Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1004/05.2TBLLE.E4
Relator: ALBERTINA PEDROSO
Descritores: DECISÃO SURPRESA
ANULAÇÃO DE JULGAMENTO
CASO JULGADO
NOVO JULGAMENTO
CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA
OMISSÃO DE FORMALIDADES
NULIDADE
CONHECIMENTO OFICIOSO
REGIME DE ARGUIÇÃO
PAGAMENTO DO PREÇO
SINAL
RESTITUIÇÃO DO SINAL EM DOBRO
Data do Acordão: 12/21/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I - A sentença proferida na sequência de anulação das anteriores audiências de julgamento, com nova produção de prova, que condenou a Ré que havia sido absolvida na sentença anulada, não pode, de forma alguma, ser qualificada como uma decisão surpresa.
II - Ao invés, nulidade existiria se a julgadora, nestas circunstâncias, tivesse «aproveitado» a prova anteriormente produzida, em violação do princípio da plenitude da assistência do juiz, vertido no artigo 605.º, n.º1, do CPC, já que as circunstâncias do caso aconselhavam a repetição dos actos já praticados.
III - A omissão do cumprimento das formalidades previstas no n.º 3 do artigo 410.º do CC, constitui uma nulidade atípica, ou mista, não invocável por terceiros, nem cognoscível oficiosamente pelo tribunal, podendo ser arguida, a todo o tempo, apenas pelo promitente-comprador, destinatário da norma protectora, e excepcionalmente pelo promitente-vendedor, se tiver sido aquele a dar-lhe causa culposamente, o que este tem que alegar e demonstrar.
IV - O pagamento integral da quantia correspondente ao preço total acordado para o contrato prometido, ainda no âmbito do contrato-promessa, não obsta à qualificação de tal entrega como tendo sido efectuada a título de sinal.
V - O simples facto de haver uma quantia entregue a título de princípio de pagamento do preço à qual as partes atribuíram o carácter de sinal, outra quantia expressamente entregue a título de reforço de sinal, e ainda uma quantia restante, entregue para pagamento do preço, sem que as partes lhe tenham atribuído esse carácter de sinal, não basta para afastar a presunção decorrente do artigo 441.º do CC.
VI - Não configurando a declaração de quitação do recebimento do indicado valor, nos termos em que foi efectuada como sendo a título de pagamento do preço final, convenção expressa ou tácita que inequivocamente afaste a natureza de sinal, funciona de pleno a indicada presunção legal, pelo que, atento o preceituado no artigo 442.º, n.º 2, do CC, a promitente-compradora, tem o direito a exigir da Ré/Recorrente o pagamento do valor prestado em dobro. (sumário do relator
Decisão Texto Integral: Tribunal Judicial da Comarca de Faro[1]

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]:

I – RELATÓRIO
1. A. instaurou em 10-04-2005 a presente acção declarativa constitutiva, sob a forma de processo ordinário, contra R., peticionando que:
a) Seja proferida sentença que produza os efeitos da declaração negocial de venda da Ré de um prédio misto identificado nos autos na sequência do contrato-promessa de compra e venda celebrado entre as partes, em conformidade com o artigo 830.º, n.ºs 1 e 4 do Código Civil, condenando esta a cumprir a obrigação de realizar a escritura pública de compra e venda;
b) A Ré seja condenada no pagamento de uma indemnização a liquidar em execução de sentença, a título de danos patrimoniais decorrentes da mora;
c) Subsidiariamente, se considere o contrato-promessa resolvido por incumprimento imputável à Ré, condenando a mesma a pagar-lhe a quantia de 678.366,00€, equivalente ao dobro do sinal recebido[3].
Em fundamento da sua pretensão, alegou, em síntese, que celebrou com a R., em 26 de Janeiro de 2004, um contrato-promessa de compra e venda relativo a um prédio misto, tendo-lhe pago de sinal 339.183,00€, ou seja, o preço total acordado, devendo o contrato definitivo, a ser marcado pela Ré, ser celebrado até ao final do ano de 2004, avisando aquela a Autora com 15 dias de antecedência, o que não fez, pelo que incorreu em mora, continuando a utilizar o prédio e retirar rendimentos do mesmo por via do arrendamento de vários anexos, nunca diligenciando para obter a necessária licença de habitabilidade.

2. Regularmente citada, a ré contestou, impugnando os factos alegados pela Autora, pretendendo a suspensão da instância por existência de causa prejudicial relativamente a processo-crime no qual apresentou queixa contra … relativamente a factos relacionados com o contrato-promessa em litígio nos autos, invocando a nulidade/invalidade do contrato-promessa por erro, aduzindo que foi enganada quando assinou o contrato-promessa de compra e venda em causa nos autos, o qual era um documento em português cujo conteúdo desconhecia, tendo assinado os documentos apenas na convicção de que apenas contraiu um empréstimo de 70.000,00€ para com o sócio da Autora, que nunca percebeu que estava a vender a sua casa porque nunca isso foi acordado, sendo que sucessivos expedientes foram usados pelo sócio da Autora para obter a sua assinatura em documentos que sabia que a Ré não entenderia, em conjugação com o intérprete, o referido …, que alegadamente lhe traduziu o conteúdo dos referidos documentos e que a foi também induzindo intencionalmente para o efeito, nunca lhe falando na venda de qualquer casa, que nunca teve intenção de vender a casa nem recebeu o dinheiro referido na petição inicial, pelo que o contrato-promessa deve ser declarado nulo.
Para além disso, invocou a invalidade do contrato-promessa por falta de licença de habitabilidade e por a assinatura da Autora só ter sido reconhecida notarialmente em data muito posterior à da assinatura do contrato.
A Ré deduziu ainda reconvenção, pedindo a condenação da Autora e do seu legal representante a pagar-lhe uma indemnização no valor que se vier a liquidar em execução de sentença, alegando prejuízos decorrentes da situação supra descrita que a coloca na posição de não poder dispor livremente da sua casa, vivendo com parcos rendimentos, não podendo ainda concretizar os danos sofridos.
Concluiu, pedindo a procedência das excepções alegadas com a declaração de nulidade do contrato ou, caso se entenda, a improcedência da acção e procedência da reconvenção.

3. Na réplica, a Autora impugnou a factualidade alegada na contestação, invocou a caducidade do direito da Ré invocar a anulabilidade do negócio com base em erro, sendo certo que o erro invocado constitui erro na declaração e não falta de consciência na declaração, para além de que a Ré não alega conhecimento ou que a Autora não podia ignorar a essencialidade do erro para a Ré.
Mais aduziu que a invocação pela Ré da invalidade do contrato-promessa por falta de licença de habitabilidade constitui abuso de direito.
A Autora procedeu ainda à ampliação do pedido, pedindo que, subsidiariamente, se considere o contrato-promessa de compra e venda em causa nos autos resolvido por incumprimento imputável à Ré, condenando a mesma a pagar-lhe a quantia de 678.366,00€, equivalente ao dobro do sinal recebido.

4. Na tréplica, a Ré pugnou pela inadmissibilidade legal da ampliação do pedido deduzido pela Autora na réplica e pela improcedência da excepção de caducidade, aduzindo ainda não haver lugar ao pagamento do sinal em dobro porque foi pago o preço integral e não um sinal[4].

5. Foi proferido despacho saneador que indeferiu o pedido de suspensão da instância por inexistência de questão prejudicial, admitiu o pedido reconvencional apenas contra a Autora (e não contra o seu legal representante), admitiu a ampliação do pedido da Autora deduzido na réplica, por legalmente admissível, e relegou para final o conhecimento das excepções peremptórias deduzidas pela Ré na contestação, tendo ainda fixado os factos assentes e a base instrutória, e sido admitido o incidente de arguição de falsidade dos documentos de fls. 252 a 255 (recibo de quitação redigido em língua portuguesa e inglesa e respectiva tradução certificada).

6. Realizou-se audiência de discussão e julgamento e foi proferida sentença que julgou improcedentes a acção e o pedido reconvencional, julgando “procedente a matéria de excepção deduzida pela R, declarando a anulação do contrato com base em erro de vontade”, da qual foi interposto recurso pela Autora, tendo este Tribunal da Relação, por Acórdão que faz fls. 1028 a 1063 dos autos, confirmado a decisão recorrida.

7. Interposto novo recurso, por Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Julho de 2011, que faz fls. 1163 a 1178 dos autos, foi determinada a baixa do processo a este Tribunal da Relação para se proceder a novo julgamento da matéria de facto, por se verificarem contradições na decisão de facto proferida e por insuficiência de averiguação da matéria de facto relevante para a decisão da causa.

8. Por Acórdão deste Tribunal da Relação de 27 de Outubro de 2011, que faz fls. 1190 a 1214, foi determinada a anulação do julgamento da matéria de facto e o aditamento à Base Instrutória de 3 quesitos (3º-A, 3º-B e 4º-A), com o teor indicado.

9. Realizou-se nova audiência de discussão e julgamento e foi proferida nova sentença que julgou improcedente a acção e declarou a anulação do contrato-promessa em causa nos autos (não se pronunciando acerca do pedido reconvencional), da qual foi interposto novo recurso, tendo sido determinado por novo Acórdão deste Tribunal da Relação, de 24 de Setembro de 2015, que faz fls. 1363 a 1380 dos autos, “a remessa dos autos à 1ª instância para que o Exmº Julgador, com base nas gravações efectuadas ou se necessário através da repetição da produção de prova e demais prova produzida nos autos, proceda à fundamentação da decisão de facto nos termos acima referidos”, por se entender que existia insuficiência e obscuridade na referida fundamentação, em violação do disposto no artigo 607.º, n.º 4 do Código de Processo Civil de 2013.

10. Após várias vicissitudes, com vista a decidir qual a Senhora Juíza que deveria cumprir o determinado no indicado Acórdão, por decisão proferida em 27 de Maio de 2016, que faz fls. 1423 a 1427 dos autos, o Exm.º Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça decidiu o conflito, determinando que era competente para o efeito a actual titular do processo.

11. Realizada a audiência final, com a renovação de toda a prova, foi proferido despacho ao abrigo do disposto no artigo 613.º, n.ºs 2 e 3, do CPC, com a rectificação de lapsos de escrita, constantes no despacho saneador, e seguidamente foi proferida a sentença que faz fls. 1576 a 1637 dos autos, na qual se decidiu:
«a) Julgar parcialmente procedente a acção e, em consequência, declarar resolvido o contrato-promessa referido em 2) dos factos provados celebrado em 26 de Janeiro de 2004 e condenar a Ré … a pagar à Autora … a quantia de € 678.366,00, absolvendo-a do demais peticionado.
b) Julgar totalmente improcedente, por não provado, e, em consequência, absolver a Autora …. do pedido reconvencional deduzido pela Ré …».

12. Desta feita, foi a Ré que, inconformada, apresentou recurso de apelação, finalizando a respectiva minuta com prolixas conclusões, as quais, respondendo ao convite de aperfeiçoamento oportunamente formulado pela ora Relatora, sintetizou efectivamente, não ainda nas extensas conclusões novamente apresentadas mas no pedido formulado, nos seguintes termos:
«Deverá conceder-se provimento ao recurso, revogando-se a douta decisão de facto e substituindo-se por outra em que:
A) Se julgue a matéria de facto constante das alíneas 8), 13), 14), 15), 16), 17) e 18) dos factos considerados indiciariamente provados como não provada;
B) Se julguem provados os factos constantes das alíneas b), c) d) e) g), h), i), j), k), l) o), p), q), r), s) t, u) v) e w), que foram erradamente dados como não provados;
Consequentemente,
C) Julgar-se procedente, por provado, o presente recurso, absolvendo-se a Recorrente do pagamento da quantia de 678.366,00€ e declarando-se a anulação do contrato promessa de compra e venda por vício da vontade e falta de consciência da declaração da ora recorrente aquando da respectiva assinatura.
D) Declarar-se a nulidade do contrato promessa de compra e venda por preterição de formalidades legais e essenciais constantes nos n.ºs 2 e 3 do artigo 410.º do Código Civil.
E) Declarar-se erro na interpretação e aplicação do Direito por violação do instituto da inaplicabilidade do sinal».

13. Na alínea E) das conclusões, a Recorrente invocou ainda a nulidade da sentença por violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil[5], tendo a Senhora Juíza emitido pronúncia, considerando não se verificar a nulidade arguida.

14. Não foram apresentadas contra-alegações.

15. Observados os vistos, cumpre decidir.
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II. O objecto do recurso.
Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do CPC, é pacífico que o objecto do recurso se limita pelas conclusões das respectivas alegações, evidentemente sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, vistos os autos, as questões que importa apreciar no presente recurso, atenta a sua ordem lógica, consistem em saber se:
- se verifica a nulidade arguida;
- a indicada matéria de facto deve ser reapreciada;
- deve ser revogada a decisão recorrida, absolvendo-se a Ré do pedido.
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III – Fundamentos
III.1. – De facto
Na sentença recorrida consta que:
«a) Da discussão da causa resultaram provados, nos termos do disposto nos artigos 5º, nos 1 e 2, 574º, n.º 2 e 607º, n.º 4 do Código de Processo Civil de 2013, os seguintes factos:
I) Dos Factos Assentes
1) A ora A. é uma sociedade unipessoal por quotas, cujo objecto social é a compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim e manutenção de propriedades (Alínea A) dos Factos Assentes).
2) As ora Autora e Ré assinaram o documento junto a folhas 218 a 221 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, intitulado “Contrato-Promessa de Compra e Venda”, do qual consta, designadamente:
- Que a ora Ré declarou que é dona e legítima possuidora do prédio misto sito em …, freguesia de …, concelho de …, com a área total de 4.700 m2, composto por parte rústica e parcela urbana, descrito na Conservatória do Registo Predial de …, sob o n.° …, do livro … a fls. …, inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo n.° … e parte rústica sob o artigo n.° …, da freguesia de …;
- Que declarou ainda que pelo preço de € 339.183,00 (trezentos e trinta e nove mil cento e oitenta e três euros), que seria pago da forma ali estabelecida na cláusula terceira, prometia vender à ora Autora o mesmo prédio, livre de quaisquer ónus ou encargos e completamente devoluto de pessoas e bens;
- Que declarou ainda ter pleno conhecimento que o prédio referido não tem licença de habitabilidade, e que se comprometia a fazer todas as diligências junto da Câmara Municipal de … para a obter até à data da escritura;
- Que a escritura seria realizada até ao final do ano de 2004, sendo marcada pela ora Ré;
- Que a ora Ré declarou não perceber a língua portuguesa, e que indicou como intérprete da sua escolha …, o qual, sob compromisso de honra, traduziu para inglês o acordo referido, transmitindo todo o seu conteúdo à ora Ré;
- Que a ora Autora declarou aceitar o contrato e prometer comprar o prédio identificado (Alínea B) dos Factos Assentes).
3) As assinaturas apostas no referido contrato-promessa encontram-se reconhecidas notarialmente e presencialmente, a da ora Ré em 27-01-04 e a de …, na qualidade de sócio e gerente da ora Autora, em 30-07-04 (Alínea C) dos Factos Assentes).
4) Em 27 de Janeiro de 2004, a ora Ré recebeu um cheque no valor de € 20.000,00, que depositou na sua conta pessoal com o n.º …, Balcão n° … (Alínea D) dos Factos Assentes).
5) Em 20 de Fevereiro de 2004, a Ré recebeu do gerente da ora Autora, o Sr. …, o montante de € 12.500,00 (Alínea E) dos Factos Assentes).
6) No dia 7 de Abril de 2005, relativamente ao prédio objecto do documento referido em 2), foi subscrito pela ora Ré, e apresentado junto da CRP de …, o requerimento de registo provisório de aquisição a favor de …, de que o documento junto com o n.º 3 ao requerimento inicial do procedimento cautelar que correu termos por apenso a estes autos constitui cópia e que se dá por reproduzido (Alínea F) dos Factos Assentes).
7) No mesmo pedido de registo refere-se que o preço seria de € 400.000,00 (Alínea G) dos Factos Assentes).
II) Da Base Instrutória
8) O … traduziu para inglês o documento referido em 2), transmitindo à Ré todo o seu conteúdo, que compreendeu o mesmo (Artigos 1º e 2º da Base Instrutória).
9) A ora Ré não estava presente quando foi reconhecida a assinatura no dia 30-07-2004 (Artigo 4º -A da Base Instrutória).
10) Para além do cheque referido em 4), a ora Ré recebeu ainda, em 27 de Janeiro de 2004, do sócio gerente da ora Autora, outro cheque no valor de € 20.000,00 (Artigo 5º da Base Instrutória).
11) O cheque referido em 10) foi recebido pela Ré que posteriormente o entregou a …, que procedeu ao seu levantamento em numerário (Artigo 6º da Base Instrutória).
12) A quantia referida em 5) foi recebida através de cheque (Artigo 10º da Base Instrutória).
13) Foi entregue a título de reforço do sinal e por conta do preço total estabelecido no documento referido em 2) dos factos provados (Artigo 11º da Base Instrutória).
14) Em 5 de Março de 2004 o gerente da Autora entregou à Ré um cheque no montante de € 286.683,00, que a mesma descontou e fez sua a quantia no mesmo inscrita (Artigos 14º e 15º da Base Instrutória).
15) A quantia de € 286.683,00 foi igualmente entregue a título de reforço de sinal e final de pagamento do preço relativo ao contrato promessa referido em 2) celebrado entre Autora e Ré (Artigo 16º da Base Instrutória).
16) A Ré assinou em 05-03-2004, depois de totalmente elaborados, e compreendeu o conteúdo dos escritos de fls. 252 e 255, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, ou seja, do recibo de quitação de 05-03-2004, em português, subscrito pela Ré, do qual resulta que esta declara ter recebido da Autora a quantia de € 286.683,00, de que dá quitação, “por conta do preço previsto no contrato de promessa de compra e venda, celebrado em 26 de Janeiro de 2004 (...) sobre o prédio misto sito em …, freguesia de …, concelho de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de …, sob o n.º …, do Livro … a fls. …, inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo … e parte rústica sob o artigo n.º …, da freguesia de …, mais declarando ainda que, com este recebimento, o preço do prédio objecto do contrato-promessa e supra identificado, se encontra totalmente pago” e do recibo de quitação de 05-03-2004, em inglês, subscrito pela Ré, do qual resulta que esta declara ter recebido da Autora a quantia de € 286.683,00, de que dá quitação, “do preço estipulado no Contrato Promessa de Compra e venda, por mim em celebrado em 26 de Janeiro de 2004 com a referida sociedade referente ao prédio localizado em …, freguesia de …., concelho de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de …, sob o n.º …, do Livro …, folhas …, inscrito na Repartição de Finanças, a parte urbana sob o número … e parte rústica do terreno sob o número …, também da freguesia de …, concelho de …. Declaro ainda que o preço estipulado no Contrato Promessa e acima mencionado para a compra do prédio foi pago na totalidade com este recebimento, o preço do prédio objecto do contrato-promessa e supra identificado, se encontra totalmente pago” (Artigos 13º e 20º da Base Instrutória).
17) Pelo menos entre Setembro de 2004 e Março de 2005, o gerente da Autora foi várias vezes a casa da Ré, acompanhado de pessoa que traduzisse a conversa, tentando saber quando esta última iria obter a licença de habitabilidade e quando pretendia sair da casa referida em 2) considerando o acordado no contrato-promessa (Artigos 36º e 37º da Base Instrutória).
18) Entre 10-03-2005 e 23-03-2005 foi trocada correspondência por telecópia entre o Dr. … e o escritório da Dr.ª …, Advogada da Ré, cujas respostas são remetidas por …, invocando a qualidade de secretária daquela e atenta a sua ausência do escritório, em que o Dr. … remete, “Conforme combinado”, uma minuta com vista à assinatura de um aditamento ao contrato-promessa em litígio, com prorrogação do prazo da sua assinatura até 06-09-2005, comprometendo-se a promitente-vendedora a obter a licença de habitabilidade do prédio até à nova data da escritura, escolhendo esta última como intérprete a Dr.ª …, sendo que a Sra. Secretária responde que a sua cliente poderá assinar o aditamento ao contrato, mas precisa de ver “uma cópia dos cheques que foram passados à ordem de Mrs. … e por ela endossados atrás, correspondentes aos valores alegados pelo Sr. …” e, depois de acusar a recepção da documentação enviada, solicita a marcação de uma reunião, bem como a respectiva autorização de dispensa de sigilo profissional da Ordem dos Advogados com vista à sua junção aos autos, tal como resulta de fls. 805 a 820, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (Artigo 38º da Base Instrutória).
19) Para proceder ao pagamento do preço objecto do documento referido em 2), a Autora contraiu um empréstimo bancário junto do B…, SA, o qual foi amortizado (Artigo 39º da Base Instrutória).
III) Nos termos do disposto nos artigos 5º, n.º 2, als. a) e b) e 607º, n.º 4 do Código de Processo Civil de 2013:
20) A Ré nunca diligenciou, em relação ao imóvel referido em 2), pela obtenção da licença de habitabilidade (Artigo 28º da petição inicial).
21) A Ré apresentou queixa crime contra … em 29 de Setembro de 2004, dando origem ao processo n.º 499/04.6 TALLE, no âmbito do qual … veio a ser constituído arguido e que foi objecto de despacho de arquivamento, tal como resulta de fls. 720 a 734, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
22) A Autora intentou em 19 de Abril de 2005 o procedimento cautelar comum apenso aos autos contra a Ré, com vista a impedir a venda por esta do imóvel referido em 2) a C…, o qual foi decretado por decisão de 02-05-2005, tendo a aí requerida sido citada em 11 ou 12 de Maio de 2005.
23) A presente acção foi intentada em 8 de Abril de 2005.
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b) Não se provaram quaisquer outros factos que se não compaginam com a factualidade apurada, designadamente que:
a) A ora Ré declarou que o conteúdo do documento referido em 2) dos factos provados correspondia à sua vontade (Artigo 3º da Base Instrutória).
b) O sócio-gerente da Autora sabia que a ora não Ré tinha conhecimento do contrato-promessa de compra e venda (Artigo 3º-A da Base Instrutória).
c) A ora Ré assinou o documento “contrato-promessa de venda” sem saber e sem ter consciência do que estava a assinar (Artigo 3º-B da Base Instrutória).
d) A ora Ré assinou o documento referido em 2) dos factos provados convencida de que estava a celebrar com o gerente da Autora um empréstimo de € 70.000,00 (Artigo 4º da Base Instrutória).
e) A… declarou à Ré que iria entregar o cheque referido em 4) dos factos provados ao gerente da Autora, referindo que se tratava da comissão que o mesmo levava por lhe ter emprestado o dinheiro e que o Sr. … estava a tirar aquele dinheiro dos negócios porque se encontrava a separar-se da mulher (Artigos 7º a 9º da Base Instrutória).
f) A Ré, apôs a sua assinatura no documento cuja cópia foi junta com o n.º 7 da petição inicial quando o mesmo se encontrava em branco, isto é, sem a declaração que dele consta agora (Artigo 12º da Base Instrutória).
g) A Ré assinou o documento n° 9 - recibo de quitação de € 286.683,00 junto com a Petição Inicial- sem entender o conteúdo do mesmo (Artigo 17º da Base Instrutória).
h) A Ré assinou o documento cuja cópia está a fls. 52, datado de 5 de Março de 2004-tradução em língua inglesa do doc. 9- sem entender o seu conteúdo (Artigo 19º da Base Instrutória).
i) O gerente da ora Autora entregou o cheque referido em 14) dos factos provados dizendo-lhe que o assinasse por trás, o que esta fez, após a tradução dos Sr. … (Artigo 21º da Base Instrutória).
j) A ora Ré, seguindo as instruções do Sr…., deu então o cheque ao mesmo e este entregou-o ao funcionário do Banco B… (Artigo 22º da Base Instrutória).
k) Sem que, quer o Sr. R…, quer o Sr. A…, quer o funcionário do Banco tivessem dirigido qualquer palavra à ora Ré (Artigo 23º da Base Instrutória).
l) O gerente da ora Autora serviu-se sempre do facto da ora Ré não entender a língua portuguesa para a levar a assinar documentos cujo conteúdo a ora Ré não entendia (Artigo 24º da Base Instrutória).
m) A Ré assinou e entregou em 27 de Janeiro de 2004 no registo predial um pedido de registo provisório de aquisição de propriedade do prédio a favor da ora Autora sem compreender o conteúdo de tal documento (Artigo 25º da Base Instrutória).
n) Em 13 de Agosto de 2004 requereu a renovação do mesmo registo, igualmente sem compreender o conteúdo de tal requerimento (Artigo 26º da Base Instrutória).
o) Ao assinar todos os documentos mencionados, a ora Ré apenas pretendeu obter um empréstimo no valor de € 70.000,00 (Artigo 27º da Base Instrutória).
p) A ora Ré havia já tentado junto das instituições bancárias obter tal empréstimo, sem que o tivesse conseguido (Artigo 28º da Base Instrutória).
q) A ora Ré carecia de dinheiro para fazer face às suas despesas mensais (Artigo 29º da Base Instrutória).
r) Face a tal situação económica, o Sr. A… apresentou-lhe o Sr. R…, explicando-lhe que este lhe concederia o empréstimo (Artigo 30º da Base Instrutória).
s) Ambos utilizaram a circunstância da ora Ré não saber ler nem falar português para conseguir que assinasse documentos com desconhecimento total do seu conteúdo (Artigo 31º da Base Instrutória).
t) Para que a ora Ré assinasse os documentos foi-lhe ainda referido que estava a ajudar o Sr. R… a realizar negócios (Artigo 32º da Base Instrutória).
u) Actualmente a ora Ré não pode dispor do único bem imóvel de que tem (Artigo 33º da Base Instrutória).
v) Vive com uma reforma de € 346,00 mensais, que constituem o seu único rendimento e sozinha (Artigo 34º da Base Instrutória).
w) Só em 21 de Setembro de 2004 é que a ora Ré tomou conhecimento de que tinha declarado prometer vender o prédio em conformidade com o teor do documento referido em 2) dos factos provados (Artigo 35º da Base Instrutória).».
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Mais se consignou que:
«a matéria e/ou documento não seleccionada dos articulados, para além dos constantes do despacho-saneador, é mera repetição, conclusiva, de direito, de mera impugnação, meras suposições, não incumbe o ónus da prova da mesma a quem a alega e não se selecciona o facto na negativa ou não assume qualquer relevância para a decisão da causa, só tendo sido seleccionados, para além dos constantes dos articulados, considerando o disposto no artigo 5º, n.º 2 do Código de Processo Civil de 2013, os factos essenciais, complementares e instrumentais que se consideram relevantes para a decisão e compreensão da matéria em causa e para a compreensão do litígio (…)».
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Porém, como é sabido, sendo o artigo 607.º do CPC, mormente os seus n.ºs 4 e 5, aplicável à elaboração dos acórdãos ex vi do disposto no artigo 663.º, n.º 2, da mesma codificação, importa ainda considerar o conteúdo da cláusula terceira do documento junto a folhas 218 a 221 dos autos, a que alude o ponto 2) dos Factos Assentes, intitulado “Contrato-Promessa de Compra e Venda”, intitulada Forma de pagamento do preço, e que tem o seguinte teor:
«O preço será pago da seguinte forma:
a) O montante de 40.000,00 (Quarenta mil euros) a título de sinal e princípio de pagamento, de que aqui dá recibo e plena quitação, com a assinatura do presente contrato;
b) O restante no prazo de 30 dias a contar da data de assinatura do presente contrato».
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III.2. – O mérito do recurso
III.2.1. – Da nulidade arguida
Intitulando-a como «questão prévia» invoca a Recorrente a nulidade da sentença, por violação da alínea d) n.º 1 do artigo 615.º do CPC, com o fundamento de que se trata de «uma sentença completamente surpresa, na medida em que o processo corre termos há (12) doze anos nos tribunais, tendo as decisões sido sempre favoráveis à aqui recorrente, tendo esta sentença pugnado pela surpresa e condenado a Recorrente, nomeadamente, quanto aos factos dados como provados, mais relevantes para o vício de vontade».
Aduziu a Senhora Juíza que não se verifica a invocada nulidade porquanto o Tribunal não está «vinculado às decisões anteriores e anuladas nos autos, sob pena de não ser necessária nova produção de prova como foi determinado nos autos».
Apreciando.
Decorre da invocada alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Esta causa de nulidade da sentença consiste, portanto, na omissão de pronúncia, sobre as questões que o tribunal devia conhecer; ou na pronúncia indevida, quanto a questões de que não podia tomar conhecimento[6].
É entendimento pacífico que esta nulidade está em correspondência directa com o anteriormente preceituado no artigo 660.º, n.º 2, do CPC, e agora vertido no artigo 608.º, n.º 2, do CPC, que impõe ao juiz a resolução de todas as questões que as partes submeteram à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras, não podendo, porém ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo as que sejam de conhecimento oficioso, constituindo, portanto, a sanção prevista na lei processual para a violação do estabelecido no referido artigo[7].
Acresce que, no domínio do novo CPC tem sido entendido que configurando a sentença proferida uma decisão-surpresa, o meio próprio para atacar a violação do princípio do contraditório plasmado no artigo 3.º, n.º 3, do CPC, seria a invocação do incumprimento pelo juiz da audição prévia à decisão, gerando uma nulidade processual nos termos do disposto no artigo 195.º, n.º 1, do CPC.
Porém, nos casos em que tal nulidade processual decorrente da violação do princípio do contraditório se encontre coberta por uma decisão judicial que admita recurso, aquela é consumida pela nulidade da sentença por excesso de pronúncia, prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, porquanto, sem a prévia audição das partes, o tribunal conhece de questão que não podia conhecer, por outras palavras, “o tribunal não pode conhecer do fundamento que utilizou na sua decisão”[8].
Portanto, existindo uma efectiva decisão surpresa, verifica-se a comissão de tal nulidade.
Acontece que, na situação presente, a sentença recorrida não pode, de forma alguma, ser qualificada como uma decisão surpresa.
Na verdade, a proibição da decisão surpresa constitui um desenvolvimento do princípio do contraditório vertido no artigo 3.º, n.º 3 do CPC, e postulado pelo direito a um processo equitativo que decorre do artigo 20.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, princípio que o juiz deve observar e fazer cumprir ao longo de todo o processo, não lhe sendo lícito decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem, salvos os casos de manifesta desnecessidade.
Ora, no caso em apreço, conforme resulta da tramitação processual supra referida no Relatório, efectivamente a ora Recorrente foi absolvida nas duas anteriores sentenças proferidas em primeira instância. Olvida, porém, que as mesmas foram anuladas e, na sequência das vicissitudes ali também sumariamente relatadas, foi, no fundo, determinada nova produção de prova. Outra coisa não podia ocorrer, porquanto a julgadora que proferiu a decisão ora recorrida, não tinha presidido às anteriores audiências de julgamento, logo, nulidade existiria se a mesma, nestas circunstâncias, tivesse «aproveitado» a prova anteriormente produzida, em violação do princípio da plenitude da assistência do juiz, vertido no artigo 605.º, n.º1, do CPC, já que as circunstâncias do caso aconselhavam a repetição dos actos já praticados.
Acresce que, o Tribunal não decidiu com base em factos que as partes não tenham alegado, nem decidiu com base em questões de direito que as partes não conhecessem ou não tivessem a obrigação de conhecer, em face das posições por cada uma delas vertidas nos articulados[9], razão pela qual, também não ocorre a nulidade da sentença com base no invocado excesso de pronúncia.
O que acontece é que a Recorrente discorda do entendimento expresso pela Senhora Juíza na decisão proferida quanto à matéria de facto dos artigos que indica. Porém, esse inconformismo não configura nulidade, não sendo a arguição da indicada nulidade que justifica a sua discordância quanto ao que foi decidido[10], enquadrando-se antes no eventual erro de julgamento, já que aquilo que a mesma pretende salientar é que a decisão tomada pela julgadora está errada.
Trata-se de questão diversa, que será apreciada no local próprio, que é a de saber se a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, designadamente a impugnada, porque os factos tidos por assentes ou a prova produzida impunham decisão diversa, nos termos previstos no artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Concluindo, no caso vertente, a sentença recorrida não enferma da alegada nulidade, cabendo antes apreciar se se verifica o invocado erro de julgamento, iniciando-se pela pretendida reapreciação da matéria de facto.
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III.2.2. – Da impugnação da matéria de facto
Pretende a Recorrente que se julgue a matéria de facto constante das alíneas 8), 13), 14), 15), 16), 17) e 18) dos factos considerados indiciariamente provados como não provada; e correspondentemente se julguem provados os factos constantes das alíneas b), c) d) e) g), h), i), j), k), l) o), p), q), r), s) t, u) v) e w), que foram erradamente dados como não provados. Mais pretende que sejam aditados os factos que indica, relativos à mesma matéria de facto.
Cumprindo a Apelante o preceituado no artigo 640.º do CPC relativamente aos ónus a cargo do Recorrente que impugna a matéria de facto, incumbe a este Tribunal apreciar se efectivamente a prova produzida nos autos, impõe decisão diversa da recorrida, conforme referido no artigo 662.º, n.º 1, da mesma codificação.
Como é sabido, se as circunstâncias em que se inscreve a actuação da Relação quanto à reapreciação da matéria de facto, devem ser idênticas às que existiam aquando da prolação da decisão relativa à matéria de facto pela primeira instância, porquanto também a segunda instância tem que proceder a uma valoração autónoma de todos os meios de prova produzidos quanto à matéria impugnada, tendo os poderes conferidos por lei à Relação quanto ao princípio fundamental da livre apreciação das provas fixado no artigo 655.º, n.º 1, do CPC, amplitude idêntica à conferida ao tribunal de 1.ª instância.
Acresce ainda que, relativamente à reapreciação do julgamento de facto pela Relação cumpre ter presente que a mesma se destina primordialmente a corrigir invocados erros de julgamento que - atento o preceituado no artigo 662.º, n.º 1, do CPC, que rege sobre a modificabilidade da decisão de facto -, se evidenciem a partir dos factos tidos como assentes, da prova produzida ou de um documento superveniente, por forma a imporem decisão diversa. Significa esta formulação legal que não basta que a prova produzida nos autos permita decisão diversa, necessário é que a imponha. Por isso que, se exige ao Recorrente que motive as alegações de recurso, dizendo as razões que determinam, em seu entender, diverso juízo probatório, para que a Relação possa aquilatar se os meios de prova por aquele indicados impõem ou não decisão diversa da recorrida quanto aos concretos pontos de facto impugnados.
Posto este enquadramento genérico, vejamos então se assiste ou não razão à Recorrente.
Quanto ao pretendido aditamento, trata-se de factualidade de todo irrelevante para a decisão do pleito. Na verdade, conforme já havia referido a Senhora Juíza, diremos singelamente que só devem ser seleccionados para integrar a matéria de facto provada e não provada, do acervo factual vertido pelas partes nos articulados, considerando o disposto no artigo 5.º, do Código de Processo Civil, os factos essenciais, complementares e instrumentais que se considerem relevantes para a decisão e compreensão da matéria em causa e para a compreensão do litígio. Tanto assim é que, em face do preceituado no artigo 607.º, n.º 4, do CPC, verificamos que quando existem ilações a retirar dos factos instrumentais, são estas que devem constar na fundamentação de facto da sentença. Assim, para além do facto relativo à cláusula do contrato que se refere à forma de pagamento do preço, que já aditámos, nenhuma outra matéria de facto assume relevância na decisão da causa que não decorra já da matéria de facto considerada provada e não provada, designadamente daquela contra a qual a Apelante se insurge.
Vejamos, então, a matéria de facto impugnada.
No que tange aos factos 8 e 13 a 18, depois de pormenorizadamente enunciar todo o acervo probatório que constitui a prova documental e de sintetizar cada um dos depoimentos e declarações das partes, fazendo seguidamente a respectiva apreciação crítica, numa fundamentação em que escalpeliza cada um dos passos do respectivo raciocínio, e que globalmente se estende por 30 páginas, a Senhora Juíza concretizou mais sinteticamente os meios probatórios que fundaram a respectiva convicção, considerando quanto àqueles referidos factos que se mostram provados, como justificou, «com base na cópia do cheque emitido por A.M.R. à Ré, no valor de € 20.000,00 e datado de 27-01-2004, assinado por trás pela Ré de fls. 38, na cópia do cheque emitido por A.M.R.. à Ré, no valor de € 20.000,00 e datado de 27-01-2004, assinado por trás por A.M.L. e pago ao Balcão de fls. 41, na certidão comercial da Autora de fls. 208 a 210, nas certidões prediais relativa ao prédio em causa nos autos de fls. 211 a 217 dos autos e de fls. 201 a 222 e 337 a 345 do processo apenso, no contrato-promessa de compra e venda subscrito pelo legal representante da Autora e pela Ré o entre os Autores e o Réu datado de 26-01-2004, de fls. 218 a 223, na cópia do cheque emitido por A.M.R. à Ré, no valor de € 12.500,00 e datado de 20-02-2004 que foi pago à Ré em numerário de fls. 227, na declaração subscrita pela Ré de 20-02-2004, na qual declara ter recebido da Autora a importância de € 12.500,00 da qual dá recibo e quitação, a título de reforço do sinal e por conta do preço previsto no contrato-promessa assinado em 26-01-2004 de fls. 228, na cópia do cheque emitido pela Autora à Ré, no valor de € 286.683,00 e datado de 05-03-2004 de fls. 231, na declaração do B…, SA da qual resulta que concedeu em 12-02-2004 à Autora um financiamento, sob a forma de conta corrente, no montante de € 250.000,00 que foi utilizado pela sociedade em 5 de Março de 2004, de fls. 231 (paginação repetida), nos recibos de quitação de 5 de Março de 2004, em português e inglês, subscritos pela Ré, nos termos acima descritos, de fls. 253 a 255, na certidão do inquérito n.º 499/04.6 TALLE, da qual consta a queixa que a ora Ré apresentou contra A.L. em 29 de Setembro de 2004 pela prática de crimes de corrupção, abuso de confiança, falsificação de documento e burla, indicando o legal representante da Autora como testemunha de fls. 719 a 756 e 1484 a 556, nas cópias do processo n.º 41/03.6 JAFAR, de fls. 761 a 783, 792 a 804 e 1557 a 1572, na cópia da certidão do registo predial relativa ao pedido de registo da aquisição provisória do prédio em causa nos autos a favor de C… requerido pela Ré, de 7 de Abril de 2005, de fls. 39 a 43 do procedimento cautelar apenso, na certidão do registo predial da qual consta um pedido de registo de aquisição provisória do prédio em causa nos autos a favor da Autora, de 27 de Janeiro de 2004, subscrito por J…, com assinatura reconhecida notarialmente por ter sido feita na presença de Notário, tendo sido registado provisoriamente por dúvidas por falta de documento matricial do prédio e um pedido de registo de aquisição provisória do prédio em causa nos autos a favor da Autora, de 23 de Agosto de 2004, com junção de certidão matricial do prédio de 04-03-2004, subscrito pelo legal representante da Autora, com assinatura reconhecida notarialmente por ter sido feita na presença de Notário de fls. 178 a 180 do processo apenso e na informação do Banco …, SA relativa aos procedimentos quanto ao pagamento do cheque no valor de € 286.683,00 e datado de 05-03-2004, na qual identifica … como um dos funcionários em funções na Agência de … naquela tarde, estando em causa um cheque cruzado que pode ser depositado ou pago a cliente do Banco, tendo sido efectuado, às 15.25 horas, por aquele funcionário, o pagamento em numerário à Ré que era cliente do Banco, após ter sido devidamente identificada através do seu passaporte, tendo o pagamento sido solicitado pela cliente …, Lda para concretização e um negócio com um estrangeiro, tendo que fazer o pagamento em numerário, de fls. 257 do processo apenso (considerando o ofício de fls. 225 e o requerimento de fls. 191 e 192 do referido processo apenso), conjugados com as regras da experiência comum e com as declarações do legal representante da Autora e das testemunhas …., cujas declarações em todo ou nas partes consideradas, se mostraram credíveis e consentâneas entre si nas partes em que intervieram na situação em litigio, tal como resulta da descrição supra dos depoimentos. (…)
Facto 17- Provado com base nas declarações do legal representante da Autora conjugadas com as declarações credíveis das testemunhas …. que acompanharam o primeiro à casa da Ré no sentido de traduzirem a conversa, com vista a saber quando é que a Ré pretendia abandonar a casa ou obter a licença de habitabilidade, pedindo a Ré sempre mais tempo.
Facto 18- Provado com base na correspondência por telecópia entre 10-03-2005 e 23-03-2005 remetida pelo Dr…. à Dr.ª … e as respostas dadas por …, na qualidade de secretária desta invocando a sua ausência do escritório, bem como a respectiva dispensa de sigilo profissional para a sua junção de fls. 805 a 820, não se tendo apurado qualquer reunião pessoal entre o legal representante da Autora e a Ré com vista ao aditamento do contrato promessa».
Já quanto às referidas alíneas da matéria de facto considerada não provada, aduziu que: «Em relação ao facto b), remete-se para a fundamentação dos factos 8) e 12) a 16) dados como provados, na medida em que se provou que a Ré tinha conhecimento do teor do contrato-promessa desde o seu início (ainda que assim não fosse, nunca o Tribunal poderia concluir que o legal representante da Autora sabia que a Ré não tinha conhecimento no mesmo, dado que recebia o dinheiro do preço, ia ao Notário, nunca tendo os dois falado um com o outro por não terem língua comum).
Quanto aos factos c) a e), g), h), l), m), o) e r) a t), remete-se para a fundamentação dos factos 8) e 10) a 16) dados como provados, na medida em que se explica a conclusão do Tribunal que a Ré sempre entendeu e soube o que estava assinar, mesmo que os documentos estivessem em língua portuguesa. (…)
Os factos i) a k) foram dados como não provados atenta a circunstância do Tribunal não ter dado qualquer credibilidade à versão da Ré que nem sequer é compatíveis com as mais elementares regras da experiência comum e foi infirmada pro outros elementos do processo, designadamente no facto de imediatamente a seguir a Ré ter assinado o recibo de quitação em inglês em que reconhece ter recebido o dinheiro em causa, estando numa entidade bancária a descontar um cheque, sendo necessário admitir um conluio entre funcionários do banco, o legal representante da Autora e A.M.L. para que a versão da Ré pudesse colher (sendo certo que a mesma na contestação e no requerimento de impugnação dos documentos de fls. 263 e 264 até pôs em causa ter assinado o documento em inglês, o que se demostrou cabalmente não corresponder à verdade até pelas suas próprias declarações).(…)
Em relação ao facto p), não foi produzida qualquer prova concreta que permita concluir que a Ré tentou obter um empréstimo junto de uma instituição bancária sem sucesso, não merecendo a versão da Ré credibilidade nos termos supra expostos, tanto mais que tinha um imóvel de elevado valor para dar de garantia e estava-se na época da euforia do financiamento bancário, como é do conhecimento geral.
Relativamente aos factos q) e v), a ordem de pagamento na conta da Ré da quantia de € 354,80 vinda do estrangeiro de 02-03-2005 de fls. 145 não permite a conclusão de que a Ré apenas tem de rendimento o valor de uma reforma nesse montante, sendo certo que a demais prova produzia infirma esse facto, na medida em que a Ré arrendava anexos das sua casa, como foi confirmado pelas declarações do legal representante da Autora, pela própria Ré e pela testemunha P… que vivia numa casa da Ré a troco da prestação e serviços, coincidentes nessa parte, sendo evidente que a Ré não conseguiria manter uma casa que, nas suas palavras vale € 800.000,00 com um rendimento daquele valor, atenta a descrição do e a sua área referidas na certidão predial (fls. 213), para além da própria Ré ter ainda referido que parte do dinheiro que o Sr. … lhe iria entregar seria para comprar um novo cavalo, claramente um bem de luxo, o que é de todo incompatível com um rendimento de € 346,00 mensais, sendo certo que também não se fez prova do motivo pelo qual a Ré necessitava de dinheiro, se era para fazer face às suas despesas mensais ou para fazer face a quaisquer outras despesas extraordinárias, motivo pelo qual se dão tais factos como não provados, considerando que a versão da Ré não mereceu credibilidade ao Tribunal nos termos supra expostos.
No que concerne ao facto u), para além de não se ter produzido qualquer prova de que a Ré não tem mais património, de igual modo a mesma poderá dispor do imóvel, ainda que sujeita às contingências de ter registado a presente acção no registo predial, pelo que se dá tal facto como não provado.
Por fim, quanto ao facto w), remete-se para a fundamentação dos factos 8) e 10) a 16) dados como provados na medida em que se apurou que a Ré desde o momento da assinatura do contrato promessa em causa nos autos teve conhecimento do teor do mesmo e que declarou pretender vender o imóvel à Autora pelo preço aí constante, sendo certo que, ainda que assim não fosse, da leitura do recibo de quitação em inglês de fls. 255 resulta inequívoco que a Ré desde esse momento não poderia ignorar a existência do contrato promessa dos autos, pelo que sempre seria dado como não provado que a Ré apenas em 21 de Setembro de 2004 teve conhecimento da existência do contrato».
Insurge-se a Recorrente contra a ponderação efectuada pelo primeiro grau relativamente aos indicados pontos 8 e 13 a 18 da matéria de facto provada e aos correspondentes pontos da matéria de facto considerada não provada.
Seguidamente procede à transcrição dos excertos das declarações de parte da Ré e do depoimento das identificadas testemunhas tendentes a confirmar o que vai invocando, após/ao passo que respiga também as declarações de parte do legal representante da autora e da testemunha identificada como tendo feito a tradução, tudo para significar que se conheceram num contexto da prática de um crime de burla, crime pelo qual a testemunha cumpre pena de prisão, não devendo merecer, como mereceram, a credibilidade do tribunal.
Assim, em apertada síntese das extensas alegações da Recorrente que fazem - só nesta parte da impugnação da matéria de facto -, fls. 1766 v.º a 1705 a 1791 v.º dos autos, podemos concentrar tudo o que alega e escalpeliza, na persistência de considerar que se deve considerar provada a versão dos factos por si trazida aos autos, no fundo, pretendendo um novo julgamento da causa, do qual resultem provados todos aqueles factos que indica, e que a Senhora Juíza considerou não provados, e vice-versa, por forma a obter a respectiva absolvição, com fundamento num alegado erro na celebração deste contrato-promessa de compra e venda quando pensava que estava a celebrar um contrato de mútuo.
Portanto, considerando que toda a convicção da Senhora Juíza quanto à prova produzida nos autos, se mostra vertida na fundamentação da matéria de facto a este respeito, e a motivação da Ré se encontra reproduzida nas respectivas alegações, mais do que estarmos a escalpelizar também e novamente cada um dos indicados factos, iremos referir as razões pelas quais, apreciados os documentos juntos aos autos e auditado o suporte áudio com vista a aquilatarmos do fluir dos depoimentos prestados pelas testemunhas e da forma como as partes prestaram declarações, não podemos deixar de sufragar a convicção formada pela Senhora Juíza - quanto à celebração do contrato-promessa de compra e venda em causa, e ao recebimento das quantias parcelares que somadas correspondem ao pagamento do preço -, relativamente às razões pelas quais considerou inverosímil a versão dos acontecimentos trazida aos autos pela Ré na parte concernente à celebração do contrato promessa de compra e venda em causa, com recurso a abundantes argumentos de ordem lógica que nos dispensamos de novamente repetir.
Efectivamente, estamos perante duas versões genericamente contraditórias apresentadas por cada uma das partes, e também de um modo geral, grosso modo corroboradas, na versão da Autora, pela testemunha …, e na versão da Ré, pela testemunha ….
Quando assim é naturalmente a livre convicção do julgador, que não é discricionária, antes controlável, designadamente por esta via recursória, assenta na apreciação dos diversos meios de prova, de forma conjugada e de acordo com as regras da experiência comum e do normal acontecer, retirando ainda dos factos conhecidos as necessárias ilações.
Vejamos, então, porque se nos afigura inverosímil a versão trazida pela Ré aos autos, na qual a mesma funda, a pretensão da modificação da matéria de facto, isto é, na alegação de que a sua intenção sempre foi obter um empréstimo, no valor de 70.000,00 €, nunca se tendo apercebido que estava a vender a sua casa, o que de modo algum queria, não tendo recebido as quantias correspondentes ao pagamento do preço, tudo tendo acontecido do modo descrito mercê de um conluio entre o legal representante da autora e a testemunha A…. Com o fundamento de ter sido vítima de uma burla, invoca a existência de erro na declaração com vista à anulação do contrato em apreço.
Ora se a versão trazida aos autos pela Ré até podia assumir foros de credibilidade, se tivéssemos apenas em conta o seu depoimento e o da testemunha …, mormente em face do depoimento prestado pelo Senhor Inspector da Polícia Judiciária, e pelo teor dos elementos que o mesmo apôs no processo-crime (designadamente de fls. 1577 a 1560), no sentido de que o legal representante da autora tinha em sua casa, e foi-lhe apreendido um elevado valor em dinheiro que não correspondia aos rendimentos que aquele declarava e que podia ser precisamente o recebido através do cheque endossado pela Ré, basta avançarmos nesse mesmo documento para verificarmos, pelo crime que lhe foi imputado, que o Ministério Público, apreciados esses elementos probatórios, também não retirou a ilação retirada pelo Senhor Inspector de que o dinheiro podia pertencer à Ré, mas sim, em síntese, que se tratava de um crime de branqueamento. Ou seja, ouvido o seu depoimento vemos que se trata de uma presunção do Senhor Inspector, a qual, na parte referente à queixa-crime apresentada pela Ré contra o Legal Representante da Autora e a testemunha A…, veio também a ser objecto de despacho de arquivamento.
Mas diremos ainda mais. Se apenas existisse o contrato-promessa de compra e venda subscrito pela Ré mas redigido em língua portuguesa, ainda a versão apresentada pela mesma poderia assumir foros de credibilidade.
Acontece, porém, que isso seria se só existissem esses meios de prova, o que não é o caso.
Na verdade, perante versões contraditórias, para sedimentar a sua convicção, o tribunal recorre desde logo à prova documental que exista, cotejando-a designadamente com a prova testemunhal, para aferir da credibilidade desta em face daquela.
E é precisamente na prova documental que se encontra a primeira grande brecha na credibilidade da versão que a Ré pretende ver provada.
De facto, é a existência do documento a que alude o ponto 16 da matéria de facto provada que, inquina irremediavelmente a verosimilhança da versão apresentada pela Ré.
Trata-se de um recibo de quitação, escrito em língua inglesa, subscrito pela Ré em 05-03-2004, no qual esta declara ter recebido da Autora a quantia de 286.683,00 € “da qual dou respectivo recibo e quitação, do preço estipulado no Contrato Promessa de Compra e venda, por mim celebrado em 26 de Janeiro de 2004 com a referida sociedade referente ao prédio localizado em …. Declaro ainda que o preço estipulado no Contrato Promessa e acima mencionado para a compra do prédio foi pago na totalidade”.
Claro que estamos cientes que a Ré apresentou uma justificação. Só que a mesma não se mostra plausível. Como podia a Ré não compreender o que ali estava escrito se o documento estava em língua inglesa, se referia ao contrato de compra e venda, identificava a casa e o valor do preço, que declarava já ter recebido. E compreendendo o seu teor, qual a razão para ter assinado só porque o A.L. lhe dizia? A Ré não alegou qualquer incapacidade ainda que temporária, nem coacção por parte daquele, sendo certo que a respectiva idade (que se calcula em face da ora declarada na acta da audiência de julgamento) não era tão avançada à data da celebração do contrato que nos faça conjecturar alguma dificuldade de compreensão de recibo com este teor, já que as expressões no mesmo usadas são de uso e compreensão corrente. Resta, pois, a natural conclusão decorrente das regras da experiência comum, que a Ré assinou tal documento porque o que constava no documento correspondia à realidade, tanto mais que, tendo invocado no respectivo articulado que havia assinado um documento em branco, veio a declarar que não o fez.
Mas, não existe só esta prova documental que afasta a versão apresentada pela Ré: temos ainda a certidão da CRP que atesta ter esta ido requerer pessoalmente o registo provisório de venda da casa a favor de um terceiro, quando diz sempre que nunca queria vender a casa mas apenas obter um empréstimo; temos as suas assinaturas apostas nos cheques, e temos também a correspondência a que alude o ponto 18 da matéria de facto provada. Pergunta-se, pois, por que razão, se a Ré desconhecia ter celebrado um contrato-promessa, se encontram provadas diligências com vista à realização de um aditamento ao mesmo? (não importa para o caso que este não se tenha concretizado, como a ré repisa nas suas alegações). O facto em referência, sendo instrumental, é seguramente mais um dos elementos probatórios que, conjugados, permitem a conclusão que leva a que se encontre provada e não provada a matéria de facto nos termos descritos.
Acresce que, está também demonstrado que todas as assinaturas são da Ré, a própria declarou não ter assinado qualquer documento em branco, foi vista no Banco a levantar os cheques, mormente o de maior valor que assinou, está explicado pelo funcionário do Banco o procedimento usual e, não diga a mesma que ele é somente genérico: se o funcionário procede assim sempre, por que razão não o faria em caso de levantamentos avultados, a demandarem cautelas e responsabilidade acrescida? Está também provado que a Ré se deslocou para o reconhecimento presencial da respectiva assinatura. Pergunta-se: se tinha dúvidas quanto ao que estava a assinar por que razão não as colocou aos funcionários?
Enfim, sumariamente demonstradas as razões pelas quais concordamos com a extensa e acertada fundamentação da matéria de facto efectuada pela Senhora Juíza, para a qual remetemos quanto ao acervo documental integral, resumo da prova oralmente produzida e respectiva apreciação crítica para evitar inútil e fastidiosa repetição, importando igualmente lembrar que nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil[11], «àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado».
Acresce ainda que, de acordo com o preceituado no artigo 344.º, n.º 1, do mesmo código «as regras dos artigos anteriores invertem-se quando haja presunção legal (…), e, de um modo geral, sempre que a lei o determine».
Ora, no caso em apreço, em cumprimento do disposto no indicado artigo 342.º, n.º 1, do CC, a A. juntou aos autos prova documental - os escritos denominados “Contrato Promessa de Compra e Venda” e “Recibo de Quitação” - dos factos que alegou relativamente à celebração do contrato e ao pagamento do sinal e do restante do preço acordado.
Em todos os documentos particulares em apreço encontram-se apostas assinaturas, no primeiro daqueles referidas como sendo de cada uma das partes outorgantes: a do legal representante da autora, na qualidade de promitente-comprador, e a da ré, na qualidade de promitente vendedora.
Conforme decorre do preceituado no artigo 374.º, n.º 1, do CC, «a letra e a assinatura, ou só a assinatura, de um documento particular consideram-se verdadeiras, quando reconhecidas ou não impugnadas pela parte contra quem o documento é apresentado, ou quando esta declare não saber se lhe pertencem, apesar de lhe serem atribuídas, ou quando sejam havidas legal ou judicialmente como verdadeiras».
No caso vertente, a Ré ora Recorrente, não impugnou as assinaturas respectivas pelo que, só podemos concluir que, não tendo sido validamente impugnadas, as assinaturas constantes dos documentos em questão nos autos, consideram-se verdadeiras.
Assim sendo, atento o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 376.º do CC, encontrando-se reconhecida a autoria dos referidos documentos particulares, e não tendo sido provada a falsidade da declaração constante dos mesmos, por não se ter demonstrado que a ré tivesse outra intenção que não a de celebrar o contrato-promessa em apreço, tais escritos fazem prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, considerando-se provados os factos compreendidos na declaração na medida em que forem contrários aos interesses do declarante.
Ora, tratando-se nessa medida de prova vinculada não pode a mesma ser afastada por qualquer outro meio de prova e está subtraída à livre apreciação pelo tribunal (cfr. artigo 607.º, n.º 5, do CPC).
Na verdade, conforme se expendeu no Acórdão da Relação de Coimbra de 17-12-2014[12]: «A demonstração da genuinidade do texto do documento particular transforma o documento em confessório, i.e., os factos nele relatados consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante.
A confissão extrajudicial segue a regra segundo a qual a confissão tem o valor probatório do meio pelo qual é comunicado ou adquirido pelo tribunal, pelo que, se for comunicada por documento autêntico ou documento particular genuíno e tiver sido feita à parte contrária, tem força probatória plena qualificada».
Acresce que, «na prova plena qualificada, a prova do contrário – que vincula a contraparte - não pode fazer-se por testemunhas ou presunções judiciais.
Incorre num error in iudicando, no julgamento da matéria de facto, a decisão que, por erro, considera controvertido e, portanto, necessitado de prova, um facto plenamente provado»
Deste modo, fácil é compreender as razões pelas quais atento o teor dos oportunamente indicados documentos subscritos pela Ré, não impõem, como esta pretende, decisão diversa da recorrida quanto à celebração do contrato-promessa de compra e venda e à quitação dos valores por si recebidos, e, ao invés, a sustentam.
Não obstante, se entendemos ser de sufragar a convicção formada pela Senhora Juíza quanto à celebração do contrato-promessa de compra e venda em causa, e ao recebimento das quantias parcelares que somadas correspondem ao pagamento integral do preço, o mesmo não acontece quanto à qualificação nesta sede factual de que todas as demonstradas entregas foram efectuadas a título de sinal, nos termos expressos na matéria de facto constante dos pontos 13) e 15).
Na verdade, se quanto à entrega a que alude o ponto 12) da matéria de facto, concordamos integralmente que desde já se expresse que a mesma tenha foi efectuada a título de sinal, como consta no ponto 13) da matéria de facto, em face de tal expressa menção na declaração assinada pela Ré que faz fls. 228 dos autos, com o seguinte teor: «eu abaixo assinado, …, declaro que recebi de “…, Lda” a importância de 12.500,00€ (Doze mil e quinhentos euros) de que aqui dou recibo e plena quitação, a título de reforço de sinal e por conta do preço previsto no contrato promessa de compra e venda entre nós assinado no passado dia 26 de Janeiro de 2004» (o sublinhado é nosso), o mesmo não podemos concluir quanto à afirmação de que a entrega referida em 16) foi igualmente efectuada a título de sinal.
Como dito, estes documentos constituem prova vinculada, na medida em que são confessórios.
Ora, no contrato promessa de compra e venda consta que o preço será pago da seguinte forma: a quantia de 40.000,00€, a título de sinal e princípio de pagamento, de que dá recibo e plena quitação com a assinatura do presente contrato; o restante no prazo de 30 dias a contar da assinatura do presente contrato.
Por seu turno, na declaração que faz fls.228, consta também a declaração subscrita pela Ré de que dá quitação do recebimento da quantia de 12.500,00€, a título de sinal e princípio de pagamento, conforme, e bem, como dito, consta do ponto 13) da matéria de facto.
Ao invés, no recibo de quitação do pagamento do restante preço consta apenas que a Ré declara ter recebido da Autora a quantia de € 286.683,00, de que dá quitação, não havendo qualquer referência ao sinal. De facto, enquanto no recibo em português consta que dá recibo e plena quitação, por conta do preço estipulado no Contrato Promessa de Compra e venda, mais declarando ainda que com este recebimento, o preço do prédio objecto do contrato se encontra totalmente pago, no recibo correspondente à respectiva tradução em língua inglesa consta a menção a que dá recibo e quitação, do preço, sem a expressão por conta. Pese embora estas ligeiras nuances entre as versões do recibo em língua portuguesa e inglesa, é incontornável que não existe em nenhum destes documentos qualquer referência à sua natureza de sinal. E, é também seguro que a mesma constituiu o pagamento do restante preço, ou seja, constituiu a entrega final, mediante a qual foi considerado o pagamento do preço total.
Assim, diversamente dos documentos anteriormente referidos, que constituem prova vinculada, na medida em que configuram declarações confessórias por banda da Ré quanto à natureza da entrega das indicadas quantias a título de sinal, quanto a este documento de quitação, uma vez que a inexistência de tal qualificação da entrega como sinal, no caso vertente, favorece a Ré a quem está imputado o incumprimento do contrato-promessa, não pode a subscrição do documento pela mesma constituir neste aspecto declaração confessória, a qual só funciona quanto ao recebimento da indicada quantia, ou seja, no segmento que a desfavorece.
Deste modo, nada obstaria a que a entrega da mesma igualmente a título de reforço de sinal pudesse decorrer de outros meios de prova e, nomeadamente, do funcionamento da presunção decorrente do artigo 441.º do Código Civil.
No caso vertente, na fundamentação da matéria de facto provada consta expressamente afirmado pela Senhora Juíza que foi precisamente com base na indicada presunção que a mesma deu como provado aquele segmento do referido ponto 15) da matéria de facto, referindo que «Os factos 13) e 15) resultam provados com base no teor do próprio contrato-promessa em causa nos autos, sendo certo que as quantias entregues no âmbito do contrato-promessa presume-se terem o carácter de sinal, nos termos do artigo 441º do Código Civil, presunção que à Ré competia ilidir, o que não fez».
Ora, considerando que também a este tribunal é lícito extrair (ou não) presunções decorrentes da matéria de facto provada, e que a justificação das ilações a retirar, que no caso vertente constituem simultaneamente a decisão jurídica da causa, mais pormenorizadamente se devem enquadrar na apreciação jurídica a efectuar porque aquele segmento da matéria de facto provada não assenta em qualquer outro meio de prova, entende-se que o referido ponto 15) da matéria de facto, deve espelhar apenas o que decorre do recibo de quitação, extraindo-se oportunamente do acervo factual as ilações pertinentes, designadamente, se podemos ou não considerar que, no caso concreto em apreço, esta última quantia foi igualmente entregue a título de sinal, ou seja, se deve ou não funcionar a referida presunção legal.
Como assim, impõe-se a alteração ao ponto 15) da matéria de facto em conformidade, expurgando-se do mesmo a referência a que a quantia ali referida foi igualmente entregue a título de reforço de sinal.
Concluindo, mantém-se intocada a decisão da matéria de facto considerada provada
e não provada em primeira instância, improcedendo ou mostrando-se deslocadas todas as conclusões do recurso a este respeito formuladas, excepto no que tange ao ponto 15) da matéria de facto provada que, pelas sobreditas razões, passa a ter a seguinte redacção:
15) A quantia de € 286.683,00 foi entregue como final de pagamento do preço relativo ao contrato promessa referido em 2) celebrado entre Autora e Ré (Artigo 16º da Base Instrutória).
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III.2.3. - Da nulidade formal do contrato-promessa
Invoca a Recorrente a nulidade do contrato-promessa, por vícios de forma, começando por dizer que o Tribunal omite que a falta de licença de habitabilidade conduz à nulidade do compra e venda, e ainda que a ora Autora tem consciência de que não está a cumprir com as formalidades ad substantiam, relativas ao reconhecimento da assinatura e ao conhecimento da inexistência de licença.
Confessamos a nossa dificuldade em compreender o que pretende a Recorrente nos artigos 227 a 240 do corpo das suas alegações.
Mas, como termina dizendo: «não sendo declarado nulo o contrato promessa de compra e venda há violação clara do artigo das formalidades constantes no n.º 2 e 3 do artigo 410.º do Código Civil», afigura-se-nos que pretende que o contrato seja declarado nulo, ou seja, que pensa poder arguir as invocadas nulidades.
Vejamos.
Conforme decorre do preceituado no artigo 219.º do CC, por regra, a validade da declaração negocial não depende da observância de forma especial, salvo quando a lei o exigir. É o que resulta do princípio da consensualidade ou liberdade de forma.
Porém, em face do disposto no artigo 410.º do CC[13], estando o contrato de compra e venda de imóveis sujeito a forma escrita, a lei exige que o contrato-promessa conste de documento particular, assinado pelas partes, o que bem se compreende se atentarmos que tem subjacentes razões que se prendem tanto com a necessária ponderação e reflexão das partes, como com razões de certeza e segurança que impõem a respectiva redução a escrito, importando estas tanto ao clausulado do próprio contrato-promessa, como do comércio jurídico.
Na verdade, sendo o contrato-promessa “a convenção pela qual, ambas as partes ou apenas uma delas, se obrigam, dentro de certo prazo, ou verificados certos pressupostos, a celebrar determinado contrato[14]”; trata-se de “um acordo preliminar que tem por objecto uma convenção futura, o contrato prometido. Mas em si é uma convenção completa, que se distingue do contrato subsequente. Reveste, em princípio, a natureza de puro contrato obrigacional, ainda que diversa seja a índole do contrato definitivo. Gera uma obrigação de prestação de facto, que tem apenas de particular consistir na emissão de uma declaração negocial. Trata-se de um pactum de contrahendo[15]”; (…) É bilateral se ambas as partes se obrigam a celebrar o contrato definitivo; unilateral se apenas uma das partes se vincula”.
Acresce que, para além da sujeição a forma escrita, em face do disposto no n.º 3 do referido artigo 410.º do CC, no caso de promessa relativa à celebração de contrato oneroso de transmissão ou constituição de direito real, como é a situação objecto do contrato em apreço, o documento deve ainda cumprir as formalidades ali prescritas: o reconhecimento presencial das assinaturas dos promitentes e a certificação pelo notário da existência de licença respectiva de construção ou utilização.
Ora, em caso de omissão do cumprimento destas formalidades estamos perante uma denominada nulidade atípica, ou mista, não invocável por terceiros, nem cognoscível oficiosamente pelo tribunal, podendo ser arguida, a todo o tempo, apenas pelo promitente-comprador, destinatário da norma protectora, e excepcionalmente pelo promitente-vendedor, se tiver sido aquele a dar-lhe causa culposamente, o que este tem naturalmente que alegar e demonstrar[16].
De facto, julgamos ser este entendimento pacífico tanto na jurisprudência[17], como na doutrina, lapidarmente expresso por João Calvão da Silva[18], nos seguintes termos: “tratar-se-á de nulidade atípica, por via de regra ser invocável, não por qualquer interessado, mas apenas pelo promitente-comprador - sendo nula a cláusula pela qual o promitente-comprador renuncia antecipadamente ao direito de a invocar, para salvaguarda da ordem pública de protecção ou ordem social que ditou a norma legal, ou seja, para proteger a sua própria fraqueza e inexperiência, ligeireza e inadvertência, na tomada da decisão temporã em branco. (…)
Nulidade atípica, ainda por dever ser passível de sanação ou convalidação (cfr. art.º 906.º, ex art. 913.º) o contrato «o qual será juridicamente tratado como se tivesse sido concluído com defeitos» - pense-se, por exemplo, na superveniente legalização da construção ou da ulterior apresentação de licença e no posterior reconhecimento da(s) assinatura (s) do promitente(s)”.
Revertendo ao caso dos autos, a falta de reconhecimento presencial das assinaturas e da certificação notarial da licença de construção ou de utilização, traduz-se na referida nulidade atípica ou mista, invocável a todo o tempo, mas pelo promitente comprador[19]. Ora, a Ré, que a invocou, é a promitente vendedora, não se compreendendo como pode pretender que a falta de licença de habitabilidade seja imputável ao promitente comprador, tanto mais que no caso em presença não houve sequer traditio! E, quanto ao facto de o reconhecimento da assinatura do legal representante da autora não ter sido feito no mesmo dia, conforme se afirmou na sentença recorrida, a lei não exige o reconhecimento simultâneo das assinaturas dos contraentes.
Finalmente, pese embora não encontremos no corpo das alegações o fundamento da conclusão vertida em GGG), sempre diremos que concordamos inteiramente com o entendimento a este respeito formulado na sentença recorrida de que «estando em causa um documento particular, não são aplicáveis ao mesmo as regras do Código do Notariado relativas às traduções, não sendo sequer necessário que o tradutor constasse do contrato-promessa nem que a sua assinatura fosse reconhecida presencialmente para que o mesmo fosse válido, improcedendo igualmente a invocação desse vício por parte da Ré».
Deste modo, improcedem ou mostram-se igualmente deslocadas as conclusões do recurso a respeito das nulidades formais do contrato.
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III.2.4. - Da condenação no pagamento do sinal em dobro
O autor intentou a presente acção pedindo a execução específica do contrato-promessa de compra e venda, alegando ter o direito a obter sentença que produza a declaração negocial do promitente vendedor que não outorgou o contrato definitivo.
Julgado improcedente este pedido, em face da inexistência de licenciamento do imóvel, a sentença recorrida debruçou-se sobre o pedido subsidiariamente formulado pela autora, de resolução do contrato-promessa por incumprimento definitivo imputável à Ré, concluindo que aquela tem direito à devolução do sinal prestado em dobro, considerando como sinal toda a quantia entregue à Ré, ou seja, o pagamento do preço.
Insurge-se a Recorrente, invocando desta feita que se o tribunal dá como provado o pagamento integral do preço, não pode condenar no pagamento do sinal em dobro, não questionando que exista incumprimento definitivo da sua parte, fundador do direito à resolução do contrato.
Portanto, a nossa pronúncia incidirá somente sobre aquela condenação no pagamento do sinal em dobro.
Neste segmento do recurso importa primeiramente decidir se o pagamento da quantia correspondente ao preço estabelecido no contrato-promessa obsta ou não à sua qualificação como sinal, para depois apreciarmos se toda a quantia entregue pela Autora à Ré deve ser considerada sinal.
Vejamos.
Sabido é que a restituição do sinal em dobro é a sanção aplicável ao não cumprimento definitivo da obrigação do promitente que o recebeu. Havendo sinal passado, o incumprimento da obrigação, por causa imputável ao contraente que o constituiu, concede à outra parte a faculdade de obter indemnização igual ao seu valor – art. 442º-2 C. Civil -, indemnização que, de resto, é igual à que, para a outra parte, corresponde a perda do sinal.
Por isso se vem afirmando que a perda do sinal ou a sua restituição em dobro andam indissoluvelmente ligados ao não cumprimento definitivo do contrato-promessa.
Porém, para que haja lugar à condenação no pagamento desta indemnização tabelada, mister é que a quantia entregue seja qualificada como sinal.
No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Março de 2012[20], em situação em que se identificou como questão a decidir saber se assiste ou não aos promitentes – compradores o direito de exigirem o sinal em dobro, havendo satisfeito integralmente o preço, afirmou-se o seguinte: «Dispõe o artigo 440º do C.C. que, “se, ao celebrar-se o contrato ou em momento posterior, um dos contraentes entregar ao outro coisa que coincida, no todo ou em parte, com a prestação a que fica adstrito, é a entrega havida como antecipação total ou parcial do cumprimento, salvo se as partes quiserem atribuir à coisa o carácter de sinal”.
Porém, segundo o estatuído no artigo 441º, “no contrato-promessa de compra e venda, presume-se que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”.
Conjugando estas normas, é de notar que o pagamento ou princípio de pagamento da prestação actual ou futura só assume a natureza de sinal se as partes lho atribuírem (artigo 440º). Todavia, quanto ao contrato – promessa de compra e venda, a lei presume que valerá como sinal toda a quantia (em dinheiro) entregue pelo promitente – comprador ao promitente – vendedor, ainda que as partes se limitem a dizer que a entrega é feita como antecipação total ou parcial do pagamento do preço (artigo 441º). A lei estabelece esta presunção por a qualificação como sinal corresponder, na promessa de compra e venda, à vontade normal das partes – presunção juris tantum, como tal ilidível por prova em contrário (artigo 350º, n.º 2 C.C.).
Embora não seja muito habitual que, a título de sinal, seja paga a totalidade do preço, o certo é que a letra da lei é taxativa quando, no normativo indicado, faz presumir como sinal “toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”.
Assim, não estabelecendo a lei qualquer limite, não importa, por isso, que “o sinal seja inferior, igual ou superior à prestação[2]”.
“A existência de sinal é especialmente frequente na promessa recíproca de compra e venda. Quase sempre, quando se celebra uma tal promessa, o promitente – comprador entrega ao promitente – vendedor uma importância correspondente a parte do preço, ou, até, a todo ele. Há o cumprimento antecipado, parcial ou total, da futura dívida de preço: e dizemos «futura» porque ela na realidade só se constituirá com a celebração da prometida compra e venda. E, além disso, as partes querem, normalmente, que a entrega funcione também como sinal. De maneira que, se o promitente – comprador faltar à promessa, poderá o promitente – vendedor reter a importância recebida; se faltar este, poderá aquele reclamar a restituição dessa importância, em dobro.
Mesmo que as partes não qualifiquem expressamente como sinal a entrega feita, semelhante qualificação valerá em princípio, por presunção legal, na hipótese a que estamos a referir-nos de promessa recíproca de compra e venda.
Tudo isto decorre do disposto nos artigos 440º e 442º C.C.[3]” (…)
Porque o não cumprimento do contrato foi devido à promitente – vendedora, (aquela que recebeu o sinal), têm os promitentes – compradores a faculdade de exigirem o dobro do que prestaram (artigo 442º, 2 C.C.)».
No aresto que vimos de citar, ainda que com aparente semelhança com o caso dos autos na formulação da questão, a totalidade do preço foi paga aquando da celebração do contrato, nada neste se mencionando a respeito do sinal, donde, ali se concluiu, sumariando, que: «embora a quantia que os promitentes – compradores pagaram à promitente – vendedora, nos termos do contrato – promessa em causa, corresponda à totalidade do preço, tem carácter de sinal (confirmatório). Deste modo, porque o não cumprimento do contrato foi devido á promitente – vendedora (aquela que recebeu o sinal), têm os promitentes - compradores a faculdade de exigirem o dobro do que prestaram (art. 442.º, n.º 2 do CC)».
De igual modo, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06.05.2004[21] se havia ponderado que «Presume-se possuir carácter de sinal toda a quantia entregue, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento, nada no texto ou no espírito da lei permitindo concluir que a presunção de sinal prevista no art. 441.° do C. Civil seja apenas aplicável às quantias entregues no momento da celebração do contrato»[22].
Portanto, respondendo concretamente à objecção colocada pela Ré nas suas alegações, diremos que o pagamento integral da quantia correspondente ao preço total acordado para o contrato prometido, ainda no âmbito do contrato-promessa, não obsta à qualificação de tal entrega como tendo sido efectuada a título de sinal.
Tudo está em determinar, na economia de cada caso, se a factualidade permite atribuir a natureza jurídica de sinal à(s) quantia(s) entregue(s).
Efectivamente, é entendimento pacífico aquele que se mostra subjacente aos indicados arestos do nosso mais Alto Tribunal o qual, no fundo, se reconduz à conclusão de que “[a)lém do sinal expresso atribui-se presuntivamente o mesmo carácter, no contrato-promessa de compra e venda, a «toda e qualquer quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço», tanto mais que «resulta claramente da lei que a quantia entregue pode ter o simultâneo alcance de constituição de sinal e de cumprimento antecipado da obrigação futura emergente do contrato prometido»[23].
Porém, a questão que o caso vertente convoca é a de saber se, tendo as partes, na execução do contrato-promessa, atribuído expressamente a determinadas quantias entregues o carácter de sinal, e não o tendo feito aquando da entrega da quantia que perfazia o valor necessário a completar o pagamento do preço, quantia esta de valor muito mais elevado do que aquelas entregues aquando da celebração do contrato-promessa de compra e venda, e posteriormente a título declarado de reforço do sinal, se deve ou não considerar ilidida a presunção decorrente do artigo 441.º do CC.
Na verdade, sabido é que «[e]sta presunção é ilidível com base na oposta vontade real dos contraentes (art.350.º, n.º 2)»[24]. Daí que, descortinar aquela que foi a vontade dos contraentes, seja essencial para distinguir «entre os casos de constituição de sinal e os de mera antecipação de cumprimento», distinção que envolve «um problema de pura interpretação da vontade dos contraentes. Problema que nem sempre será de fácil solução, antes se prevendo que ele levante a cada passo as maiores dúvidas e hesitações, tanto mais que o sinal não deixa de ser tratado também como uma antecipação do cumprimento (art.442.º, n.º 1).
Entre os elementos de que o julgador pode socorrer-se para qualificar ou desvendar a intenção das partes, assume especial relevo o que tiver sido convencionado acerca das consequências da falta de cumprimento por parte de alguma das partes, dado o disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 442.º. (…)
Trata-se de uma simples presunção, já que nada impede que as partes convencionem o cumprimento antecipado de uma obrigação futura – a que emerge, não do contrato-promessa, mas do contrato prometido. Simplesmente, a mera declaração da antecipação não tira à quantia entregue o carácter de sinal»[25].
Enquadrados por estes ensinamentos e revertendo ao caso dos autos com o intuito de apurar a vontade real dos contraentes, temos que, no contrato promessa de compra e venda consta que o preço será pago da seguinte forma: a quantia de 40.000,00€, a título de sinal e princípio de pagamento, de que dá recibo e plena quitação com a assinatura do presente contrato; o restante no prazo de 30 dias a contar da assinatura do presente contrato. Seguidamente, surpreendemos uma alteração quanto a esta cláusula, manifestada pela entrega comprovada por recibo de quitação da quantia de 12.500,00€, onde consta a expressa referência à entrega desta quantia a título de reforço de sinal.
Portanto, quanto a estas quantias de 40.000,00€ e 12.500,00€, não existem quaisquer dúvidas que foi vontade das partes atribuir-lhes a natureza de sinal.
Por seu turno, no recibo de quitação do pagamento do restante preço consta apenas que a Ré declara ter recebido da Autora a quantia de € 286.683,00, de que dá recibo e quitação, do preço estipulado no Contrato Promessa de Compra e venda, declarando ainda que o preço estipulado no Contrato Promessa para a compra do prédio foi pago na totalidade com este recebimento.
Ora, como é entendimento pacífico, expresso designadamente no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05.07.2012[26]:
«Na interpretação de um contrato, ou seja, na fixação do sentido e alcance juridicamente relevantes, deve ser procurado, não apenas o sentido de declarações negociais artificialmente isoladas do seu contexto negocial global, mas antes o discernir do sentido juridicamente relevante do complexo regulativo como um todo».
Por isso que - ponderados estes princípios e tendo ainda presente que a execução contratual de boa fé deve atender aos interesses recíprocos dos contraentes e que a interpretação deve partir do contrato, tendo em conta o interesse aí regulado, e ponderar se é legítimo estender o seu objecto e finalidade para aquilatar se o resultado se compagina com a intenção presumível dos contraentes, sendo de afastar o resultado interpretativo se se concluir que o mesmo afronta tal vontade[27] -, no caso vertente, sendo a situação factual de base diversa daquela que foi objecto das citadas decisões do Supremo Tribunal de Justiça, importa aquilatar se esta diversidade implica ou não diversa solução jurídica.
Efectivamente, na situação em apreço as partes estabeleceram o pagamento de uma primeira quantia de 40.000,00€ a título de sinal, afirmando ainda que o restante correspondia ao pagamento integral do preço. Assim, neste caso, em face da expressa declaração das partes nesse sentido, não há dúvidas ter sido sua intenção haver sinal passado quanto àquela parte correspondente à antecipação parcial e princípio do pagamento do preço em que as mesmas convencionaram que a quantia entregue teria tal carácter. E, tendo igual declaração de vontade das partes quanto ao carácter de sinal da quantia, sido também expressamente formulada, por escrito, no recibo de quitação de 12.500,00€, onde essa qualificação da entrega consta como sendo também a título de reforço de sinal, igualmente não subsistem dúvidas que também quanto a esta entrega tal foi a intenção das partes.
Porém, precisamente porque quando as partes assim o entenderam convencionar, expressamente mencionaram que as quantias entregues, mormente a intercalar, tinham carácter de sinal, é que importa avaliar se é de aplicar a presunção decorrente do artigo 441.º do CC, ou se mesma foi ilidida quanto à entrega da quantia correspondente ao pagamento do restante preço, à qual as partes não atribuíram expressamente tal natureza.
Ora, conforme claramente refere Ana Coimbra[28] não podemos olvidar que “o artigo 441.º não dispensa a «intenção de constituir um sinal». (…) Uma tal vontade ou intenção é no artigo 440.º directamente prevista; no artigo 441.º somente presumida, mas por nenhuma das disposições é ignorada ou prescindida.
Por aqui se vê que o sinal não é tratado pela lei como uma mera dação, uma pura entrega, mas sim como um verdadeiro negócio jurídico, para cuja perfeição não basta a vontade de acção nem mesmo a vontade de declaração, sendo também indispensável a vontade funcional. É a este concreto elemento psicológico ou anímico que parece reportar-se a exigência legal da vontade (expressa ou presumida) de constituir sinal, devendo como tal entender-se a intenção de, mediante a entrega – e o recebimento – de certa coisa ou quantia, vincularem-se as partes aos particulares efeitos atribuídos por lei (artigo 442.º) à constituição de sinal.
E como não basta também uma vontade unilateral – só de quem dá ou só de quem recebe a coisa -, sendo necessário um acordo ou consenso, o negócio jurídico em que o sinal se traduz é passível da qualificação de contrato”.
Assente que o sinal é, em si mesmo, um contrato, ainda que acessório, e visto já que a presunção legal decorrente do artigo 441.º do CC, pode ser ilidida mediante prova em contrário, conforme preceituado no artigo 350.º, n.º 2, do CC, tudo está em saber o que é necessário para que as partes consigam ilidir tal presunção.
Diz-nos ainda aquela Autora que «em nada trairá o pensamento legislativo o intérprete que se fixe no entendimento segundo o qual, embora a qualificação atribuída pelas partes de pagamento antecipado não obste ao funcionamento da presunção constante do artigo 441.º, já a tal obstará convenção - expressa ou tácita[29] - que afaste de modo inequívoco a natureza de sinal da quantia entregue. Bastará pois que as partes digam que a soma em causa não tem o carácter de sinal, só possui o valor de antecipação de pagamento, ou firmem convenção de idêntico significado. Nem outra interpretação seria, ademais, compaginável com o princípio de que só deve a autonomia privada ser sacrificada quando interesses superiores o justifiquem e reclamem»[30].
Aplicando estes ensinamentos ao caso em apreço, podemos então concluir que o facto de haver uma quantia entregue a título de princípio de pagamento do preço à qual as partes atribuíram o carácter de sinal, outra quantia expressamente entregue a título de reforço de sinal, e ainda uma quantia restante, entregue para pagamento do preço, sem que as partes lhe tenham atribuído esse carácter de sinal, não basta para afastar a presunção decorrente do artigo 441.º do CC.
Efectivamente, para esse efeito, necessário seria que do declarado no último recibo que temos vindo a referir, decorresse de forma inequívoca a intenção expressa ou tácita de afastamento do disposto naquela presunção legal, de acordo com a qual se presume que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor.
Assim, não configurando a declaração de quitação do recebimento do indicado valor, nos termos em que foi efectuada como sendo a título de pagamento do preço final, convenção expressa ou tácita que inequivocamente afaste a natureza de sinal, funciona de pleno a indicada presunção legal.
Nestes termos, e constituindo uma «[e]stipulação real dirigida a reforçar os vínculos nascentes do contrato e a garantir o seu cumprimento, pela coerção indirecta que exerce sobre o devedor, o sinal constitui também a fixação preventiva e convencional da indemnização devida, em caso de não cumprimento imputável a uma das partes. Isto é, se a finalidade coercitiva do sinal não for alcançada, ainda assim ele determina previamente o quantum respondeatur resultante do não cumprimento, independentemente do montante ou até da existência do dano efectivo. (…)
Deste modo, quando não for eficaz como meio de compulsão ao cumprimento, o sinal funciona como meio ressarcidor do dano»[31].
Revertendo ao caso dos autos, concluindo-se, como se concluiu, ser de reconhecer que toda a quantia paga pela Autora à Ré tem o carácter de sinal, em função da verificação do incumprimento definitivo e culposo do contrato por parte da promitente-vendedora, ora Apelante, e atento o preceituado no artigo 442.º, n.º 2, do CC, a promitente-compradora, tem o direito a exigir da Ré/Recorrente o pagamento do valor prestado em dobro, conforme acertadamente se decidiu na sentença recorrida.
Na verdade, esta é a indemnização que expressamente decorre da disciplina da lei quando existe sinal passado, de acordo com a qual, «sendo o contraente faltoso aquele que recebeu o sinal, constitui-se, pelo não cumprimento, na sua esfera jurídica, a obrigação de devolver em dobro o recebido, constituindo-se a favor do contraente fiel, simultaneamente e pela mesma razão, o crédito à restituição dobrada»[32].
Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
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IV - Decisão
Face ao exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente - artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.
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Évora, 21 de Dezembro de 2017
Albertina Pedroso [33]
Tomé Ramião
Francisco Xavier
______________________________________________
[1] Juízo Central Cível de Faro, Juiz 2.
[2] Relatora: Albertina Pedroso;
1.º Adjunto: Tomé Ramião;
2.º Adjunto: Francisco Xavier.
[3] Após ampliação do pedido deduzido na réplica e oportunamente admitido, e a correcção do cálculo aritmético.
[4] A restante alegação da Ré foi considerada não escrita por despacho de fls. 320 dos autos.
[5] Doravante abreviadamente designado CPC, na redacção aprovada pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, por estar em causa decisão recorrida posterior a 1 de Setembro de 2013 – cfr. artigos 5.º, 7.º, n.º 1 e 8.º deste diploma.
[6] Cfr. José Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil, Anotado, vol. V, págs. 142 e ss; e Ac. STJ de 19-04-2012, processo n.º 9870/05.5TBBRG.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[7] Cfr. neste sentido, exemplificativamente, Ac. STJ de 12-01-2010, processo n.º 630/09.5YFLSB; Ac. TRL de 20-12-2010, processo n.º 1650/10.2TBOER-A.L1-1; e Ac. TRC de 29-02-2012, processo n.º 144732/10.9YIPRT.C1, todos disponíveis em www.dgsi.pt. Este entendimento jurisprudencial pacífico estriba-se na doutrina já defendida por José Alberto dos Reis que a propósito do correspondente normativo afirmava que se impõe ao juiz o dever de resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, resultando a nulidade, precisamente, da infracção pelo juiz desse dever que lhe está legalmente cometido. Mais recentemente, cfr. no mesmo sentido, Jorge Augusto Pais de Amaral, in Direito Processual Civil, 7.ª edição, Almedina 2008, pág. 391.
[8] Cfr. posição expressa pelo Professor Miguel Teixeira de Sousa neste sentido, no blog do IPPC.
[9] Cfr. Ac. STJ de 5-4-2016, proferido no processo n.º 1538/11.0TBFIG.C1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[10] Cfr., Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2014, pág. 139.
[11] Doravante abreviadamente designado CC.
[12] Proferido no processo n.º 98/11.6TBSCD.C1, disponível em www.dgsi.pt.
[13] Que rege nos seguintes termos:
“1. À convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato são aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato prometido, exceptuadas as relativas à forma e as que, por sua razão de ser, não se devam considerar extensivas ao contrato-promessa.
2. Porém, a promessa respeitante à celebração de contrato para o qual a lei exija documento, quer autêntico, quer particular, só vale se constar de documento assinado pela parte que se vincula ou por ambas, consoante o contrato-promessa seja unilateral ou bilateral”.
[14] Cfr. Antunes Varela, In Das Obrigações em Geral, 6.ª ed., I vol. pág. 301.
[15] Cfr. Galvão Telles, in Direito das Obrigações, 6.ª ed., págs. 83 e 84.
[16] Cfr. neste sentido o citado Acórdão do TRC.
[17] Inclusivamente vertido nos Assentos do STJ de 28/6/94, DR IA de 12/10/94, e de 1/2/95, DR IA de 22/4/95.
[18] In Sinal e Contrato-Promessa, 14.ª Edição Revista e Aumentada, Almedina 2017, pág. 67.
[19] Neste sentido e para mais desenvolvimentos sobre as razões desta norma e da alteração da redacção original do n.º 3 do artigo 410.º do CC pelo DL n.º 236/80, de 18 de Julho, bem como da modificação posteriormente introduzida pelo DL n.º 379/86, e também com expressa pronúncia sobre a natureza da sanção estabelecida para a omissão dos indicados requisitos formais, cfr. Antunes Varela, in Sobre o Contrato Promessa, 2.ª edição, Coimbra Editora 1989, págs. 38 a 53, e Menezes Cordeiro, em anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-11-1998, em Jurisprudência Crítica, disponível na internet em https://portal.oa.pt/upl/%7Bd1694b6d-9770-4f61-a843-e8deaddc059e%7D.pdf.
[20] Proferido no processo n.º 476/10.8TBPNF.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[21] Proferido no processo n.º 03B4295, disponível em www.dgsi.pt.
[22] Diversamente no Aresto do Supremo Tribunal de Justiça, de 07.05.2009, concluiu-se que «não tendo havido, portanto, sinal passado, não há lugar à aplicação do artº 442º, nº 2, do CC». Porém, cumpre notar que o mesmo foi proferido numa situação com factualidade diversa daquela agora em presença.
[23] Cfr. Mário Júlio de Almeida e Costa, in Direito das Obrigações, 4.ª edição, págs. 284 e 285.
[24] Idem.
[25] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, vol. I, págs. 392 e 393.
[26] Proferido no processo n.º 1028/09.0TVLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[27] Cfr. Ac. STJ de 29-03-2012, Revista n.º 278/2001.P1.S1 - 6.ª Secção, disponível em www.stj.pt, Sumários de Acórdãos.
[28] O Sinal: Contributo para o Estudo do seu Conceito e Regime, In O Direito, Ano 122.º, 1990, III-IV (Julho-Dezembro), pág. 626.

[29] No sentido de que tal convenção tem de ser expressa, em caso com muitas semelhanças com o presente, cfr. Ac. TRP de 28.04.2014, processo n.º 2134/11.7TBPVR.P1, disponível em www.dgsi.pt.
[30] Obra citada, pág. 626.
[31] Cfr. Autor e obra citada, pág. 136, indicando neste sentido jurisprudência do STJ, sendo a mais recente o Acórdão de 07.06.2016, proferido mo processo n.º 2303/08.7TVLSB.L1.S1.
[32] Cfr. Ana Coimbra, O Sinal: Contributo para o Estudo do seu Conceito e Regime, In O Direito, Ano 122.º, 1990, III-IV (Julho-Dezembro), pág. 626.
[33] Texto elaborado e revisto pela Relatora.