B.E1
Relator: ELISABETE VALENTE
Descritores: EXECUÇÃO
OPOSIÇÃO
Data do Acordão: 06/30/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: CONFIRMADA
Sumário: Se na oposição à execução não resultou provado qualquer facto que obste à execução a mesma deve prosseguir.
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora:

1 - Relatório.

Em 10.07.2013, no então 1.º Juízo Cível do Tribunal Judicial, por apenso à execução para pagamento de quantia certa, que lhes move, AA, Lda. veio intentar a presente oposição à execução que lhes havia sido movida por Condomínio BB.
Para fundamentar a sua posição, em suma, alega que não recebeu, nem tomou conhecimento da carta de notificação para penhora dos créditos, razão pela qual nada informou, e, ainda, que nada deve à CC, S.A..
O exequente contestou alegando, em suma, que a oponente recebe diariamente correspondência na morada para a qual a carta de notificação de penhora de créditos foi expedida e que, entre a CC e a AA foram celebrados dois contratos, um de cessão de exploração, com pagamento de contraprestação e outro de cessão de créditos.
Foi dispensada a selecção da matéria de facto.
Realizou-se a audiência de julgamento.
Foi então proferida sentença que declarou improcedente a oposição à execução e absolveu o requerido/exequente Condomínio BB da pretensão formulada pela requerente da oposição/executada AA, Lda..
Inconformada com a sentença, a executada interpôs recurso contra a mesma, formulando as seguintes conclusões:
«a) Do autos resulta que a recorrente nada deve à exequente e que só está a ser executada neste processo porque não respondeu à notificação para penhora de créditos de uma terceira sociedade realizada pelo Exm.ª Senhor Agente de Execução.
b) Na oposição à execução a recorrente alegou que nada deve nem nunca nada deveu sociedade Iberotel, SA, e, no âmbito no âmbito deste processo, produziu prova irrefutável para, de modo seguríssimo, demonstrar que nada deve nem nunca nada deveu à CC, SA.
c) A Meritíssima Juiz de 1.ª Instância ignorou toda a prova produzida pela recorrente para demonstrar que o crédito penhorado não existe.
d) A prova produzida consiste em documentos não impugnados, alguns autênticos, cujo teor é irrefutável, e no depoimento do técnico de contas responsável pela escrita da recorrente.
e) Nos termos das normas do artigo 856.º do CPC e da norma do n.º 4 do artigo 860.º do CPC, se a recorrente provar que o crédito não existe a oposição tem de proceder.
f) Do teor da douta sentença recorrida resulta que para a Meritíssima Juiz “a quo”, o facto de a recorrente não ter respondido à carta para penhora dos créditos, é suficiente para que a oposição improceda, e resulta ainda que o crédito da CC, SA, sobre a AA advém do contrato de cessão de exploração que estas duas empresas celebraram no dia 1 de Março de 2012.
g) Todavia, e com todo o respeito, estas duas conclusões assentam em dois erros gravíssimos: o primeiro, de direito, consiste no facto de a Meritíssima Juiz “a quo” ignorar a norma do n.º 4 do artigo 860.º do CPC, e, por isto, não ter operado com o facto de a recorrente poder sempre fazer valer a não existência do crédito em sede de oposição.
h) E o segundo erro consiste no facto de a Meritíssima Juiz “a quo” fundar a convicção sobre a existência do crédito num contrato cuja alteração relativa às partes ignorou.
i) Este contrato foi celebrado no dia 1 de Março, para vigorar até ao dia 31 de Dezembro de 2014, mas, por razões com as quais a recorrente nada tem que ver, só vigorou entre a recorrente e a CC até ao final do mês de Março de 2012, ou seja, durante um mês, como resulta, sem margem para dúvidas, dos documentos que antes se referiram.
j) Ou seja, a CC, SA, por ter ficado sem as fracções objecto do contrato de cessão de exploração, foi obrigada a ceder a sua posição contratual a uma outra empresa.
k) Além disto, a recorrente juntou aos autos elementos contabilísticos que demonstram que o crédito não existe, e o depoimento do técnico oficial de contas não deixa margem para dúvidas quanto a este facto.
l) Assim sendo, e como resulta tanto dos documentos que a Meritíssima Juiz “a quo” não valorizou e não refere na douta sentença recorrida, como do depoimento testemunha DD, que também foi ignorado pela Meritíssima Juiz “a quo”, o crédito reclamado pelo condomínio recorrente não existe.
m) E, não existindo o crédito, a decisão que julgou a matéria de facto relativa à existência ou à não existência deste crédito da CC, SA, sobre a recorrente, no valor de 125.000,00€ (cento e vinte e cinco mil euros) deve ser revogada e substituída por outra que julgue o crédito inexistente, o que fará com que, á luz da inexistência do crédito, a oposição seja julgada procedente.
n) Ou seja, a matéria alegada nos artigos 2 e 8 da oposição, que a Meritíssima Juiz “a quo” julgou não provada, deve ser julgada como provada, e, em consequência, cumprindo-se a norma do n.º 4.º do artigo 860.º do CPC, deve a oposição ser julgada procedente.
Termos em que o presente recurso deve ser julgado provado e procedente, com a consequente revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que julgue a oposição procedente, com o que se fará a habitual justiça desse Venerando Tribunal.
JUSTIÇA !»
Não foram oferecidas contra-alegações.
Colhidos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
Factos dados como provados na 1.ª instância:
1. A execução instaurada pela exequente teve por fundamento o facto de a executada AA não ter procedido ao depósito ou entrega dos créditos quando foi notificada pelo agente de execução em 14.03.2013 (resposta ao artigo 1º da contestação).
2. A oponente recebeu a notificação, via postal, enviada pelo agente de execução (resposta ao artigo 2º da contestação).
3. A oponente AA recebe diariamente correspondência para a morada na Avenida e nessa correspondência nunca se verificou a falta de entrega (resposta ao artigo 3º da contestação).
4. A AA, após a recepção da notificação, nada disse, nem depositou quaisquer valores (resposta ao artigo 4º da contestação).
5. A AA e a CC celebraram um denominado “contrato de exploração turística”. Nesse contrato, as partes estabeleceram que a AA está obrigada a pagar uma renda anual equivalente a 2,5%, no primeiro ano e a 5%, nos anos subsequentes, da totalidade das receitas obtidas, à CC (resposta ao artigo 6º, 11º e 12º da contestação).
6. O referido contrato foi celebrado no dia 01 de Março de 2012 (resposta ao artigo 7º, 11º e 12º da contestação).
7. A oponente, quando realizou o registo no Turismo de Portugal, I.P., também informou que: “passou a ser a entidade exploradora do Clube Praia” (resposta ao artigo 8º, 11º e 12º da contestação).
8. A CC realizou cessão de créditos a favor da AA (resposta ao artigo 9º da contestação).


2 – Objecto do recurso.

Face ao disposto nos artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, e 639º, nº 1 do Código de Processo Civil, as conclusões das alegações de recurso delimitam os poderes de cognição deste tribunal, pelo que as questões a decidir são as seguintes:
- Análise da impugnação da matéria de facto;
-Saber se estamos perante uma situação que obste à execução:


3 - Análise do recurso.

3.1 – Análise da impugnação da matéria de facto:

A recorrente veio impugnar a matéria de facto por referência à Oposição.
Impugna a matéria do art. 2º e 8º da contestação.
Vejamos:
Quanto ao art. 2º da Contestação:
É a seguinte matéria:
«2. A oponente recebeu a notificação, via postal, enviada pelo agente de execução.»
Corresponde ao ponto 2 da matéria de facto da sentença.
Na fundamentação da matéria de facto a este propósito, é dito o seguinte:
«Aviso de recepção de fls. 31
Ou seja, o tribunal baseia a sua convicção no teor do A/R, cuja cópia foi junta aos autos.
E não se vê como poderia deixar de ser considerada provada essa matéria.
A recorrente não impugna o teor deste documento, nem põe em causa – pelo contrário, aceita – que a carta tenha sido recebida na empresa. Limita-se a alegar que, embora tenha sido recebida, por motivos que a gerência não consegue explicar, a carta nunca lhes chegou às mãos.
Ora, acontece que a notificação foi correctamente efectuada e o alegado não pode servir para infirmar o facto considerado provado, que assim deve permanecer.
Quanto ao art. 8º da Contestação:
É a seguinte matéria:
«8. A oponente, quando realizou o registo no Turismo de Portugal, I.P., também informou que: “passou a ser a entidade exploradora do Clube Praia”.
Na fundamentação da matéria de facto a este propósito, é dito o seguinte:
«Documento de fls. 37 – suficiente para que o tribunal considerasse provado o facto alegado no art. 8 da contestação.»
Consultado tal documento traduz o mesmo uma carta enviada ao Turismo de Portugal, com a informação em causa.
Também aqui não assiste razão à recorrente.
O facto em causa decorre do documento referido e nem a recorrente explica minimamente a razão da sua discordância.
Não há pois que proceder a qualquer alteração da matéria de facto.


3.2 – Análise da impugnação da matéria de direito/Saber se estamos perante uma situação que obste à execução:

A recorrente insurge-se contra a sentença recorrida invocando que a mesma deveria ter reconhecido que o crédito penhorado não existe.
Alega que ignorou a prova produzida que o demonstrou.
Ora, em sede de impugnação da matéria de facto já vimos que o recorrente não tinha razão, pelo que, quanto à prova nada mais cumpre analisar.
Em termos jurídicos – embora de forma muito confusa – a recorrente parece invocar a violação do art. 856º e 860º nº 4 do CPC e refere ainda que a sentença “ignorou a alteração do contrato e por isso concluir pela existência de um crédito que não existe”.
Vejamos:
É o seguinte o teor do referido art. 856º do anterior CPC (aplicável).
Artigo 856.º - Penhora de créditos
1 - A penhora de créditos consiste na notificação ao devedor, feita com as formalidades da citação pessoal e sujeita ao regime desta, de que o crédito fica à ordem do agente de execução.
2 - Cumpre ao devedor declarar se o crédito existe, quais as garantias que o acompanham, em que data se vence e quaisquer outras circunstâncias que possam interessar à execução.
3 - Não podendo ser efectuadas no acto da notificação, as declarações referidas no número anterior são prestadas por escrito ao agente de execução, no prazo de 10 dias.
4 - Se o devedor nada disser, entende-se que ele reconhece a existência da obrigação, nos termos da indicação do crédito à penhora.
5 - Se faltar conscientemente à verdade, o devedor incorre na responsabilidade do litigante de má-fé.
6 - O exequente, o executado e os credores reclamantes podem requerer ao agente de execução a prática, ou a autorização para a prática, dos actos que se afigurem indispensáveis à conservação do direito de crédito penhorado.
7 - Se o crédito estiver garantido por penhor, faz-se apreensão do objecto deste, aplicando-se as disposições relativas à penhora de coisas móveis, ou faz-se a transferência do direito para a execução; se estiver garantido por hipoteca, faz-se no registo o averbamento da penhora.
E
Artigo 860.º - Depósito ou entrega da prestação devida
1 - Logo que a dívida se vença, o devedor que não a haja contestado é obrigado:
a) A depositar a respectiva importância em instituição de crédito à ordem do agente de execução ou, nos casos em que as diligências de execução sejam realizadas por oficial de justiça, da secretaria; e
b) A apresentar o documento do depósito ou a entregar a coisa devida ao agente de execução ou à secretaria, que funciona como seu depositário.
2 - Se o crédito já estiver vendido ou adjudicado e a aquisição tiver sido notificada ao devedor, será a prestação entregue ao respectivo adquirente.
3 - Não sendo cumprida a obrigação, pode o exequente ou o adquirente exigir a prestação, servindo de título executivo a declaração de reconhecimento do devedor, a notificação efectuada e a falta de declaração ou o título de aquisição do crédito.
4 - Verificando-se, em oposição à execução, no caso do n.º 4 do artigo 856.º, que o crédito não existia, o devedor responde pelos danos causados, nos termos gerais, liquidando-se a sua responsabilidade na própria oposição, quando o exequente faça valer na contestação o direito à indemnização.
5 - É aplicável o disposto no n.º 3 do artigo 861.º
(Redacção dada por Decreto-Lei nº 226/2008 de 20-11-2008, Artigo 1.º - Alteração ao Código de Processo Civil)
Não se vislumbra qualquer violação dos artigos em causa
Foi efectuada a notificação à AA de que o crédito que detém sobre a CC fica à ordem do agente de execução e pela falta de declaração do devedor entende-se que reconhece a existência da obrigação, nos termos da indicação do crédito à penhora e a verdade é que se encontra provado que, após a recepção da notificação, a executada AA nada disse.
Não resultou provado qualquer facto que obste à execução.
Tanto basta para a improcedência do recurso.


Sumário:
Se na oposição à execução não resultou provado qualquer facto que obste à execução a mesma deve prosseguir.


4 – Dispositivo.

Pelo exposto os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora acordam em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

Évora, 30.06.2016

Elisabete Valente

Bernardo Domingos

Silva Rato