Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
389/14.4TBSTR.E1
Relator: FRANCISCO MATOS
Descritores: INDEMNIZAÇÃO POR DANOS NÃO PATRIMONIAIS
DANOS FUTUROS
EQUIDADE
Data do Acordão: 10/14/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: O prejuízo funcional, com reflexos na vida profissional do sinistrado, que se traduz num esforço acrescido na prestação do trabalho e eventuais perdas de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados pelo défice funcional que definitivamente o vai afetar, é uma dimensão patrimonial do chamado dano biológico que justifica uma indemnização autónoma.
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 389/14.4TBSTR.E1

Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
1. (…), casado, engenheiro civil, residente na Rua do (…), n.º 104, Cartaxo, instaurou contra (…), residente na Urbanização dos (…), lote 17, 3.º-Dto., Alpiarça e Fundo de Garantia Automóvel, com sede na Av. da (…), n.º 59, 4.º, em Lisboa, ação declarativa com processo comum.
Alegou, em resumo, que no dia 5 de Março de 2011, ao Km 32,4 da E.N. n.º 3, o 1.º R conduzia o veículo ligeiro de passageiros, com a matrícula (…), sem seguro, propriedade de (…), no sentido Cartaxo-Santarém, em excesso de velocidade e ao sair de uma curva próxima do café “(…)”, perdeu o controlo do veículo e foi embater no A., o qual seguia a pé, por uma caminho de terra batida, a cerca de dois metros e quarenta centímetros da berma da estrada, abandonando em seguida o local sem prestar assistência ao A.
Em consequência do embate, o A sofreu lesões no joelho direito, luxação da tíbia, feridas na região frontal direita e hematomas por todo o corpo, ferimentos que lhe determinaram um período de doença de 745 dias, durante o qual foi submetidos a duas intervenções cirúrgicas e cujas sequelas lhe vieram a determinar uma incapacidade permanente parcial de 19,49 pontos.
Concluiu pedindo a condenação dos RR, a título de indemnização, no pagamento da quantia de € 249.553,16, acrescida de juros a contar da citação.
O Instituto da Segurança Social, IP, formulou pedido de condenação dos RR no pagamento da quantia de € 3.685,03, a título de reembolso de prestações de subsidio de doença alegadamente pagas ao A, enquanto beneficiário.
Contestou o Fundo de Garantia Automóvel excecionando a sua ilegitimidade por preterição de litisconsórcio necessário passivo (o A não demandou o proprietário do veículo), impugnando os factos articulados pelo A, considerando manifestamente exagerados e infundados os valores indemnizatórios por este peticionados e considerando que não obrigado a reembolsar o ISS pelas alegadas prestações de subsídio de doença.
Conclui pela improcedência da ação e do pedido formulado pelo ISS.
Foi provocada a intervenção de (…) e suscitando-se dúvidas sobre a identidade do proprietário do veículo, foi admitida a intervenção principal passiva daquele e de (…), os quais foram citados e não contestaram.
O réu (…) faleceu e foram habilitados como seus herdeiros, para com eles prosseguir a demanda, (…), (…) e (…).
O réu (…) faleceu e foram habilitados como seus herdeiros, para com eles prosseguir a demanda, (…), (…) e (…).

2. Foi proferido despacho que afirmou a validade e regularidade da instância, conheceu parcialmente do mérito da causa e absolveu o FGA do pedido formulado pelo ISS, identificou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento e depois foi proferida sentença em cujo dispositivo designadamente se consignou:
“Nos termos e pelos fundamentos expostos, julgo a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência, decido:

6.1. – Condenar os réus Fundo de Garantia Automóvel, (…), (…), (…) e (…) a pagar solidariamente ao autor (…), as seguintes quantias:

6.1.1. – A título de danos morais, € 40.000,00 (quarenta mil euros), acrescidos de juros de mora contados à taxa legal de 4% desde a presente data de prolação da sentença até integral pagamento;

6.1.2. – A título de danos emergentes, € 27,00 (vinte e sete euros), acrescidos de juros de mora contados à taxa legal de 4% desde a data da citação até integral e efetivo pagamento;

6.1.3. – A título de lucros cessantes, € 7.980,00 (sete mil novecentos e oitenta euros), acrescidos de juros de mora contados à taxa legal de 4% desde a data da citação até integral e efetivo pagamento;

6.1.4. – A título de dano biológico, € 70.000,00 (setenta mil euros), de igual modo acrescidos de juros de mora contados à taxa legal de 4% desde a presente data de prolação da sentença até integral pagamento;

6.1.5. – A título de danos decorrentes de o autor ter necessidade de frequentar ginásio e realizar fisioterapia (MFR), € 7.650,00 (sete mil, seiscentos e cinquenta euros), acrescidos de juros de mora contados à taxa legal de 4% desde a presente data da citação até integral e efetivo pagamento.

6.2. – Condenar os réus Fundo de Garantia Automóvel, (…), (…), (…) e (…) a pagarem ao autor (…) a quantia que vier a liquidar-se em incidente de liquidação de sentença por danos patrimoniais com custos de cirurgias necessárias em consequência do acidente de viação objeto destes autos.

6.3. – Absolver os réus Fundo de Garantia Automóvel, (…), (…), (…) e (…) de tudo o demais contra os mesmos peticionado pelo autor (…).

6.4. – Absolver os réus (…), (…) e (…) de todos os pedidos contra os mesmos peticionados pelo autor (…).

6.5. – Condenar solidariamente os réus (…), (…), (…) e (…) a pagarem ao demandante INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. a quantia de € 3.685,03 (três mil, seiscentos e oitenta e cinco uros e três cêntimos), acrescida dos juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, contados a partir da notificação para contestar o pedido de reembolso.


3. O recurso
FGA – Fundo de Garantia Automóvel recorre da sentença e conclui assim a motivação do recurso:
“1. Atribui-se ao recurso o valor de € 68.000,00, correspondente ao valor de decaimento que é posto em causa, pelo que foi liquidada taxa de justiça no valor de € 408,00.

2. O Apelante foi condenado a indemnizar o Autor em € 40.000,00 a título de danos morais, dos quais se põem em causa € 13.000,00, entendendo ser adequado o quantum indemnizatório de € 17.000,00.

3. O Quantum Doloris do Autor foi fixado no grau 5 de 7, o Dano Estético no grau 3 de 7, a Repercussão nas Atividades Desportivas e de Lazer no grau 4 de 7 e repercussão na atividade sexual no grau 3 de 7.

4. O Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica em 17 pontos.

5. Atentas as lesões sofridas pelo Autor e as sequelas de que ficou a padecer, o montante arbitrado peca por excessivo, devendo ser reduzido a € 15.000,00, no máximo de € 17.000,00.

6. Para fixação de indemnização a título de dano biológico, saliente-se que o Autor será ressarcido em € 7.980,00 pela perda de lucros cessantes, pelo que resta ponderar as limitações genéricas de que ficou a padecer, relevando que tinha a idade de 41 anos à data do acidente e lhe foi fixado um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 17 pontos.

7. O dano biológico, considerado e sentenciado autonomamente, deverá, pois, ser valorado em € 25.000,00, ao invés dos € 70.000,00 sentenciados.

8. A douta decisão de fls. violou o artigo 566.º, n.os 2 e 3, do Código Civil.

Termos em que deverá ser dado provimento ao recurso. Com o que se fará Justiça!”

Respondeu o A. por forma a defender a confirmação da decisão recorrida.

Admitido o recurso e observados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.


II. Objeto do recurso
Considerando que o objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso (artigos 635.º, n.º 4 e 608.º, n.º 2 e 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), que nos recursos se apreciam questões e não razões ou argumentos e que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido, importa decidir se as indemnizações por danos não patrimoniais e dano biológico devem ser reduzidas.

III. Fundamentação
1. Factos.
A decisão recorrida julgou assim os factos:
Factos Provados:
1. No dia 5 de março de 2011, cerca das 01:05 horas, … (entretanto falecido) conduzia o veículo ligeiro de passageiros, de marca “ROVER”, modelo “214SI”, de cor preta, com matrícula (…), propriedade de réu (…), pela Estrada Nacional n.º 3, no sentido Cartaxo (Vale de Santarém) – Santarém, sendo acompanhado por (…), que seguia no lugar do pendura.

2. Ao quilómetro 32,4 da referida Estrada Nacional n.º 3, (…), ao sair de uma curva próxima do café “(…)”, (…), nesta comarca, porque seguia a velocidade não concretamente apurada, mas superior a 90 quilómetros por hora, perdeu o controlo do veículo de matrícula (…), saiu da faixa de rodagem e embateu com a traseira, do lado direito desse veículo, no corpo do autor, projetando-o para o solo.

3. No momento do embate, o autor fazia uma peregrinação a Fátima e, por isso, seguia a pé, no sentido Cartaxo (Vale de Santarém) – Santarém, com colete refletor vestido, fora da faixa de rodagem da Estrada Nacional 3, por um caminho de terra batida, a cerca de dois metros e quarenta centímetros da berma.

4. (…) viu perfeitamente que circulavam no lado direito em relação ao sentido do trânsito em que circulava cerca de dez pessoas com coletes refletores, mesmo antes do café “(…)”.

5. (…) apercebeu-se perfeitamente que provocara um acidente e, embora ciente que do mesmo podia advir, como efetivamente advieram, ferimentos para o autor, suscetíveis de colocar em perigo a integridade física do mesmo, abandonou o local de imediato, sem cuidar de saber do seu real estado, nem de providenciar pelo seu socorro.

6. Após a colisão, o veículo (…) ficou parado, virado no sentido Cartaxo (Vale de Santarém) – Santarém, durante cerca de 10 segundos, tendo (…) retomado a sua marcha, conduzindo-o para local não apurado.

7. O veículo (…) não embateu em qualquer outro obstáculo, a não ser no corpo do autor.

8. Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 1. fazia bom tempo, a iluminação era boa, o piso estava seco e em bom estado de conservação e não existia qualquer obra ou obstáculo na via.

9. Realizado exame de pesquisa de álcool ao autor, apresentou uma TAS de 0,00g por litro.

10. Em virtude do embate no corpo do autor, o veículo (…) ficou com o farolim traseiro do lado direito partido.

11. No local onde ocorreu o embate, a Estrada Nacional n.º 3 é composta por duas vias de trânsito de sentidos opostos, tendo a faixa de rodagem 6,3 metros de largura e a velocidade máxima permitida no local é de 50 quilómetros por hora.

12. No sentido em que seguia, (…) deparou-se com a seguinte sinalização vertical: sinal vertical de perigo “A29 – outros perigos”, sinal vertical de proibição “C14a – proibição de ultrapassar” e imediatamente antes de chegar ao entroncamento onde se deu o acidente encontrava-se o sinal de perigo “B9a – entroncamento com via sem prioridade”.

13. O veículo (…), conduzido por (…), era propriedade de (…) e não tinha seguro válido e eficaz.

14. Em consequência direta e necessária do descrito embate e projeção para o solo o autor sofreu as seguintes lesões corporais: rotura total dos ligamentos cruzado anterior, cruzado posterior, lateral interno, e rotura quase total do ligamento lateral externo, todos do joelho direito, lesões condrais de espessura quase completa do condilo femoral externo, hemorragia no osso do joelho direito, lesão na cartilagem do joelho direito, luxação postero - externa da tíbia e externa da rótula, duas feridas inciso - contusas na região frontal direita e hematomas por todo o corpo.

15. Imediatamente após o acidente, o autor foi transportado para o Hospital Distrital de Santarém, onde lhe foram prestados os primeiros socorros, designadamente foi levado ao bloco operatório imediatamente para redução da luxação, sob anestesia geral.

16. Permaneceu internado naquele Hospital até ao dia 11 de março de 2011, de onde saiu com imobilização total da perna direita, em função do gesso fechado crudo- podálico e com indicação para consulta externa pelo Dr. (…), Ortopedista, no dia 24 de março de 2011, tendo nessa data realizado RX.

17. No dia 31 de março de 2011 retirou o gesso, tendo colocado uma joelheira com barras de estabilização lateral, limitativa dos movimentos.

18. A partir de abril de 2011 iniciou tratamentos de fisioterapia, que se mantiveram ininterruptos e diariamente até 14 de agosto de 2011, para recuperação muscular e da mobilidade articular.

19. No dia 11 de abril de 2011 efetuou exame médico de Ressonância Magnética, que confirmou as lesões descritas.

20. Continuou a ser seguido pelo Dr. (…) em consulta de Ortopedia do Hospital Distrital de Santarém, até 31 de maio de 2011.

21. Nesta data apresentava instabilidade grave, multiligamentar do joelho direito, realizando marcha com auxílio de canadianas e joelheira com barras de estabilização lateral, encontrando-se em tratamentos de Medicina Física e de Reabilitação para recuperação muscular e da mobilidade articular, com indicação para tratamento cirúrgico das lesões.

22. Devido à gravidade das lesões (considerada medicamente como a mais grave lesão que se pode ter a nível de joelho), foi o autor aconselhado a ser seguido pelo Dr. (…), especialista em cirurgia do joelho no Hospital CUF Descobertas, em Lisboa.

23. A gravidade das lesões implicava a realização de uma ou várias cirurgias, face à rotura total dos ligamentos cruzado anterior, cruzado posterior e lateral interno e quase total do lateral externo.

24. Não sendo possível fazer a cirurgia com recurso a tecido corporal do próprio autor, tal implicou ligamentoplastia, com recurso a tecido de cadáver (aloenxerto).

25. Nessa área o Dr. (…) era um dos dois únicos especialistas que já havia realizado cirurgias dessas em Portugal, a par com o Prof. Dr. (…), motivo pelo qual o autor começou a ser seguido pelo Dr. (…) no Hospital CUF Descobertas a partir de 28 de abril de 2011.

26. Onde foi submetido a duas intervenções cirúrgicas, a primeira em 16 de agosto de 2011, para reconstrução dos ligamentos cruzado anterior e cruzado posterior com aloenxerto de tendão de Aquiles por via artroscópica, e a segunda em 28 de março de 2012, onde foi sujeito a artroscopia de reconstrução do ligamento lateral interno com semitendinoso e tensagem do ligamento oblíquo posterior.

27. Entre ambas as cirurgias o autor realizou, de segunda a sexta-feira sessões de fisioterapia, dolorosas.

28. De igual forma, após a segunda cirurgia, prosseguiu com os tratamentos de fisioterapia diários, que passaram a 3 vezes por semana em 21 de maio de 2012 e a 2 vezes por semana em 13 de setembro de 2012.

29. Bem como iniciou, hidroterapia duas vezes por semana em 13 de setembro de 2012 quando passou para sessões bissemanais de fisioterapia, iniciou complementarmente ginásio para fortalecimento da massa muscular, sob conselho médico.

30. Durante o período de recuperação o autor teve de se submeter à realização de vários exames médicos, entre os quais RX, análises e eletrocardiogramas.

31. Teve de tomar medicação forte para as dores (Tilalgin e Clonix) bem como antiinflamatória, tanto em comprimidos como em forma de pomada –Diclofenac - esta última indispensável para a realização dos tratamentos de fisioterapia, medicação esta que lhe causou dores de estômago e uma bulbite erosiva, diagnosticada em 12/10/2011 pelo Dr. (…), Gastroenterologista.

32. Durante os períodos de imobilização, o autor teve ainda de efetuar uma injeção diária no abdómen (Lovenox), para prevenção de tromboflebites, o que lhe causou dores e hematomas no abdómen e esteve dependente de terceira pessoa para o exercício das elementares necessidades fisiológicas.

33. O autor sofreu dores intensas, não apenas na altura do acidente e durante a sua recuperação, como atualmente continuando a sofrer de dores no joelho direito e instabilidade.

34. Em 12 de dezembro de 2018 (data da realização da avaliação no IML) o autor apresentava como sequelas relacionáveis com o acidente:

- Crânio:

Cicatriz hipocrómica na região fronto parietal direita, na inserção do cabelo, com cerca de 5 centímetros por 2 centímetros de eixo maior antero posterior.

- Face:

Área hipocrómica, na região temporo maxilar direita, abaixo da inserção do cabelo, com cerca de 3 centímetros de diâmetro médio, cicatriz na região retro auricular direita, linear, vertical, com cerca de 0,5 centímetros de comprimento.

- Membro inferior direito:

Cicatriz operatória, com vestígios de pontos de sutura, na face medial do joelho, vertical, com 13 centímetros de comprimento;

Quatro cicatrizes na face anterior do joelho de status pós artroscopia;

Amiotrofia da coxa de 1 centímetro (53 centímetros Dta./54 centímetros Esq.);

Amiotrofia da perna de 2 centímetros (40,5 centímetros Dta./42,5 centímetros

Crepitação da rótula; limitação da mobilidade articular do joelho na flexão a 110º (135º Esq.);

Instabilidade ligamentar mista.

35. A consolidação médico – legal das lesões que o autor sofreu em consequência do acidente é fixável em 18 de março de 2013.

36. O autor sofreu um período de Défice Funcional Temporário Total situado entre 5 de março de 2011 e 11 de março de 2011, entre 15 de agosto de 2011 e 19 de agosto de 2011 e entre 27 de março de 2012 e 29 de março de 2012, num período de 15 dias.

37. O autor sofreu um período de Défice Funcional Temporário Parcial situado entre 12 de março de 2011 e 14 de agosto de 2011, entre 20 de agosto de 2011 e 26 de março de 2012 e entre 30 de março de 2012 e 18 de março de 2012, num período de 730 dias.

38. Ao nível da repercussão permanente na atividade profissional, as sequelas são compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicam esforços suplementares.

39. O quantum doloris fixou-se no grau 5 (cinco) de uma escala de 7 (sete) graus de gravidade crescente.

40. O défice funcional permanente da integridade físico-psíquica do autor foi fixado em 17 (dezassete) pontos.

41. O dano estético permanente do autor fixou-se no grau 3 (três) de uma escala de 7 (sete) graus de gravidade crescente.

42. A repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer do autor fixou-se no grau 4 (quatro) de uma escala de 7 (sete) graus de gravidade crescente.

43. A repercussão permanente na atividade sexual do autor fixou-se no grau 3 (três).

44. Em termos de ajudas medicamentosas autor necessita de analgésicos e anti-inflamatórios.

45. É previsível que o autor no futuro venha a necessitar de cirurgias, tanto artroscopias como para colocação de prótese no joelho e que necessite de realizar fisioterapia.

46. O autor não consegue, em virtude da incapacidade de que padece, tomar posturas de esforço difíceis, incluindo fazer transporte de pequenas cargas (ordem dos 20 kg), a manutenção e limpeza do terreno, horta, árvores e anexos, existentes no logradouro da sua habitação (recursos a alfaias manuais ou mecânicas, cujo manuseio afeta sempre o joelho), bem como apresenta limitação na marcha acelerada e ao subir e descer escadas, a correr, a ajoelhar-se e a acocorar-se.

47. Sofre frequentes as dores no joelho direito.

48. Continua a claudicar.

49. Tem inchaço no joelho se faz uma caminhada mais prolongada.

50. O autor necessita como ajuda técnica permanente o uso de joelheira com barras laterais.

51. A nível físico, o autor deixou de poder praticar qualquer desporto que provoque movimentos de impacto e/ou rotação do joelho, tais como ténis e corrida, cuja prática era regular, assim como alguns jogos de cariz social como o futebol de cinco e até de dançar, atividade que dava bastante prazer ao autor.

52. Bem como ficou afetado na sua vida social, no relacionamento com o seu grupo de familiares, amigos, próximos, incluindo crianças e a disponibilidade física para estas.

53. Como resultado e desde o acidente o autor sofre a nível psicológico de dificuldade em lidar com a sua situação de incapacidade física, mesmo a nível familiar, com grande irritabilidade e insónias.

54. Não se conseguindo abstrair do facto de ser uma pessoa ainda jovem, mas que tem limitações físicas permanentes, o que o deixa bastante triste e combalido.

55. Ficou ainda o autor limitado no campo íntimo, com reflexo no envolvimento sexual em situações que sobrecarregam o joelho, reduzindo a sua performance sexual, reservando a sua atividade sexual para lugares de conforto e em posições vulgares, de diferente erotismo.

56. Para manutenção da massa muscular, de forma a evitar um retrocesso ou agravamento das sequelas, o autor tem necessidade de fazer tratamentos de MFR (duas series, duas vezes ao ano), hidroginástica e musculação em ginásio duas vezes por semana.

57. O autor é Engenheiro Civil de profissão e à data do acidente auferia, ao serviço da empresa (…) – Impermeabilização, Revestimentos e Isolamentos, Lda., a retribuição mensal de € 1.792,13 (mil, setecentos e noventa e dois euros e treze cêntimos) ilíquida e € 1.300,00 (mil e trezentos euros) líquida.

58. Em termos de perda salarial o autor foi ressarcido pelo Instituto da Segurança Social, que deferiu e pagou o subsídio de doença no período compreendido entre 5 de março de 2011 e 9 de junho de 2011, no valor de € 3.685,03 (três mil, seiscentos e oitenta e cinco euros e três cêntimos).

59. O autor não foi ressarcido da perda de retribuição do período compreendido entre os dias 1 de março de 2013 e 18 de março de 2013, na quantia de € 755,00 (setecentos e cinquenta e cinco euros) líquidos.

60. O autor suportou o valor de € 27,00 (vinte sete euros) referente a mensalidade de ginásio de fevereiro de 2013.

61. A entidade empregadora do autor à data do acidente – (…), Lda. –, sendo uma empresa que se dedica à atividade da construção civil, necessitava de ter nos seus quadros um técnico que lhe pudesse assegurar a capacidade técnica de forma a poder ter alvará e assim desenvolver a sua atividade.

62. O autor foi admitido na empresa em setembro de 2010, com a categoria de engenheiro civil, para desempenhar as funções correspondentes a essa categoria profissional e concomitantemente, assinar o alvará da empresa, que até aí estava a ser assegurado pelo Engenheiro (…).

63. Que auferia, apenas para assinar o alvará, a quantia mensal líquida de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros).

64. Foram encetadas diligências pela entidade patronal do autor para a substituição do técnico, de forma a ser aquele a assumir a capacidade técnica da empresa, prevendo-se o seu início em abril de 2011.

65. Face ao acidente e à inerente incapacidade para o trabalho, ficou o autor impossibilitado de assumir o alvará da empresa.

66. O que se traduziu numa perda de remuneração de € 300,00 mensais durante 24 meses, de abril de 2011 a março de 2013, num total de € 7.200,00 (sete mil e duzentos euros).

67. As suas funções eram predominantemente o acompanhamento em obra, com visitas técnicas aos locais onde decorrem, nas suas diferentes fases de execução, o que implica disponibilidade física para se deslocar aos mais variados tipos de geomorfologia/solos, nos mais variados estados de consistência e irregularidade.

68. Implicando ainda, as suas funções, deslocamentos em altura em edifícios, depósitos, reservatórios ou similares e outros que ainda não têm executados, nalgumas fases de construção, os elementos estruturais para os acessos verticais (escadas vulgares ou elevadores), pelo que os acessos aos topos ou coberturas são realizados com recurso a escadas verticais (nos depósitos, ETA´s ou ETAR´s, com muitos degraus sem patamares de descanso), assim como passar por acessos de reduzidas dimensões a espaços chamados de confinados.

69. O autor começou a auferir subsídio de desemprego no dia 19 de abril de 2013, no montante diário de € 36,29 (trinta e seis euros e vinte e nove cêntimos).

70. Em 18 de abril de 2013, o autor deixou de trabalhar por conta da (…) – Impermeabilização, Revestimentos e Isolamentos, Lda., quer pelo facto de o sector da construção civil estar em recessão, quer pelo facto de, nas obras existentes, o autor ter dificuldade em conseguir realizar os atos descritos no ponto 68.

71. O autor nasceu no dia 27 de setembro de 1969.

72. O veículo ligeiro de passageiros, de marca “ROVER”, modelo “214SI”, de cor preta, com matrícula (…), propriedade de réu (…), não tinha seguro de responsabilidade civil emergente de acidente de viação.

Factos não provados

1. Em consequência direta e necessária do atropelamento de que foi vítima, o autor ficou afetado de incapacidade parcial permanente de 19,49 pontos (dezanove vírgula quarenta e nove).

2. O autor despendeu € 39,36 (trinta e nove euros e trinta e três cêntimos) em despesas de correios na troca de correspondência com o réu Fundo de Garantia Automóvel.

3. A título de proporcionais de subsídio de férias do período compreendido entre 5 de março de 2011 e 30 de setembro de 2011, o autor deixou de auferir a quantia de € 166,82 (centos e sessenta e seis euros e oitenta e dois cêntimos).

4. De igual forma, não foram pagas ao autor as quantias referentes a proporcionais do subsídio de natal do período compreendido entre os dias 1 de janeiro de 2013 e 18 de março de 2013, no valor de € 281,66 (duzentos e oitenta e um euros e sessenta e seis cêntimos) líquidos.

5. Bem como as quantias referentes a proporcionais de subsídio de férias do período compreendido entre os dias 1 de novembro de 2012 e 18 de março de 2013, no valor de € 489,32 (quatrocentos e oitenta e nove euros e trinta e dois cêntimos) líquidos.

6. Em que data entrou o autor no mercado de trabalho após o acidente ocorrido no dia 5 de março de 2011.

2. Direito

A decisão recorrida fixou em € 40.000,00 a indemnização devida por danos não patrimoniais e em € 70.000,00 a indemnização devida por danos futuros decorrentes do défice funcional da integridade físico-psíquica de que é portador o A, ora Recorrido e o recurso questiona estes montantes, por exagerados, defendendo que os mesmos deverão ser fixados em € 17.000,00 e € 25.000,00 respetivamente.

2.1. Danos não patrimoniais

O montante da indemnização por danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito é fixado equitativamente pelo tribunal e deve encontrar-se com recurso ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (artigos 496.º, n.os 1 e 4 e 494.º, ambos do Código Civil).
Recurso à equidade, pondera-se no Ac. STJ de 31/5/2012[1], que “não afasta, no entanto, a necessidade de observar as exigências do princípio da igualdade, o que implica a procura de uma uniformização de critérios, naturalmente não incompatível com a devida atenção às circunstâncias do caso. Cumpre “não nos afastarmos do equilíbrio e do valor relativo das decisões jurisprudenciais mais recentes” acórdão de 25 de Junho de 2002 (www.dgsi.pt, proc. nº 02A1321); nas palavras do recente acórdão deste Supremo Tribunal, de 31 de Janeiro de 2012 (www.dgsi.pt, proc. nº 875/05.7TBILH.C1.S1), “os tribunais não podem nem devem contribuir de nenhuma forma para alimentar a ideia de que neste campo as coisas são mais ou menos aleatórias, vogando ao sabor do acaso ou do arbítrio judicial. Se a justiça, como cremos, tem implícita a ideia de proporção, de medida, de adequação, de relativa previsibilidade, é no âmbito do direito privado e, mais precisamente, na área da responsabilidade civil que a afirmação desses vetores se torna mais premente e necessária, já que eles conduzem em linha reta à efetiva concretização do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição.
Os traços fundamentais que caracterizam, neste particular, o caso dos autos mostram-se discriminados nos pontos 16 a 55 dos factos provados e destes decorre designadamente que o A., em consequência das lesões ocasionadas pelo acidente, esteve 6 dias em internamento hospitalar, foi sujeito a duas intervenções cirúrgicas para reconstrução dos ligamentos do joelho direito, esteve 15 dias com défice funcional temporário total e 730 dias com um défice funcional temporário parcial, sofreu quantum doloris fixável no grau 5 numa escala crescente de 1 a 7 e que das lesões lhe resultaram sequelas estéticas (dano estético) permanentes de grau 3 numa escala crescente de 1 a 7, repercussões permanentes nas atividades desportivas e de lazer de grau 4 numa escala crescente de 1 a 7, repercussões permanente na atividade sexual de grau 3 (três), numa escala idêntica, importando ainda não olvidar que, à data do acidente, o A. tinha 41 anos de idade e que o acidente se ficou a dever exclusivamente a negligência do condutor do veículo, o qual abandonou o local sem prestar qualquer auxílio ao sinistrado, ora Recorrido.

A decisão recorrida ponderou este quadro factual e procurou uniformizar o seu juízo com recentes decisões do Supremo Tribunal de Justiça que fixaram indemnizações entre € 20.000,00 e € 50.000,00 para ressarcimento de danos não patrimoniais a lesados em acidentes de viação; nenhum dos casos tratados em tais decisões corresponde ipsis verbis à espécie dos autos, é certo, mas os montantes anotados servem para afirmar que o quantum indemnizatório fixado pela decisão recorrida, € 40.000,00 não se afasta significativamente da orientação do Supremo Tribunal de Justiça em casos que têm pontos de interseção com o caso dos autos, razão pela qual não se justifica, a nosso ver, a redução desta parcela indemnizatória mormente numa situação em que é manifestamente grave a culpa do condutor do veículo ao atropelar o Recorrido fora da faixa de rodagem e a cerca de dois metros e meio para além desta, depois de ter visto perfeitamente que aí circulavam várias pessoas, abandonando o local sem prestar auxílio ao sinistrado (pontos 2 a 5 dos factos provados).

O montante encontrado pela decisão recorrida, acolheu os critérios legais, não olvidou recente e apropriada jurisprudência do STJ, que anotou, e conforma-se com o quadro factual que julgou provado, assim minguando, a nosso ver, razões para a sua redução.
O recurso, nesta parte, improcede.

2.2. A indemnização pelo défice funcional permanente da integridade físico-psíquica/dano biológico.
A perda da capacidade de ganho, já se escreveu “constitui um dano presente, com repercussão no futuro, durante o período laboralmente ativo do lesado e durante todo o seu tempo de vida”[2] ou, lendo noutro lugar, “o dano futuro previsível mais típico prende-se com os casos de perda ou diminuição da capacidade de trabalho e da perda ou diminuição da capacidade de ganho, perda esta caracterizada como “efeito danoso, de natureza temporária ou definitiva, que resulta para o ofendido do facto de ter sofrido uma dada lesão, impeditiva da sua obtenção normal de determinados proventos certos (…) como paga do seu trabalho”[3].
A perda da capacidade de ganho insere-se, pois, no domínio do dano futuro indemnizável, por força do preceituado no artigo 564.º, n.º 2, do Código Civil, que disponde se lê:
“Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior”.
Mas o dano futuro, decorrente da perda da capacidade de ganho, não se circunscreve às incapacidades que envolvam perda efetiva ou redução permanente da capacidade de trabalho ou de ganho do lesado resultante do acidente – conceito puro do domínio laboral – pois casos existem em que o lesado, não obstante as sequelas que do acidente lhe resultaram, pode continuar a desempenhar a mesma atividade laboral que desempenhava antes do acidente não obstante com esforço acrescido e existem também casos em que o lesado não desempenha qualquer atividade profissional, designadamente por não a haver ainda iniciado [a circunstância de, à data do acidente, ser estudante e não ter tido alguma perda de rendimentos de trabalho não esvaece esse direito[4]]; nestes casos fala-se em dano biológico, designação com origem italiana, para se acentuar que não obstante a lesão corporal não envolver como consequência direta a perda da capacidade de ganho, stricto sensu, traduz um prejuízo funcional, com reflexos na vida profissional do lesado (esforço acrescido na sua prestação e perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afetar) e na sua vida recreativa, social, sexual e até sentimental, ou como mais apropriadamente se escreveu no Ac. STJ de 4/10/2005, “o dano biológico traduz-se na diminuição somático-psíquica do indivíduo, com natural repercussão na vida de quem o sofre[5], e também este dano reclama reparação por efeito da tendencial integralidade desta (artigo 562.º e seguintes do Código Civil).
A indemnização por danos patrimoniais, não sendo possível a reposição natural (artigo 562.º do Código Civil) deve, em princípio, corresponder ao valor dos danos, calculados com recurso à teoria da diferença, ou seja, deve corresponder ao resultado da diferença aritmética entre a atual situação do lesado e aquela que existiria se o dano não tivesse ocorrido (artigo 566.º, n.º 2, do Código Civil).
Mas calcular esta diferença, como se tem amiúde repetido, não é tarefa fácil quando, como é o caso, uma das parcelas da equação (a situação que existiria se o dano não tivesse ocorrido) está condicionada por fatores predominantemente aleatórios [a esperança de vida, as possibilidades de progressão na carreira, o nível remuneratório futuro, a evolução dos níveis dos preços, das taxas de juros, da inflação, a própria evolução tecnológica enquanto condicionante da prestação e retribuição do trabalho e outros, como as politicas fiscais e de emprego futuros].
O cálculo deste valor, ainda que indiciariamente objetivado com recurso a tabelas financeiras ou matemáticas, dificilmente corresponderá ao valor exato daquela diferença e daqui que a indemnização não possa ser fixada sem recurso à equidade, como impõe o artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil e constitui orientação da jurisprudência, como decorre, entre outros do Ac. STJ de 15/3/2012, ao significar que “(…) os critérios matemáticos de cálculo do capital correspondente à indemnização por danos patrimoniais futuros são apenas um instrumento ao serviço do juízo de equidade, devendo os resultados alcançados funcionar como valores de referência que devem ser ponderados com outros elementos objetivos cuja relevância emerge e se impõe naturalmente ao julgador (como são o percebimento de uma só vez e em antecipação da indemnização correspondente a danos que se prolongam no futuro por vários anos, a evolução provável da sua carreira profissional, da taxa de juro, etc).[6]
Ainda assim, a jurisprudência como, aliás, a decisão recorrida não deixou de anotar, tem procurado encontrar critérios que reduzam ao mínimo o subjetivismo do tribunal e a margem de arbítrio, como dá conta o Ac. do STJ de 17-12-2009[7] que, esquematizou os princípios e ideias que deverão presidir à quantificação da indemnização em apreço.
Tornando aos autos, não existem dúvidas, por assim se haver demonstrado, que o Recorrido, engenheiro civil de profissão, em consequência das lesões ocasionadas pelo acidente ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psiquica fixável em 17 pontos e que estas sequelas, embora compatíveis com o exercício da sua atividade laboral, implicam esforços suplementares (pontos 57, 40 e 38 dos factos provados).
Caraterizado se mostra, assim, o prejuízo funcional, com reflexos na vida profissional do A. (esforço acrescido na prestação do trabalho e eventuais perdas de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados pelo défice funcional que definitivamente o vai afetar), dimensão patrimonial do chamado dano biológico que justifica indemnização autónoma.
Como se ajuizou no Ac. STJ de 26/1/2017[8], “o dano biológico não se pode reduzir aos danos de natureza não patrimonial na medida em que nestes estão apenas em causa prejuízos insuscetíveis de avaliação pecuniária e naquele estão também em causa prejuízos de natureza patrimonial provenientes das consequências negativas ao nível da atividade geral do lesado”.
A dificuldade está no cálculo desta indemnização, pelas razões já apontadas, acrescidas, no caso, de estarmos perante um prejuízo funcional, um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica (fixável em 17 pontos) e não perante uma incapacidade permanente parcial para o trabalho, cuja fórmula de cálculo da indemnização decorre da lei e fora do domínio laboral tem sido objeto de vasto labor da jurisprudência.
A única referência legal para a determinação do montante desta indemnização é a que decorre da Portaria n.º 377/2008, de 26/5, designadamente do anexo IV, de cuja aplicação, tendo em vista os 17 pontos de défice funcional e que o A. tinha 41 anos de idade à data do acidente, resultaria um valor indemnizatório situado entre € 18.575,73 e € 20.058,30.
Valores que foram encontrados designadamente com recurso à retribuição mínima garantida vigente à data da Portaria (cfr. preâmbulo), ou seja, com base na quantia de € 403,00 (artigo 1.º do D.L. n.º 2/2007, de 3/1) e que não sendo obrigatórios na fase judicial do processo (artigo 1.º, n.º 2, da Portaria), atualizados à luz de critérios objetivos, poderão funcionar como valores de referência a ajustar ao caso concreto segundo juízos de equidade ou, nas palavras do Ac. desta Relação de 15/4/2021[9]não deixam de ser um importante instrumento para fixar uma plataforma base de cálculo que permita, em termos gerais, tratar de forma análoga situações similares, afinando o cálculo com as particularidades do caso”.
Assim e em linha com este aresto, segundo o qual, “aplicando a Tabela IV da Portaria n.º 377/2008, de 26/5, na versão introduzida pela Portaria n.º 679/2009, de 25/06, com as adaptações necessárias a um cálculo mais conforme com a tendência atual da jurisprudência, para uma justa fixação das indemnizações devidas no domínio do dano biológico, que a tabela manifestamente não alcança, somos levados a introduzir alterações para o cálculo da indemnização base, que, no essencial, se atêm a efetuar o cálculo do valor base da indemnização, equacionando o valor por ponto de IPP pelo máximo da tabela (…) corrigindo o cálculo do mesmo, passando a atender ao salário médio mensal dos trabalhadores por conta de outrem disponível na base da PORDATA”, considerando o salário médio mensal dos trabalhadores por conta de outrem, no ano de 2019, € 1.005,10[10], em vez da RMMG de 2007, no valor de € 403,00 e tendo em conta os valores máximo por ponto, constantes na referida tabela, por referência à idade do sinistrado à data do acidente, obtemos o valor de € 50.026,29 [(1.179,90x17x1.005,10):403,00].
Valor indemnizatório que ajustado às particularidades do caso concreto, onde relevam as sequelas físicas que, em consequência das lesões causadas pelo acidente, definitivamente afetarão o Recorrido, entre elas amiotrofia da coxa de 1 centímetro, amiotrofia da perna de 2 centímetros, crepitação da rótula, limitação da mobilidade articular do joelho na flexão a 110º, instabilidade ligamentar mista, a previsibilidade da necessidade de cirurgias e fisioterapia futuras, a impossibilidade de transporte de pequenas cargas (ordem dos 20 kgclaud), as limitações na marcha, a marcha claudicante, e, enfim, a necessidade permanente do uso de joelheira com barras laterais (pontos 43 a 50 dos factos provados), justificam, por equitativo, o montante indemnizatório encontrado pela decisão recorrida.
Improcede o recurso, restando confirmar a decisão recorrida.


3. Custas
Vencido no recurso, incumbe ao Recorrente o pagamento das custas (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).

IV. Dispositivo:
Delibera-se, pelo exposto, em julgar improcedente o recurso, confirmando-se, em consequência, a sentença recorrida.
Custas pelo Recorrente.
Évora, 14/10/2021
Francisco Matos
José Tomé Carvalho
Mário Branco Coelho


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[1] Disponível in www.dgsi.pt
[2] Ac. STJ de 2/5/2012, disponível in www.dgsi.pt
[3] Ac. STJ de 28/10/92, CJSTJ, Tomo IV, página 29.
[4] Ac. STJ de 20/9/2011, sumariado em stj.pt/ficheiros/jurisp-tematica/cadernodanosfuturos2002-2012.pdf.
[5] Disponível em www.dgsi.pt; no mesmo sentido e, entre outros, cfr. AC.STJ de 9/3/2010, disponível no mesmo endereço.
[6] Disponível em www.dgsi.pt.
[7] Disponível em www.dgsi.pt
[8] Disponível em www.dgsi.pt.
[9] Proc. 3496/16.5T8FAR.E1, decisão não publicada, tanto quanto averiguámos.
[10] https://www.pordata.pt/Portugal/Sal%C3%A1rio+m%C3%A9dio+mensal+dos+trabalhadores+por+conta+de+outrem+remunera%C3%A7%C3%A3o+base+e+ganho-857.