Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2710/09.8TBEVR-A.E1
Relator: CANELAS BRÁS
Descritores: INJUNÇÃO
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
FUNDAMENTOS
INCONSTITUCIONALIDADE
Data do Acordão: 02/27/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Sumário:
Em execução baseada em requerimento de injunção a que foi aposta a fórmula executória são admissíveis todos os fundamentos de oposição que se podiam invocar no processo de declaração, pese embora a proibição estatuída no n.º 2 do artigo 814.º do CPC, dada a declaração da sua inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, emitida pelo Tribunal Constitucional através do seu Acórdão n.º 388/2013, de 09 de Julho.

Sumário do relator
Decisão Texto Integral:
Acordam os juízes nesta Relação:

A Apelante/executada M..., residente …, vem interpor recurso da douta sentença que foi proferida em 06 de Novembro de 2013 (agora a fls. 34 a 44), no 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial da comarca de Évora, nestes autos de oposição à execução comum, para pagamento de quantia certa, no montante de € 7.253,72 (sete mil, duzentos e cinquenta e três euros e setenta e dois cêntimos) e juros, aí deduzida contra o Apelado/exequente R..., com residência … – decisão essa que veio a julgar totalmente improcedente a oposição (com o fundamento aí aduzido de que o motivo invocado se não enquadra nas hipóteses de oposição à execução fundada em injunção, porquanto “não encontram eco no artigo 814.º, n.º 1, do C.P.C. e, como tal, está-lhe vedado, nesta sede, socorrer-se a fundamentos que poderiam e deveriam ter sido alegados em oposição à injunção, no âmbito do processo declarativo, por terem directamente a ver com a relação contratual subjacente que serviu de suporte factual e de causa de pedir no requerimento injuntivo apresentado”) –, intentando ver agora revogada tal decisão da 1ª instância e que venha a julgar-se a oposição procedente, alegando, para tanto e em síntese, que a douta sentença ora em causa, “ao julgar improcedente a oposição apresentada, ignora diversos entendimentos em sentido contrário de Tribunais de Relação e do Tribunal Constitucional, através dos quais se tem entendido que é sempre admissível a oposição sem restrições na fase executiva, mesmo que o título dado à execução seja o requerimento administrativo de Injunção com força executiva, em respeito pelo direito de defesa, o qual não pode ser limitado” (ora invocando, nesse sentido, o Acórdão n.º 388/2013, do Tribunal Constitucional, in DR de 24 de Setembro de 2013, emitido com força obrigatória geral). Como tal, a douta sentença impugnada “coloca em crise o seu direito de defesa”, pelo que deverá ser revogada e substituída por decisão que admita a oposição “com a fundamentação que da mesma consta”, assim se dando provimento ao recurso.
Não foram apresentadas quaisquer contra-alegações.
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Vêm dados por provados os seguintes factos de interesse para a decisão:

1) Na execução que corre com o n.º 2.710/09.8TBEVR, à qual a presente oposição constitui um apenso, R... apresentou à execução um requerimento executivo contra M... para pagamento da quantia exequenda de € 7.253,72 (sete mil, duzentos e cinquenta e três euros e setenta e dois cêntimos) – (vide fls. 2 a 3 desses autos).
2) Constitui título executivo um requerimento de injunção apresentado a 31 de Julho de 2009, ao qual foi aposta a fórmula executória em 20 de Outubro de 2009 (vide fls. 8 daquele processo executivo).
3) Tal requerimento de injunção foi, a seu tempo, notificado à executada para, no prazo de quinze dias, pagar a quantia pedida ou para, querendo, deduzir oposição (vide fls. 18 a 22 dos presentes autos).
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Ora, a questão que demanda apreciação e decisão da parte deste Tribunal ad quem é a de saber se numa execução baseada em injunção a que foi aposta a fórmula executória é ainda possível invocar fundamentos de oposição previstos apenas para quando o título executivo não seja sentença. É isso que hic et nunc está em causa, como se extrai das conclusões alinhadas no recurso apresentado.

A executada/oponente vem dizer na oposição que não contratou qualquer serviço ao exequente – antes sendo o seu filho quem o fez – e que, por isso, lhe não deve nada, e designadamente a quantia que agora está a ser executada.
Quer dizer: vem suscitar questões que deveria ter invocado em sua defesa – mas não invocou – no processo de injunção com que foi confrontada.

A douta sentença, à partida, aplicou bem a lei, porquanto o artigo 814.º, n.º 2, do Código de Processo Civil – aditado pelo Decreto-lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro –, pretendendo acabar com a polémica jurisprudencial até ali existente, veio equiparar expressamente às sentenças que fundam as execuções os requerimentos de injunção a que tenha sido aposta a fórmula executória.
Consequentemente, só podiam ser invocados os fundamentos de oposição estabelecidos no artigo 814.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, previstos para quando a execução seja fundada em sentença, e não, como fez a oponente neste caso, os (de âmbito bem mais lato) estatuídos no seu artigo 816.º, previstos para quando a execução está fundada noutro título executivo que não a sentença ou o requerimento de injunção a que tenha sido aposta a fórmula executória.
[Naturalmente que se tem que aplicar ainda o regime dos fundamentos de oposição à execução previsto no velho Código de Processo Civil e não o regime estabelecido no novo, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, porquanto foi à luz daqueles anteriores preceitos que tudo se passou.]

Porém, foi emitida douta decisão do Tribunal Constitucional – tirada com força obrigatória geral – que veio a declarar tudo isso inconstitucional, isto é, que, ao contrário do que dizia a lei, é ainda possível invocar outros fundamentos de oposição à execução que poderiam ter sido já aduzidos na fase declaratória, mesmo que a execução esteja baseada em requerimento de injunção a que tenha sido aposta fórmula executória.
Trata-se do douto Acórdão n.º 388/2013, do Tribunal Constitucional, de 9 de Julho de 2013, tirado no seu processo n.º 185/13, e publicado na 1ª Série do Diário da República n.º 184, de 24 de Setembro de 2013, que decide:
Nos termos expostos, o Tribunal Constitucional declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 814.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), na redacção do Decreto-lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro, quando interpretada no sentido de limitar os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimentos de injunção à qual foi aposta a fórmula executória, por violação do princípio da proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição”.

[Curiosamente, o novo Código de Processo Civil veio reativar a polémica que estava já encerrada pelo Tribunal Constitucional, porquanto, apesar de ter eliminado a norma correspondente ao n.º 2 do anterior artigo 814.º – que havia sido declarada inconstitucional – (vide o actual artigo 729.º), veio a manter, no seu artigo 731.º, a restrição que o Tribunal Constitucional já censurara, pelo que é de esperar que aquela enunciada polémica se vá, agora, reacender.]

Razões para que, nesse enquadramento fáctico e jurídico, se não possa manter, intacta na ordem jurídica, a sentença da 1ª instância que assim decidiu.
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Decidindo.
Assim, face ao que se deixa exposto, acordam os juízes nesta Relação em conceder provimento ao recurso e revogar a douta sentença recorrida, devendo os autos prosseguir os seus termos, designadamente com eventual produção das provas indicadas e apreciação dos fundamentos invocados na oposição.
Não são devidas custas.
Registe e notifique.
Évora, 27 de Fevereiro de 2014
Mário João Canelas Brás
Jaime de Castro Pestana
Paulo de Brito Amaral