Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
207/13.0TBSTR-B.E1
Relator: JOSÉ ANTÓNIO MOITA
Descritores: OPOSIÇÃO À PENHORA
FUNDAMENTOS
Data do Acordão: 11/11/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1- Em face da especificidade do procedimento em questão, entende-se pacificamente como sendo taxativa a enumeração dos fundamentos do incidente de oposição à penhora descriminados nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 784.º do CPC.
2- Assim, quando no n.º 2 do artigo 785.º do CPC se prevê a aplicação, com “as necessárias adaptações”, ao incidente de oposição à penhora do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 732.º do mesmo Código, não pode deixar de se interpretar o disposto na alínea b) do n.º 1 do mencionado artigo 732.º como aludindo apenas aos fundamentos para oposição mencionados nas ditas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 784.º do CPC e não aos fundamentos prevenidos nos artigos 729.º a 731.º do CPC, uma vez que estes últimos se aferem expressamente aos fundamentos para oposição à execução e não a fundamentos para oposição à penhora.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 207/13.0TBSTR-B.E1

Tribunal Judicial da Comarca de Santarém –
Juízo de Execução do Entroncamento – Juiz 3
Apelante: (…)
Apelado: (…)
***
***
Sumário do Acórdão
(Da exclusiva responsabilidade do relator – artigo 663.º, n.º 7, do CPC)
(…)
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Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora no seguinte:
I – RELATÓRIO
Por apenso à acção executiva para pagamento de quantia certa, instaurada contra si por (…) veio o Executado (…) suscitar incidente de oposição à penhora, sobre o qual recaiu despacho liminar com o conteúdo que a seguir se transcreve:
“Oposição à Penhora (artigo 784.º CPC)
1 - Despacho de indeferimento liminar da oposição à penhora
(artigos 732.º, n.º 1 e 785.º, n.º 2, do Código de Processo Civil)
O executado deduz oposição à penhora, alegando que a quantia exequenda não é a devida.
Preceitua o artigo 785.º que a oposição à penhora pode ser deduzida no prazo de 10 (dez) dias a contar da notificação do acto de penhor.
Preceitua o artigo 784.º do Código de Processo Civil que sendo penhorados bens do executado o mesmo pode opor-se à penhora em caso de inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada, da imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda e da incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência.
No caso vertente, entende o tribunal que o fundamento invocado não se enquadra nos fundamentos previstos no artigo 784.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Na verdade, o fundamento invocado encontra-se no âmbito dos embargos de executado e não no âmbito da oposição à penhora.
Assim sendo, deve a oposição à penhora ser liminarmente indeferida.
Face ao exposto, decide-se indeferir liminarmente a oposição à execução mediante embargos nos termos do artigo 732.º, n.º 1, alínea b), ex vi artigo 785.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Civil.
Valor: o da execução (artigos 296.º, 299.º, 304.º e 306.º do Código de Processo Civil).
Custas pelo executado (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
Notifique.”
*
Inconformado com a decisão o oponente apresentou recurso de apelação, aduzindo as seguintes conclusões:
“CONCLUSÕES:
(…) *
O Embargado/Apelado não respondeu ao recurso.
*
O recurso foi admitido na 1ª Instância como apelação, a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
*
Já neste Tribunal da Relação foi proferido despacho pelo relator convidando ao aperfeiçoamento das conclusões recursivas, que passamos a transcrever:
“I- Resulta do artigo 639.º, n.º 1, do CPC, que:
O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.”.
II- Decorre, outrossim, do artigo 652.º, n.º 1, do CPC, que ao relator incumbe deferir todos os termos do recurso até final, designadamente:
a) […] convidar as partes a aperfeiçoar as conclusões das respetivas alegações, nos termos do n.º 3 do artigo 639.º”.
III- Por seu turno, dispõe o referido n.º 3 do artigo 639.º do CPC, que:
Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetiza-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada”.
IV- A este propósito diz-nos o Conselheiro António Abrantes Geraldes (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, 2018, a páginas 155), que:
“As conclusões serão complexas quando não cumpram as exigências de sintetização a que se refere o n.º 1 (prolixidade) ou quando, a par das verdadeiras questões que interferem na decisão do caso, surjam outras sem qualquer interesse (inocuidade) ou que constituem mera repetição de argumentos anteriormente apresentados.
Complexidade que também poderá decorrer do facto de se transferirem para o segmento que deve integrar as conclusões, argumentos, referências doutrinais ou jurisprudenciais propícias ao segmento da motivação… Nestes casos, trata-se fundamentalmente de eliminar aquilo que é excessivo, de forma a permitir que o tribunal de recurso apreenda com facilidade as verdadeiras razões nas quais o recorrente sustenta a sua pretensão de anulação ou de alteração do julgado”.
V- Ora, analisando criteriosamente o segmento das conclusões introduzidas no requerimento de recurso do Apelante (…) verifica-se que as mesmas padecem notoriamente de falta da necessária sintetização percebendo-se que aquele logrou canalizar para o segmento das apelidadas “Conclusões” recursivas toda a argumentação que expos no segmento da motivação recursiva, limitando-se como tal a reproduzi-la, repetindo-a, no segmento reservado às conclusões recursivas.
VI- Na verdade, cotejando o teor do segmento respeitante à motivação, ou corpo das alegações, com o reservado às conclusões constata-se que qualquer um deles se espraia por quatro páginas não existindo qualquer distinção entre o que foi referido na motivação e o que foi exposto nas conclusões, abarcando estas, inclusive, referências jurisprudenciais anteriormente feitas no corpo das alegações.
VII- O procedimento seguido em concreto pelo Apelante em apreço contende, assim, com a razão de ser das conclusões recursivas não contribuindo para que o Tribunal de recurso filtre com a desejável facilidade e rapidez as concretas razões que justificam a pretensão daquele em ver alterado o julgado da 1ª instância, apresentando, sublinhe-se, conclusões de teor idêntico ao da própria motivação, repetindo esta.
VIII- Destarte, convido o Apelante a no prazo de cinco dias apresentar segmento de conclusões recursivas devidamente sintetizado”.
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O Apelante veio em tempo apresentar peça processual respondendo ao convite reformulando as conclusões iniciais nos seguintes termos:
CONCLUSÕES:
I- O Recorrente por apenso aos autos de Execução, deduziu oposição à penhora, tendo sido o mesmo indeferido liminarmente pelo despacho ora recorrido.
II- Tendo o aqui Recorrente alegado na oposição que a quantia exequenda não é por ele devida.
III- Bem como o montante que traduz o crédito é significativamente inferior ao pedido na acção executiva.
IV- Entendeu o Despacho recorrido, que o fundamento alegado pelo aqui recorrente foi “a quantia exequenda não é a devida”, concluindo que o mesmo não se enquadra nos fundamentos previstos no artigo 784.º, n.º 1, do CPC, e sim nos embargos de executado
V- Não obstante ter requerido a nomeação de advogado, a Ordem dos Advogados veio a dar sem efeito a nomeação feita e consequentemente ao arquivamento do processo de nomeação.
VI- Pelo que o aqui Recorrente nunca esteve representado nos autos supra identificados.
VII- Assim, o Tribunal a quo deveria ter alertado o aqui Recorrente, nos termos e para os efeitos do artigo 47.º, n.º 3, alínea b), do CPC.
VIII- Pelo que a primeira e única vez em que o aqui Recorrente esteve representado foi quando mandatou o advogado que assina o presente recurso e que assinou a oposição à penhora.
IX- O despacho recorrido em sede de Oposição à penhora não procedeu à apreciação dos factos alegados e das provas apresentadas pelo aqui recorrente.
X- Sendo que tais factos e provas são essenciais para o apuramento da verdade e uma vez provados tornam inadmissível a penhora sobre os bens do aqui Recorrente.
XI- O Recorrente viveu em união de facto com sra. (…), filha do exequente, durante essa relação, constituíram uma sociedade comercial denominada “(…)” de comércio de carnes a retalho, produtos alimentares e não alimentares.
XII- Por dificuldades de liquidez dessa empresa, recorreram ao auxílio do exequente, que os auxiliou com quantias que totalizaram entre € 15.000,00 a € 20.000,00.
XIII- Não obstante, o recorrente ter feito uma declaração de divida no notário, a mesma foi feita debaixo de problemas que estava a atravessar na relação de união de facto que tinha com a filha do exequente.
XIV- Declaração essa que não tem a virtualidade de provar a existência dessa divida (vide acórdão supra mencionado).
XV- Portanto, a quantia exequenda foi emprestada em benefício da empresa da filha do exequente.
XVI- Pelo que, estamos perante uma factualidade subsumível na alínea c) do n.º 1 do artigo 784.º do Código de Processo Civil.
XVII- Factualidade que podia ser alegada em sede de oposição à execução, mas que o legislador dá a possibilidade de ser alegada na oposição à penhora, tendo em conta o disposto no n.º 2 do artigo 785.º, conjugado com o artigo 732.º, n.º 1, alínea b), com remissão para o artigo 731.º, todos do Código de Processo Civil.
XVIII- Assim, s.m.o., o despacho recorrido fez uma interpretação errada do artigo 784.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil.
Nestes termos e nos mais que V. Exas. doutamente suprirão, deverá, pois, ser revogado o Despacho recorrido e substituído por outro que receba a Oposição à penhora”.
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Correram Vistos.
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Dispõe o artigo 639.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (doravante apenas CPC), que:
“3- Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada.”
O Recorrente foi convidado a aperfeiçoar as respectivas conclusões recursivas no sentido de as sintetizar e apresentou em prazo nova peça recursiva, à qual o Apelado não respondeu.
Apreciando:
Cotejando o teor das conclusões inicialmente apresentadas com o das conclusões constantes da peça processual enviada aos autos em resposta ao convite ao aperfeiçoamento verifica-se ter havido algum esforço e empenho da parte do Apelante no sentido de as tornar menos extensas e complexas em prol do cumprimento legal do dever de sintetização sendo certo que se mostra suficientemente perceptível a indicação dos fundamentos pelos quais se pede a alteração do julgado.
Por outro lado, não se olvida o sentido jurisprudencial emanado do Supremo Tribunal de Justiça que vem sustentando a necessidade de parcimónia e cautela na apreciação das conclusões aperfeiçoadas, com vista a determinar a rejeição do recurso apenas em situações limitadas.
Neste sentido, entre outros, destacamos o recente Acórdão, relatado pela Conselheira Rosa Ribeiro Coelho, proferido em 19/10/2017 (processo n.º 1577/14.9T8STR.E1.S1), de que nos permitimos reproduzir o seguinte trecho, constante da respectiva nota sumativa:
“II-Vem, desde há muito, sendo sedimentado na jurisprudência deste STJ o entendimento segundo o qual só em casos extremos a deficiente reformulação das conclusões, após convite dirigido pelo relator à parte deve dar lugar ao não conhecimento do recurso.
III-Introduzindo o recorrente, após convite formulado para o efeito, uma significativa redução do número e conteúdo das conclusões e sendo facilmente apreensível, embora ainda longe da perfeição, a linha de raciocínio, não há motivo para deixar de conhecer o recurso”.
Dito, entendemos ser de conhecer do objecto do recurso.
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O recurso é o próprio e foi admitido adequadamente quanto ao modo de subida e efeito.
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II – OBJECTO DO RECURSO
Nos termos do disposto no artigo 635.º, n.º 4, conjugado com o artigo 639.º, n.º 1, ambos do CPC, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recurso, salvo no que respeita à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas ao caso concreto e quando se trate de matérias de conhecimento oficioso que, no âmbito de recurso interposto pela parte vencida, possam ser decididas com base em elementos constantes do processo, pelo que no caso vertente impõe-se apreciar do mérito da decisão impugnada.
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III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos a considerar são os que constam já descritos no segmento atinente ao “Relatório” desta peça processual, a que se acrescenta neste momento o teor integral do requerimento inicial de oposição à penhora:
“(…), Executado nos autos supra identificados, vem, nos termos do disposto nos artigos 784.º e 785.º do C.P.C, opor-se à penhora nos termos e pelos seguintes fundamentos:
Da Falta de Notificação da Penhora:

O executado ainda não foi notificado da penhora objecto da presente oposição, uma vez que o Sr. Agente de Execução enviou essa notificação para a seguinte morada: Rua dos (…), n.º 167, (…), sendo que o executado não reside nessa morada há quase sete anos, dado que reside na Rua dos (…), n.º 108, (…).

O executado veio a tomar conhecimento da penhora a que se opõe na medida em que no dia 25/05/2021, a CCAM de Salvaterra de Magos o contactou a informar do bloqueio da sua conta bancária para efeitos de penhora dos seus saldos bancários.

Não obstante não ter sido ainda notificado dessa penhora, o mesmo ao ter conhecimento da mesma pela forma supra mencionada, vem pelo presente opor-se a essa penhora e às demais penhoras que incidem sobre o seu património no âmbito dos presentes autos.

Inadmissibilidade da penhora sobre quaisquer bens do Executado.

O Executado desde que se iniciou o presente processo há já oito anos nunca esteve representado por advogado, sendo que nos presentes autos essa representação é obrigatória (artigo 58.º do Código de Processo Civil).

Ainda que tenha requerido apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, apoio que foi deferido (vide Refª 227170), a verdade é que a Ordem dos Advogados veio a dar sem efeito a nomeação da advogada nomeada e o consequente arquivamento do respectivo processo (vide Refª 287484).

Não tendo o executado sabido os motivos de tal arquivamento.

Assim pela primeira vez o Executado vem opor-se às penhoras que incidem sobre o seu património pelos seguintes factos:

O executado viveu em união de facto com a senhora (…), filha do Exequente.

No âmbito dessa relação o Exequente e a Sra. (…) constituíram uma sociedade comercial a (…) de comércio de carnes a retalho, produtos alimentares e não alimentares, sendo única sócia a Sra. (…) e o executado um dos Gerentes (cfr. Documento que se junta como Doc. 1 e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
10º
Durante o funcionamento dessa empresa, veio a mesma a passar por dificuldades económicas, que a impediam de cumprir com os seus compromissos.
11º
Tendo o Executado e a sra. (…) recorrido à ajuda monetária do Exequente a fim de poder a empresa cumprir com alguns dos seus compromissos.
12º
Essa ajuda foi concedida a título de empréstimos à empresa (…), não a título pessoal ao Executado (cfr. Documento que se junta como Doc. 2 e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
13º
Empresa que viria a cessar a sua actividade por não conseguir, de todo, cumprir com os seus compromissos em 2007 (vide doc. 1).
14º
Contudo, o montante concedido pelo Exequente está muito longe da quantia exequenda, dado que, os valores emprestados pelo Exequente rondam entre os € 15.000,00 a € 20.000,00.
15º
O exequente sabe que o titulo executivo da presente acção, alicerça-se numa declaração de divida feita no notário, em que o mesmo se declara devedor da quantia exequenda. Porém, segundo o Executado essa declaração foi feita numa fase atribulada da sua vida, nomeadamente, durante a fase de grande instabilidade que a (…) estava a atravessar com a constante exigência dos fornecedores a exigirem o pagamento dos seus créditos, e em simultâneo com a instabilidade que o mesmo estava a atravessar na relação de união de facto que tinha com a filha do Exequente.
16º
No entanto, essa declaração que serve de titulo executivo não tem a virtualidade de provar a existência dessa dívida, pois, a quantia que o Exequente se diz credor não foi concedida aquando da declaração no notário e perante este. Neste sentido, vide o acórdão de uniformização de jurisprudência do STJ n.º 3/2018 e o acórdão da Relação de Coimbra, Proc. 8470/15.6T8CBR.C1, Relator Falcão de Magalhães, proferido em 09-01-2018, consultáveis em www.dgsi.pt.
17º
Assim, esse valor emprestado pelo Exequente foi em beneficio da (…) da qual a filha do Exequente era a única sócia.
18º
No formulário electrónico, da exposição dos factos que fundamentam a pretensão do Exequente, consta o seguinte:
“No dia 07/03/2006, o executado assinou presencialmente no cartório Notarial de (…), em Lisboa, perante funcionária com poderes delegados, uma Declaração de Dívida em que o Executado se confessa devedor ao Exequente (…), pela quantia de € 64.695,42 (sessenta e quatro mil, seiscentos e noventa e cinco euros e quarenta e dois cêntimos), cfr. Declaração que se junta como Doc. 1”.
“A dívida teve origem em empréstimos de várias quantias que o Exequente foi fazendo ao Executado”.
“De acordo com o combinado verbalmente a dívida seria para pagar até final do ano 2006.
Contudo, não obstante as várias insistências por parte do Exequente quer diretamente quer através da sua filha e das várias promessas de pagamento feitas pelo Executado, nenhuma quantia foi entregue por conta do pagamento da dívida”.
“Em Setembro de 2012 foi enviada ao Executado uma interpelação para pagamento com prazo até 31/12/2012, com a cominação de que a falta de pagamento implicaria interposição de ação judicial logo após aquele prazo, cfr. Doc. 2”.
“A quantia de € 64.695,42 encontra-se por pagar na presente data”.
“O Executado não pagou e nada disse, pelo que se requer a dívida, através do presente processo executivo, acrescida de juros, taxa de justiça paga e demais encargos com o processo executivo”.
19º
Ora, conforme se retira da leitura do formulário electrónico acima citado, o mesmo limita-se a mencionar que “A dívida teve origem em empréstimos de várias quantias que o Exequente foi fazendo ao Executado” e nada mais diz. Pelo que, questiona-se por pertinente, empréstimos a que título, para que finalidade? Segundo o Executado para que a (…) lograsse cumprir os seus compromissos perante os seus credores.
20º
Contudo, a quantia concedida a título de empréstimo pelo Exequente está muito longe da quantia pedida na presente acção, pois, segundo o Executado, essa quantia rondou os € 15.000 a € 20.000.
Nestes termos, e nos de mais de direito do douto suprimento de V. Exa. deverá a presente oposição ser recebida e procedente por provada e, em consequência, seja ordenada a extinção e o cancelamento das penhoras efectuadas sobre o património do Executado”.
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IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Impõe-se referir previamente que por nenhuma consequência jurídica ter o ora Apelante retirado do que referiu nos pontos V a VIII das suas conclusões recursivas aperfeiçoadas nada se nos oferece determinar, sendo certo que, a talhe de foice, sempre se acrescenta que se o Apelante pretendia estar representado mais cedo no processo impunha-se que tivesse constituído mandatário judicial no mesmo logo após a tomada de conhecimento da decisão de arquivamento do processo de nomeação de patrono que, conforme decorre da consulta do suporte virtual da acção executiva, foi proferida pelo competente organismo da Ordem dos Advogados em 25/11/2014, apenas o tendo feito por procuração forense datada de 20/05/2021 e remetida a estes autos em 21/06/2021, não recaindo sobre o Tribunal a quo o ónus de o alertar “para os efeitos do artigo 47.º, n.º 3, alínea b), do CPC”, até porque a situação factual relatada pelo Apelante não configura sequer um cenário de anterior renúncia a mandato.

Entremos, então, na apreciação do mérito da decisão impugnada.
Resulta do artigo 784.º do CPC, epigrafado “Fundamentos da oposição” o seguinte:
1- Sendo penhorados bens pertencentes ao executado, pode este opor-se à penhora com algum dos seguintes fundamentos:
a) Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada;
b) Imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda;
c) Incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência”.
Da leitura do requerimento inicial respeitante ao incidente de oposição à penhora integralmente transcrito supra percebemos com relativa clareza que a matéria factual invocada pelo Apelante não é, desde logo, passível de integrar a previsão das alíneas a) e b) acima reproduzidas.
A decisão recorrida entendeu ainda, pese embora de forma notoriamente perfunctória, não ser tal matéria igualmente integrável na previsão da alínea c), mas apenas nos fundamentos dos embargos de executado, sendo aí que reside a discordância do Apelante, o qual, contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, entende que o que alegou permite fundamentar a sua oposição à penhora na previsão de tal alínea c).
Note-se, porém, que em parte alguma do requerimento inicial de oposição à penhora o Apelante menciona expressamente a alínea c), ou qualquer outra das contidas no n.º 1 do artigo 784.º do CPC, com vista a fundamentar devidamente no plano jurídico a sua pretensão, limitando-se a invocar genericamente logo no inicio do dito requerimento os artigos 784.º e 785.º do CPC.
Vejamos, sem embargo, se lhe assiste razão.
Sobre a previsão da dita alínea c) dizem-nos António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe de Sousa (“Código de Processo Civil Anotado”, Vol. II, 2020-Reimpressão, Almedina, Coimbra, página 179), o seguinte:
“Abrangem-se aqui as seguintes situações: penhora de bens do herdeiro do devedor que aquele não recebeu deste (artigo 744.º, n.º 1); penhora de bens que, por convenção entre credor e devedor, não integram os designados para responder pela dívida (artigo 602.º do Código Civil), penhora de bens deixados ou doados com a cláusula da exclusão da responsabilidade por dívidas do beneficiário, no condicionalismo do artigo 603.º, n.º 1, do Código Civil; penhora por impulso do credor cessionário e/ou dos credores posteriores à cessão de bens pelo devedor aos seus credores para que estes liquidem os bens e repartam entre si o produto da venda (artigo 883.º, in fine, do Código Civil).”
Essencialmente na mesma senda escreve Rui Pinto (“A Ação Executiva”, 2018, AAFDL Editora, Lisboa, páginas 677 e 679), o seguinte:
“Tal como sucede com a oposição à execução, também esta oposição tem fundamentos, i.e., causas de pedir restritas. Elas aparecem-nos arroladas no artigo 784.º, n.º 1. […]
Estas causas têm em comum tratar-se, sempre, de ilegalidades objetivas do ato de penhora, ou seja, em razão do objeto respetivo e dizem sempre respeito a bens do executado” (página 677).
[…]
“O terceiro fundamento (alínea c)) é a incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência.
Relembrem-se aqui os casos de limitação convencional e legal de responsabilidade e os casos de bens não transmissíveis ou mesmo fora do comércio” (página 679).
Relendo o requerimento inicial de oposição à penhora e mormente o alegado nos artigos 9.º a 20.º do mesmo percebemos que o Apelante se insurge, basicamente, contra o montante da quantia entendida como exequenda, que sustenta ser muito superior à quantia efectivamente em dívida ao Exequente, bem como contra o facto de o título executivo dado à execução respeitar à dita quantia efectivamente em dívida, entendendo não ser título executivo da mesma.
Ora, tal acervo factual poderia fundamentar uma oposição à própria execução, por embargos de executado, de acordo com o disposto nos artigos 731.º e 729.º, a), do CPC, respectivamente, hipótese que, porém, no caso vertente, não se coloca, pois há muito que se esgotou o prazo para o Apelante poder reagir através de oposição, por meio de embargos, à própria execução.
O que não pode de todo é fundamentar uma oposição à penhora, mormente fundada na alínea c), do n.º 1 do artigo 784.º do CPC, como sustenta o Apelante, desde logo atendendo ao entendimento acima exposto pelos Autores citados nas obras igualmente identificadas, que também sufragamos, que parte da existência de ilegalidades objetivas do acto de penhora, não se podendo com razoabilidade fazer qualquer tipo de analogia entre o caso vertente e as várias hipóteses descritas pelos ditos Autores no respectivo comentário à previsão da mencionada alínea c).
Note-se que o Apelante ao sustentar juridicamente nas respectivas conclusões recursivas a aplicação ao caso vertente do normativo previsto no artigo 731.º do CPC, incorre, a nosso ver, em patente erro de interpretação, pois o artigo 785.º, nº 2, parte final, do CPC, ao mandar aplicar ao incidente de oposição à penhora, designadamente, o disposto no n.º 1 do artigo 732.º do dito Código (como tal e além do mais o disposto na alínea b) do dito n.º 1), deixa claro que tal aplicação será feita com “as necessárias adaptações”, o que só pode significar que o julgador deverá indeferir liminarmente o incidente de oposição à penhora se o fundamento não se enquadrar nos fundamentos (taxativamente previstos), para o incidente de oposição à penhora que estão prevenidos, como já sabemos, unicamente nas alíneas a) a c) do n.º 1. do artigo 784.º do CPC, pois a relevar-se outra interpretação (mormente a do Apelante), que considerasse tal qual o que consta do elemento literal da alínea b) do n.º 1 do artigo 732.º do CPC, ou seja a referência aos artigos 729.º a 731.º, não só não se estaria a interpretar com “as necessárias adaptações”, que a especificidade do incidente de oposição à penhora requer, como, mais grave ainda, estaria a admitir-se como válidos para deduzir aquele incidente uma série de fundamentos para além dos que constam das alíneas a) a c) , do n.º 1 do artigo 784.º do CPC, sublinhando-se que tal descrição é pacificamente entendida pela doutrina como taxativa e não como meramente enunciativa, ou exemplificativa.
Na esteira do que acabamos de sustentar chamamos aqui novamente à colação a lição de Rui Pinto (obra citada, pág. 681), que a propósito do n.º 2 do artigo 785.º do CPC, nos elucida nos termos que passamos a transcrever:
“O juiz profere depois despacho liminar, ex vi artigo 732.º, n.º 1, o qual pode ser de indeferimento liminar, por intempestividade, por o fundamento não ser uma das alíneas do artigo 784.º, n.º 1, ou por manifesta improcedência” (realce a itálico nosso).
Nos termos expostos é, pois, de considerar como integralmente improcedentes as conclusões recursivas do Apelante.
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V – DECISÃO
Termos em que, face a todo o exposto, acordam os Juízes que compõem este Tribunal em negar provimento ao presente recurso de Apelação interposto pelo Apelante (…), decidindo, em consequência, o seguinte:
a) Confirmar a decisão recorrida;
b) Fixar as custas a cargo do Apelante (artigo 527.º, n.º 1, 1.ª parte e n.º 2, do CPC).
*
DN.
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Évora, 11/11/2021
José António Moita (Relator)
Silva Rato (1º Adjunto)
Mata Ribeiro (2º Adjunto)