Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
279/12.5TBGLG.E1
Relator: ANA MARGARIDA LEITE
Descritores: ACÇÃO DE DIVISÃO DE COISA COMUM
REFORMA AGRÁRIA
EXPROPRIAÇÃO
HERANÇA INDIVISA
PARTILHA
Data do Acordão: 06/28/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário:
I – Em sede de expropriação no domínio da reforma agrária, em caso de derrogação do ato expropriativo ocorre o restabelecimento do direito de propriedade sobre os prédios rústicos expropriados, nos termos existentes à data da expropriação, sendo os mesmos reintegrados no património do seu titular ou, em caso de falecimento, da respetiva herança, como se não tivesse ocorrido o ato expropriativo;
II – Se os prédios cuja divisão é peticionada não se encontram em situação de compropriedade, antes pertencendo à herança aberta por óbito do expropriado, a cessação da comunhão hereditária opera por via da partilha entre os interessados e não através da ação de divisão de coisa comum.
Decisão Texto Integral:

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:

1. Relatório

BB intentou a presente ação de divisão de coisa comum contra CC, na qualidade de cabeça-de-casal das heranças abertas por óbito de Jorge … e de Elisa …, DD, que exerce as funções de cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de Maria E…, EE, FF, GG, HH, II, JJ, LL, MM, que exerce as funções de cabeça de casal da herança aberta por óbito de José J…, NN, OO, PP, única herdeira de Maria H…., QQ, que exerce as funções de cabeça de casal da herança aberta por óbito de Maria C…, RR e SS, pedindo se proceda à divisão dos três prédios rústicos que identifica em três partes iguais e se atribua uma parte aos herdeiros de Maria E…, outra parte aos herdeiros de Elisa … e a terceira parte a CC.
Alega, para o efeito, que é filha de Maria E…, falecida em 2000, a qual era comproprietária, com a respetiva mãe, Elisa …, falecida em 1988, e com CC, dos três prédios rústicos que identifica, os quais integram a herança aberta por óbito de Jorge …, da qual são as únicas e universais herdeiras; acrescenta que os prédios em causa foram expropriados pela Portaria 32/76, de 26-01, na sequência do que, por despacho de 07-06-1985, foram atribuídas duas reservas sobre tais prédios – uma em propriedade plena a favor de Maria E…, em conjunto com Elisa … e com CC, e a outra, em propriedade plena, a favor de José J… –, as quais deram origem aos prédios descritos sob as fichas …/19870630, …/19870708 e …/19861010, inscritos a favor de Maria E…, Elisa … e CC; conclui que os prédios pertencem, em compropriedade, à herança de Maria E…, à herança de Elisa … e a CC e acrescenta que não pretende permanecer na indivisão, como tudo melhor consta da petição inicial.
Citados os réus, foram apresentadas as contestações seguintes:
- a ré CC contestou, negando que os prédios se encontrem em situação de compropriedade e sustentando que pertencem ao acervo hereditário de Jorge …, dado que a Portaria 86/91, de 27-03, reconhecendo que o património rústico da herança de Jorge … não era expropriável, derrogou a Portaria 32/76 de 26-01, esvaziando de conteúdo e de efeito esta Portaria de expropriação; deduz pedido reconvencional, pedindo sejam declarados nulos os registos que deram origem às descrições …/19870630, …/19870708 e …/19861010, ordenando-se o e respetivo cancelamento;
- a ré QQ contestou, não pondo em causa a divisão pretendida pela autora, sustenta que a divisão deve igualmente abranger, pelos motivos que expõe, outros prédios que integram a herança aberta por óbito de Jorge …; deduz pedido reconvencional, pedindo sejam objeto de divisão os imóveis que identifica;
- a ré NN contestou, não pondo em causa a divisão pretendida pela autora;
- as rés MM e OO apresentaram contestação conjunta, não pondo em causa a divisão pretendida pela autora.
Notificada das contestações, a autora apresentou articulado no qual se pronuncia no sentido da improcedência dos pedidos reconvencionais deduzidos.
Por despacho de 26-11-2013, foi determinado que os autos sigam os termos do processo comum.
Foi realizada audiência prévia, na qual se rejeitaram os pedidos reconvencionais deduzidos, se fixou o valor da causa, se identificou o objeto do litígio e se procedeu à enunciação dos temas da prova.
Atento o falecimento do réu II, por decisão de 15-06-2015, foram declarados habilitados BB, DD, EE, FF, GG, HH, JJ e LL, para prosseguirem a demanda como sucessores do réu falecido.
Realizada audiência final – no decurso da qual foi arguida e julgada improcedente a exceção de incompetência material do tribunal, foi realizada uma perícia e prescindiram as partes da prova testemunhal apresentada, bem como das alegações orais, na sequência do que apresentaram alegações escritas –, foi proferida sentença (cuja parte decisória veio a ser retificada por despacho de 24-04-2018), na qual se decidiu julgar improcedente a ação e absolver os réus do pedido, tendo a autora sido condenada nas custas.
Inconformada, a autora interpôs recurso desta decisão, pugnando pela respetiva revogação e substituição por outra que considere verificada a situação de compropriedade dos imóveis identificados nos autos e reconheça que lhe assiste o direito a pôr termo à indivisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que se transcrevem:
«A. Vem o presente Recurso apresentado relativamente À sentença proferida pelo Tribunal “a quo” que julgou improcedente a Acão de divisão de coisa comum interposto pela ora recorrente por entender que a derrogação da expropriação decorrente da Portaria 32/76, determinou a restituição dos prédios em causa ao seu primitivo titular que os prédios se encontram, pois, integrados na herança de Jorge …, devendo, ser partilhados por via do inventário e não por via da ação de divisão de coisa comum;
B. A ora recorrente é filha de Maria E…;
C. Os prédios advieram à propriedade de sua mãe por via de herança aberta por óbito de Jorge … seu avô;
D. Com o falecimento de Jorge … a sua parte nos aludidos prédios transmitiu-se para os herdeiros;
E. Em abril de 1974 os aludidos imóveis eram propriedade de Elisa … e dos seus filhos;
F. Maria E…, era conjuntamente com Elisa …, e com CC, comproprietária dos seguintes prédio rústicos:
a. Parte “A… de C…” sito na freguesia do Chouto, registado na Conservatória do Registo Predial de Chamusca sob o n.º …, e inscrito na matriz rústica sob o artigo … da Secção D-D1, com a área de 433,0725 hectares.
b. Parte “C… das F…” sito na freguesia do Ulme, registado na Conservatória do Registo Predial da Chamusca sob o n.º …, e inscrito na matriz rústica sob o sob o artigo … da secção N (parte), com a área de 196,0 hectares.
c. “Os N…”, sito na freguesia da Chamusca, registado na Conservatória do Registo Predial de Chamusca sob o n.º …, e inscrito na matriz rústica sob o sob o artigo n.º …, da secção D, com a área de 0,836 hectares.
G. Com o 25 de abril de 1974, tais prédios foram expropriados pela Reforma Agrária;
H. Paralelamente e para os proprietários que ficaram sem fonte de rendimento, o Estado criou o direito de reserva diferente da figura da reserva de propriedade;
I. Primeiro expropriou-se, depois calculou-se a área e pontuação para a expropriação e a seguir, cria-se o direito de reserva como “devolução“ administrativa de parte dos terrenos expropriados;
J. Convolado em direito real de aquisição na medida em origina a constituição de um direito novo de diferente qualidade sendo um modo legitimo de adquirir originariamente o direito de propriedade suscetível de inscrição no registo;
K. Estes prédios rústicos foram mandados expropriar e foram constituídos direitos de reserva a favor de alguns nomeadamente da Mãe da avó e da tia da ora recorrente;
L. Por despacho de 7 de junho de 1985, e na atribuição do direito da reserva, foram atribuídas duas (2) reservas;
M. Uma, em propriedade plena, a Maria E…, em conjunto com Elisa …, e com CC;
N. Outra, igualmente em propriedade plena, e fazendo parte do mesmo património, apenas atribuída a José J…;
O. As entregas das reservas foram efetivadas com a emissão dos alvarás de concessão de reserva a favor de Maria E…, Elisa …, CC, e a José J…;
P. Na posse dos aludidos alvarás todos promoveram a respetiva inscrição, a favor daquelas, no Registo Predial no ano de 1987, bem como da sua desanexação no respetivo serviço cadastral e de finanças;
Q. Tais inscrições deram origem aos prédios descritos sob as fichas …/19870630; …/19870708 e …/19861010, com inscrição a favor de Maria E…, Elisa …, e de CC;
R. As expropriações ocorreram a partir de 1975 (Decreto-lei 406-A/75 de 29 de julho), no caso sub judice, nomeadamente através da Portaria 32/76 de 26 de janeiro;
S. É aprovada a Lei Base da Reforma Agrária em 1977 (Lei 77/77 de 29 de setembro);
T. Criação do Direito de reservas em 1981, (Portaria 87/91 de 27/03);
U. A Portaria 86/91 de 27 de março, vem derrogar a expropriação dos referidos prédios;
V. O direito de reserva como constitutivo de um direito novo e legítimo para adquirir originariamente o direito de propriedade suscetível de inscrição no registo a favor dos reservatários;
W. Os prédios atrás, melhor identificados, encontram-se por esse facto, devidamente registados, na competente conservatória do registo predial;
X. A Portaria derrogativa, não previu, a qualquer efeito retroativo relativamente aos atos praticado no período mediado entre 1981 e 1991 (10 anos) produtivos de efeitos jurídicos;
Y. Não mandou anular os registros prediais;
Z. Em 1989, por escritura pública outorgada em 29/12/1989, no 3º Cartório Notarial de Lisboa a fls. 836 Vº do Livro 128 C foi constituída a Sociedade TT, S.A. para cujo capital entraram os prédios rústicos que constituíam a reserva de José J… herdeiro de Jorge …;
AA. A sentença de que se recorre viola nomeadamente o estabelecido na Lei 77/77 de 26 de setembro nomeadamente nos seus artigos 11º, 13º, 14º e 31º
BB. A sentença de que se recorre contraria o Acórdão de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de outubro de 2007 (Acórdão n.º STJ_07A3018) primando pela não retroatividade da Portaria derrogativa quanto aos atos e efeitos jurídicos anteriores à sua derrogação e, entretanto, produzidos na esfera jurídica de cada um;
CC. Devem os prédios em análise ser considerados em regime de compropriedade e como tal, suscetíveis de serem divididos em ação de divisão de coisa comum.»
A ré PP apresentou contra-alegações, pronunciando-se no sentido da improcedência da apelação.
A ré QQ apresentou contra-alegações, pronunciando-se no sentido da improcedência da apelação.
Face às conclusões das alegações da recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre apreciar as questões seguintes:
- da existência de uma situação de compropriedade sobre os bens imóveis;
- do direito de exigir a divisão dos bens imóveis comuns.
Corridos os vistos, cumpre decidir.

2. Fundamentos

2.1. Decisão de facto
Em 1.ª instância foram considerados provados os factos seguintes:
1.1. Por escritura outorgada em 16 de Novembro de 1973, no Cartório Notarial de Torres Novas, Fernando …, António … e Fernando V…, declararam que “no dia catorze de Novembro de mil novecentos e setenta e um, na vila, freguesia e concelho da Chamusca, onde tinha residência habitual, faleceu o Senhor JORGE … (…) no estado de casado, em primeiras núpcias de ambos e sob o regime de comunhão geral, com a Senhora D. Elisa …, que se mantém no estado de viúva (…)
Que o falecido deixou testamento público (…)
Que, como única descendência sucessível, deixou, por únicos e universais herdeiros, os seguintes
Filhos legítimos
a) Engenheiro JOSÉ J… (…)
b) D. MARIA E…(…)
c) D. MARIA H… (…)
d) D. MARIA C… (…)
e) D. MARIA J… (…)
Que, consequentemente, são os identificados filhos os únicos e universais herdeiros do falecido Jorge …, e não há qualquer outra pessoa que lhes prefira ou com eles possa concorrer na sucessão (…).
1.2. Por escritura outorgada em 2 de Junho de 1989, no Cartório Notarial de Vila Nova da Barquinha, Diamantina …, Joaquim … e Maria A…, declararam que:
no dia vinte e oito de Fevereiro de mil novecentos e oitenta e oito, na freguesia e concelho de Chamusca, donde era natural, e onde teve a sua última residência habitual (…) faleceu ELISA …, no estado de viúva de Jorge Rosa Rodrigues, com quem foi casada, sob o regime de comunhão geral, e , em primeiras e únicas núpcias de ambos.
QUE a falecida não deixou testamento, ou qualquer outra disposição de última vontade, pelo que lhe sucederam, como únicos e universais herdeiros, seus filhos:
A) JOSÉ J… (…)
B) MARIA E… (…)
C) MARIA H… (…)
D) MARIA C…, que também usa e é conhecida por MARIA C… P… (…)
E) MARIA J… (…)
São todos naturais da freguesia e concelho de Chamusca.
QUE, não há outras pessoas que, segundo a lei, prefiram aos indicados herdeiros ou com eles possam concorrer à sucessão.”.
1.3. Por escritura outorgada em 21 de Julho de 2000, no Cartório Notarial de Salvaterra de Magos, Maria T…, Maria T… A… e Carlos A…, declararam que:
no dia dezoito de Março de dois mil, na freguesia e concelho de Campo Grande, na cidade de Lisboa onde residia (…) faleceu MARIA E…, que também usava e era conhecida por MARIA E… R… ou MARIA E… I…, natural da freguesia e concelho da Chamusca, no estado de viúva de Joaquim I…, sem deixar testamento ou qualquer outra disposição de sua última vontade e tendo deixado como seus únicos e universais herdeiros:
Os seus nove filhos:.
a) EE (…)
b) JOSÉ R… (…)
c) FF (…)
d) GG (…)
e) HH (…)
f) II (…)
g) JJ (…)
h) MARGARIDA M… (…)
i) LL (…)
QUE não há outras pessoas que, segundo a lei, prefiram aos indicados herdeiros ou com eles possam concorrer na sucessão da aludida herança.”.
1.4. Por escritura outorgada em 11 de Julho de 2006, no Cartório Notarial de Maria Fátima Fernandes Ramada de Sousa, Maria J…, declarou que:
exerce o cargo de cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de seu marido, JOSÉ J…, natural da freguesia e concelho de Chamusca.
O qual faleceu no dia dezoito de Agosto de dois mil e cinco, na freguesia e concelho de Chamusca, no estado de casado com Maria J…, em primeiras e únicas núpcias de ambos, e sob o regime da separação de bens (…)
Que, deixou como únicas herdeiras legitimárias – que não têm quem as prefira ou com elas concorra à sucessão
O cônjuge:
MARIA J… (…)
As filhas:
NN (…)
OO (…)
Que, não há outras pessoas que, segundo a lei, prefiram às indicadas herdeiras ou que, com elas, possam concorrer na sucessão à herança do mencionado falecido.”
1.5. Por escritura outorgada em 28 de Abril de 2008, no Cartório Notarial de Clara Maria Pereira dos Santos Rodrigues, Maria C…, declarou que:
desempenha o cargo de cabeça-de-casal por óbito de sua mãe, Maria H….
Nessa qualidade declara:
Que, no dia vinte e nove de Janeiro de dois mil e seis, na freguesia e concelho de Salvaterra de Magos, faleceu Maria H…, no estado de viúva de Carlos …, (…).
Que, a autora da herança não deixou testamento ou qualquer outra disposição de última vontade, tendo-lhe sucedido, como única herdeira por vocação legal, sua filha Maria C…, supra identificada.
Que não existem outras pessoas que, segundo a lei, possam concorrer com a referida herdeira na sucessão à herança.”
1.6. Por escritura outorgada em 15 de Outubro de 2004, no Décimo Sétimo Cartório Notarial de Lisboa, Ana I…, Alexandre M… e Mariana D…, declararam que:
no dia dezoito de Setembro de dois mil e quatro, em Lisboa, faleceu MARIA C… (…) no estado de viúva de António R….
Que, a falecida deixou um testamento público (…)
Que, a autora da herança deixou como herdeiros legitimários:
a) sua filha, QQ (…)
b) sua filha, RR (…)
c) seu filho, SS (…)
Que, assim, os referidos QQ, RR e SS, são os únicos herdeiros de MARIA C….”
1.7. Em sede de procedimento simplificado de habilitação de herdeiros e registos referente a II, em 30 de Setembro de 2014, José R…, declarou que:
o autor da herança faleceu em 13 de Agosto de 2014, na freguesia de Alcântara, concelho de Lisboa, sem descendentes nem ascendentes vivos.
O autor da herança não deixou testamento ou qualquer disposição de última vontade.
Declarados herdeiros do falecido:
Irmãos: José R…, EE, FF, GG, HH, II, Margarida M…, JJ, Margarida M… R… e LL.
Que não há quem lhes prefira ou com eles possa concorrer na sucessão.”
1.8. Encontra-se inscrita, por ap. 5 de 1987/06/30, a aquisição por reversão a favor de Elisa …, Maria E… e CC, do prédio rústico sito em Chouto, Casal do A… de C…, com a área total de 433,0725 ha, composto de cultura arvense, eucaliptal, sobreiral e olival, confrontando a norte com Aranhas de Baixo, Caniceira e Carpinteiro, a sul com estrada camarária e José J…, a nascente com José J… e Estado, a poente com Tábuas e Arcos, desanexado do n.º … – Chouto, descrito sob o n.º …/19870630 da Conservatória do Registo Predial de Chamusca e inscrito na matriz sob o art. …, secção DD.
1.9. Encontra-se inscrita, por ap. 5 de 1987/07/08, a aquisição a favor de Elisa …, Maria E… e CC, pelo uso de direito de reserva, do prédio rústico sito em Ulme, C… das F…, com a área total de 196 ha, composto de sobro, cultura arvense e olival, confrontando a norte com Arraiolos, a sul com estrada camarária, a nascente com Famão e Vale das Mós, a poente com ribeiro e estrada, desanexado do n.º …/280422, descrito sob o n.º …/19870708 da Conservatória do Registo Predial de Chamusca e inscrito na matriz sob o art. …º, secção N.
1.10. Encontra-se inscrita, por ap. 2 de 1987/06/30, a aquisição por atribuição do direito de reserva a favor de Elisa …, Maria E… e CC, do prédio rústico sito em Chamusca, Rua José …, com a área total de 1,06 ha, composto de horta e terreno estéril, confrontando a norte com Manuel … e herdeiros de Jorge …, a sul e poente com Casa V… M…, a nascente com herdeiros de Jorge … e Rua José …, desanexado do n.º …/170388, descrito sob o n.º …/19861010 da Conservatória do Registo Predial de Chamusca e inscrito na respectiva matriz sob o art. …º, secção D.
1.11. Pela Portaria 32/76, de 26 de Janeiro, o Ministério da Agricultura e Pescas, declarou expropriar, além do mais, os seguintes prédios, pertencentes a Jorge …:
- C… de F…, matriz cadastral artigo …, secção N, freguesia de Ulme, concelho da Chamusca, com 16,1800 ha;
- C… do A… de C…, matriz cadastral artigo …, secção DD1, freguesia do Chouto, concelho de Chamusca, com 951,9725 ha;
- sem designação, matriz cadastral artigo …, secção D, freguesia e concelho de Chamusca, com 1,0600 ha.
1.12. Em 13 de Janeiro de 1986 foi emitido alvará de concessão de direito de reserva pelo Ministro da Agricultura do Governo da República Portuguesa, atribuindo a título de propriedade a reserva do prédio à Rua José …, inscrito na matriz predial rústica sob o n.º … da secção D, sito na freguesia e concelho de Chamusca, com a área de 1,0600 hectares, a herdeiros de Jorge … (Elisa …, Maria E… e CC).
1.13. Em 3 de Dezembro de 1985 foi emitido alvará de concessão de direito de reserva pelo Ministro da Agricultura do Governo da República Portuguesa, atribuindo a título de propriedade a reserva do prédio C… do A… de C…, inscrito na matriz predial rústica sob o n.º … da secção DD1, sito na freguesia de Chouto, concelho de Chamusca, com a área de 416,1784 hectares, a Jorge J….
1.14. Pela Portaria 86/91, de 27 de Março, por referência aos prédios designados por C… das F…, inscrito na matriz cadastral sob o art. …º, secção N, da freguesia de Ulme, do concelho de Chamusca, com a área de 228,9500 ha, C… do A… de C…, inscrito na matriz cadastral sob o art. …º, secção DD1, da freguesia do Chouto, do concelho da Chamusca, com a área de 951,9725 ha, e N…, inscrito na matriz cadastral, sob o art. …º, secção D da freguesia e concelho de Chamusca, com a área de 1,0600 ha, foi derrogada a Portaria 32/76, de 16 de Janeiro, na parte em que procedia à expropriação dos aludidos prédios rústicos, por se concluir que aquele património não era expropriável.
1.15. Na Secção Cível da Instância Central de Santarém, J4, do Tribunal da Comarca de Santarém, correm termos autos de processo ordinário, com o n.º 824/14.1T8STR, inicialmente com o n.º 158/1999 do Tribunal Judicial da Golegã, mediante os quais, Maria E…, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de Jorge … e de Elisa …, demandou José J…, MM, Sociedade TT, S.A., o Estado Português, pedindo:
- que se declarasse que, além do mais, os prédios designados por C… das F…, sito na freguesia do Ulme, concelho da Chamusca, inscrito na matriz cadastral sob o artigo … da Secção N com 228,9500 ha, C… do A… de C…, sito na freguesia do Chouto, concelho da Chamusca, inscrito na matriz cadastral sob o artigo … da secção DD1 com 951,9725 ha, e Os N…, sito na freguesia e concelho de Chamusca, inscrito na matriz cadastral sob o artigo … da Secção D, com 1,0600 ha, integram a herança de Jorge …;
- que se condenasse os ali RR. a reconhecer o direito de propriedade daquela herança;
- que se condenasse os RR. a pagar à A., na qualidade em que intervém, indemnização correspondente ao valor dos frutos dos prédios;
- que se ordenasse o cancelamento dos registos dos prédios a favor do 1º e 2º RR.
1.16. Por decisão, proferida pelo STJ em 3 de Dezembro de 2009, transitada em 19/01/2010, revogada a decisão do Tribunal da Relação de Évora incidente sobre os autos e mantida a decisão proferida em 1ª instância em que se absolveram os RR. da instância por ilegitimidade da A. para intentar a acção por desacompanhada dos demais herdeiros concorrentes à herança de Jorge … e Elisa ….

2.2. Apreciação do objeto do recurso
Com a presente ação de divisão de coisa comum, pretende a autora obter a divisão de três prédios rústicos que identifica, sustentando que pertencem, em compropriedade, à herança aberta por óbito de sua mãe Maria E…, da qual é herdeira, à herança aberta por óbito de Elisa … e a Maria José Rosa Rodrigues.
Tal pretensão foi julgada improcedente por se ter entendido que os prédios pertencem à herança aberta por óbito de Jorge …, em consequência do que se considerou não verificada a invocada situação de compropriedade, concluindo-se que devem ser partilhados por via de inventário e não de ação de divisão de coisa comum.
Extrai-se da fundamentação da decisão recorrida, além do mais, o seguinte:
Conforme resulta do vertido nos pontos 1.8., 1.9. e 1.10. dos factos provados, os três prédios ora em apreço apresentam inscrição registal de aquisição do direito de propriedade por reversão e por direito de reserva a favor de Elisa …, Maria E… e CC.
Tal aquisição assentava na atribuição de um direito de reserva sobre propriedades expropriadas pelo Estado na senda da reforma agrária subsequente ao 25 de Abril.
(…)
Ora, no que tange aos prédios ora em análise decorre que os mesmos foram expropriados através da Portaria 32/76, de 26 de Janeiro (facto descrito em 1.11.).
Posteriormente, e de acordo com o regime implementado pela Lei 77/77, de 29 de Setembro, foi atribuído direito de reserva aos herdeiros de Jorge …, apenas com menção a Elisa …, Maria E… e CC (facto descrito em 1.12. quanto ao prédio designado “Os N…); a favor de Jorge J… (facto descrito em 1.13. quanto ao prédio designado por C… do A… de C…). Quanto ao prédio designado por C… de F… não foi junto o respectivo alvará de concessão do direito de reserva, mas o mesmo mostra inscrição registal a favor de Elisa …, Maria E… e CC, com tal fundamento, como acima se indicou.
Posteriormente, veio a ser aprovada a Lei 109/88, de 26 de Setembro, que estabeleceu a Lei de Bases da Reforma Agrária, e que veio revogar expressamente, no seu art. 51º, a Lei 77/77. Tal legislação prevê, no art. 31º o regime aplicável à derrogação do acto expropriativo.
Assim, por força da portaria descrita no ponto 1.14. dos factos provados (Portaria 86/91, de 27 de Março) foi derrogada a já referida Portaria 32/76, relativamente aos prédios em causa por se concluir que aquele património não era expropriável na sequência da instrução do processo de reserva, sendo que ali se refere expressamente que o titular dos prédios em causa falecera em 14/11/71, incumbindo os direitos referentes à expropriação aos respectivos herdeiros. Tal possibilidade de revogação do acto expropriativo encontrava-se já prevista ao abrigo da legislação anteriormente aplicável (DL 81/78), ao abrigo do qual havia sido concedido o aludido direito de reserva.
Ora, a derrogação do acto expropriativo determina o retrocesso à situação anterior àquele acto, ou seja, os prédios expropriados reingressam na esfera do seu primitivo titular – no caso a herança indivisa de Jorge …, afigurando-se-nos que cessam também todos os efeitos decorrentes dessa expropriação – concretamente os direitos de reserva estabelecidos com base na mesma.
(…)
Ora, face àquela Portaria 86/91 que, tanto quanto se sabe, não foi impugnada, a derrogação da expropriação decorrente da Portaria 32/76, determinou a restituição dos prédios em causa ao seu primitivo titular – a herança de Jorge … – não subsistindo presentemente a situação de compropriedade defendida pela A. Os prédios encontram-se, pois, integrados na herança daquele Jorge …, devendo, nessa sede, ser partilhados por via de inventário e não de acção de divisão de coisa comum.
Nesta medida, afigura-se-nos falecer o primeiro pressuposto de procedência da acção de divisão de coisa comum – a vigência de uma situação de compropriedade – devendo, por isso, improceder a presente acção.
Discordando deste entendimento, defende a recorrente que a Portaria 86/91, de 27-03, que derrogou a Portaria 32/76, de 26-01, designadamente na parte em que procedeu à expropriação dos três prédios rústicos em causa, não prevê qualquer efeito retroativo quanto aos atos praticados e aos efeitos jurídicos, nomeadamente registrais, anteriores à derrogação, pelo que entende deverem os prédios ser considerados em situação de compropriedade e, como tal, suscetíveis de serem divididos no âmbito da presente ação.
Vejamos se lhe assiste razão.
Pela Portaria 32/76, de 26-01, foram expropriados, nos termos dos artigos 1.º e 8.º do DL 406-A/75, de 29-07, entre outros, os prédios rústicos, pertencentes a Jorge …, seguintes:
i) C… das F… – matriz cadastral: artigo …, secção N, freguesia de Ulme, concelho da Chamusca, com 228,9500 ha;
ii) C… do A… de C… – matriz cadastral: artigo …, secção DD1, freguesia do Chouto, concelho da Chamusca, com 951,9725 ha;
iii) sem designação – matriz cadastral: artigo …, secção D, freguesia e concelho da Chamusca, com 1,0600 ha.
Encontra-se assente a emissão, na sequência de tal expropriação, dos alvarás de concessão de direito de reserva seguintes:
- em 13-01-1986, atribuindo a título de propriedade a reserva do prédio à Rua José …., inscrito na matriz predial rústica sob o n.º … da secção D, sito na freguesia e concelho de Chamusca, com a área de 1,0600 hectares, a herdeiros de Jorge … (Elisa …, Maria E… e CC);
- em 03-12-1985, atribuindo a título de propriedade a reserva do prédio C… do A… de C…, inscrito na matriz predial rústica sob o n.º … da secção DD1, sito na freguesia de Chouto, concelho de Chamusca, com a área de 416,1784 hectares, a Jorge J….
Extrai-se da matéria de facto provada o registo dos factos seguintes:
- encontra-se inscrita, por ap. 5 de 1987/06/30, a aquisição por reversão a favor de Elisa …, Maria E… e CC, do prédio rústico sito em Chouto, Casal do A… de C…, com a área total de 433,0725 ha, composto de cultura arvense, eucaliptal, sobreiral e olival, confrontando a norte com Aranhas de Baixo, Caniceira e Carpinteiro, a sul com estrada camarária e José J…, a nascente com José J… e Estado, a poente com Tábuas e Arcos, desanexado do n.º … – Chouto, descrito sob o n.º …/19870630 da Conservatória do Registo Predial de Chamusca e inscrito na matriz sob o art. …, secção DD.
- encontra-se inscrita, por ap. 5 de 1987/07/08, a aquisição a favor de Elisa …, Maria E… e CC, pelo uso de direito de reserva, do prédio rústico sito em Ulme, C… das F…, com a área total de 196 ha, composto de sobro, cultura arvense e olival, confrontando a norte com Arraiolos, a sul com estrada camarária, a nascente com Famão e Vale das Mós, a poente com ribeiro e estrada, desanexado do n.º …/280422, descrito sob o n.º …/19870708 da Conservatória do Registo Predial de Chamusca e inscrito na matriz sob o art. …º, secção N.
- encontra-se inscrita, por ap. 2 de 1987/06/30, a aquisição por atribuição do direito de reserva a favor de Elisa …, Maria E… e CC, do prédio rústico sito em Chamusca, Rua José …, com a área total de 1,06 ha, composto de horta e terreno estéril, confrontando a norte com Manuel … e herdeiros de Jorge …, a sul e poente com Casa V… M…, a nascente com herdeiros de Jorge … e Rua José …, desanexado do n.º …/170388, descrito sob o n.º …/19861010 da Conservatória do Registo Predial de Chamusca e inscrito na respectiva matriz sob o art. …º, secção D.
Pela Portaria 86/91, de 27-03, foi derrogada a Portaria 32/76, de 26-01, na parte em que procede à expropriação de diversos prédios rústicos pertencentes a Jorge …, entre eles os três prédios supra identificados, nos termos seguintes:
Pela Port. 32/76, de 26-1, foram expropriados em nome de Jorge … os seguintes prédios rústicos:
(…)
C… das F…, inscrito na matriz cadastral, sob o art. …, secção N, da freguesia de Ulme, do concelho da Chamusca, com a área de 228,9500 ha;
(…)
C… do A… de C…, inscrito na matriz cadastral respectiva, sob o art. …, secção DD1, da freguesia do Chouto, do concelho da Chamusca, com a área de 951,9725 ha;
(…)
Os N…, inscrito na matriz cadastral, sob o art. …, secção D, da freguesia e concelho da Chamusca, com a área de 1,0600 ha.
Organizado o processo de reserva nos termos da Lei 109/88, de 26-9, (…) concluiu-se que a pontuação é de 102 018,5400 pontos.
Jorge … faleceu em 14-11-71, pelo que os direitos inerentes à expropriação dos aludidos prédios rústicos assistem aos seus herdeiros.
Ora, da instituição do processo de reserva concluiu-se que tal património não é expropriável (…)
Assim, nos termos do art. 31.º da Lei 109/88, de 26-9, manda o Governo, pelo Secretário de Estado da Alimentação, derrogar a Port. 32/76, de 26-1, na parte em que procede à expropriação dos prédios rústicos atrás referidos e identificados.
Está em causa, na presente apelação, a determinação dos efeitos da derrogação do ato expropriativo dos três indicados prédios, operada através da citada Portaria 86/91, de 27-03.
Considerou a decisão recorrida que a derrogação do ato expropriativo determina o retrocesso à situação anterior àquele ato, reingressando os prédios expropriados na esfera jurídica do seu primitivo titular, no caso, a herança aberta por óbito de Jorge …, e cessando os direitos de reserva estabelecidos com base na expropriação.
Tendo os prédios em causa sido expropriados no âmbito da reforma agrária, há que ter em conta o disposto no DL 406-A/75, de 29-07, o qual prevê a possibilidade de expropriação de prédios rústicos e faculta aos respetivos proprietários o direito a demarcarem uma reserva; este diploma veio a ser revogado pela Lei 77/77, de 29-09, a qual, além do mais, ampliou e regulou o direito de reserva, esclarecendo, no artigo 38.º, que o titular do direito de reserva goza dos direitos de propriedade na área reservada, nos termos da lei civil.
No caso presente, tendo sido instituída reserva aos prédios em causa a herdeiros de Jorge …, conforme decorre das inscrições constantes dos pontos 1.8, 1.9 e 1.10 da factualidade assente, daqui decorre que se restabeleceu o direito de propriedade, com o conteúdo existente à data da expropriação, incidente sobre a área da reserva.
Esta Lei 77/77, de 29-09, foi revogada pela Lei 109/88, de 26-09 (posteriormente alterada pela Lei n.º 46/90, de 22-08), que prevê, além do mais, o regime aplicável aos casos em haja lugar à derrogação do ato expropriativo, dispondo no artigo 31.º que o preceituado no Capítulo II se aplica, com as devidas adaptações, aos casos em que da instrução do processo de atribuição de reserva se conclua pela não expropriabilidade do prédio ou prédios rústicos ou sempre que haja lugar a derrogação do ato expropriativo, devendo o ato derrogatório salvaguardar os direitos reais menores e de arrendamento existentes à data da ocupação, da expropriação ou da medida de nacionalização global.
Como tal, face à derrogação do ato expropriativo, cumpre atender ao disposto no Capítulo II daquela lei, designadamente aos preceitos seguintes: prevê o artigo 13.º a atribuição aos proprietários dos prédios expropriados do direito de reserva de propriedade de uma área determinada nos termos desta lei, esclarecendo o artigo 14.º que a concessão do direito de reserva determina o reestabelecimento do respetivo direito de propriedade, tal como existia à data da expropriação; o artigo 17.º, por seu turno, dispõe que, nos casos de contitularidade e heranças indivisas, cada uma das partes ou quinhões hereditários, existentes à data da expropriação, tem direito a uma reserva, cuja pontuação é a correspondente à respetiva percentagem sobre a pontuação total dos prédios expropriados ou expropriáveis nos termos da lei anterior, podendo os contitulares ou herdeiros agrupar as respetivas partes ou quinhões hereditários; o artigo 24.º determina que os prédios expropriados passam para o domínio privado indisponível do Estado.
Da análise do direito de reserva, nos termos regulados no DL 406-A/75, de 29-07, e na Lei 77/77, de 29-09, conjugados com a clarificação constante da Lei 109/88, de 26-09, decorre que, com a concessão da reserva, é restabelecido o direito de propriedade tal como existia à data da expropriação, isto é, na titularidade do proprietário expropriado, agora incidente sobre a área da reserva.
Neste sentido, cf. o acórdão desta Relação de 25-09-2003 (relatora: Maria Laura Leonardo), proferido na apelação n.º 716/03-3 (publicado em www.dgsi.pt), no qual se considerou que o direito de reserva é, legalmente, definido como um direito de propriedade sobre a área de reserva (que pode abranger todo o prédio expropriado) - veja-se artigo 38.º da Lei 77/77 - estabelecendo a Lei 109/88, no seu artigo 14.º, que a concessão do direito de reserva determina o restabelecimento do respetivo direito de propriedade, tal como existia à data da expropriação. No mesmo sentido, cf. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-04-2006 (relator: Urbano Dias), proferido na revista n.º 833/06 - 1.ª Secção (publicado em www.dgsi.pt), no qual se entendeu o seguinte: “Não se pode falar nas expropriações que tiveram lugar ao abrigo do D.L. 406-A/75 em extinção do direito de propriedade em relação ao "expropriado" e no surgimento de um direito no [novo] em relação ao Estado expropriante, como se verifica nas expropriações que se fazem tendo por base as disposições dos Códigos das Expropriações, a coberto do disposto no art. 62º da Constituição. Nestas, sim, o beneficiário, desde que respeite o fim, adquire a título originário, ex novo, um direito sobre a coisa expropriada e, consequentemente, isso provoca a extinção do direito anterior. Se o regime fosse o mesmo, não faria sentido, falar em restabelecimento do direito de propriedade a respeito da atribuição do direito de reserva”.
Tendo-se concluído que, com a concessão do direito de reserva, é restabelecido o direito de propriedade tal como existia à data da expropriação, daqui decorre que a titularidade de tal direito pertence ao proprietário expropriado, sendo tal direito reintegrado no respetivo património como se não tivesse ocorrido o ato expropriativo. Em caso de falecimento do titular dos bens expropriados, o direito em causa integra a herança, ainda que o direito de reserva tenha sido concedido a um dos seus herdeiros.
Reportando-se à inclusão, no âmbito sucessório, de bens expropriados e à respetiva relacionação em sede de inventário, esclarece João António Lopes Cardoso (Partilhas Judiciais, volume I, 4.ª edição, Coimbra, Almedina, 1990, p. 437) que, tratando-se de expropriação derivada da execução da denominada Reforma Agrária (Lei n.º 77/77, de 29-09), “o exercício do direito de reserva pelo cabeça-de-casal e a atribuição da reserva nos termos legais, subsistente que seja a indivisão da herança, implica a relacionação da área atribuída, com a delimitação respectiva”.
Neste sentido, cf. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-05-2008 (relator: Garcia Calejo), proferido na revista n.º 955/08 - 1.ª Secção (publicado em www.dgsi.pt), no qual se entendeu o seguinte: I - Com o exercício e concessão do direito de reserva, o direito de propriedade renasceu tal como existia à data da expropriação, razão por que se deve entender que o bem desapossado, aquando da concessão da reserva, voltou a integrar o património do expropriado e, consequentemente, a sua massa hereditária, como se não tivesse ocorrido esse acto; II - Assim, o imóvel em evidência deve considerar-se como fazendo parte da massa hereditária do inventariado (expropriado) e consequentemente deve ser levado em linha de conta na partilha, pese embora o direito de reserva tenha sido concedido a um dos seus herdeiros.
Retornando ao caso presente, a instituição de reserva sobre os prédios em causa a herdeiros de Jorge …, nos termos que decorrem das inscrições constantes dos pontos 1.8, 1.9 e 1.10 da factualidade assente, determinou o restabelecimento do direito de propriedade na titularidade da herança aberta por óbito de Jorge …, com o conteúdo existente à data da expropriação, incidente sobre as áreas correspondentes às reservas, apesar de terem estas sido atribuídas apenas a alguns dos seus herdeiros.
Da aplicação do regime exposto à situação de derrogação do ato expropriativo, nos termos previstos no artigo 31.º da Lei 109/88, de 26-09 (com as alterações introduzidas pela Lei n.º 46/90, de 22-08), extrai-se que, em tal caso, ocorre o restabelecimento do direito de propriedade sobre os prédios rústicos expropriados, nos termos existentes à data da expropriação, sendo os mesmos reintegrados no património do seu titular, como se não tivesse ocorrido o ato expropriativo.
Mostra-se, assim, acertada a decisão recorrida, ao concluir que, com a derrogação do ato expropriativo, os prédios rústicos expropriados voltaram a integrar o património do seu titular, no caso, a herança aberta por óbito de Jorge …, inexistindo a invocada situação de compropriedade.
O artigo 1412.º, n.º 1, do Código Civil confere ao comproprietário o direito a pôr termo à indivisão de coisa comum, dispondo que “nenhum dos comproprietários é obrigado a permanecer na indivisão, salvo quando houver convencionado que a coisa se conserve indivisa”.
Tendo-se concluído que os prédios cuja divisão é peticionada não se encontram em situação de compropriedade, antes pertencendo à herança aberta por óbito de Jorge …, não se encontra preenchido um dos pressupostos do direito a exigir a divisão, nos termos previstos no citado preceito. Tratando-se de uma situação de comunhão hereditária, a respetiva cessação opera por via da partilha entre os interessados e não por recurso à ação de divisão de coisa comum, conforme concluiu a decisão recorrida.
Cumpre, assim, julgar improcedente a apelação.

Em conclusão:
I – Em sede de expropriação no domínio da reforma agrária, em caso de derrogação do ato expropriativo ocorre o restabelecimento do direito de propriedade sobre os prédios rústicos expropriados, nos termos existentes à data da expropriação, sendo os mesmos reintegrados no património do seu titular ou, em caso de falecimento, da respetiva herança, como se não tivesse ocorrido o ato expropriativo;
II – Se os prédios cuja divisão é peticionada não se encontram em situação de compropriedade, antes pertencendo à herança aberta por óbito do expropriado, a cessação da comunhão hereditária opera por via da partilha entre os interessados e não através da ação de divisão de coisa comum.

3. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Notifique.

Évora, 28-06-2018
Ana Margarida Leite
Silva Rato
Mata Ribeiro