Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
3406/12.9TBSTB.E1
Relator: ALEXANDRA MOURA SANTOS
Descritores: FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
Data do Acordão: 11/19/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1 - O Fundo de Garantia Automóvel fica sub-rogado nos direitos do lesado quando satisfaz a indemnização para ressarcimento de danos ocasionados por veículo cujo responsável não beneficie de seguro válido;
2 - O prazo de prescrição para o exercício deste direito é de três anos, por aplicação analógica do disposto no artº 498º, nº 2, do C.C., não se aplicando a extensão do prazo prescricional previsto no nº 3 deste artigo.
Sumário da Relatora
Decisão Texto Integral: APEL. Nº 3406/12.9TBSTB.E1 (1ª SECÇÃO)


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA


FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL intentou contra (…), a presente acção declarativa sob a forma ordinária pedindo a condenação do R. no pagamento da quantia de € 79.412,08, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, que à data ascendem a € 11.314,78 bem como nas despesas de liquidação e cobrança que se vierem a liquidar em execução de sentença, nomeadamente todos os custos com a citação, taxas de justiça e honorários do mandatário.
Fundamenta na ocorrência de um acidente de viação, cuja única responsabilidade se ficou a dever ao R., que então não dispunha de seguro válido e eficaz pelo que efectuou o pagamento ao lesado (…) daqueles montantes no âmbito da acção declarativa que este lhe moveu e ao R., onde efectuou com aquele transacção judicial, devidamente homologada por sentença.
Tramitados os autos e realizada a audiência de julgamento foi proferida a sentença de fls. 360 e segs. que decidiu:
A – Declarar prescrito o direito A., a título de sub-rogação legal, ao abrigo do disposto no artº 25º do DL 522/85, de 31/12;
B – Absolver o R. do pedido.

Inconformado, apelou o A. alegando e formulando, na sequência do convite que lhe foi dirigido nos termos do artº 639º, nº 3, do CPC, as seguintes conclusões:
1 – Entendeu o douto Tribunal a quo julgar procedente a excepção de prescrição invocada pelo R. com fundamento no artº 498º, nº 1, do C.C. e, portanto, por entender que não era aplicável o nº 3 do mesmo artigo.
2 – O último pagamento efectuado pelo FGA, no âmbito do sinistro dos autos ocorreu em 31/10/2008, precisamente ao lesado, e no âmbito de uma transacção judicial em acção que corria contra o FGA e o aqui R..
3 – A questão está em enquadrar ou não o acidente dos autos na tipificação do artº 148º, nº 1 ou nº 2, do Código Penal.
4 – Os factos julgados provados na douta sentença sobre a dinâmica o acidente são os seguintes:
5 – Nesse acidente foi interveniente o veículo ligeiro misto de matrícula (…), conduzido pelo R.
6 – Na data e hora acima indicadas, o (…), circulava na Estrada Nacional nº 379, no sentido Palmela-Azeitão;
7 – Invadindo a faixa de trânsito destinada ao trânsito de veículos em sentido contrário;
8 – Indo embater violentamente, com o lado esquerdo do (…) numa barreira existente no lado esquerdo da estrada, atento o seu sentido de marcha, capotando de imediato.
9 – O local onde ocorreu o sinistro era uma recta com boa visibilidade.
10 – Aquando da ocorrência do acidente era de noite e chovia.”
5 – Tais factos são suficientes para imputar ao R., pelo menos, a violação das normas estradais ínsitas nos artºs 13º e 24º do Código da Estrada vigente na data dos factos (DL 114/94, de 3/5).
6 – O R. recorrido invadiu a faixa de rodagem destinada ao trânsito dos veículos em sentido contrário e capotou o veículo, indo embater numa barreira ali existente.
7 – Não estão provados quaisquer factos alheios à condução do R., que o ilibem (factos de terceiro, factos do veículo em si próprio). O facto de ter sido alegado que era noite e chovia, obrigava o R. a uma condução muito mais prudente, atendendo a que o mesmo tem de regular a velocidade e condução às condições atmosféricas.
Portanto,
8 – Tendo em conta a violação das normas estradais, pelo R., e as extensas lesões corporais no passageiro (…), conforme factos provados 11 e segs., que aqui se dão por reproduzidos, há-de concluir-se pela comissão em autoria material do crime de ofensas à integridade física por negligência do artº 148º, nº 1, do C. Penal.
9 – Sendo esses factos puníveis com pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias, é aplicável o artº 118º, al. c), do C. Penal, o que valer por dizer que o prazo de prescrição criminal é de 5 anos.
10 – Ao direito ao reembolso que tem o FGA sobre os responsáveis por sinistros, inexistindo seguro válido, deve aplicar-se, quando o facto constitui crime (como no caso vertente), o disposto nos artºs 498º, nºs 2 e 3, do Código Civil, isto é, o prazo conta-se desde o último pagamento, e se o facto gerador constitui crime, esse prazo é alargado de 3 para, pelo menos, 5 anos.
11 – O artº 498º, nº 2, do C.C., porquanto a sub-rogação do FGA é uma sub-rogação atípica, mais próxima do direito de regresso, conforme doutrina estabelecida no âmbito do DL 522/85, de 31/12, pelo Ac. do STJ, relatado pelo Colendo Conselheiro Oliveira Barros, tirado no proc. 05B3061, em 17/11/2005, acessível para consulta em www.dgsi.pt.
12 – Não há nenhum entendimento que obste a que o prazo de prescrição que se aplica ao lesado, não se aplique também a quem vem exercer o direito de regresso, nessa caso o nº 3 não estaria após o nº 2, sem fazer qualquer ressalva.
13 – Razão pela qual o FGA dispunha de prazo até Outubro de 2013 para propor a presente acção, tendo a mesma dado entrada em Maio de 2012.
14 – A douta sentença recorrida violou, assim, por omissão, o disposto nos artºs 13º e 24º do C.E. ao não aplicar essas normas aos factos julgados provados, e bem assim, o artº 148º, nº 1, do C.P..
15 – Por consequência lógica da referida violação normativa, a douta sentença violou o disposto no artº 498º, nºs 2 e 3, do C. Civil (neste sentido decidiu esta Veneranda Relação proc. 1418/10.6TBSTB.E1, Acórdão confirmado pelo STJ, que se juntam como docs. 1 e 2, que se dão por reproduzidos para todos os legais efeitos).
O R. contra-alegou nos termos de fls. 436 concluindo pela confirmação da sentença recorrida.
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Delimitando-se o âmbito do recurso pelas conclusões da alegação do recorrente abrangendo apenas as questões aí contidas (artºs 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), verifica-se que a única questão a decidir consiste em saber se o direito que o A. pretende exercer contra o R. se encontra ou não prescrito.
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Por não terem sido impugnados, têm-se por definitivos e dão-se aqui por reproduzidos todos os factos tidos por provados na sentença recorrida.
Atenta a questão a decidir, que constitui objecto do recurso – prescrição do direito invocado pelo A. –, destacam-se, da referida factualidade, os seguintes pontos de facto:
1 – No termo de um processo de regulação extrajudicial, o FGA pagou ao lesado (…), uma indemnização no montante de € 65.000,00, pelos seus danos patrimoniais e não patrimoniais, consequência de um sinistro automóvel.
2 – A indemnização foi paga ao lesado (…), em consequência da transacção judicial homologada por sentença, datada de 24/09/2009, proferida no âmbito do processo comum ordinário que correu termos sob o nº 3009/2000, na Vara de competência mista deste douto Tribunal.
75 – No estrito cumprimento da sentença homologatória da transacção a que se supra se alude, o ora A., FGA, pagou no dia 31 de Outubro de 2008 uma indemnização ao lesado no montante global de € 65.000,00.
3 – Para além da indemnização supra indicada, o Fundo pagou ainda indemnizações ao lesado Hospital Garcia da Orta, E.P.E., em Almada no montante global de € 139.605$00 (€ 696,35) e ao Hospital de São José, a quantia total de 2.356.500$00 (€ 11.754,17), num total de pagamentos aos hospitais que assistiram o lesado (…).
81 – Em despesas de gestão com o sinistro, despendeu o A. FGA, a quantia de € 34,92.
82 – O A. FGA suportou também despesas de gestão com (…) & (…), sociedade de Advogados, designadamente com o pagamento de honorários, no montante global de € 316,63.
4 – As indemnizações pagas aos lesados resultaram de um sinistro automóvel ocorrido às 04,30 horas do dia 31/05/1997, na estrada Nacional nº 379, ao Km 29,250, localidade Quinta do Anjo, no concelho de Palmela.
5 – Nesse acidente foi interveniente o veículo ligeiro misto de matrícula (…), conduzido pelo R..
6 – No dia e hora acima indicados o (…) circulava na Estrada nº 379 no sentido Palmela/Azeitão.
7 – Invadindo a faixa de trânsito destinada ao trânsito de veículos em sentido contrário;
8 – Indo embater violentamente, com o lado esquerdo do (…) numa barreira existente no lado esquerdo da estrada, atento o seu sentido de marcha, capotando de imediato.
9 – O local onde ocorreu o sinistro era uma recta com boa visibilidade.
10 – Aquando da ocorrência do acidente era de noite e chovia.
84 – O FGA efectuou o último pagamento ao lesado em 31/10/2008
E ainda:
- A presente acção deu entrada em juízo no dia 25/05/2012.
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Como se referiu a questão a decidir consiste em saber se ao direito de sub-rogação do FGA é ou não aplicável a extensão do prazo de prescrição do direito à indemnização por danos resultantes de facto ilícito que constitua crime, nos termos do nº 3 do artº 498º do CC.

Conforme resulta das conclusões da sua alegação pretende o recorrente que o prazo de prescrição aplicável ao caso em apreço é de cinco anos e não de três por lhe ser aplicável o artº 498º, nºs 2 e 3, do CC, uma vez que os factos por ele alegados (e os provados vertidos na sentença) consubstanciam a prática pelo R. do crime de ofensas à integridade física p. e p. pelo artº 148º do CP, beneficiando assim o FGA do prazo prescricional de 5 anos que no caso haveria de ter o seu início com o pagamento da indemnização, que efectuou em Outubro de 2008, nada obstando a que o prazo de prescrição que se aplica ao lesado, se aplique também a quem vier exercer o direito de regresso.

Vejamos.

Compete ao FGA satisfazer nos termos do DL 522/85 as indemnizações decorrentes de acidentes originados por veículos sujeitos ao seguro obrigatório e que estejam matriculados em Portugal ou em países terceiros em relação à Comunidade Europeia que não tenham gabinete nacional de seguros ou cujo gabinete não tenha aderido à Convenção Complementar entre Gabinetes Nacionais (artº 21º/1).
No caso de o responsável, sendo conhecido, não beneficiar de seguro válido ou eficaz, o Fundo garante por acidente originado pelos veículos referidos no artº 21º/1, a satisfação de indemnizações por morte e por lesões materiais (artº 21º/2), neste último caso com uma franquia a deduzir no montante a cargo do Fundo (artº 21º/3), até ao limite, por acidente, das quantias fixadas no artº 6º (artº 23º).

Dispõe o artº 25º, nº 1, do DL 522/85, de 31/12, em vigor à data em que ocorreu o acidente, que “Satisfeita a indemnização, o Fundo de Garantia Automóvel fica sub-rogado nos direitos do lesado, tendo ainda direito ao juro de mora legal e ao reembolso das despesas que houver feito com a liquidação e cobrança.
Por sua vez nos termos do seu nº 3 “As pessoas que, estando sujeitas à obrigação de segurar, não tenham efectuado seguro poderão ser demandadas pelo Fundo de Garantia Automóvel nos termos do nº 1, beneficiando do direito de regresso contra outros responsáveis pelo acidente, se os houver, relativamente às quantias que tiverem pago.”.
Tal diploma foi revogado pelo DL 591/2007, de 21/08, estipulando o seu artº 54º (Sub-rogação do Fundo) o seguinte:
1 – Satisfeita a indemnização, o Fundo de Garantia Automóvel fica sub-rogado nos direitos do lesado, tendo ainda direito ao juro de mora legal e ao reembolso das despesas que houver feito com a instrução e regularização de sinistro e reembolso. (…)
6 – Aos direitos do Fundo de Garantia Automóvel previstos nos números anteriores é aplicável o nº 2 do artº 498º do Código Civil, sendo relevante para o efeito, em caso de pagamentos fraccionados por lesado ou a mais que um lesado, a data do último pagamento efectuado pelo Fundo de Garantia Automóvel”.

Ora, relativamente à prescrição que, in casu, nos ocupa, dispõe o nº 1 do artº 498º do CC que “O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso”, sendo que, nos termos do seu nº 2 “Prescreve igualmente no prazo de três anos a contar do cumprimento o direito de regresso entre os responsáveis”.
Por sua vez estabelece o seu nº 3 que “Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo é este o prazo aplicável.”.
É esta a norma que o recorrente invoca para fazer valer a tempestividade do exercício do seu direito.
Não decorrendo da letra da lei, expressamente, se o alongamento do prazo de prescrição respeita apenas ao direito de indemnização do lesado ou a este e à acção de regresso entre responsáveis, ambas as soluções já têm sido defendidas e a questão encontra-se amplamente debatida a propósito do prazo de prescrição aplicável ao direito de regresso das seguradoras (artº 19º do DL nº 522/85, de 31/12), sendo a orientação dominante na jurisprudência do STJ a de que o alongamento do prazo respeita apenas ao direito do lesado não abarcando o direito de regresso das seguradoras.
Neste sentido, o Ac. do STJ de 18/10/2012, proferido no proc.º nº 6/10.8TBCVL-A.C1.S1, relatado pelo Cons. Tavares de Paiva, com indicação de outros acórdãos, onde se escreveu: “Sobre esta problemática este Supremo tem vindo a decidir pacifica e uniformemente no sentido de que o direito de regresso da seguradora que satisfaz uma indemnização ao abrigo do contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, causador de acidente que originou os danos objecto daquela indemnização, está sujeito ao prazo de prescrição de três anos, previsto no nº 2 do artº 498º do C.C. não se aplicando ao mesmo prazo a extensão do nº 3 (cfr. Ac. do STJ de 5/06/2012, acessível in www.dgsi.pt, relator Cons.º João Camilo, bem como os Acs. deste Supremo aí citados).
Como bem salienta o Ac. deste Supremo de 5/06/2012, supra citado, a respeito da problemática aqui em questão “A razão de ser da introdução do preceito do nº 3 em causa visou alargar o prazo da prescrição do lesado quando o facto lesante constitua crime de gravidade acentuada que leve a que o prazo de prescrição do crime seja superior aos três anos fixados no nº 1. É que não se pode esquecer o princípio da adesão da dedução da indemnização civil no processo criminal e se o prazo de prescrição criminal ainda não decorreu, se não compreenderia que se extinguisse o direito à indemnização civil – conexa com o crime – e ainda estivesse a decorrer o prazo para a prescrição penal operar, onde o legislador entendeu dever ser deduzido o pedido de indemnização civil – dentro de certas limitações constantes das normas penais
E neste seguimento o acórdão adianta “Daqui parece apontar para que a extensão do prazo de prescrição do nº 3 referido apenas se justifica no prazo de prescrição do direito do lesado e não do direito do regresso.”
Acresce também, como se diz no citado Acórdão “o direito de regresso em causa tem natureza diversa, é um direito autónomo em relação ao direito do lesado, nascido “ex novo”, com o pagamento do direito à indemnização ao ofendido, que assim se extinguiu fazendo nascer aquele direito de regresso”.
E como se diz no Ac. deste Supremo de 17/11/11 (Pº 1372/10.4T2AVR.C1.S1) “Não vale aqui, manifestamente, o argumento de que, enquanto facto ilícito pode ser discutido em sede penal, deve, pois, ser apreciado no âmbito da responsabilidade civil. Como se escreveu na sentença “nenhuma razão existe para lhe aplicar (ao direito de regresso) um alargamento do prazo que pressupõe que a medida dessa responsabilidade possa ser ainda discutida em sede penal.”. Efectivamente, estamos perante dois direitos bem diferentes, de um lado está o direito do lesado referenciado expressamente no nº 1 do citado artº 498º e do outro está o direito de regresso contemplado no nº 2.
(…)
Este entendimento foi também sufragado no Ac. deste Supremo de 29/11/2011, acessível via www.dgsi.pt Relator Nuno Cameira, quando, depois de considerar que o alongamento do prazo de prescrição do direito à indemnização em consequência de danos ocasionados por facto ilícito que constitua crime (artº 498º, nº 3, do C.C.) não vale para o exercício do direito de regresso da al. c) do artº 19º do DL 522/85, de 31/12, concluiu também que embora “o elemento literal da norma não afasta em definitivo a aplicação do nº 3 do artº 498º às situações do nº 2, mas é ilógica essa aplicação, dado que na hipótese do exercício do direito de regresso, só está em aberto o direito da seguradora ao reembolso do que pagou ao lesado e não a determinação da responsabilidade extracontratual do lesante, ponto nesse momento já assente e indiscutido”.
E termina com as seguintes conclusões:
“1 – O direito de regresso da seguradora que satisfaz uma indemnização ao abrigo de um contrato de seguro de responsabilidade civil, emergente de acidente de viação, que originou os danos fundamentos daquela indemnização, está sujeito ao prazo de prescrição de 3 anos previsto expressamente no nº 2 do artº 498º do C.C., não se lhe aplicando o alongamento do prazo previsto no nº 3 do citado normativo.
2 – Isto porque aquele direito de regresso compreende apenas o direito da seguradora ao reembolso do que pagou ao lesado, sendo, por isso, um direito diferente do lesado e, daí que não se justifique aquele alongamento do prazo de prescrição previsto no citado nº 3 do artº 498º, que diz respeito apenas para o direito do lesado”.

No mesmo sentido, veja-se ainda:
Ac. do STJ de 17/11/2011, proc. nº 1372/10.4T2AVR.C1.S1, relatora Cons. Maria dos Prazeres Beleza, com o seguinte sumário: “O alongamento do prazo de prescrição do direito à indemnização por danos resultantes de facto ilícito que também constitua crime, previsto no nº 3 do artº 498º do C.C., não vale para o exercício do direito de regresso conferido à seguradora pela al. c) do artº 19 do DL 522/85, de 31/12”.
Ac. do STJ de 04/11/2010, proc. 2564/08.1TBCB.A.C1.S1, relator Cons. João Bernardo, com o seguinte sumário: “1 – Relativamente ao mesmo sinistrado e ressalvados os casos de indemnização sob a forma de renda, o prazo prescricional da seguradora para exercer o direito de regresso relativamente à indemnização que pagou, faseadamente, no âmbito do seguro obrigatório automóvel, começa a contar-se da data em que foi efectuado o último pagamento. 2 – Este prazo é de três anos, não valendo, quanto a ele, o alongamento previsto no nº 3 do artº 498º do C.C.”.
Ac. do STJ de 27/10/2009, proferido no proc. nº 844/07.2TBOET.L1, relatado pelo Cons. Paulo Sá, onde sobre a questão em apreço decidiu: “V – Na acção de regresso, a circunstância do facto ilícito constituir crime não justifica o alargamento do prazo prescricional do nº 2 do artº 498º do CC, nos moldes previstos no nº 3 desse preceito legal, pois não está já em causa, em termos directos e imediatos, a responsabilidade civil extracontratual derivada do facto voluntário, culposo, ilícito, causal e lesivo que, em rigor, já estará definida, mas antes um segundo momento, subsequente, à definição em concreto, da dita responsabilidade, não se vislumbrando necessidade ou motivo, quer em termos fácticos, como jurídicos para proceder a tal ampliação do prazo de 3 anos previsto para o direito de regresso”.

No seguimento desta jurisprudência pacífica e uniforme impõe-se concluir que o direito de regresso entre os responsáveis, fundado na responsabilidade civil extracontratual prescreve no prazo de três anos, não valendo, quanto a ele, o alongamento previsto no nº 3 do artº 498º do C.C.

In casu, não está em causa que o direito de regresso não se confunde com o direito que assiste ao sub-rogado.
Com efeito, “(…) embora haja certa afinidade substancial nas suas raízes, a sub-rogação e o direito de regresso constituem, no sistema legal português, realidades jurídicas distintas e em determinado aspecto, mesmo opostas.
A sub-rogação, sendo uma forma de transmissão das obrigações, coloca o sub-rogado na titularidade do mesmo direito de crédito (conquanto limitado pelos termos do cumprimento, que pertencia ao credor primitivo. O direito de regresso é um direito nascido “ex novo” na titularidade daquele que extinguiu (no todo ou em parte) a relação creditória anterior ou daquele à custa de quem a relação foi considerada extinta” (Antunes Varela “Das Obrigações em Geral”, V. II, 3ª ed., ps. 309/310).
Contudo, vem entendendo a jurisprudência, que as razões que justificam o prazo curto de prescrição nas acções de direito de regresso são igualmente válidas para o direito do sub-rogado e, por via analógica, aplicado a este o prazo do artº 498º, nº 2, do CPC.
Como decidiu o acórdão do STJ de 10/01/2013 “Como vimos, o direito de regresso não se confunde com o direito que assiste ao sub-rogado. Contudo, tem sido constante a interpretação deste preceito por analogia, considerando-o aplicável aos casos de sub-rogação por parte do FGA que paga a indemnização.
Assim, os Acs. deste Tribunal de 13/04/2000, Rev. nº 200/00 da 7ª sec.; de 9/11/2006, Rev. nº 2849/06 da 2ª sec.; de 22/10/2009 Rev. nº 501/09.5YFLSB da 2ª sec.; de 25/03/2010 Rev. nº 2195/06.OTVLSB.L1.S1 e de 16/03/2011, supra citado.
Nada temos a contrapor a tal interpretação, porquanto cremos que subjazem para o direito do sub-rogado as mesmas razões de fixação do prazo curto de prescrição que para o titular do direito de regresso.
E tanto subjazem as mesmas razões que o artº 54º, nº 6, do DL nº 291/2007, de 21/08, veio a dispor expressamente nesse sentido” (proc. nº 157-E/1996, Rel. cons. João Bernardo in www.dgsi.pt).

Sobre serem idênticas as razões que implicam a não aplicação do prazo alongado do nº 3 do artº 498º do CC ao titular do direito de regresso e ao sub-rogado, é também esclarecedor o Ac. do STJ de 05/06/2012, proc. nº 32/09.3TBSRQ.L1S1, relatado pelo Cons. João Camilo, acessível in www.dgsi.pt.

É esta também a orientação que sufragamos, igualmente adoptada, entre outros, nos Acs. da R.P de 09/04/2015, proc. 11173/12.OTBVNG.P1; de 27/05/2014 proc. nº 62/10.2TBCNF.P1; da RL de 06/11/2012, proc. nº 6022/09.9TVLSB.L1-7, todos acessíveis in www.dgsi.pt.

Dissentimos, assim, quanto a esta questão, do entendimento constante dos acórdãos juntos com as alegações do recorrente.

Em face de todo o exposto e entendendo-se que não aproveita ao FGA o prazo a que se refere o nº 3 do artº 498º do CC, considerando que a presente acção foi instaurada em 24/05/2012 (presumindo-se a citação do R. em 5/06/2012) e que o último pagamento ao lesado foi efectuado em 31/10/2008, verifica-se que, efectivamente, mostra-se prescrito o direito que o A. pretendia fazer valer contra o R. no presente processo.
Improcedem, pois, in totum, as conclusões da alegação do recorrente, impondo-se a confirmação da sentença recorrida.

DECISÃO
Nesta conformidade, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e, consequentemente, em confirmar a sentença recorrida.
Sem custas por delas estar isento o apelante (artº 4º, nº 1, al. o), do RCP).
Évora, 19/11/2015
Maria Alexandra de Moura Santos
Acácio Luís Jesus das Neves
José Manuel Bernardo Domingos