Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1884/19.4T8EVR-A.E1
Relator: VÍTOR SEQUINHO
Descritores: CONTAGEM DO PRAZO PARA A CONTESTAÇÃO
PRORROGAÇÃO DO PRAZO
Data do Acordão: 11/05/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Ainda que o prazo para o réu contestar seja prorrogado nos termos dos artigos 141.º, n.º 1 e 569.º, n.º 5, do CPC, continua a existir um único prazo, que deve ser contado nos termos estabelecidos no artigo 138.º, n.º 1, do mesmo Código.
O regime previsto no artigo 138.º, n.º 2, do CPC apenas poderá aplicar-se no final desse prazo.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1884/19.4T8EVR-A.E1

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(…) Clube interpôs recurso de apelação do despacho, proferido na acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra si proposta por (…) – Empreendimentos Imobiliários, Lda., mediante o qual o tribunal a quo rejeitou a contestação por si apresentada com fundamento na sua extemporaneidade.

As conclusões do recurso são as seguintes:

A) O artigo 141.º, n.º 2, do CPC permite a prorrogação do prazo original, por igual prazo;

B) A prorrogação inicia-se desde o termo do prazo original, contabilizado de acordo com o estatuído no artigo 138.º do CPC, suspendendo-se durante as férias judiciais e transferindo o seu termo para o dia seguinte, quando o prazo terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados;

C) De acordo com tais dispositivos legais, o termo do prazo original terminou no dia 6 de Janeiro de 2020;

D) O consignado no artigo 142.º do CPC destinou-se, única e exclusivamente, a obstar à aplicação do disposto no n.º 5 do artigo 139.º do CPC, no termo do prazo original;

E) O tribunal violou o correcto entendimento dos preceitos legais invocados na presente peça recursiva.

A recorrida apresentou contra-alegações, com as seguintes conclusões:

1 – O despacho recorrido não enferma de qualquer nulidade, nem apresenta qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão, pelo que não é passível de qualquer reparo;

2 – O recorrente foi citado no dia 22.11.2019 para apresentar a sua contestação;

3 – O prazo para apresentação da contestação iniciou-se em 23.11.2019;

4 – No decurso dos 30 dias de que o recorrente dispunha para apresentação da contestação, requereu a prorrogação do prazo, tendo sido prorrogado por 30 dias;

5 – O requerimento de prorrogação do prazo não suspendeu o prazo em curso – n.º 6 do artigo 569.º do CPC;

6 – O recorrente dispunha assim de um prazo total de 60 dias para contestar a acção;

7 – O prazo de 60 dias para apresentar a sua contestação teve assim início em 23.11.2019 e termo em 03.02.2020;

8 – A contestação deu entrada no tribunal em 10.02.2020;

9 – A jurisprudência é unânime em considerar que, prorrogado um prazo legal, passa a haver um prazo único legal acrescido do tempo de prorrogação, o qual corre de acordo com as regras previstas no artigo 138.º do CPC;

10 – Deve, assim, ser considerado improcedente o recurso, mantendo-se o despacho recorrido.

O recurso foi admitido, com subida em separado e efeito meramente devolutivo.


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Tendo em conta as conclusões das alegações de recurso, a única questão a resolver consiste em saber em que dia terminou o prazo para o recorrente contestar.

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Os factos relevantes para a decisão do recurso, evidenciados pelos autos deste, são os seguintes:

1 – (…) – Empreendimentos Imobiliários, Lda., propôs a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra (…) Clube (fls. 3 a 85);

2 – (…) Clube foi citado no dia 22.11.2019 (fls. 86);

3 – (…) Clube requereu a prorrogação do prazo de contestação por 30 dias (fls. 87 e 88);

4 – O tribunal a quo deferiu o requerimento referido em 3 (fls. 90);

5 – (…) Clube apresentou a contestação no dia 10.02.2020 (fls. 96 a 201);

6 – O tribunal a quo notificou (…) Clube para, querendo, se pronunciar sobre a tempestividade da contestação (fls. 202);

7 – (…) Clube sustentou que a contestação foi apresentada tempestivamente (fls. 203 e 204);

8 – Em seguida, o tribunal a quo proferiu o despacho recorrido, rejeitando a contestação com fundamento na extemporaneidade desta (fls. 204 v.º e 205).


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Para a resolução da questão que se suscita no presente recurso, importa considerar o disposto nas seguintes normas do Código de Processo Civil:

- Artigo 138.º, n.º 1: O prazo processual, estabelecido por lei ou fixado por despacho do juiz, é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de actos a praticar em processos que a lei considere urgentes.

- Artigo 138.º, n.º 2: Quando o prazo para a prática do acto processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte.

- Artigo 141.º, n.º 1: O prazo processual marcado pela lei é prorrogável nos casos nela previstos.

- Artigo 569.º, n.º 1: O réu pode contestar no prazo de 30 dias a contar da citação, começando o prazo a correr desde o termo da dilação, quando a esta houver lugar; no caso de revogação de despacho de indeferimento liminar da petição, o prazo para a contestação inicia-se com a notificação em 1.ª instância daquela decisão.

- Artigo 569.º, n.º 5: Quando o juiz considere que ocorre motivo ponderoso que impeça ou dificulte anormalmente ao réu ou ao seu mandatário judicial a organização da defesa, pode, a requerimento deste e sem prévia audição da parte contrária, prorrogar o prazo da contestação, até ao limite máximo de 30 dias.

Importa considerar, ainda, o disposto no artigo 279.º, al. b), do Código Civil: Na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr.

Importa, finalmente, considerar o disposto no artigo 28.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário: As férias judiciais decorrem de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro, do Domingo de Ramos à Segunda-Feira de Páscoa e de 16 de Julho a 31 de Agosto.

Na sequência de requerimento por si apresentado nesse sentido, o recorrente beneficiou de uma prorrogação do prazo de contestação por 30 dias. Ficou, assim, com um prazo de 60 dias para contestar. Um único prazo, salientamos. A prorrogação de um prazo é diferente da concessão de um novo prazo depois de expirar um prazo anterior. O prazo prorrogado continua a ser o mesmo, apenas passando a ter uma duração superior. Não há dois prazos sucessivos, mas, repetimos, um único prazo.

O recorrente foi citado no dia 22.11.2019, pelo que a contagem do referido prazo de 60 dias para ele contestar a acção teve início no dia seguinte, 23.11.2019. Suspendeu-se, devido ao início das férias judiciais, no dia 22.12.2019. Estavam então decorridos 29 dias. As férias judiciais terminaram no dia 03.01.2020, pelo que a contagem do prazo foi retomada no dia seguinte, 04.01.2020. O último dia do prazo foi 03.02.2020.

O recorrente considera que “O primitivo prazo de 30 dias, terminou no dia 6 de Janeiro de 2020, considerando o início das férias judiciais no dia 22 de Dezembro de 2019 e términus no dia 3 de Janeiro de 2020, sendo que os dias 4 e 5 de Janeiro de 2020, corresponderam a um sábado e a um domingo – cfr. artigo 138.º do CPC”.

É aqui que reside o erro do recorrente. Não houve um primeiro prazo de 30 dias seguido de um segundo prazo de idêntica duração. Houve, sim, um único prazo, que começou por ser de 30 dias mas, por efeito de prorrogação, passou a ser de 60 dias. Daí que ao decurso dos primeiros 30 dias do prazo não se aplique o disposto no n.º 2 do artigo 138.º do CPC, como o recorrente pretende. Findo o período de férias judiciais no dia 03.01.2020, a contagem do prazo recomeçou logo no dia seguinte, 04.01.2020, não obstante ter sido um sábado.

Nem havia fundamento substancial para solução diversa. O regime estabelecido no n.º 2 do artigo 138.º do CPC justifica-se apenas na hipótese expressamente prevista nesta norma, ou seja, de o prazo para a prática de um acto processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados. Na hipótese de prorrogação de um prazo, a parte não tem de praticar qualquer acto processual por efeito do decurso do período correspondente ao prazo primitivo, pelo que não faria sentido beneficiar, nesse momento, do regime estabelecido naquela norma. Isso poderá acontecer, por efeito da aplicação dessa mesma norma, uma única vez, no final do prazo resultante da prorrogação.

O regime do artigo 142.º do CPC, que o recorrente refere nas suas alegações, nada tem a ver com a situação dos autos. Nele se estabelece que, quando um prazo peremptório se seguir a um prazo dilatório, os dois prazos contam-se como um só. Na situação dos autos, nem sequer se verifica a necessidade de aplicar esta norma para que o prazo se conte como um só. Sendo o prazo objecto de prorrogação o mesmo, embora alargado na sua extensão, necessariamente é contado como um só, nos termos acima expostos.

Como anteriormente afirmámos, o prazo para contestar terminou no dia 03.02.2020, que foi uma Segunda-Feira. Mesmo aplicando o regime previsto no artigo 139.º, n.º 5, do CPC, a contestação teria de ser apresentada até ao dia 06.02.2020. Tendo-o sido no dia 10.02.2020, é, tal como decidiu o tribunal a quo, extemporânea. Daí que o recurso improceda, devendo manter-se o despacho recorrido.


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Dispositivo:

Delibera-se, pelo exposto, julgar o recurso improcedente, confirmando-se o despacho recorrido.

Custas pelo recorrente.

Notifique.


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Sumário:

(…)


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Évora, 05 de Novembro de 2020

Vítor Sequinho dos Santos (relator)

Mário Rodrigues da Silva

José Manuel Barata