Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
162/14.0PATVR.E1
Relator: ANTÓNIO JOÃO LATAS
Descritores: CONCURSO DE INFRACÇÕES
DEFERIMENTO DA COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO AO TRIBUNAL SINGULAR
LIMITE MÁXIMO DA PENA
INSUFICIÊNCIA PARA A DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA
REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS
Data do Acordão: 12/21/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSOS PENAIS
Decisão: PROVIDO O RECURSO DO MP. PROVIDOS EM PARTE OS RECURSOS DOS ARGUIDOS
Sumário:
1. Resulta com clareza do art. 16.º nºs 3 e 4 do CPP que tanto no caso de unidade criminosa como de concurso de crimes o tribunal singular não pode aplicar pena superior a 5 anos de prisão quando o MP fizer uso da possibilidade de sujeitar o arguido a julgamento por tribunal singular prevista naquele art. 16.º nº3 do CPP.

2. A preterição daquele limite não constitui, porém, violação de norma de competência do tribunal com a correspondente nulidade (al. e) do art. 119.º do CPP), contrariamente ao que parece entender o arguido recorrente, uma vez que o art. 16.º do C. Penal não prevê a competência de outro tribunal para aplicar pena superior a 5 anos de prisão, antes fixa um novo limite máximo da pena aplicável, conforme entendimento há muito estabilizado.

3. Assim, verifica-se erro de direito por violação do limite máximo de pena legalmente estabelecido, pelo que impõe-se a revogação da sentença recorrida nesta parte, determinando-se, em substituição, a pena única a aplicar dentro da moldura legal resultante dos nºs 3 e 4 do art. 16º., de acordo com os critérios estabelecidos no art. 77.º do C. Penal.

4. Uma vez que o tribunal de julgamento não considerou provados ou não provados factos alegados pelo arguido com interesse para a determinação da sanção, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto com esse fundamento não é admissível por falta de objeto, verificando-se antes o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada previsto na al. a) do nº2 do art. 410.º do CPP que implica o reenvio do processo para novo julgamento parcial, nos termos do art. 426.º do CPP, sobre os factos invocados pelo recorrente e não apreciados pelo tribunal a quo.
Decisão Texto Integral:
Em conferência, acordam os Juízes na 2ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora

I. Relatório

1. – Nos presentes autos de processo comum com intervenção do tribunal singular que correu termos na secção de competência genérica (J1) da Instância local de Tavira da Comarca de Faro, o MP requereu o julgamento com intervenção do tribunal singular, ao abrigo do disposto no art. 16º nº 3 do CPP, dos arguidos:

- HM, solteiro, estudante, nascido a 16/12/1996, natural de Faro;
- HT, solteiro, nascido a 22/03/1996, natural de Faro;
- FJ, solteiro, nascido a 24/02/1993, natural de Faro, atualmente sujeito a prisão preventiva à ordem do processo 257114.0TAOLH, do M.P. de Olhão e
- HG, solteiro, nascido a 26/01/1996, natural de Faro, a quem o MP imputara a prática, em co-autoria material, na forma consumada, de um crime de roubo p. e p. pelos art. 210.°, nºs 1 e 2 al. b) ex vi art.° 204.° n. 2 al. f) do Código Penal, e ao arguido FJ ainda a prática, em autoria material e concurso efectivo com o crime indicado, um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.° 86.°, n.º 1 al. c), ex vi artigos 2.° al. x) art.° 3.° n. 2 al. 1) todos da Lei n. 5/2006, de 23/02, com as alterações introduzidas pela Lei n. 17/2009, de 6/05, Lei n. 26/2010 de 30-08 e Lei n. 12/2011, de 27/04.

2. - Realizada a Audiência de discussão e julgamento o tribunal a quo decidiu:

- Condenar os arguidos HM, HT, HG e FJ pela prática, em co-autoria material, na forma consumada, de um crime de roubo p. e p. pelos art.° 210.°, nos 1 e 2 al. b) ex vi art. 204.° n 2 al. f) do Código Penal - o arguido HM na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período 3 anos e 6 meses, subordinada ao cumprimento de regime de prova; o arguido HT na pena de 3 anos e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período 3 anos e 3 meses, subordinada ao cumprimento de regime de prova; o arguido HG na pena de 8 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano e o arguido FJ na pena de prisão de 5 anos de prisão.

b) Condenar o arguido FJ pela prática em autoria material, na forma consumada e em concurso efetivo, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.°, n. 1 al. c), ex vi artigos 2.° al. x) art.° 3.° n. 2 al. 1) todos da Lei n.º 5/2006, de 23/02, com as alterações introduzidas pela Lei n. 17/2009, de 6/05, Lei n. 26/2010 de 30/08 e Lei n. 12/2011, de 27/04, na pena de 1 ano de prisão.

c) Realizado o cúmulo jurídico das duas penas parcelares aplicadas ao arguido FJ, condenar o arguido na pena única de 5 anos e 6 meses de prisão

3. – Inconformados, o MP e os arguidos FJ e HM interpuseram recurso da sentença.

3.1. O MP extrai da sua motivação as seguintes conclusões:

«CONCLUSÕES:
1 - Nos presentes autos, o Ministério Público deduziu acusação contra os arguidos HM, HT e FJ, HG, imputando-lhes, em co-autoria, a prática de um crime de roubo, e, no que concerne ao arguido FJ, além do crime de roubo, foi-lhe também imputada a prática de um crime de detenção de arma proibida;

2 - Porque a moldura legalmente prevista para o crime de roubo (e, consequentemente, também no que se reporta à moldura resultante do concurso da pena aplicável a tal crime, em concurso com a pena aplicável ao crime de detenção de arma proibida) é superior a 5 anos de prisão, o Ministério Público aplicou o disposto no artigo 16.º, n.º3, do Código de Processo Penal, requerendo a sujeição dos arguidos a julgamento em Tribunal Singular;

3 - Realizado o julgamento, o Tribunal a quo condenou os arguidos HM na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período subordinada a regime de prova; HT na pena de 3 anos e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, subordinada tal suspensão a regime de prova; HG na pena de 8 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano; FJ na pena única de 5 anos e 6 meses de prisão;

4 - Ora, perante a utilização da faculdade a que alude o disposto no artigo 16.º, n. º3, do Código de Processo Penal, o Tribunal a quo não poderia ter aplicado ao arguido FJ pena de prisão superior a 5 anos;

5 - Ao determinar medida concreta de pena superior a 5 anos, violou o Tribunal a quo o disposto no n. º 4 do artigo 16.°, do Código de Processo Penal;

6 - Assim deverá a sentença ser revogada nessa parte, determinando-se que seja fixada pena de limite inferior a 5 anos de prisão, assim se fazendo a acostumada justiça.»

3.2. Por sua vez, o arguido FJ extrai da sua motivação as seguintes conclusões:

«CONCLUSÕES:
1º- O Recorrente não se conforma com a decisão de que ora recorre na parte em que a mesma o condena na pena de 5 anos e 6 meses de prisão.

2º- O presente recurso tem por objeto a mediada da pena aplicada ao Arguido, a condenação a pena de prisão efetiva de 5 anos e 6 meses, entendendo o Recorrente que o Tribunal a quo não tinha competências para exceder os 5 anos, e que ainda assim, a mesma é excessiva e manifestamente desproporcional.

3º- O Tribunal não pode aplicar pena de prisão superior a 5 anos, nos termos do artigo 16º., nº.4, sempre que o Ministério Público, na acusação, faça uso do artigo 16.º, n.º3 do Código de Processo Penal.

4º- Enferma assim a sentença de nulidade insanável, nos termos do disposto no 119º, al. e) e 122º, n.º 1do Código de Processo Penal, por violação das regras de competência do tribunal singular, devendo ser revogada a sentença proferida, e sua substituição por outra.

5º-Ainda quanto à pena aplicada, o recorrente considera que a mesma viola o disposto no art. 40º do Código Penal, na falta de proporcionalidade entre a aplicação da pena e a medida da culpa do arguido.

6º- A medida concreta da pena deve ter em consideração a finalidade de prevenção especial, de ressocialização do arguido ou de suficiente advertência, no sentido de retirar este agente do caminho criminoso, o que não foi devidamente ponderado pelo Tribunal a quo.

7º-O artigo 40º do Código Penal refere que a aplicação das penas e medidas de segurança visam a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, não podendo, em caso algum, ultrapassar a medida da culpa.

8º- Salvo o devido respeito por opinião contrária, entende o recorrente que o Tribunal a quo não teve em devida consideração a pessoa do arguido, os factos, os testemunhos em sede de audiência de julgamento, a idade do arguido, bem como a situação familiar do mesmo.

9º- A pena aplicada pelo Tribunal a quo, para além de violar a competência do Tribunal Singular e exceder os 5 anos, foi manifestamente desproporcionada e violadora do disposto no art. 71º do Código Penal.

10º- A condenação do arguido deverá ser numa pena mais harmoniosa, proporcional e justa, de acordo com o disposto no Artigo 71.º do Código Penal, que não deverá ultrapassar o limite mínimo, por entender que desta forma se realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, a proteção dos bens jurídicos ofendidos e a reintegração do agente na Sociedade.

11º- A culpa do arguido deverá ser assim, o limite inultrapassável da pena.

12º- A pena de 5 anos e 6 meses de prisão deverá ser revogada, substituída por outra, inferior a 5 anos, e próxima da pena aplicada aos restantes arguidos.

Termos em que deve conceder-se integral provimento ao recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA!»

3.3. Por último, o arguido HM extrai da sua motivação as seguintes conclusões:

- «IV - DAS CONCLUSÕES

A. Quer do teor de fls. 658 e de 659, resulta prova documental apresentada pelo ora Recorrente antes do inicio das sessões de Audiência de Julgamento que vieram efectivamente a culminar na prolação da decisão ora recorrida, ainda que posteriormente à sessão adiada de 23 de Maio de 2016.

B. Estes factos são anteriores ao inicio das sessões de Audiência de Julgamento que vieram efectivamente a culminar na prolação da decisão ora recorrida, ainda que posteriormente à sessão adiada de 23 de Maio de 2016.

C. Desta prova documental de fls. 658 e 659 resultam factos relevantes para a boa decisão da boa causa e para a determinação da pena a ser aplicada ao ora Recorrente.

D. Note-se dos documentos de fls. 658 e 659 dos presentes autos, conjugando-se com toda a prova produzida através de documentos e depoimentos produzidos em sede de Audiência de Julgamento, resulta provado que:

E. De fls. 357 e seguintes resulta que o referido telemóvel identificado nos factos 1 a 3 dos Factos Provados da Fundamentação da decisão de que ora se recorre foi devolvido a JB.

F.E de fls. 658 e 659 dos presentes autos resulta que o ora Recorrente foi o único Arguido do presente processo a: Compensar JB com o valor de 100 € a título de compensação pelos factos descritos nos factos 1 a 3 dos Factos Provados da Fundamentação da decisão de que ora se recorre; A pedir desculpas a JB pelos factos descritos nos factos 1 a 3 dos Factos Provados da Fundamentação da decisão de que ora se recorre;

G. Por ter sido o único Arguido a fazê-lo, por tê-lo feito efectivamente e pelo momento em que o fez, os factos que resultam de fls. 658 e 659, os mesmos assumem relevância para a boa decisão da boa causa e para a determinação da pena a ser aplicada ao ora Recorrente.

H. Visto que os factos que decorrem destes documentos de fls. 658 e 659 relevam para a determinação da pena a ser aplicada ao ora Recorrente, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto da decisão ora recorrida, por erro notório na análise da prova documental que consta de fls. 658 e fls. 659 dos presentes autos, o que ora se alega para todos os efeitos legais.

I. Uma vez que a decisão ora recorrida não considera o documento de fls. 658 dos presentes autos, para dar como provado a entrega pelo o ora Recorrente do montante de 100 € (cem euros) ao Ofendido JB no dia 23 de Maio de 2016 a título de compensação pelos danos sofridos como resulta de fls. 658, Conjugando com o facto da decisão ora recorrida não considerar o documento de fls. 659 dos presentes autos, para dar como provado a entrega ao mesmo Ofendido pelo Recorrente de uma carta de pedido desculpas pelo ora Recorrente ao ora Ofendido como resulta de fls. 659, Verifica-se que a decisão ora recorrida não ponderou, nem aplicou o preceituado no artigo 72.º números 1 e 2 alínea c) do Código Penal, e conclui-se necessariamente pela violação do disposto neste artigo 72.º n.º s 1 e 2 alínea c) do Código Penal por parte da decisão ora recorrida.

J.O teor de fls. 658 e 659 dos presentes autos, constitui em termos objectivos, circunstâncias posteriores ao crime que diminuem de forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou necessidade da pena, pois de fls. 658 e 659 dos presentes autos, resultam actos demonstrativos de arrependimento sincero do Recorrente, nomeadamente a reparação dos danos causados, e o pedido de desculpas, por escrito, devido a JB, o que implica necessariamente a aplicação do previsto no artigo 73.º n.º 1 alínea b) do Código Penal, considerando o mínimo da moldura penal prevista para crime de que vem acusado e condenado o ora Recorrente, cfr. artigo 210.º n.º 2 alínea b) do Código Penal.

K.E assim o mínimo abstracto da moldura penal do artigo 210.º n.º 2 alínea b) do Código Penal seria de 7 meses de prisão, a que corresponde um quinto do limite mínimo de três anos previsto neste preceito legal, o que considerando a pena de prisão 3 anos e seis meses em que o ora Recorrente vem condenado, conjugando com a aplicação do artigo 73.º n.º 1 alínea b) do Código Penal, levaria necessária e legamente a uma acentuada diminuição da pena de prisão em que o ora Recorrente vem condenado, termos em que se invoca para todos os efeitos legais a impugnação da decisão sobre a matéria de Direito da decisão ora recorrida, quando não considera os factos que resultam da prova documental a fls. 658 e 659 dos presentes autos, para efeitos do previsto nos artigos 72.º números 1 e 2 alínea c) e 73.º n.º 1 alínea b) do Código Penal,

L.Tendo a decisão ora recorrida violado o previsto nos artigos 72.º números 1 e 2 alínea c) e 73.º n.º 1 alínea b) do Código Penal, ao não ter considerado a atenuação especial da pena aplicada ao ora Recorrente, pelos actos demonstrativos de arrependimento do ora Recorrente através da reparação dentro do possível dos danos causados e do pedido de desculpas ao Ofendido, e ao não ter considerado a aplicação do previsto no artigo 73.º n.º 1 alínea b) do Código Penal, considerando o mínimo da moldura penal prevista para crime de que vem acusado e condenado o ora Recorrente, cfr. artigo 210.º n.º 2 alínea b) do Código Penal, e assim o mínimo abstracto da moldura penal do artigo 210.º n.º 2 alínea b) do Código Penal seria de 7 meses de prisão, a que corresponde um quinto do limite mínimo de três anos previsto neste preceito legal.

M. Como resulta da decisão ora recorrida, o ora Recorrente vem acusado e condenado pela prática, em co-autoria material na forma consumada, de um crime de roubo p. e p. pelos artigos 210.º n.º s 1 e 2 alínea b) ex vi artigo 204.º n.º 2 alínea f) do Código Penal.

N. Para efeitos do artigo 1.º n.º 1 do Regime Penal Especial para Jovens Adultos previsto no Decreto - Lei n.º 401/82 de 23 de Setembro, o ora Recorrente veio acusado e condenado pelo cometimento de um facto qualificado como crime.

O. Como resulta da decisão ora recorrida, o ora Recorrente nasceu em16 de Dezembro de 1996, o que implica que em 2014, à data da prática dos factos, o ora Recorrente tinha dezoito anos, à data da prolação da sentença ora recorrida, o ora Recorrente tinha vinte anos.

P. Assim para efeitos do previsto no artigo 1.º n.º 2 do Regime Penal Especial para Jovens Adultos previsto no Decreto - Lei n.º 401/82 de 23 de Setembro, em termos abstractos, o ora Recorrente insere-se na previsão desta disposição legal.

Q. Analisada a decisão de que ora se recorre, verifica-se que não foi ponderada a aplicação do regime previsto no Decreto - Lei n.º 401/82 de 23 de Setembro.

R. Pelo que o ora Recorrente impugna a decisão sobre a matéria de Direito da decisão ora recorrida, quando não se pondera a aplicação ao ora Recorrente do Regime Penal Especial para Jovens Adultos previsto no Decreto - Lei n.º 401/82 de 23 de Setembro, e não fundamenta o afastamento da sua aplicação, o que constitui a violação do disposto nos artigos 1.º, 2.º e 4.º do referido Decreto - Lei n.º 401/82 de 23 de Setembro, o que implica a nulidade da sentença ora recorrida, por omissão de pronuncia, a qual desde de já se alega e invoca, nos termos e para os efeitos do artigo 379.º números 1 alínea c), 2 e 3 do Código de Processo Penal.

S. Impugna-se a decisão sobre a matéria de Direito, quanto a decisão de condenar o ora Recorrente numa pena de três anos e seis meses de prisão, por excessiva, e por se entender que não condenar o ora Recorrente pelo mínimo da moldura penal prevista no número 2 do artigo 210.º n.º 2 do Código Penal, se viola o artigo 71.º n.º s 1 e 2 alínea e) do Código Penal.

T. Á luz da conjugação de fls. 658 e 659 dos presentes autos resulta que o ora Recorrente foi o único Arguido do presente processo a compensar JB com o valor de 100 € a título de compensação pelos factos descritos nos factos 1 a 3 dos Factos Provados da Fundamentação da decisão de que ora se recorre, a pedir desculpas a JB pelos factos descritos nos factos 1 a 3 dos Factos Provados da Fundamentação da decisão de que ora se recorre, por ter vinte anos, e por viver com os pais, sujeito à sua vigilância e com o irmão e por estar a trabalhar como copeiro no bar do irmão sito no Largo …, em Faro,

U. Conclui-se necessariamente pela violação do artigo 71.º n.º s 1 e 2 alínea e) do Código Penal, decorrente da aplicação de uma pena acima dos três anos de prisão, sempre sem prejuízo das duas violações legais de que padece a decisão ora recorrida e acima enumeradas, que culminariam na atenuação especial da pena do ora Recorrente abaixo do mínimo da moldura penal.

Nestes termos se conclui pela procedência do presente recurso, rogando-se a V. Exas. que revoguem a decisão ora recorrida, modificando a matéria de facto dada como provada contemplando o teor de fls. 658 e 659, e a declarem nula por omissão de pronúncia, e conheçam das demais ilegalidades decorrentes da violação dos normativos legais supra citados, fazendo V. Exas. JUSTIÇA»

4. – Notificado para o efeito, o MP junto do tribunal a quo apresentou a sua resposta aos recursos interpostos pelos arguidos FJ e HM.

4.1 Relativamente ao recurso do arguido FJ o MP conclui a sua resposta no sentido da procedência parcial do recurso, nos seguintes termos:

- «CONCLUSÕES
1 – O recorrente foi condenado na pena de 5 anos de prisão pela prática de um crime de roubo, de 1 ano de prisão pela prática de um crime de detenção de arma proibida, tendo a pena única sido fixada em 5 anos e 6 meses de prisão;

2 – De acordo com o recorrente, o Tribunal não poderia ter aplicado pena superior a 5 anos de prisão, porque o Ministério Público usou da faculdade prevista no artigo 16.º, n.º 3, do Código de Processo Penal;

3 – Assiste-lhe razão, dando-se aqui por integralmente reproduzidos por economia de meios, o recurso interposto pelo Ministério Público a favor do aqui recorrente, por versar exclusivamente sobre tal questão;

4 – Mais refere o recorrente que a pena de prisão que lhe foi aplicada pela prática do crime de roubo é excessiva, visto que a sua participação nos factos não compreendeu o uso de violência, tratar-se de um jovem inserido e com família disposta a auxiliá-lo;

5 – Concordamos com o recorrente, entendendo que, no caso concreto, deveria ter-lhe sido aplicada pena de prisão de 4 anos e 3 meses de prisão pela prática do crime de roubo, considerando o facto de o Tribunal ter dado como provados antecedentes criminais que não o eram, porquanto duas das condenações averbadas ao CRC do recorrente respeitam a factos praticados após os factos objecto deste processo;

6 – O recorrente argui ainda que a pena de prisão que lhe vier a ser fixada deve ser suspensa na sua execução;

7 – Quanto a este ponto em concreto, não podemos concordar com a argumentação expendida pelo recorrente, mormente atendendo aos antecedentes criminais com que esse já contava aquando da prolação da sentença nestes autos, antecedentes esses que reclamam uma resposta enérgica por parte do sistema judicial, que, já em momentos anteriores, permitiu ao recorrente que encetasse uma vida conforma ao direito, o que este não fez, sendo, nessa sequência, impossível realizar um juízo de prognose favorável;

8 – Atendendo à pena concreta que consideramos adequada aplicar ao recorrente pela prática do crime de roubo, consideramos que a pena única resultante do concurso deverá ser fixada em 4 anos e 8 meses de prisão efectiva, assim se fazendo a inteira e acostumada justiça.

4.2. No que respeita ao arguido HM, o MP conclui pela procedência do recurso nos seguintes termos:

- « CONCLUSÕES
1 – HM foi condenado na pena de três anos e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período;

2 – Inconformado com a sentença, veio da mesma recorrer, invocando que esta padece de erro notório na análise da prova, por não ter dado como provados os factos que decorrem do teor dos documentos juntos aos autos a fls. 658 e 659; que esta deveria ter atenuado especialmente a pena e, ao não fazê-lo, violou o disposto no artigo 72.º e ss., do Código Penal; que a sentença é nula por não ter equacionado da eventual aplicação do regime penal especial para jovens; e, subsidiariamente, que a medida da pena a que foi condenado é excessiva;

3 – Assiste-lhe razão no que tange aos factos que pretende que sejam dados como provados, também entendendo nós que, tratando-se de factos posteriores ao crime que depõem a favor do recorrente, deveriam ter sido considerados como provados e, nessa sequência, deverá ser concedido provimento ao recurso nesta parte, dando V. Exas. como provados os seguintes factos:

A) O arguido HM entregou ao ofendido JB a quantia de €100,00, a título de compensação pelos danos sofridos;

B) O arguido HM entregou ao ofendido JB uma carta com um pedido de desculpa, admitindo a prática dos factos e escrevendo mostrar-se arrependido pela sua conduta e pelas consequências que essa teve na vida do ofendido.

4 – Pese embora a prova de tais factos e, bem assim, da sua conjugação com os demais elementos dos autos, não tem aplicação no caso concreto o disposto no artigo 72.º, do Código Penal, ao contrário do sustentado pelo recorrente; com efeito, apenas há lugar à atenuação especial da pena para responder a situações de facto em que a ilicitude do facto e a culpa, mas também as exigências de prevenção se revelem de tal forma diminutas que exista uma desconformidade da moldura penal abstractamente aplicável no caso concreto;

5 – Ora, não se verifica tal circunstancialismo no caso concreto: a ilicitude do facto é elevada (não diminuindo pelos elementos factos que o recorrente pretende que sejam considerados como provados), tanto mais que foi usada uma arma de fogo no seu cometimento; as necessidades de prevenção geral são elevadas (considerando o aumento exponencial de violência e de crimes de roubo); as necessidades de prevenção especial também são elevadas (atentos os antecedentes criminais do recorrente; pelo que não há lugar à aplicação de uma pena especialmente atenuada;

6 – O recorrente invoca ainda a nulidade da sentença por não ter ponderado da eventual aplicação do regime penal especial para jovens, no que lhe assiste razão; assim, deve ser declarada tal nulidade e apreciada a possibilidade de aplicação de tal regime especial, concluindo-se pena sua não aplicação: o arguido conta já com antecedentes criminais que não o dissuadiram da prática de novos factos ilícitos, atentatórios do património e das pessoas, pelo que não se vislumbra em que medida possa ter aplicação este regime especial, por não se verificarem factos susceptíveis de concluir que resultam vantagens da sua aplicação para a reinserção social do recorrente;

7 – Por fim, também consideramos não dever ser concedido provimento ao recurso na parte em que o recorrente refere que a pena concretamente aplicada deveria ter sido menor;

8 – A moldura abstractamente aplicável situa-se entre os 3 e os 15 anos de prisão, tendo o Tribunal fixado a mesma em 3 anos e 6 meses, o que nos parece até no limiar do mínimo da pena que os critérios de aplicação e determinação da medida concreta da pena ainda permitiam ao Tribunal a quo: com efeito, a culpa é elevada, elevadas são igualmente as exigências de prevenção, o dolo é directo apenas militando a favor do arguido o facto de a ilicitude ser baixa e de ser jovem;

9 – Assim sendo, deverão V. Exas. conceder provimento ao recurso, considerando como provados os factos supra descritos e declarando a nulidade da sentença por não ter equacionado da aplicação do Regime Penal Especial para jovens e, em face dos novos factos e em suprimento da nulidade, conhecer das demais questões suscitadas pelo recorrente, devendo ser negado provimento a todas elas, mantendo-se, destarte, a sentença recorrida no que respeita à concreta pena a que o recorrente foi condenado.»

5.- Nesta Relação, o senhor Procurador-Geral Adjunto apresentou parecer no sentido da procedência dos recursos interpostos pelo MP e pelos arguidos Flávio e Hernâni.

6. – Notificados da junção daquele parecer, os arguidos nada acrescentaram.

7. – A sentença recorrida (transcrição parcial):

«1- Factos provados

Da acusação
1. No dia 28 de Junho de 2014, pelas 01h30, na Rua Sesinando da Purificação Azinheira, Calçada de Santana, em Tavira, os arguidos, na execução de um plano previamente acordado entre todos, abordaram o ofendido JB e BG, questionando-os sobre se tinham drogas para vender.

2. Acto contínuo, um dos arguidos retirou da mão do JB, o telemóvel de marca LG, modelo Máximo L5 E6l0, preto, com o IMEI ------ e o cartão SIM n.º 961-----, com uma capa de cabedal preta, pertencente ao mesmo, no valor de € 70,00, puxando-o de forma abrupta e violenta, enquanto os demais arguidos cercavam os mesmos.

3. Simultaneamente, um dos arguidos, retirou das calças que trajava uma arma de tipo revólver, marca" Sprint Pat Pend", fabricada para utilização de fulminantes, de metal, preta, que empunhou e direccionou ao JB enquanto lhe dizia" é melhor seguires o teu caminho para não haver problemas".

4. Seguidamente, todos os arguidos se colocaram em fuga, afastaram-se do local, apropriando-se do telemóvel acima descrito, que fizeram seu, integrando-o nos seus patrimónios.

5. As condutas assumidas pelos arguidos e acima descritas, em especial o uso da arma descrita, eram aptas a perturbar seriamente o ofendido no seu sentimento de segurança, deixando-o intimidado e com receio pela sua integridade física e vida, o que efectivamente sucedeu.

6. Apenas por temer pela sua integridade física e pela sua vida e por se encontrar limitado na sua liberdade de locomoção, o ofendido não se opôs a que os arguidos lhe retirassem os objectos acima descritos.
7. Todos os arguidos agiram, em comunhão de esforços e de acordo com um plano previamente gizado entre os mesmos, com o propósito concretizado de fazerem seus o mencionado telemóvel, mediante recurso à intimidação e à utilização de um objecto em tudo idêntico a uma arma de fogo, que um dos arguidos exibiu e apontou ao ofendido, objecto esse, cujas características e detenção eram do conhecimento prévio de todos os demais arguidos.

8. Todos os arguidos agiram pela forma descrita, bem sabendo que o referido objecto não lhes pertencia e que actuavam contra a vontade do seu legítimo proprietário que não consentia na descrita apropriação.

9. Cada um dos arguidos actuou pela forma acima descrita, livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

10. No dia 26 de Agosto de 2014, pelas 08h00 o arguido FJ tinha na sua posse, no interior do seu quarto na residência sita no Largo…, em Olhão, uma pistola de marca STAR, modelo S&W GM, prateada e preta, de calibre 6.35 mm. Com o n.º de série 10-004885, com o carregador inserido, que continha no seu interior cinco munições de marca S&B, de calibre 6.35mm, assim como uma munição da marca S&B, de calibre 6.35.

11. Tal arma trata-se de uma pistola semiautomática, em condições de funcionamento, originalmente de provável calibre nominal 8 mm e destinada a deflagrar munições de alarme e/ ou de gás lacrimogéneo, posteriormente transformada a disparar munições com projéctil de calibre 6.35 mm Browning.

12. Tal arma não foi manifestada nem registada e trata-se de uma pistola apta a disparar projécteis, que era de alarme e que foi convertida em arma de fogo mediante a transformação / adaptação artesanal das características originais da arma, pela adaptação de um cano estriado rudimentarmente, com a câmara redimensionada ao calibre 6.35.

13. As seis munições de calibre 6.35 supra referenciadas, encontravam-se por deflagrar e em condições de utilização.

14. O arguido FJ actuou ciente de que não possuía autorização ou licença para detenção de pistola ou qualquer outro tipo de arma de fogo, nem para detenção das munições supra aludidas.

15. Conhecia as características da arma de fogo e das munições de sua pertença.

16. O arguido FJ quis manter na sua posse os objectos acima descritos, o que logrou concretizar e agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a detenção dos objectos em questão eram proibidos e punidos por lei.

Dos antecedentes criminais e condições pessoais e económicas dos arguidos

17. O arguido HM foi anteriormente condenado pela prática dos seguintes crimes:

• um crime de furto qualificado p.p. pelo artigo 203° n.º 1 e 204° n.º 1 al. b) do C.Penal, praticado em 06-11-2013, na pena de 160 dias de multa;

• um crime de roubo qualificado p.p. pelos artigos 210° n.º 1 do C.Penal e um crime de consumo de estupefacientes p.p. pelo artigo 40° n02 do DL n° 15/93, de 22-01, praticados em 22-11-2015, na pena de 1 ano e 10 meses de prisão suspensa, subordinada a regime de prova.

18. O arguido HM vive com os pais e com o irmão e está a trabalhar como copeiro no bar do irmão sito no largo da … em Faro e tem o 9° ano de escolaridade.

19. O arguido HT foi anteriormente condenado pela prática de um crime de detenção de arma proibida p.p. artigo 86° n° 1 al. d) por referência à al. p) do n° 1 do artigo 2°, al. e) do n° 2 do artigo 3° e n° 1 do artigo 4° da Lei 5/2006, de 23-02.

20. O arguido HT trabalha e ajuda o pai na pesca e tem o 9° ano de escolaridade.

21. O arguido FJ foi anteriormente condenado pela prática dos seguintes crimes:

• um crime de furto qualificado p.p. pelo artigo 203° n° 1 e artigo 204° n° 2 al. e) por referencia à al. d) do artigo 202 do C. Penal, praticado em 22-12-2010, na pena de 2 anos e 9 meses de prisão suspensa, subordinada a regime de prova.

• um crime de tráfico de estupefacientes p.p. pelo artigo 25° al. a) do DL 15/93, de 22-01, praticado em 02-08-2011, na pena de 2 anos e 3 meses de prisão, subordinada a regime de prova.

• um crime de detenção de arma proibida p.p. pelo artigo 86° n° 1 al. c) com referencia aos artigos 2° n° 1 al. t) e 1),3° al. p), 5° al. g), 3° n.ºs 1,2 al. q) e 4, 4° n° 1, 6° e 86° n° 1 al. d), da Lei n° 5/2006, de 23-02, praticado em 012-02-2011, na pena de 210 dias de multa.

• um crime de tráfico de estupefacientes p.p. pelo artigo 21° n° 1 do DL 15/93, de 22-01, praticado em Maio de 2014, e um crime de detenção de arma proibida, praticado em 31-08-2014, p.p. pelo artigo 86 n° 1 al. c) da Lei n° 5/2006, de 23/02, na pena única de 5 anos e 5 meses de prisão efectiva.

• um crime de condução sem habilitação legal p.p. pelo artigo 3° do DL 2/98, de 03-01, praticado em 29-10-2014, na pena de 100 dias de multa.

22. O arguido FJ está a cumprir pena de prisão, tem o 6° ano de escolaridade, nunca trabalhou e vive em casa da mãe.

23. O arguido HG não tem antecedentes criminais.

24. O arguido HG vive com a mãe, tem o 9° ano de escolaridade e não trabalha.

2- Factos não provados:

Da acusação

1. Foi o arguido HM que retirou das calças que trajava a arma identificada em 3. dos factos provados e a empunhou e direccionou ao ofendido.

2. A arma foi direccionada ao peito do ofendido.

3. O telemóvel LG tinha o valor de 150 euros.

4. O arguido FJ sabia que a arma descrita em 11. dos factos provados não era susceptível de legalização face a potencial perigosidade da mesma como meio de agressão e que, ao ter tal arma e munições na sua posse punha em crise o interesse do Estado no controlo da detenção de objectos daquela natureza.

3. Motivação de decisão da matéria de facto.

A convicção do tribunal fundou-se genericamente na análise e apreciação de toda a prova produzida e examinada em audiência de julgamento à luz do princípio da normalidade e das regras da experiência comum, nomeadamente:

. no depoimento prestado pela testemunha PP que declarou ter acompanhado e transportado os 4 arguidos a Tavira no dia dos factos descritos nos pontos 1. a 9. da acusação, no veículo automóvel propriedade da testemunha MF, tendo identificado cada um dos arguidos, e referiu que pelas tidas pelos mesmos no carro no trajecto de Olhão para Tavira apercebeu-se que os arguidos tinham em mente praticar um furto ou qualquer outro acto ilícito, referindo depois que chegados a Tavira saíram do carro, estiveram num baile, tendo a testemunha acabado por voltar para o carro por se sentir constrangido com a conversa dos arguidos e ficar à espera deles; mais referiu que passado algum tempo os arguidos telefonaram à testemunha para os ir buscar perto de uma ponte (que que não conseguiu identificar) e que quando aí chegou os arguidos entraram no carro e gritaram à testemunha para arrancar; mais referiu ter ouvido estarem a falar de um telefone preto concretizando as seguintes palavras dos arguidos: "mostra lá o telefone", "ele ficou todo borrado de medo quando apontaste a arma", não se recordando no entanto quem é que tinha o telemóvel e a qual deles é que os demais se dirigiram; mais explicou que no regresso obrigaram-no a virar para a Fuseta, descrevendo depois as circunstancias em que o carro que conduzia foi apreendido e foram detidos já em Olhão.

Confrontado com o auto de reconhecimento fotográfico de fls. 95, donde resulta o reconhecimento pela testemunha dos indivíduos seus conhecidos que acompanhou a Tavira no dia dos factos descritos na acusação, confirmou ter feito o reconhecimento dos arguidos.

• no depoimento da testemunha MF, proprietária do veiculo Citroen AX , matricula ----AP, que confirmou de forma circunstanciada ter emprestado o carro ao sobrinho PP na data dos factos descritos em 1. a 9. da acusação, bem como o abandono do carro junto do Ria Shopping em Olhão e sua apreensão, mais referindo ter sido ela que foi levantar o carro.

• no depoimento da testemunha LF que declarou conhecer o arguido HM e confirmou ter comprado o telemóvel LG preto apreendido nos autos ao referido HM por 60 euros e que confrontado com fls. 266 reconheceu o arguido HM como sendo a pessoa que lhe vendeu o telemóvel.

• no depoimento do ofendido JB que descreveu as circunstancias em que ele e o amigo BG foram abordados por 4 indivíduos, reconhecendo o arguido FJ como sendo um deles, mais referindo que os abordaram, perguntaram-lhes se tinham droga e de seguida apontaram-lhe uma pistola às partes intimas e tiraram-lhe o telemóvel (LG preto), não reconhecendo o arguido FJ como a pessoa que lhe apontou o revolver e lhe tirou o telemóvel.

• no depoimento da testemunha DP que disse conhecer o arguido H por ser seu amigo e que foi o HM que lhe vendeu a pistola de fulminantes que foi apreendida.

• no depoimento da testemunha BG que confirmou terem sido (ele e o amigo JB) abordados e assaltados por um grupo de indivíduos em Tavira, referindo que lhes apontaram um objecto em metal e roubaram o telemóvel ao amigo, não se recordando já dos demais detalhes.

• nos depoimentos das testemunhas AJ, agente da PSP, que descreveu as circunstancias das detenções dos arguidos e apreensão do veículo automóvel, e AS, inspector da PJ, que relatou de forma detalhada a sua intervenção na investigação, confirmando que a pistola de fulminantes identificada em 3. da acusação lhe foi entregue pela testemunha DP que disse, na altura, a ter comprado ao arguido HM.

• no relatório de inspecção lofoscópica da viatura Citroen AX com a matricula ----AP de fls. 100 a 121, donde resultaram 2 dos vestígios lofoscópicos que se identificam com as impressões digitais dos dedos médio direito e médio esquerdo do arguido HM.

• no auto de busca e apreensão da pistola de marca STAR, modelo S&W GM, de fls. 206, aprendida ao arguido FJ em sua casa.
• no auto de exame directo à referida arma e munições de fls. 215 e 315.
• no auto de reconhecimento de objectos de fls. 315 a 318.
• no auto de exame directo de fls. 319.
• no relatório de exame da arma identificada em 10. da acusação, de fls. 320 a 326;

• nos relatórios de inspecção lofoscópica da viatura Citroen AX, com a matricula ---AP, a fls. 327 a 342, donde resultaram 3 dos vestígios lofoscópicos que se identificam com as impressões digitais dos dedos indicador esquerdo e médio esquerdo do arguido HG.

• no auto de apreensão do telemóvel da marca LG, MODELO bl-44JN, como o IMEI: ---, a LR, de fls. 269 e 270.

• no auto de exame e avaliação do referido telemóvel com o valor atribuído de 70 euros, de fls. 344 a 345.

• nos CRC dos arguidos de fls. 889 a 899 que fundamentaram as respostas aos antecedentes criminais dos arguidos.

. Nas informações prestadas pelos arguidos quanto às suas situações pessoais e económicas que mereceram credibilidade e que conjugadas com os depoimentos das testemunhas CS, AT, JA, AA, LM, que depuseram sobre a personalidade dos arguidos HT e HM, fundamentaram as respostas dadas a tal matéria nos factos provados.

Concretizando:
Em face da prova produzida em audiência de julgamento conjugada com a demais supra identificada, nomeadamente, os autos de reconhecimento dos arguidos, as buscas, apreensões e exames dos objectos apreendidos e os relatórios de inspecção lofoscópica, não restam dúvidas que foram os 4 arguidos que acompanharam a testemunha PP a Tavira no dia e noite dos factos descritos em 1. a 9 da acusação e bem assim que foram os arguidos que abordaram o ofendido JB e o amigo BG e que depois de os questionarem se tinham droga retiraram da mão do JB o telemóvel apontando-lhe o revolver aí identificado em 3., colocando-se depois em fuga, sendo certo que o ofendido JB reconheceu o arguido FJ em audiência como sendo um dos 4 indivíduos do grupo que o assaltou e que, como resultou do depoimento da testemunha PP, os arguidos quando entraram no carro por este conduzido para regressarem a Olhão traziam consigo o telemóvel LG preto subtraído e tendo apontado uma pistola ao referido JB que nas palavras daqueles o fez "borrar-se de medo ".

Em suma não restaram dúvidas ao Tribunal de que foram os arguidos, agindo em comunhão de esforços e de acordo com um plano previamente gizado entre os mesmos, os autores dos factos descritos na acusação.

Quanto aos factos que integram o elemento subjectivo do ilícito em questão o tribunal baseou-se na forma como os arguidos actuaram e nas regras da experiência comum, porquanto ao agir da forma descrita os arguidos não podia deixar de saber que estavam a apoderar-se de bem que não lhes pertencia contra a vontade do seu legítimo proprietário, recorrendo à intimidação e á utilização de um objecto em tudo idêntico a uma arma de fogo que um dos arguidos exibiu.

Relativamente aos factos descritos em 10. a 14 e 16. da acusação a convicção do tribunal fundou-se no depoimento prestado pela testemunha AS e nos autos de busca e apreensão e de exame da arma identificada em 10. da acusação.

Quanto à matéria dada como não provada, resultou de não ter sido produzida prova concludente sobre a mesma e da prova produzida em sentido contrário no que se refere ao valor do telemóvel.

4. Enquadramento jurídico-penal
Os arguidos HM, HT, FJ e HG vem acusados da prática, em co-autoria material, e na forma consumada, de um crime de roubo p. e p. pelos art.º 210.°, ns. 1 e 2 al. b) ex vi art.º 204.° n.º 2 al. f) do Código Penal.

O arguido FJ, ainda, pela prática em autoria material e concurso efectivo com o crime já indicado, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.°, n.º 1 al. c), ex vi art.°s 2.° al. x) art.º 3.° n.º 2 al. 1) todos da Lei n.º 5/2006, de 23/02, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 17/2009, de 6/05, Lei n.º 26/2010 de 30-08 e Lei n.º12/2011, de 27/04.

Dispõe o artigo 210° do Código Penal que:
"1- Quem, com ilegítima intenção de apropriação para SI ou para outra pessoa, subtrair, ou constranger que lhe seja entregue, coisa móvel alheia, por meio de violência contra uma pessoa, de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física, ou pondo-a na impossibilidade de resistir, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.

2- A pena é a de prisão de 3 a 15 anos se:
( ... )
b) Se verificarem, singular ou cumulativamente, quaisquer requisitos referidos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 204.°, sendo correspondentemente aplicável o disposto no n.º 4 do mesmo artigo.
( ... )"
O roubo é um crime complexo que ofende, simultaneamente, bens jurídicos patrimoniais e pessoais, surgindo a ofensa aos bens jurídicos pessoais como um meio de lesão dos bens patrimoniais.

A ofensa aos bens pessoais será levada a cabo por uma das formas previstas no n° 1, do artigo 210°, nomeadamente, através de violência contra uma pessoa.

A violência contra uma pessoa deverá ser entendida de forma abrangente, englobando quer a violência física, quer a psíquica, e ainda, a violência directa sobre o corpo da pessoa, e a violência indirecta - neste sentido, Conceição Cunha, in Comentário Conimbricense ao Código Penal, tomo II, 1999, pág. 167.

A subtracção da coisa fica preenchida com a retirada da coisa da posse do detentor ou a sua colocação à disposição do agente ou de terceiro, não sendo sequer necessário que a coisa seja deslocada de um lugar para o outro (Ac. RP de 12-12-84, in BMJ, 342, pág. 440).

A subtracção da coisa móvel alheia pode, também, ser conseguida através de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física da pessoa, ou pondo-a na impossibilidade de resistir, sendo que, nestes casos, se está perante o recurso a verdadeiros meios de constrangimento, em que se põe em causa a liberdade de acção ou de decisão do indivíduo.

A violência característica do roubo tem de ser exercida para o fim da subtracção patrimonial ou para garantir, depois desta, a impunidade do crime ou a detenção da coisa subtraída.

Ou seja, o elemento característico do crime de roubo é a violência sobre a pessoa possuidora do objecto a subtrair. Assim, e para que essa violência se verifique, não é necessário que exista lesão ou contacto físico com o ofendido. O que importa é que a força física empregue pelo agente, tendo em vista o objectivo apropriativo, se revele de tal forma que se possa dizer que atingiu a liberdade de determinação do ofendido - neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29 de Abril de 1999, in Maia Gonçalves, Código Penal Português, Anotado e Comentado, l4a edição - 2001, nota ao artigo 210°, pág. 674.

Nos termos do artigo 26° do Código Penal, age como co-autor aquele que tomar parte na execução do facto, por acordo ou juntamente com outro ou outros, o que à luz da teoria do domínio do facto que vem assumindo preponderância crescente entre nós, significa que cada co-autor não tem o domínio do facto por si mesmo, nem por intermédio de outro, mas em conjunto com outro ou outros, de tal modo que pode falar-se de um domínio do facto colectivo ou, como refere Figueiredo Dias, "( ... ) talvez possa também dizer-se assim, de um condomínio do facto." (Figueiredo Dias, Direito Penal. Parte Geral. Tomo I, 2a ed. - 2007, pág. 791).

No caso presente, como emerge do factualismo dado como provado, os arguidos, na execução de um plano previamente delineado entre todos abordaram o ofendido JB e BG com o propósito de se apoderarem e de fazerem seu o telemóvel do ofendido JB, mediante recurso à intimidação e à utilização de um objecto em tudo idêntico a uma arma de fogo, que um dos arguidos exibiu e apontou ao ofendido, encontrarem-se preenchidos, por outro lado, todos os elementos objectivos e subjectivo do crime de roubo de que os arguidos vem acusados.

Nos termos do artigo 86°, n.º1, al. c), da Lei n° 5/2006, de 23 de Fevereiro, " Quem, sem se encontrar autorizado, fora das condições legais ou em contrário das prescrições da autoridade competente, detiver, transportar, importar, transferir, guardar, comprar, adquirir a qualquer título ou por qualquer meio ou obtiver por fabrico, transformação, importação, transferência ou exportação, usar ou trouxer consigo Arma das classes B, Bl, C e D, espingarda ou carabina facilmente desmontável em componentes de reduzida dimensão com vista à sua dissimulação, espingarda não modificada de cano de alma lisa inferior a 46 cm, arma de fogo dissimulada sob a forma de outro objecto, ou arma de fogo transformada ou modificada, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos ou com pena de multa até 600 dias".

O bem jurídico protegido pelo tipo legal de crime é a segurança da comunidade face aos riscos (em última instância para bens jurídicos individuais, para a vida e integridade física), da livre circulação de armas não manifestadas nem registadas, visando o legislador evitar toda a actividade idónea a perturbar a convivência social e pacífica e garantir através da punição deste comportamento potencialmente perigoso, a defesa da ordem e segurança públicas contra o cometimento de crimes, em particular contra a vida e integridade física.

O crime de detenção de arma proibida é um crime de realização permanente e de perigo abstracto, em que o que está em causa é a própria perigosidade das armas, visando-se, com a incriminação da sua detenção, tutelar o perigo de lesão da ordem, segurança e tranquilidade públicas face aos riscos da livre circulação e detenção de armas.

O que se pune, através da disposição incriminadora violada é (entre o mais e na parte que nos interessa) a detenção - fora das condições legais ou em contrário das prescrições da autoridade competente - de armas de fogo, de munições ou de instrumentos construídos exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão - artigos 86.°, n.º 1, alíneas c) e d), da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro.

No caso presente, tendo ficado provado que no dia 26 de Agosto de 2014, pelas 08h00, o arguido FJ tinha na sua posse, no interior do seu quarto na residência sita no Largo …, em Olhão, uma pistola de marca STAR, modelo S&W GM, prateada e preta, de calibre 6.35 mm. Com o n.º de série 10-004885, com o carregador inserido, que continha no seu interior cinco munições de marca S&B, de calibre 6.35mm, assim como uma munição da marca S&B, de calibre 6.35. ciente de que não possuía autorização ou licença para detenção de pistola ou qualquer outro tipo de arma de fogo, nem para detenção das munições supra aludidas, integra a sua conduta a prática do crime de detenção de arma proibida de que vem acusado.

5. Escolha e medida da pena.
A pena abstractamente aplicável ao crime de roubo praticado pelos arguidos é de 3 a 15 anos de prisão (artigo 210°, n° 2, do Código Penal).

A pena abstractamente aplicável ao crime de detenção ilegal de armas praticado pelo arguido FJ é de prisão de 1 a 5 anos ou multa até 600 dias (artigo 86°, nºl , al. c), da Lei n° 5/2006, de 23 de Fevereiro).

Tendo em conta a matéria de facto apurada, as finalidades da punição e os critérios orientadores para a concretização da pena, bem como todos os factos apurados relevantes para esse fim apreciados à luz das orientações contidas no artigo 71° do Código Penal, designadamente o grau de ilicitude dos factos (que é reduzida face ao valor da coisa subtraída e à circunstância de o ofendido não ter sofrido qualquer lesão física), a culpa dos agentes (na forma de dolo directo), os antecedentes criminais dos arguidos HM, HT e FJ, as fortes exigências de prevenção geral que se fazem sentir, atento o actual crescimento de actos de violência associados a crimes contra o património, e tendo ainda em conta as condição pessoais dos arguidos, concluo que será ajustado aplicar ao arguido HM a pena de 3 anos e 6 meses de prisão, ao arguido HT a pena de 3 anos e 3 meses de prisão e ao arguido FJ a pena de 5 anos de prisão pela prática do crime de roubo e a pena de 1 ano de prisão pela prática do crime de detenção ilegal de arma .

Dispõe o artigo 77° do Código Penal que:
1 - Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.

2 - A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.

3 - Se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, a diferente natureza destas mantém-se na pena única resultante da aplicação dos critérios estabelecidos nos números anteriores.
( ... )
Considerando os factos apurados e os critérios orientadores para a concretização da pena acima referidos, fixo ao arguido FJ a pena única de 5 anos e 6 meses de prisão.

Relativamente ao arguido HG, considerando a ausência de antecedentes criminais e não existindo elementos sobre a personalidade e as condições de vida do arguido que afastem a aplicação do regime penal relativo a jovens entre os 16 e os 21 anos, previsto no DL n° 401/82 de 23-09, aplicando ao arguido este regime, por força do artigo 4° do citado diploma legal, a pena de prisão prevista para o crime de roubo será especialmente atenuada nos termos dos artigos 72° e 73° do CP.

Por força da atenuação especial, nos termos do artigo 73° do CP, a moldura penal abstracta prevista para o crime de roubo punido pelo artigo 210°, n° 2, do Código Penal é de 7 meses a 10 anos de prisão.

Considerando a matéria de facto apurada, as finalidades da punição e os critérios orientadores para a concretização da pena, bem como todos os factos apurados relevantes para esse fim apreciados à luz das orientações contidas no artigo 71° do Código Penal, concluo que será ajustado aplicar ao arguido a pena de 8 meses de prisão pela prática do crime de roubo de que vêm acusado.

Nos termos do disposto no artigo 50.°, n° 1, do Código Penal, o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Conforme se salienta no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-11-2007, in www.dgsi.pt.:

"A suspensão da execução da pena" Constitui uma medida de conteúdo reeducativo e pedagógico, de forte exigência no plano individual, particularmente adequada para, em certas circunstâncias e satisfazendo as exigências de prevenção geral, responder eficazmente a imposições de prevenção especial de socialização, ao permitir responder simultaneamente à satisfação das expectativas da comunidade na validade jurídica das normas violadas, e à socialização e integração do agente no respeito pelos valores do direito, através da advertência da condenação e da injunção que impõe para que o agente conduza a vida de acordo com os valores inscritos nas normas.

A suspensão da execução, acompanhada das medidas e das condições admitidas na lei que forem consideradas adequadas a cada situação, permite, além disso, manter as condições de sociabilidade próprias à condução da vida no respeito pelos valores do direito como factores de inclusão, evitando os riscos de fractura familiar, social, laboral e comportamental como factores de exclusão.

Não são, por outro lado, considerações de culpa que devem ser tomadas em conta, mas juízos prognósticos sobre o desempenho da personalidade do agente perante as condições da sua vida, o seu comportamento e as circunstâncias do facto, que permitam fazer supor que as expectativas de confiança na prevenção da reincidência são fundadas.

Por fim, a suspensão da execução da pena não depende de um qualquer modelo de discricionariedade, mas, antes, do exercício de um poder-dever vinculado, devendo ser decretada, na modalidade que for considerada mais conveniente, sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos.

A medida de substituição realiza, assim, de modo determinante, um programa de política criminal, que tem como elemento central a não execução de penas curtas de prisão, na maior medida possível e socialmente suportável pelo lado da prevenção geral, relativamente a casos de pequena e mesmo de média criminalidade.

Deste modo, as penas de prisão aplicadas em medida não superior a cinco anos devem ser, por princípio, suspensas na execução, salvo se o juízo de prognose sobre o comportamento futuro do agente se apresente claramente desfavorável, e a suspensão for impedida por prementes exigências geral-preventivas, em feição eminentemente utilitarista da prevenção".

Atendendo à idade dos arguidos HM, HT e HG à data dos factos e ao conteúdo reeducativo e pedagógico da medida de suspensão da execução da pena e inexistindo um juízo de prognose sobre o comportamento futuro do agente que se apresente claramente desfavorável, entendo que a simples censura do facto e a ameaça da prisão, acompanhadas de regime de prova, realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, nomeadamente, o afastamento dos arguidos no futuro da prática de novos crimes, e não frustrará as expectativas comunitárias na validade da norma violada.

Assim, a pena de prisão a aplicar ao arguido HM será suspensa na sua execução por igual período de 3 anos e 6 meses, subordinada ao cumprimento de um regime de prova.

A pena de prisão a aplicar ao arguido HT será suspensa na sua execução por igual período de 3 anos e 3 meses, subordinada ao cumprimento de um regime de prova.

A pena de prisão a aplicar ao arguido HG será suspensa pelo período de 1 ano.»

Cumpre agora apreciar e decidir os presentes recursos.

II. Fundamentação
1. Delimitação do objeto dos recursos.
É pacífico o entendimento de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.

1. O MP recorre quanto à medida concreta da pena por considerar que ao aplicar a pena única de 5 anos e 6 meses de prisão ao arguido FJ, o tribunal a quo violou o disposto no art. 16º nº4 do CPP, uma vez que o MP entendera, nos termos do art. 16º nº3 do CPP, não dever ser aplicada pena de prisão superior a 5 anos de prisão, pelo que a sentença deve ser revogada determinando-se que seja aplicada pena inferior a 5 anos de prisão.

2. O arguido FJ suscita esta mesma questão, concluindo, porém, que ao aplicar pena superior a 5 anos de prisão em violação do disposto no art. 16º nº4 do CPP o tribunal a quo violou regra relativa à sua competência, pelo que, como diz, a sentença enferma de nulidade insanável nos termos do art. 119º nº1 al. e) e 122º, do CPP, devendo ser revogada e substituída por outra (sic).

Este arguido pretende ainda que a pena a aplicar deve ser mais harmoniosa, proporcional e justa, não ultrapassando o limite mínimo e sendo suspensa na sua execução.

3. Por sua vez, o arguido HM começa por invocar que do teor de fls 658 e 659 resulta prova documental de que o arguido entregou ao ofendido JB a quantia de 100€ a título de compensação pelos factos descritos de 1) a 3) e que lhe dirigiu desculpas pelos mesmos factos, sem que, porém, o tribunal a quo tenha julgado provados estes factos. Considerando que estes factos são relevantes para a boa decisão da causa e para a determinação da pena, o arguido HM diz impugnar a decisão proferida sobre a matéria de fato por erro notório na análise da prova documental.

Alega o recorrente que a sentença recorrida violou o disposto no art. 72º nºs 1 e 2 al. c) do C. Penal ao não ponderar aqueles factos, bem como a devolução do telemóvel identificado de 1) a 3) ao ofendido JB, conforme documento de fls 357, para efeitos de atenuação especial da pena por ter havido atos demonstrativos arrependimento nos termos do art. 73 nº 1 b) e não ter procedido à subsequente determinação concreta da pena em medida inferior à aplicada.

Alega ainda que o tribunal a quo não ponderou a aplicação do Regime Especial para jovens Delinquentes, o que implica nulidade da sentença nos termos do art. 379 nº 1 als c), 2 e 3, do CPP.

Conclui que se revogue a decisão ora recorrida, modificando a matéria de facto dada como provada contemplando o teor de fls. 658 e 659, e a declare nula por omissão de pronúncia, e conheça das demais ilegalidades decorrentes da violação dos normativos legais supra citados.

São, pois, estas as questões a decidir.

2. Decidindo.
2.1. – Recursos do MP e do arguido FJ
2.1.1. Quanto à condenação do arguido FJ em pena única (5 anos e 6 meses de prisão) superior a 5 anos de prisão, não obstante o disposto nos nºs 3 e 4 do art. 16º do C. Penal – questão suscitada no recurso do MP e do arguido FJ - , é manifesta a razão daquele arguido e do MP ao invocarem violação dos preceitos ora citados, pois resulta deles com clareza que tanto no caso de unidade criminosa como de concurso de crimes o tribunal singular não pode aplicar pena superior a 5 anos de prisão quando o MP fizer uso da possibilidade de sujeitar o arguido a julgamento por tribunal singular prevista naquele art. 16º nº3 do CPP, como sucedeu no caso presente.

Não estamos, porém, perante violação de norma de competência do tribunal com a correspondente nulidade (al. e) do art. 119º do CPP), contrariamente ao que parece entender o arguido recorrente, uma vez que o art. 16º do C. Penal não prevê a competência de outro tribunal para aplicar pena superior a 5 anos de prisão, antes fixa um novo limite máximo da pena aplicável, conforme entendimento há muito estabilizado.

2.1.2. Assim, verifica-se erro de direito por violação do limite máximo de pena legalmente estabelecido, pelo que impõe-se a revogação da sentença recorrida nesta parte, determinando-se, em substituição, a pena única a aplicar dentro da moldura legal resultante dos nºs 3 e 4 do art. 16º, de acordo com os critérios estabelecidos no art. 77º do C. Penal.

Ora, o arguido FJ foi condenado nas penas parcelares de 5 e 1 ano de prisão, pelo que sendo de 5 anos o limite mínimo da moldura legal do concurso face ao disposto na parte final do nº2 do art. 77º do C. Penal, aquele limite mínimo coincide com o limite máximo resultante dos nºs 3 e 4 do art. 16º do CPP, pelo que a medida da pena única a aplicar é, necessariamente, de 5 anos de prisão, o que se decide.

2.1.3. Atendendo à gravidade dos ilícitos pelos quais o arguido FJ vem condenado, quer no que respeita ao crime de roubo, quer no que concerne ao crime de detenção de arma proibida, são elevadas as necessidades de prevenção geral positiva presentes no caso concreto, a que acrescem necessidades de prevenção especial particularmente relevantes dados os antecedentes criminais do arguido, pelo que impõe-se concluir, sem outras considerações, que em face daqueles antecedentes e da personalidade revelada, a suspensão da execução da pena de prisão não satisfaz de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, pelo que se decide não proceder à sua aplicação no caso concreto – cfr art. 50.º do C. Penal.

3. Quanto ao arguido HM, este começa por alegar que do teor de fls 658 e 659 resulta prova documental de que o arguido entregou ao ofendido JB a quantia de 100€ a título de compensação pelos factos descritos de 1) a 3) e que lhe dirigiu desculpas pelos mesmos factos, sem que, porém, o tribunal a quo tenha julgado provados estes factos, o mesmo sucedendo com a devolução ao ofendido JB do telemóvel identificado de 1) a 3), conforme documento de fls 357.

Vejamos.
3.1. Efetivamente, a fls 658 encontra-se junto um documento subscrito pelo ofendido JB, dando conta que recebeu do recorrente a quantia de €100,00, a título de compensação pelos danos sofridos, e a fls. 659 está junta uma carta subscrita pelo recorrente HM e dirigida ao referido ofendido, em que o primeiro pede desculpa ao segundo pelos seus atos. A fls 357 o responsável pelas diligências levadas a cabo pela PJ na fase de inquérito solicita autorização ao magistrado do MP para devolver ao ofendido JB o telemóvel identificado de 1) a 3) da factualidade provada, o que pressupõe ter o mesmo sido recuperado e posteriormente entregue.

Porém, nem a entrega de compensação em dinheiro, nem o pedido de desculpas, nem a devolução do telemóvel roubado, constam da matéria de facto provada ou não provada e o tribunal a quo não se lhe refere em passo algum da sentença recorrida.

Assim, desde logo, não estamos perante o vício de erro notório na apreciação da prova previsto na al. c) do nº2 do art. 410º do CPP, uma vez que este não resultaria do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, como exige o citado nº2 do art. 410º, dada não se dizer sobre estes factos na sentença recorrida.

Não está igualmente em causa erro de julgamento em matéria de facto impugnável nos termos do art. 412º nº3 do CPP, uma vez que a impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto visa obter julgamento por parte do tribunal ad quem de sentido diverso ao levado a cabo em primeira instância, o que pressupõe que os factos em causa tenham sido julgado provados ou não provados pelo tribunal recorrido.

Assim, uma vez que o tribunal de julgamento não considerou provados ou não provados factos alegados pelo arguido com interesse para a determinação da sanção, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto com esse fundamento não é admissível por falta de objeto – vd sobre a questão Ac TC 312/12.

O caso presente patenteia antes o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada a que se reporta a al. a) do nº 2 do art. 410º do CPP, relativamente ao qual pode ler-se, por todos, no sumário do Ac STJ de 4.10.06:

- “ É um dado adquirido em termos dogmáticos que o conceito de insuficiência da matéria de facto provada significa que os factos apurados e constantes da decisão recorrida são insuficientes para a decisão de direito, do ponto de vista das várias soluções que se perfilem - absolvição, condenação, existência de causa de exclusão da ilicitude, da culpa ou da pena, circunstâncias relevantes para a determinação desta última, etc. - e isto porque o tribunal deixou de apurar ou de se pronunciar sobre factos relevantes alegados pela acusação ou pela defesa ou resultantes da discussão da causa, ou ainda porque não investigou factos que deviam ter sido apurados na audiência, visto a sua importância para a decisão, por exemplo para a escolha ou determinação da pena.»- acessível em www.stj.pt(sumários).

Ou, por outras palavras, “a insuficiência a que se refere a alínea a), do artigo 410º, nº. 2, alínea a), do CPP, é a que decorre da omissão de pronúncia, pelo tribunal, sobre facto(s) alegado(s) ou resultante(s) da discussão da causa que sejam relevante(s) para a decisão, ou seja, a que decorre da circunstância de o tribunal não ter dado como provados ou como não provados todos os factos que, sendo relevantes para a decisão da causa, tenham sido alegados pela acusação e pela defesa ou resultado da discussão”[1], entendendo-se, pois, que dada a falta de apuramento de factos relevantes que se impunha ao tribunal de julgamento apurar, foi insuficiente a matéria de facto necessária à decisão, entendida esta como a decisão justa que devia ter sido proferida, e não como a decisão que efetivamente o foi[2].

Assim, sendo ainda evidente que não estamos perante factos que devam considerar-se provados pelos documentos em causa sem mediação e decisão do tribunal de julgamento, impõe-se o reenvio do processo para julgamento sobre os factos ora invocados pelo recorrente Hernâni, nos termos do art. 426º do CPP.

3.2. O arguido HM invoca também nulidade de sentença por omissão de pronúncia, em virtude de o tribunal a quo não ter ponderado sobre a aplicação do regime do jovem delinquente previsto no Dec-Lei n.º 401/82, manifestando ainda a pretensão de a pena aplicável sempre dever ser especialmente atenuada em face do arrependimento do arguido, nos termos do art. 72º nº2 c) do C. Penal.

3.2.1. Quanto à invocada nulidade de sentença, o arguido recorrente não completara ainda 21 anos de idade à data dos factos (cfr. arts 1º e 4º do Dec.-lei 401/82 de 23 de setembro) pelo que é-lhe aplicável, em abstrato, o regime dos jovens adultos previsto naquele diploma, sendo obrigatório proferir decisão sobre a aplicação do regime dos jovens adultos pelo tribunal de julgamento sempre que se mostrem verificados os seus pressupostos formais, como acontece no caso presente, conforme entendimento jurisprudencial pacífico.

Porém, o tribunal a quo nada disse sobre a aplicação ao arguido do regime dos jovens adultos, pelo que verifica-se nulidade de sentença por omissão de pronúncia nos termos do art. 379º nº1 c) do CPP, como é entendimento comum, mas que não seguíamos (conforme reafirmado em recente acórdão de 10.10.2017), alterando a nossa posição a esse respeito por considerarmos que a relevância e autonomia da aplicação do regime dos jovens adultos ou, por exemplo, da suspensão da execução da pena ou outra pena de substituição, devem considerar-se questões que o tribunal a quo deve apreciar para efeitos do art. 379 nº 1 c) do C.P.Penal, sem prejuízo de o tribunal de recurso conhecer das questões de que o tribunal a quo deixou de conhecer, de acordo com a regra da substituição ao tribunal recorrido, caso entenda nada obstar à sua apreciação, tal como expressamente se estabelece no art. 665.º do N.C.P.Civil.

In casu, a Relação não dispõe de todos os dados para a decisão uma vez que os factos a julgar na sequência do reenvio relevam para a decisão omitida sobre a aplicação, em concreto, do regime dos jovens adultos, pelo que, verificada a apontada nulidade de sentença, cumpre ao tribunal a quo decidir a questão omitida.

3.2.2. Por outro lado, uma vez que é ordenado o reenvio para o julgamento sobre os factos invocados com relevância para a questão do alegado arrependimento do arguido HM, este julgamento releva para a decisão sobre a pretendida atenuação especial da pena com esse fundamento, nos termos do art. 72º nº 2 c) do C. Penal, pelo que é prematura qualquer decisão sobre a mesma sem prévio julgamento sobre os factos omitidos. Fica, assim, prejudicada a decisão sobre a pretendida atenuação especial da pena com fundamento em ter havido atos demonstrativos de arrependimento, que será apreciada pelo tribunal a quo na sequência do julgamento sobre a matéria de facto a decidir no âmbito do presente reenvio, dado constituir agora questão apresentada à decisão do tribunal de julgamento.

III. Dispositivo
Nesta conformidade, acordam os Juízes na 2ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em julgar totalmente procedente o recurso interposto pelo MP e parcialmente procedentes os recurso interpostos pelos arguidos FJ e HM e, em consequência:

1. Relativamente ao arguido HM, julgando-se verificado o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada previsto no art. 410º nº2 al. a) do CPP, determina-se o reenvio do processo para julgamento dos seguintes factos alegados pelo arguido e não conhecidos pelo tribunal a quo:

- O arguido entregou ao ofendido JB a quantia de 100€ a título de compensação pelos factos descritos de 1) a 3) e dirigiu-lhe desculpas pelos mesmos factos pela carta de fls 659;

- O telemóvel identificado sob os números de 1) a 3) da factualidade provada descrita na sentença foi recuperado pelas autoridades policiais e entregue ao ofendido JB durante o Inquérito.

Em consequência do reenvio ora determinado declara-se parcialmente sem efeito a sentença recorrida de modo a que o novo julgamento parcial do objeto do processo possa ser tomada em conta na decisão sobre a aplicabilidade do regime dos jovens adultos e sobre a atenuação especial da pena com fundamento em atos de arrependimento do arguido, bem como, em todo o caso, na determinação da medida da pena concreta a aplicar ao arguido HM.

2. No que concerne ao arguido FJ, revoga-se a sentença recorrida na parte em que lhe aplicou a pena única de cinco anos e seis meses de prisão, decidindo, em substituição, condená-lo na pena única de 5 anos de prisão em cúmulo jurídico das penas parcelares de 5 anos e 1 ano, de prisão, que lhe foram aplicadas em primeira instância e que, não tendo sido objeto de recurso, se mantêm.

Sem custas - cfr art. 513º do CPP

Évora, 21 de dezembro de 2017

(Processado em computador. Revisto pelo relator.)

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(António João Latas)

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(Carlos Jorge Berguete)

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[1] cfr. Ac STJ 7/7/99, proc. nº 99P348.
[2] cfr. Ac. STJ de 13/5/98, CJ, Acs. do STJ, t. II, pág. 199.