Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1723/08.1JDLSB.E1
Relator: MARTINHO CARDOSO
Descritores: INDÍCIOS SUFICIENTES
NÃO PRONÚNCIA
COMUNICAÇÕES TELEFÓNICAS
Data do Acordão: 05/05/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I - Se o confronto comparado das comunicações telefónicas, que foram no passado estabelecidas a partir da área geográfica aonde se situavam os locais dos factos, permite restringir o universo de suspeitos, não os põe, contudo, no exato local do crime, nem, porque não foram gravadas, descreve a participação no mesmo de quem faz as chamadas, faltando, portanto, o resto, isto é, faltando que, através de outros meios de prova, se consiga indiciariamente preencher os vazios que sobram.
II - Não havendo preenchimento, com outras provas, desses vazios, continua a não haver nada de suficientemente concreto para levar o arguido a julgamento.
Decisão Texto Integral:

I
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:


Nos presentes autos, acima identificados, do Tribunal de Instrução Criminal de Évora, foram os arguidos:
1. FGC;
2. ECGP;
3. JMM;
4. JMGP;
5. JGP; e
6. SASP.
Acusados de terem cometido:
- O arguido FGC, em concurso real e efectivo (art.º 30º, n.º 1 do Código Penal), como co-autor (art.º 26º do Código Penal) de:
ü um crime de roubo agravado, p. e p. pelo art.º 210º, ns.º 1 e 2, al.ª b), em articulação com os arts.º 204º, n.º 2, als.ª a) e f), art.º 202º, al.ª b), todos do Código Penal e art.º 4º do D.L. n.º 48/95, de 15.03
ü um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 204º, n.º 1, al.ª a), em articulação com os arts.º 203º e 202º, al.ª a), todos do Código Penal
ü um crime de sequestro, p. e p. pelo art.º 158º, n.º 1, do Código Penal.
ü um crime de receptação, p. e p. pelo art.º 231º, n.º 1 do Código Penal.
ü um crime de usurpação de funções, p. e p. pelo art.º 358º, al.ª a), do Código Penal.
Como autor material (art.º 26º do Código Penal) na prática de:
ü um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86º, n.º 1, al.ª c) em articulação com o art.º 2º, n.º 1, als. p) e s) e 3º, n.º 6, al.ª a), todos da Lei das Armas (Lei 5/2006, de 23.02)

- O arguido ECGP, em concurso real e efectivo (art.º 30º, n.º 1 do Código Penal), como co-autor (art.º 26º do Código Penal) de:
ü um crime de roubo agravado, p. e p. pelo art.º 210º, ns.º 1 e 2, al.ª b), em articulação com os arts.º 204º, n.º 2, als.ª a) e f), art.º 202º, al.ª b), todos do Código Penal e art.º 4º do D.L. n.º 48/95, de 15.03
ü um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 204º, n.º 1, al.ª a), em articulação com os arts.º 203º e 202º, al.ª a), todos do Código Penal.
ü um crime de sequestro, p. e p. pelo art.º 158º, n.º 1, do Código Penal.
ü um crime de receptação, p. e p. pelo art.º 231º, n.º 1 do Código Penal.
ü um crime de usurpação de funções, p. e p. pelo art.º 358º, al.ª a), do Código Penal.
Como autor material (art.º 26º do Código Penal) na prática de
ü um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86º, n.º 1, al.ª d), em articulação com o art.º 2º, n.º 3, al.ª p), todos da Lei das Armas (Lei 5/2006, de 23.02).

- O arguido JMM, em concurso real e efectivo (art.º 30º, n.º 1 do Código Penal), como co-autor (art.º 26º do Código Penal) de:
ü um crime de roubo agravado, p. e p. pelo art.º 210º, ns.º 1 e 2, al.ª b), em articulação com os arts.º 204º, n.º 2, als.ª a) e f), 202º, al.ª b), todos do Código Penal e art.º 4º do D.L. n.º 48/95, de 15.03
ü um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 204º, n.º 1, al.ª a), em articulação com os arts.º 203º e 202º, al.ª a), todos do Código Penal.
ü um crime de sequestro, p. e p. pelo art.º 158º, n.º 1, do Código Penal.
ü um crime de receptação, p. e p. pelo art.º 231º, n.º 1 do Código Penal.
ü um crime de usurpação de funções, p. e p. pelo art.º 358º, al.ª a), do Código Penal.

- O arguido JMGP, em concurso real e efectivo (art.º 30º, n.º 1 do Código Penal), como co-autor (art.º 26º do Código Penal) de:
ü um crime de roubo agravado, p. e p. pelo art.º 210º, ns.º 1 e 2, al.ª b), em articulação com os arts.º 204º, n.º 2, als.ª a) e f), 202º, al.ª b), todos do Código Penal e art.º 4º do D.L. n.º 48/95, de 15.03
ü um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 204º, n.º 1, al.ª a), em articulação com os arts.º 203º e 202º, al.ª a), todos do Código Penal.
ü um crime de sequestro, p. e p. pelo art.º 158º, n.º 1, do Código Penal.
ü um crime de receptação, p. e p. pelo art.º 231º, n.º 1 do Código Penal.
ü um crime de usurpação de funções, p. e p. pelo art.º 358º, al.ª a), do Código Penal.

- O arguido JGP, em concurso real e efectivo (art.º 30º, n.º 1 do Código Penal), como co-autor (art.º 26º do Código Penal) de:
ü um crime de roubo agravado, p. e p. pelo art.º 210º, ns.º 1 e 2, al.ª b), em articulação com os arts.º 204º, n.º 2, als.ª a) e f), 202º, al.ª b), todos do Código Penal e art.º 4º do D.L. n.º 48/95, de 15.03
ü um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 204º, n.º 1, al.ª a), em articulação com os arts.º 203º e 202º, al.ª a), todos do Código Penal.
ü um crime de sequestro, p. e p. pelo art.º 158º, n.º 1, do Código Penal.
ü um crime de receptação, p. e p. pelo art.º 231º, n.º 1 do Código Penal.
ü um crime de usurpação de funções, p. e p. pelo art.º 358º, al.ª a), do Código Penal.

- O arguido SASP incorreu, em concurso real e efectivo (art.º 30º, n.º 1 do Código Penal), como co-autor (art.º 26º do Código Penal), na prática de:
ü um crime de roubo agravado, p. e p. pelo art.º 210º, ns.º 1 e 2, al.ª b), em articulação com os arts.º 204º, n.º 2, als.ª a) e f), 202º, al.ª b), todos do Código Penal e art.º 4º do D.L. n.º 48/95, de 15.03
ü um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 204º, n.º 1, al.ª a), em articulação com os arts.º 203º e 202º, al.ª a), todos do Código Penal.
ü um crime de sequestro, p. e p. pelo art.º 158º, n.º 1, do Código Penal.
ü um crime de receptação, p. e p. pelo art.º 231º, n.º 1 do Código Penal.
ü um crime de usurpação de funções, p. e p. pelo art.º 358º, al.ª a), do Código Penal.
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A acusação tem o seguinte teor:
Em data não concretamente apurada mas certamente anterior ao mês de Novembro de 2008, os arguidos ECGP, JMM, JMGP, JGP, SASP juntamente e sob a iniciativa do arguido FGC combinaram apoderar-se, com recurso à força física e mediante ameaça com armas de fogo, de um grande carregamento de tabaco, preferencialmente que estivesse em trânsito rodoviário para o estrangeiro.
O arguido FGC, conhecido por "CC", já estava referenciado como estando ligado ao furto de viaturas e assaltos ao transporte de tabaco (objeto de investigações nos processos ns° 506/10.3JAPRT, 2494/04.6JAPRT, 1184105.7GBAMT, 473/06.8GAMAI, 507/08.6GNPRT, 10108.0JAAVR, 48/08.7GAVLP, 179/08.3GAAMR, 555/09.4JAPRT, 1153109.8JACBR e 96/10.7JAPRT), tendo conhecimentos pessoais na região de Montalegre, onde residem os arguidos JMGP e JMM.
Nesse intuito, de forma que não se logrou apurar, conseguiram obter informação sobre o transporte de 26 paletes de tabaco diverso, no valor de 207.462,00 euros, que iria ocorrer no dia 17 de Novembro de 2008, com origem em Albarraque (Sintra) e destino à cidade de Marselha, em França.
Este transporte iria ser assegurado pela empresa "Logesta - Gestión de Transporte SA", usando o conjunto de veículo (articulado) constituído pelo trator de mercadorias, marca Renault Magnum, matricula 9421-CZB, e respetiva galera Marcotran, matricula 2340-BBH, propriedade da empresa "Baikal – Trading e Serviços, Ld a", conduzido por António Zacarias da Consolação Santos Teta.
A rota seguida pelo transporte seria o IC 19 em direção à Autoestrada n.º 9 (A9), saída para o IC 17, passagem na Ponte Vasco da Gama, Autoestrada n.º 2 (A2) e daí para a Autoestrada n.º 6 (A6), em direção à fronteira do Caia, onde entraria em Espanha com destino a Marselha.
Conhecedores deste itinerário, os arguidos trataram de previamente distribuir tarefas entre si, de forma que não se logrou apurar.
Assim, porque precisavam de um reboque (galera) para acoplar a um trator pesado de mercadorias a fim de posteriormente fazerem o transbordo do tabaco de que se iriam apoderar, em data não concretamente apurada mas entre as 17h.00m. do dia 07 e o dia 17 de Novembro de 2008, dirigiram-se à Rua D. Afonso IV, em Alfena, onde se encontrava parqueado o reboque de matrícula L-87857, marca Freauf, cor cinza e prata, pertencente à empresa "Transportes Avelino Coelho & Filhos, Ld.a", avaliado em 10.000,00 euros.
De forma que não se logrou apurar, os arguidos conseguiram acoplar este reboque a um trator de mercadorias cujas características se desconhecem e que possuíam, tendo abandonado o local, apoderando-se do mesmo, dele fazendo coisa sua.
No dia 17 de Novembro de 2008, pouco depois das 18h.00m., dois dos arguidos, pondo em execução o seu plano, quando AT conduzia o veículo pesado de mercadorias articulado constituído pelo trator, matricula 9421-CZB, respetiva galera Marcotran, matricula 2340-BBH, com o carregamento de tabaco referido, na A6, cerca de 5,00 km. depois da área de serviço de Estremoz, sentido Lisboa – Caia, aproximaram-se pela retaguarda conduzindo um veículo automóvel, ligeiro de passageiros, de cor escura, cujas demais caraterísticas concretas não se lograram apurar.
10°
Sem que tivessem qualquer permissão, autorização ou habilitação para o efeito, os arguidos conduziam tal viatura de cor escura ostentando no tejadilho um rotativo luminoso de cor azul, ligado, tendo ultrapassado e ladeado o conjunto de veículos, pesado de mercadorias, que AT conduzia.
11°
Simultaneamente, um dos arguidos que seguia no lugar de passageiro à frente, segurando uma lanterna cor-de-laranja similar às utilizadas pelos agentes fiscalizadores de trânsito da GNR, colocou-a de fora do veículo e fez vários sinais de paragem a AT, no intuito de o fazer encostar na berma da autoestrada, como se fossem agentes desta força de segurança.
12°
Ainda no mesmo desiderato, ao ultrapassarem o veículo pesado que AT conduzia, os arguidos ligaram um conjunto de luzes tipo néon, de cor alaranjada, que colocaram previamente no vidro traseiro daquele veículo ligeiro, com a sigla "GNR" fluorescente.
13°
Face a tal situação e estando convencido de que estava a receber uma ordem de agentes da GNR em ação de fiscalização do trânsito rodoviário, AT travou o pesado que conduzia e encostou na berma da A6, alguns metros atrás do veículo conduzido pelos arguidos, aguardando no interior da cabine do trator Renault Magnum, que fosse fiscalizado.
14°
Sem que AT se tivesse apercebido, sucedeu que outros dois arguidos pararam o veículo automóvel, ligeiro misto, matricula 58-45-PB, marca Renault, modelo Kangoo, na retaguarda do veículo pesado de mercadorias e saíram do interior do mesmo, caminhando, de forma a não serem vistos, lateralmente ao reboque.
15°
Estes arguidos vestiam luvas e capuz, empunhando cada um, uma pistola de fogo, cujas caraterísticas concretas não se lograram apurar.
16°
Ao aproximarem-se da cabine do trator de mercadorias onde AT se encontrava, abriram subitamente a porta do lado do passageiro, tendo um deles lhe apontado à cabeça uma pistola e com o uso da sua força muscular, agarraram-no pelos colarinhos, puxaram-no, tendo-lhe um dito, em voz alta e tom sério, "se tocas no alarme mato-te".
17º
Ato imediato, utilizando a sua força muscular, puxaram AT para fora da cabine do trator de mercadorias, revistaram-no e forçaram-no a entrar para o interior da cabine de carga do Renault Kangoo, matricula 58-45-PB, desferindo-lhe um forte empurrão.
18°
Com tal atuação, conseguiram manietar e dominar AT, o qual, por recear pela sua vida e integridade física, não opôs qualquer resistência
19°
De seguida, estes dois arguidos arrancaram conduzindo a Renault Kangoo, mantendo AT fechado na cabine de carga, tomando direção para parte incerta, circulando durante mais de uma hora.
20°
Após o que pararam e estacionaram numa estrada de terra batida, em frente ao Monte da Abrunheira, próximo da Estrada Nacional n.º 2, encostando totalmente a parte de trás do veículo a uma árvore de grandes dimensões, impedindo a abertura da porta traseira nomeadamente por dentro.
21°
Abandonaram então este veículo no local, deixando AT fechado na caixa de carga, impedindo-o de se libertar e sair desse espaço, aí permanecendo confinado durante toda a noite até que no dia seguinte, pelas 09h.00m., foi encontrado por guardas-florestais que passavam ocasionalmente no local e chamaram a GNR que tratou de forçar a abertura pelo exterior da porta lateral da viatura, libertando AT.
22°
Enquanto isto, em execução do planeado e combinado, outros dos arguidos tomaram a condução do veículo pesado de mercadorias Renault Magnum, matricula 9421-CZB, acoplado com o reboque, matricula 2340-BBH, carregado com 200 paletes de tabaco no valor de 207.462,00 euros e partiram, desta forma fazendo dos mesmos coisa sua, assim os integrando no património de todos.
23°
Mais fizeram coisa sua várias peças de roupa, comida, uma carteira contendo documentação pessoal e o telemóvel marca Sharp, de cor preta, com o cartão telefónico Vodafone 916540609, tudo pertencente a AT, bem como o telemóvel marca Nokia, modelo 620, de cor cinzenta, com o cartão n.º 695228493 Movistar, pertencente à empresa "Baikal"
24°
Ainda durante a noite de 17 para 18 de Novembro de 2008, já depois de terem a sua disponibilidade, os arguidos trocaram o trator de mercadorias Renault Magnum, matricula 9421-CZB, por outro cujas características concretas não se lograram apurar e que estava acoplado ao reboque matricula L-87857, marca Freauf, cor cinza e prata, seguindo depois viagem para parte incerta levando o tabaco.
25°
E abandonaram este trator Renault Magnum e o reboque marca Freauf, no parque de estacionamento do restaurante "Cachola", sito na Estrada Nacional 4, em Montemor-o-Novo.
26°
Sucede que o veículo Renault Kangoo, matricula 58-45-PB, havia sido subtraído por desconhecidos ao seu proprietário de nome Manuel Augusto Mesquita Pinto na noite de 30 para 31 de Julho de 2008, quando se encontrava estacionado na Rua da Fonte Nova, em Vila Real.
27°
E, em data posterior que não se logrou apurar mas certamente anterior a 17 de Novembro de 2008, os arguidos, sabendo a origem e forma de obtenção desta viatura, de maneira não concretamente apurada, ficaram com o mesmo decidindo utilizá-lo corno descrito.
28°
Na preparação de toda a ação para se apropriarem do tabaco, os arguidos rodearam-se de grandes cautelas, não deixando todavia de comunicar entre si, nomeadamente por telemóvel, uma vez que a execução do plano tinha de ser articulada e em vários pontos do país.
29°
Nesse desígnio, os arguidos utilizaram cartões telefónicos que depois desativaram ou que pertenciam a terceiras pessoas, para estabelecerem essas comunicações, concretamente entre o local da interceção do veículo pesado de mercadorias carregado com tabaco, na zona de Estremoz/Montemor-o-Novo e o local onde se apoderaram do reboque de matrícula L-87857, marca Freauf, em Alfena/Valongo.
30°
Assim, os arguidos utilizaram os cartões telefónicos ns.° 922141367, 922139850 e 933682855 colocados em aparelho de telemóveis para comunicarem entre si no dia 17 de Novembro de 2008, em Alfena e em Montemor-o-Novo.
31°
Através do cartão SIM 933682855 fizeram chamadas e comunicaram para o telemóvel com o cartão SIM 922141367, entre as 02h.24m. e as 02h.27m. e para o cartão SIM 922139850 às 02h.25125m., sempre no dia 17 de Novembro de 2008, na zona da Rua Afonso IV, em Alfena/alongo.
32°
Por sua vez, entre as 18h.48m. e as 19h.11m. do dia 17 de Novembro de 2008, os arguidos utilizaram os cartões SIM ns.° 933682855 e 922141367 colocados em telemóveis para comunicaram entre si, bem como o cartão SIM 922139850, pelas 19h.05m. / 19h.12m., na zona de Montemor-o-Novo/Autoestrada n.º 6 (A6).
33º
0 cartão SIM n.º 933682855 pertence à empresa "Construções Serra do Larouco, SA", estando afeto e na posse do seu utilizador habitual e ora arguido JMM, voltando a ser ativado no dia seguinte, em 18 de Novembro de 2008, na zona da sua residência, em Montalegre, pelas 05h.30m..
34°
Quanto aos cartões SIM ns.° 922141367, 922139850 nunca tiveram titulares registados e foram cancelados logo após o dia 17 de Novembro de 2008.
35º
Estes dois cartões SIM funcionaram até àquela data nos aparelhos de telemóvel correspondentes aos números de série únicos (IMEI's) 358 96701826293 e 35982601897899, respeitantes a dois Nokia modelo 2610.
36°
Todavia, mesmo depois daqueles cartões SIM serem cancelados, sucedeu que o aparelho Nokia, IMEI 35982601897899, foi utilizado com o cartão SIM 936670038 entre 24.02.2009 e 01.07.2009 e nesse mesmo aparelho foi utilizado o cartão SIM 936288145 entre 03.11.2008 e 14.11.2008.
37º
0 cartão SIM 936288145 foi objeto de carregamentos em 29.12.2008 e 31.01.2009 através da conta bancária n.º 5180654328 — Millenium BCP, titulada por Gilberto José Gonçalves Pereira, amigo do arguido FGC e pai do ora arguido ECGP, este por sua vez tio do companheiro de Elisabete Gonçalves Calaz, irmã de FGC, e conta n.º 00310345122020 Santander Totta, titulada por CSR, companheira e mãe do filho do arguido FGC.
38°
Por sua vez, o cartão SIM 936670038 foi objeto de carregamentos em 20.08.2008, 23.11.2008, 20.09.2009, 01.04.2010 e 24.08.2010 através da conta bancária n.º 0249040241400 – CGD, titulada pelos cunhados do arguido FGC, de nomes FFS e NMRS e através da conta n.º 00310345122020 -Santander Totta, titulada pela companheira do arguido FGC, de nome CSR.
39°
Na sequência de busca judicial ordenada e realizada à residência do arguido FGC, no dia 25.09.2012, foram-lhe apreendidos vários aparelhos de telemóvel, tendo-se apurado que no aparelho Nokia, C-5, com o cartão SIM 933682855 consta na memória o n.º 935938899, o qual operou no dia 10.11.2008 na zona de Alfena correspondente a "Transportes SASP" e utilizado pelo arguido SASP.
40°
Contacto este estabelecido aquando da preparação da apropriação do reboque de matrícula L-87857, marca Freauf, em Alfena.
41°
Por sua vez, no telemóvel Apple Iphone 4, n.º 963780005 pertencente e utilizado por CSR, companheira do arguido FGC, existem registos de chamadas telefónicas para os ns.° 922139850, 922141367 e 933682855, identificados em Alfena e Montemor-o-Novo, no dia 17 de Novembro de 2008.
42°
0 número de telefone fixo 276334040 correspondente à residência do arguido FGC possui registos de chamadas reatadas para o n.º 935939899 do arguido SASP, para o n.º 964253940, o qual foi igualmente contactado pelo arguido JMM pelas 09h.00m. do dia 18.11.2008 e que pertence à empresa "Auto-Pires", com sede em Montalegre, pertencente aos arguidos JGP e JMGP, a quem pertence igualmente o telemóvel n.º 964005288, para quem aquele arguido JMM ligou pelas 05h.29m. do dia 18 de Novembro de 2008
43°
No âmbito dos presentes autos, em execução de mandados judiciais, no dia 25 de setembro de 2012, foi realizada busca domiciliária à residência do arguido FGC, em Chaves.
44°
Sucedeu que no quarto do arguido foi encontrada e apreendida, estando na sua posse, a espingarda caçadeira, de tiro a tiro, com dois canos basculantes sobrepostos, de alma lisa, calibre 12, com extrator automático, comprimento de cano de 710mm., marca Aguirre Y Aranzabal, com o n.º de série 260392, livrete de manifesto n.º 01909.
45°
Esta espingarda encontrava-se acondicionada dentro de um estojo de cor verde, no interior de cujo forro estavam guardadas seis cartuchos, calibre 12, por deflagrar, cor verde, com as inscrições Nobel Sport, também apreendidos.
46°
No interior de uma gaveta sob o forno da cozinha, dentro de um saco de plástico, o arguido guardava nove munições, calibre .32, por deflagrar, com as inscrições W-W 32 S&W Long e uma munição calibre .32, por deflagrar, com as inscrições Geco .32 S&W Long, que lhe foram apreendidas.
47°
0 arguido possuía esta espingarda e munições, sem qualquer justificação que não fosse o seu eventual uso, estando à sua disposição, não sendo titular de licença que o permitisse, nem estava por qualquer forma autorizado a tal.
48°
No âmbito destes autos, em execução de mandados judiciais, no dia 25 de setembro de 2012, foi realizada busca domiciliária à residência do arguido ECGP, em Chaves.
49°
No rés-do-chão, numa cómoda junto à entrada da habitação, este arguido tinha uma caixa com as inscrições 6,35 Browning/.25 Auto – Lellier & Bellot, onde guardava doze munições, calibre 6,35, com as inscrições S&B, por deflagrar, e uma munição, calibre 6,35, com a inscrição GFL, também por deflagrar, que lhe foram apreendidas.
50°
Este arguido detinha estas munições sem qualquer justificação que não fosse o seu eventual uso, estando à sua disposição, não sendo titular de licença que o permitisse, nem estava por qualquer forma autorizado a tal.
51°
Na mesma cómoda situada no rés-do-chão da habitação do arguido ECGP, foi ainda encontrada uma carteira em napa, de cor preta, similar às utilizadas pelas forças de segurança, com uma bandeira portuguesa e um dístico, em metal amarelo, com o símbolo da GNR - Brigada Territorial da n.º 4 / Porto.
52°
Os arguidos ECGP, JMM, JMGP, JGP, SASP e FGC agiram sempre de forma deliberada, livre e conscientemente.
53°
Atuaram em conjugação de esforços e na sequência de combinação, em execução do planeado.
54°
Ao se apoderarem do reboque de matricula L-87857, marca Freauf, cor cinza e prata, em Alfena, acoplando-o a um trator de mercadorias, abandonando o local da forma como o fizeram, estes arguidos atuaram com o intuito de fazer do mesmo coisa sua, o que efetivamente conseguiram, bem sabendo que não lhe pertencia, que atuavam sem conhecimento, contra a vontade e em prejuízo do seu legítimo possuidor, estando cientes do seu valor não inferior a 10.000,00 euros.
55°
Ao receberem e guardarem o Renault Kangoo, matricula 58-45-PB, da forma como o fizeram, estes arguidos agiram conscientes que não lhes pertencia nem à pessoa que o entregou, tal como da forma ilícita como havia sido apropriado ao respetivo proprietário.
56°
Não obstante, aceitaram e ficaram com o mesmo sem qualquer custo financeiro, afetando-o da forma descrita, visando auferir um ganho patrimonial que nunca alcançariam de outra forma, o que conseguiram.
57°
Os seis arguidos tinham noção que ao agirem da forma descrita e ao sinalizarem a viatura, ostentando a sigla da GNR, que utilizaram para dar ordem de paragem ao condutor do pesado de mercadorias, estavam a assumir a prática de atos próprios desta força de segurança, o que quiseram.
58°
Sabiam que não tinham qualquer permissão para o efeito e nem estavam habilitados para tal, o que não os inibiu de agirem da forma descrita.
59°
E quiseram assumir tais atos no intuito de levar AT a acreditar que se tratavam de ordens provenientes de agentes da autoridade, parando a marcha do veículo que conduzia na auto-estrada n.º 6, tal como aconteceu.
60°
Mais sabiam todos os arguidos que os atos por si praticados eram idóneos a colocar AT na impossibilidade de reagir por qualquer forma à sua conduta, dada a maneira surpreendente, agressiva e o uso da força muscular aplicada, o que efetivamente se verificou.
61°
Atuaram assim determinados por uma vontade de fazer coisa sua o trator de mercadorias marca Renault, modelo Magnum, matricula 9421-CZB, o reboque matricula 2340 BBH, as 26 paletas com tabaco e os demais objetos descritos, sabendo que não lhes pertenciam e que atuavam contra a vontade e em prejuízo dos seus proprietários, o que quiseram e conseguiram
62°
Estavam cientes que o seu valor total era superior a 200.000,00 euros.
63°
De igual modo, cada arguido tinha consciência das características das pistolas de fogo utilizadas para praticar tais atos, bem como da sua capacidade para causar lesões físicas ou até a morte quando usadas contra seres humanos.
64°
Atuaram conscientes que ao manterem AT fechado no interior da caixa de carga da Renault Kangoo, matricula 58-45-PB, da forma descrita, o estavam a privar da sua liberdade de movimentação, forçando-o a manter-se nesse local, sabendo que agiam contra a sua vontade.
65°
Durante o período em que aí esteve fechado, AT sentiu-se e esteve privado de se movimentar e de livremente sair do interior da caixa de carga do veículo, tal como os arguidos quiseram e conseguiram.
66°
O arguido FGC conhecia as características da mencionada espingarda e projéteis que possuía e lhe foram apreendidos, concretamente que se tratavam de arma de fogo e munições respetivas.
67°
Estava ciente que não era titular de autorização ou licença válida para as deter e utilizar, o que sabia ser obrigatório.
68°
O arguido ECGP conhecia as características dos descritos projéteis que possuía e lhe foram apreendidas, concretamente que se tratavam de munições de arma de fogo.
69°
Estava ciente que não era titular de autorização ou licença válida para as deter e utilizar, o que sabia ser obrigatório.
70°
Cada um dos seis arguidos sabia que as suas condutas não lhes eram permitidas e eram punidas por lei.
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Porém, todos os arguidos requereram a abertura de instrução, finda a qual foi proferido o seguinte despacho de não pronúncia, citado apenas na parte que agora interessa ao caso:
Em face do invocado no requerimento de abertura de instrução, importará apurar se se encontra suficientemente indiciado o cometimento pelos arguidos, em coautoria, dos crimes de roubo agravado, furto qualificado, sequestro, receptação e usurpação de funções.
A imputação da prática ao arguido FGC, com autor material, de um crime de detenção de arma proibida, merecerá apreciação autónoma, assim como a imputação ao arguido ECGP, em autoria material, do crime de detenção de arma proibida.
Desde já referimos que, em nosso entender, não existem elementos nos autos que permitam sustentar a acusação no concerne aos ilícitos imputados em coautoria e relativos ao roubo perpetrado na A6.
Toda a acusação se alicerça na prova que foi recolhida pelo confronto comparado das comunicações telefónicas dos locais dos factos, na sequência do despacho de fls. 128 a 133.
A primeira questão que se suscita tem a ver com a validade da prova recolhida por tal meio e uma vez que não existia, então, qualquer suspeito minimamente identificado nos autos, dirigindo-se o meio de obtenção de prova a um universo indiscriminado de potenciais utilizadores de comunicações telefónicas móveis.
No sentido da inadmissibilidade de recurso ao meio de prova em causa, nas mesmas circunstâncias verificadas nos presentes autos, encontramos o Ac. R.L. de 7/11/2007 e os Acs. da R.E. de 18/10/2011, de 14/07/2010 e de 21/5/2013, Proc. n.º 199/12.3GTSTB-A.E, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
A sufragar-se esta posição, como temos feito, estará inquinada toda a obtenção de prova que se funda exclusivamente nos resultados obtidos do cruzamento das comunicações detetadas pelas antenas com cobertura nos locais dos factos, por se tratar de prova proibida, nos termos do disposto nos arts. 126.º, n.º 3 e 187.º, n.º 4, al. a), do Cód. Proc. Penal.
Mas mesmo que se entenda que nos presentes autos não houve recurso a métodos ilícitos de obtenção de prova, o certo é que os dados de tais comunicações móveis poderiam, quanto muito, constituir indícios que justifiquem o desencadear de outros meios de obtenção de prova aptos a confirmar e corroborar as coincidências detetadas (pela circunstância de certos números de cartões de telemóvel operarem nos locais dos factos, à data dos mesmos e de eventual conhecimento entre os seus utilizadores).
Não são é estes elementos, só por si, suficientes para alicerçar toda uma acusação.
De facto, a investigação nos presentes autos recorreu a variados meios de obtenção de prova, nomeadamente recolha, análise e comparação de vestígios biológicos, sem que se tenha conseguido corroborar as suspeitas que recaiam sobre os arguidos pela sua ligação a números de telemóvel que operaram no local dos factos (ou na área vasta coberta pelas antenas das operadoras móveis).
Por isso, em nosso entender, não se encontra suficientemente indiciado que os utilizadores dos cartões telefónicos com os números 922141367, 922139850 e 933682855 tiveram intervenção nos factos, pese embora tenham sido detetados a operar quer na zona de Alfena/Valongo, quer na zona de Montemor-o-Novo, na A6.
Ainda que assim não se entenda, apenas foi possível detetar que o cartão n.º 933682855 pertence à sociedade “Construções Serra do Larouco, S.A.”, sendo o seu utilizador habitual o arguido JMM. Contudo, daí não podemos extrair que este utilizasse tal cartão no dia 17/11/2008 e que se encontrasse em Montemor-o-Novo.
Por outro lado, todos os arguidos se conhecem entre si pelo que se mostra justificada a existência de comunicações telefónicas móveis entre os mesmos (como os arguidos alegam, sendo certo, contudo, que não é aos arguidos que cumpre justificar tais contactos).
De igual forma a ligação profissional dos arguidos à área dos transportes, o que lhes facultaria conhecimentos e potenciais meios para a prática dos factos, não pode justificar o alicerçar das coincidências detetadas em meio de prova que sustente, só por si, uma acusação.
E mesmo que se admita como admissível o recurso a prova indireta (como é nosso entendimento) a prova dos factos a extrair terá de se sustentar em factos válidos e que os suportem de modo suficiente, o que não ocorre com a prova recolhida nos autos, desde logo por não se indiciar suficientemente que os utilizadores dos cartões identificados no art. 30.º tenham tido efectiva intervenção nos factos.
Nem o recurso às regras da experiência comum indica o contrário e justifica o juízo acusatório.
Temos, assim, de concluir que não foram reunidos indícios nos autos da prática pelos arguidos dos crimes de roubo agravado. e p. pelos arts. 210.º, ns. 1 e 2, a. b), de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 204.º, n.º 1, al. a), de sequestro p. e p. pelo art. 158.º, n.º 1 do Cód. Penal, de recetação p. e p. pelo art. 231.º, n.º 1 e de usurpação de funções p. e p. pelo art. 358.º, todos do Cód. Penal.

Pelo exposto, o Tribunal considera não suficientemente indiciados os factos vertidos na acusação sob os arts. 1.º a 33.º, 39.º, 40.º, 52.º a 65.º e 70.º (para que se remete nos termos previstos no art. 307.º, n.º1 do Cód. Proc. Penal).
No que concerne ao enunciado sob os números 34.º a 38.º, 41.º e 42.º e 51.º, estamos perante mera referência a meios de prova que não devem constar da acusação e que, por isso, também não serão objeto de juízo de indiciação de facto.
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Já quanto à prática dos crimes de detenção e arma proibida imputados, em autoria, aos arguidos FGC e ECGP e bastando-se a indiciação com a posse não documentada da arma e munições encontradas nas buscas levadas a cabo nas residências dos arguidos, em nada foram os indícios dos autos abalados pela fase de instrução, permitindo antever como altamente provável a condenação em julgamento, o que impõe a respectiva pronúncia.
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Inconformado com o assim decidido, o M.º P.º interpôs o presente recurso, apresentando as seguintes conclusões:
1) Tendo em consideração as características que envolveram a prática dos factos em investigação, depoimentos de testemunha e outros meio de prova, à data em que foi ordenada a junção do tráfego de todas as chamadas telefónicas em período determinado e nos locais da prática dos factos já existia a noção de que os ora arguidos eram um grupo individualizável, com ligações à zona norte do país, à área dos transportes pesados de mercadorias e que teria recorrido a este meio para comunicar na preparação e execução dos ilícitos, tornando-os suspeitos.
2) Ao invés do que foi decidido em sede de decisão instrutória, de que o recurso a dados de registo de comunicações detetadas pelas antenas com cobertura nos locais dos factos sem suspeitos determinados constituiu meio inadmissível de prova por violação do art.º 187º, n.º 4, al.ª a) do Código de Processo Penal, entende-se que à data era já possível identificar um grupo de pessoas destacável do universo de todos os cidadãos que comunicaram nos locais e períodos determinados, relevante para aqueles efeitos.
3) Esta situação não estende ilimitadamente o universo de possíveis agentes do crime (conforme referem Exs. Srs. Profs. J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira in Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 4ª edição, vol. I, 2007, pág.ª 543), mas já constitui um recorte no universo de desconhecidos e, por isso, permite, com mínima segurança, balizar pessoas como suspeitas, ainda que não perfeitamente identificados, sendo suficiente para efeitos do disposto no art.º 1º, al.ª e) do Código de Processo Penal.
4) Tanto assim que este cerceamento está patente no relatório policial de fls. 122 e no despacho de 03.04.2009, do M.º Juiz de Instrução (fls. 133) que ordenou a junção desses elementos aos autos, pelo que inexiste a violação de qualquer norma legal e em especial aquelas já mencionadas.
5) Ainda que assim não se entendesse, ao conhecer oficiosamente desta suposta nulidade, a M.ª Juiz de Instrução acabou por violar o regime especificamente consagrado acerca da sua arguição no art.º 126º, n.º 3 do Código de Processo Penal, o qual se afasta daqueloutro previsto no art.º 118º e ss..
6) Este artigo 126º, n.º 3 prevê que a nulidade que a prova obtida em violação do direito à privacidade só possa ser conhecida a requerimento do titular do direito infringido (mesmo sentido: P. Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, UC Editora, 2ª edição, pág.ª 321, citando os Ac. do STJ de 20.09.2006, in CJ, de 27.01.1998, in BMJ , 473, 166, , de 08.02.1995, in CJ, e bem assim do TRC de 19.03.2003, in CJ, XXVIII, 2, 40, de 19.12.2001, in CJ, XXVI, 5, 57 e 20.02.1991, in CJ, XVI, 1, 102), acaso não tenha renunciado à sua arguição, o que não sucedeu nos autos, dado que nenhum dos arguidos veio suscitar ou requerer que fossem consideradas nulas as provas obtidas pelo cruzamento de chamadas nas antenas das operadoras de telecomunicações móveis.
7) A falta de legitimidade processual para arguir esta nulidade oficiosamente inviabiliza que consequentemente se possa fundamentar o despacho de não pronúncia dos arguidos em decorrência da anulação dos seus efeitos probatórios.
8) Acresce que a situação se torna ainda mais incompreensível quando a solicitação e junção desses elementos foi da autoria de Juiz de Instrução, que depois os aferiu e assim se mantiveram nos autos como válidos, desencadeando-se depois outros meios de obtenção de prova, alguns deles muito intrusivos tais como buscas domiciliárias, determinadas judicialmente.
9) Tal posição, para além da insegurança transmitida para o processo e para a sociedade em geral, representa, em nosso entendimento, uma violação do princípio da confiança.
10) No caso dos autos partiu-se destes elementos que atestam contactos telefónicos entre um grupo de pessoas integráveis no conjunto de suspeitos já cerceados para desencadear várias diligências policiais posteriores, reunindo documentação, inquirindo testemunhas, solicitando exames periciais, exames ao local e veículos, buscas domiciliárias e não domiciliárias, de molde que não se tornando possível apurar com todo o detalhe a forma como alguns dos factos aconteceram permitiram, pelo menos, confirmar a intervenção, o envolvimento de todos os arguidos na preparação, execução dos ilícitos depois imputados na acusação de roubo agravado, furto qualificado, sequestro, recetação e usurpação de funções.
11) Porque o Ministério Público também não tem acesso direto aos factos investigados, antes procura e analisa a prova que consegue obter, muitas das vezes é mediante um processo lógico dedutivo, articulando com regras da experiência de vida e senso comum, que se chega à conclusão sobre a existência ou não de indícios suficientes da prática de crimes, suficientes para fundamentar uma condenação em julgamento, sendo este mesmo processo que se suscita seja feito, de igual modo, pelo julgador, de molde a chegar ao conhecimento da parcela da realidade, do factum probandum.
12) Trata-se no fundo de valorar a prova indireta como ferramenta de apreensão da realidade, partindo de factos base para afirmar factos desconhecidos (factum probandum) mediante juízo de normalidade, de probabilidade, assente em regras da experiência e que, face ao disposto no art.º 125º do Código de Processo Penal (em previsão no art.º 349º do Código Civil), não constitui meio proibido de prova desde que se assegure a sua natureza ilidível e o espaço de defesa dos arguidos (cfr. Ac. TC n.º 922/96).
13) No presente processo a investigação partiu do conhecimento do «modus operandi» dos agentes do crime, com base no depoimento de ofendido (AT) e da análise de veículos utilizados pelos mesmos para depois se pretender alcançar a sua identificação completa, sendo a prova obtida pelo cruzamento de chamadas telefónicas mais um meio para o esclarecimento dos factos tal como o foram as subsequentes apreensões de objetos encontrados nas suas residências, designadamente apontamentos, contactos, armas, munições e crachá da GNR, confirmando as suspeitas iniciais.
14) A conclusão de que os elementos eram suficientes para imputar os aludidos ilícitos decorreu de um conjunto de meios de prova, que não apenas tais registos de comunicações entre os arguidos, suscitando também valoração de prova indireta, de molde que face ao disposto no art.º 283º, n.º 2 do Código de Processo Penal se sustentou a acusação deduzida.
15) Em consequência, ao não pronunciar os arguidos, o despacho exarado pela M.ª Juiz de Instrução não fez correta apreciação e interpretação da prova, tendo violado o disposto no art.º 308º, n.º 1, do Código de Processo Penal, em articulação com o art.º 283º, n.º 2 do mesmo diploma legal aqui aplicável «ex vi» o n.º 2 daquela disposição legal, porquanto resultam e existem elementos probatórios nos autos que, em termos indiciários, razoavelmente fazem antever a aplicação em julgamento aos arguidos FGC, ECGP, JMM, JMGP, JGP e SASP de uma pena pela prática dos crimes de roubo agravado, p. e p. pelo art.º 210º, ns.º 1 e 2, al.ª b), em articulação com os arts.º 204º, n.º 2, als.ª a) e f), art.º 202º, al.ª b), todos do Código Penal e art.º 4º do D.L. n.º 48/95, de 15.03, de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 204º, n.º 1, al.ª a), em articulação com os arts.º 203º e 202º, al.ª a), todos do Código Penal, de sequestro, p. e p. pelo art.º 158º, n.º 1, do Código Penal, de receptação, p. e p. pelo art.º 231º, n.º 1 do Código Penal e de usurpação de funções, p. e p. pelo art.º 358º, al.ª a), do Código Penal, nos exatos termos em que foram acusados.

Termos em que deve tal despacho de não pronúncia ser revogado e substituído por outro que pronuncie os arguidos pela prática desses ilícitos.
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Todos os arguidos responderam ao recurso do M.º P.º, apresentando a do arguido FGC e a do arguido SASP as seguintes conclusões, que são idênticas:
1) O douto recurso interposto pelo Digno Magistrado do Ministério Público tem como fim a revogação da douta decisão recorrida que decidiu pela não pronúncia do arguido pela prática, em co-autoria material e em concurso real, nos termos do disposto nos artigos 30.º, n.º 1 e 26.º do Código Penal, de um crime de roubo agravado, previsto e punido pelo disposto no artigo 210º n.ºs 1 e 2, alínea b), em articulação com os artigos 204º nº 2, alíneas a) e f), 202º alínea b), do Código Penal e artigo 4º do DL nº 48/95, de 15 de Março; um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo artigo 204º, n.º 1 alínea a), em articulação com os artgs. 203º e 202º alínea a), do Código Penal, um crime de sequestro, previsto e punido pelo artigo 158º, nº 1 do Código Penal, um crime de receptação, previsto e punido pelo artigo 231º, nº 1 do Código Penal e um crime de usurpação de funções, previsto e punido pelo artigo 358º alínea a) do Código Penal;
2) Não pode nem deve o Arguido concordar com tal entendimento porquanto a douta decisão do Tribunal a quo fez uma correcta interpretação do disposto no nº1 do artigo 308º do CPC bem como de todos os elementos probatórios constantes nos autos;
3) A prova está inquinada uma vez que se funda exclusivamente no cruzamento das comunicações detectadas pelas antenas de cobertura móvel nas zonas dos factos, sendo que à data da recolha da informação, não existia qualquer suspeito minimamente identificado, dirigindo-se tal obtenção de prova a um universo indiscriminado de potenciais utilizadores de comunicações telefónicas móveis e, como tal, estamos perante prova proibida, nos termos do disposto nos artigos 126º, nº3 e 187º, nº4, alínea a), todos do CPC;
4) O despacho de não pronúncia fez uma correcta apreciação dos presumíveis indícios avançados no douto libelo acusatório;
5) Compulsados os autos, constata-se que no inquérito, nada mais consta para acusar o arguido;
6) Não existe, para suportar a acusação de que é alvo, qualquer outro meio de prova complementar (tentada pela investigação), nomeadamente identificação por parte da vítima ou outras testemunhas, impressões digitais, vestígios biológicos, captação de imagens de vídeo vigilância ou escutas telefónicas que corroborem as suspeitas que recaiam sobre o arguido;
7) Contrariamente ao douto entendimento do Digno Magistrado do Ministério Público, da análise de todos os elementos dos autos, não existem provas válidas e sólidas que atestem suficientemente a ligação do arguido aos dias, locais e momentos decisivos da prática do crime aqui e agora em causa;
8) Embora se possa considerar como admissível o recurso à prova indirecta, a conclusão a sustentar terá sempre que assentar em factos válidos e concretos que suportem suficientemente a intervenção efectiva do arguido nos factos, o que no caso dos autos, não se verifica.
9) Não pode a tese do digno Magistrado do Ministério Público colher porquanto, e ao contrário do por si afirmado, se recorremos a juízos de normalidade, de probabilidade, assente em regras de experiência comum não conseguiríamos nesse caso chegar a uma conclusão verdadeira, afastando assim a chamada prova por presunções;
10) Da análise da prova junta aos autos pode afirmar-se que o Arguido não teve no local dos factos; não praticou os mesmos e que a acusação não tinha qualquer fundamento indiciário para ter sido deduzida pelo que outra conclusão não se poderá retirar a não ser que muito provavelmente o Arguido seria absolvido e não condenado;
11) A acusação e a pronúncia dependem da existência de prova indiciária, de prima facie, de primeira mas razoável aparência, quanto à verificação dos factos que constituam crime e de que alguém é responsável por esses factos;
12) No caso dos autos, essa prova indiciária não existe, não preenchendo por isso o conceito legal de “indícios suficientes”, inexistindo elementos probatórios no sentido de que o mesmo praticou os factos de que vinha acusado.
13) Face a todo o exposto, deve manter-se a douta decisão recorrida, nomeadamente não pronunciando o Arguido pelos crimes de que vinha acusado, porquanto não existem quaisquer elementos nos autos que, em termos indiciários, façam antever uma condenação em julgamento.

Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, não deve colher provimento o presente recurso, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida
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Por sua vez, a resposta dos arguidos JGP e JMGP apresenta as seguintes conclusões:
1) O douto recurso interposto pelo Digno Magistrado do Ministério Público tem como fim a revogação da douta decisão recorrida que decidiu pela não pronúncia dos arguidos JGP e JMGP pela prática, em co-autoria material e em concurso real, nos termos do disposto nos artigos 30.º, n.º 1 e 26.º do Código Penal, de um crime de roubo agravado, previsto e punido pelo disposto no artigo 210º n.ºs 1 e 2, alínea b), em articulação com os artigos 204º nº 2, alíneas a) e f), 202º alínea b), do Código Penal e artigo 4º do DL nº 48/95, de 15 de Março; um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo artigo 204º, n.º 1 alínea a), em articulação com os artgs. 203º e 202º alínea a), do Código Penal, um crime de sequestro, previsto e punido pelo artigo 158º, nº 1 do Código Penal, um crime de receptação, previsto e punido pelo artigo 231º, nº 1 do Código Penal e um crime de usurpação de funções, previsto e punido pelo artigo358º alínea a) do Código Penal;
2) Não podem nem devem os Arguidos concordar com tal entendimento porquanto a douta decisão do Tribunal a quo fez uma correcta interpretação do disposto no nº1 do artigo 308º do CPC bem como de todos os elementos probatórios constantes nos autos;
3) A prova está inquinada uma vez que se funda exclusivamente no cruzamento das comunicações detectadas pelas antenas de cobertura móvel nas zonas dos factos, sendo que à data da recolha da informação, não existia qualquer suspeito minimamente identificado, dirigindo-se tal obtenção de prova a um universo indiscriminado de potenciais utilizadores de comunicações telefónicas móveis e, como tal, estamos perante prova proibida, nos termos do disposto nos artigos 126º, nº3 e 187º, nº4, alínea a), todos do CPC;
4) O despacho de não pronúncia fez uma correcta apreciação dos presumíveis indícios avançados no douto libelo acusatório;
5) Compulsados os autos, constata-se que no inquérito, nada mais consta para acusar os Arguidos JGP e JMGP que as pretensas comunicações efectuadas entre estes arguidos e alguns dos

6) outros arguidos sendo que o número do cartão telefónico de ambos os Arguidos nunca sequer foram localizados no local dos factos acusados nem tão pouco na suposta zona (vasta) de captação da célula móvel sendo sim alvo de contactos mas em Montalegre, local de residência e trabalho dos mesmos;
7) Não existe, para suportar a acusação de que são alvo, qualquer outro meio de prova complementar (tentada pela investigação), nomeadamente identificação por parte da vítima ou outras testemunhas, impressões digitais, vestígios biológicos, captação de imagens de vídeo vigilância ou escutas telefónicas que corroborem as suspeitas que recaiam sobre os arguidos;
8) Contrariamente ao douto entendimento do Digno Magistrado do Ministério Público, da análise de todos os elementos dos autos, não existem provas válidas e sólidas que atestem suficientemente a ligação dos arguidos JGP e JMGP aos dias, locais e momentos decisivos da prática do crime aqui e agora em causa;
9) Embora se possa considerar como admissível o recurso à prova indirecta, a conclusão a sustentar terá sempre que assentar em factos válidos e concretos que suportem suficientemente a intervenção efectiva dos arguidos nos factos, o que no caso dos autos, não se verifica.
10) Não pode a tese do digno Magistrado do Ministério Público colher porquanto, e ao contrário do por si afirmado, se recorremos a juízos de normalidade, de probabilidade, assente em regras de experiência comum não conseguiríamos nesse caso chegar a uma conclusão verdadeira, afastando assim a chamada prova por presunções;
11) Da análise da prova junta aos autos pode afirmar-se que os Arguidos não estiveram no local dos factos; não praticaram os mesmos e que a acusação não tinha qualquer fundamento indiciário para ter sido deduzida pelo que outra conclusão não se poderá retirar a não ser que muito provavelmente os Arguidos seriam absolvidos e não condenados;
12) A acusação e a pronúncia dependem da existência de prova indiciária, de prima facie, de primeira mas razoável aparência, quanto à verificação dos factos que constituam crime e de que alguém é responsável por esses factos;
13) No caso dos autos, essa prova indiciária não existe, não preenchendo por isso o conceito legal de “indícios suficientes”, inexistindo elementos probatórios no sentido de que os mesmos praticaram os factos de que vinham acusados;
14) Face a todo o exposto, deve manter-se a douta decisão recorrida, nomeadamente não pronunciando os Arguidos pelos crimes de que vinham acusados, porquanto não existem quaisquer elementos nos autos que, em termos indiciários, façam antever uma condenação em julgamento.

Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, não deve colher provimento o presente recurso, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida,
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A resposta do arguido ECGP apresenta as seguintes conclusões:
1ª A ausência de elementos de prova, de prova incriminadora, só pode levar à não pronúncia dos arguidos, sem necessidade, sequer, do recurso ao princípio latino do “in dúbio pró réu”.
2ª Impõe-se reconhecer o grande mérito da julgadora na apreciação e valoração dos factos, preocupando-se sempre por demandar a verdade e revelando largos conhecimentos jurídicos.
3ª Dizemos isto não porque os ora recorridos não foram pronunciados, mas apenas porque reconhecer isso é também uma questão de justiça.
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Por fim, a resposta do arguido JMM apresenta as seguintes conclusões:

1) O douto recurso interposto pelo Digno Magistrado do Ministério Público tem como fim a revogação da douta decisão recorrida que decidiu pela não pronúncia do arguido JMM pela prática, em co-autoria material e em concurso real, nos termos do disposto nos artigos 30.º, n.º 1 e 26.º do Código Penal, de um crime de roubo agravado, previsto e punido pelo disposto no artigo 210º n.ºs 1 e 2, alínea b), em articulação com os artigos 204º nº 2, alíneas a) e f), 202º alínea b), do Código Penal e artigo 4º do DL nº 48/95, de 15 de Março; um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo artigo 204º, n.º 1 alínea a), em articulação com os artgs. 203º e 202º alínea a), do Código Penal, um crime de sequestro, previsto e punido pelo artigo 158º, nº 1 do Código Penal, um crime de receptação, previsto e punido pelo artigo 231º, nº 1 do Código Penal e um crime de usurpação de funções, previsto e punido pelo artigo358º alínea a) do Código Penal;

2) Não pode nem deve o Arguido concordar com tal entendimento porquanto a douta decisão do Tribunal a quo fez uma correcta interpretação do disposto no nº1 do artigo 308º do CPC bem como de todos os elementos probatórios constantes nos autos;

3) A prova está inquinada uma vez que se funda exclusivamente no cruzamento das comunicações detectadas pelas antenas de cobertura móvel nas zonas dos factos, sendo que à data da recolha da informação, não existia qualquer suspeito minimamente identificado, dirigindo-se tal obtenção de prova a um universo indiscriminado de potenciais utilizadores de comunicações telefónicas móveis e, como tal, estamos perante prova proibida, nos termos do disposto nos artigos 126º, nº3 e 187º, nº4, alínea a), todos do CPC;

4) O despacho de não pronúncia fez uma correcta apreciação dos presumíveis indícios avançados no douto libelo acusatório;

5) Compulsados os autos, constata-se que no inquérito, nada mais consta para acusar o ora Recorrido que as pretensas comunicações efectuadas entre este arguido e alguns dos co-arguidos, cujo número de telefone alegadamente utilizado pelo mesmo pertenceria à sua Entidade Patronal, o que levanta a possibilidade de eventual utilização por outra pessoa.

6) Acresce que à data dos factos, e conforme declarações prestadas por uma Colega de trabalho, Eng.ª Sandra Ribeiro, a fls. 571 e o registo diário de horas de trabalho a fls. 575, juntas pela testemunha, o Arguido encontrava-se em funções na região de Montalegre entre cerca das 08h00 e as 17h00.

7) Pelo que, seria de todo impossível este Arguido ter tido qualquer intervenção nos factos constantes da acusação.

8) O próprio raio de captação das antenas de comunicações móveis não permite obter a localização exacta das chamadas efectuadas ou recebidas.

9) Com efeito, nada mais além das pretensas comunicações efectuadas, existe para suportar a acusação de que é alvo.

10) Não existe qualquer outro meio de prova complementar (tentada pela investigação), nomeadamente identificação por parte da vítima ou outras testemunhas, impressões digitais, vestígios biológicos, captação de imagens de vídeo vigilância ou escutas telefónicas que corroborem as suspeitas que recaiam sobre o arguido;

11) Contrariamente ao douto entendimento do Digno Magistrado do Ministério Público, da análise de todos os elementos dos autos, não existem provas válidas e sólidas que atestem suficientemente a ligação do arguido JMGP, aos dias, locais e momentos decisivos da prática do crime aqui e agora em causa;

12) Embora se possa considerar como admissível o recurso à prova indirecta, a conclusão a sustentar terá sempre que assentar em factos válidos e concretos que suportem suficientemente a intervenção efectiva do arguido nos factos, o que no caso dos autos, não se verifica.

13) Não pode a tese do digno Magistrado do Ministério Público colher porquanto, e ao contrário do por si afirmado, se recorremos a juízos de normalidade, de probabilidade, assente em regras de experiência comum não conseguiríamos neste caso chegar a uma conclusão verdadeira, afastando-se assim a chamada prova por presunções;

14) Da análise da prova junta aos autos pode afirmar-se que o Arguido, ora Recorrido, não esteve no local dos factos; não praticou os mesmos e que a acusação não tinha qualquer fundamento indiciário para ter sido deduzida pelo que outra conclusão não se poderá retirar a não ser que muito provavelmente o Arguido, em sede de audiência de discussão e julgamento, seria absolvido e não condenado;

15) A acusação e a pronúncia dependem da existência de prova indiciária, de prima facie, de primeira mas razoável aparência, quanto à verificação dos factos que constituam crime e de que alguém é responsável por esses factos;

16) No caso dos autos, essa prova indiciária não existe, não preenchendo por isso o conceito legal de “indícios suficientes”, inexistindo elementos probatórios no sentido de que o mesmo praticou os factos de que vinha acusado.

17) Face a todo o exposto, deve manter-se a douta decisão recorrida, nomeadamente não pronunciando o Arguido pelos crimes de que vinha acusado, porquanto não existem quaisquer elementos nos autos que, em termos indiciários, façam antever uma condenação em julgamento.

Nestes termos e nos mais de direito que V.as Ex.as doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida,

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Nesta Relação o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer também no sentido da procedência do recurso.
Cumpriu-se o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
Procedeu-se a exame preliminar.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II
De acordo com o disposto no art.º 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o objecto do recurso é definido pelas conclusões formuladas pelo recorrente na motivação e é por elas delimitado, sem prejuízo da apreciação dos assuntos de conhecimento oficioso de que ainda se possa conhecer.
De modo que as questões que em princípio estariam em causa no presente recurso seriam:

1.ª – A da validade da prova recolhida pelo confronto comparado das comunicações telefónicas estabelecidas a partir da área geográfica aonde se situaram os locais dos factos; e

2.ª – Se existem ou não indícios suficientes de que os arguidos tenham cometido, em co-autoria, os crimes de roubo agravado, furto qualificado, sequestro, receptação e usurpação de funções.

Não obstante a decisão recorrida ter defendido que era ilegal a prova obtida pelo confronto comparado das comunicações telefónicas estabelecidas a partir da área geográfica aonde se situaram os locais dos factos, o que se segue é quando abordou a questão da existência ou não de indícios suficientes da prática pelos arguidos dos crimes em apreço, o tribunal "a quo" o fez levando também em consideração essa prova, como explicitamente resulta de começar a abordagem do tema dos indícios afirmando mas mesmo que se entenda que nos presentes autos não houve recurso a métodos ilícitos de obtenção de prova, o certo é que …

De modo que, como no nosso ordenamento jurídico os recursos não se destinam ao aperfeiçoamento em abstracto dos procedimentos e das práticas jurídicas, nem a aprimorar o pensamento jurisprudencial, mas sim a decidir o resultado de situações concretas, a alterá-las ou modifica-las num sentido eminentemente prático e não de mera meditação académica, vamos abordar a questão da existência ou não de indícios levando também em conta a prova obtida pelo confronto comparado das comunicações telefónicas, como o fez o tribunal "a quo", e, se mesmo com recurso a essa prova concluirmos pela inexistência de indícios suficientes, escusado será então conhecer isoladamente da validade ou não dessa prova, porque o resultado de tal conhecimento nada de novo traria à solução no entretanto encontrada para o caso.

Ora bem.
Nos termos do n.º 1 do art.° 286.° do Código de Processo Penal, "a instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento".
E, nos termos do n.º 1 do art.° 308.° do mesmo diploma legal "se, até ao encerramento da instrução, tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, o juiz, por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respectivos; caso contrário, profere despacho de não pronúncia ".
Na expressão do art.º 283.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, «consideram-se suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança».

A este respeito, escreveu em 1974 o Prof. Figueiredo Dias, in “Direito Processual Penal”, 1.º, pág. 133, a respeito do Código de Processo Penal anterior, mas ainda com total utilidade para a compreensão do actual, que «os indícios só serão suficientes e a prova bastante quando, em face dela, seja de considerar altamente provável a futura condenação do acusado, ou quando esta seja mais provável do que a absolvição» E adianta: «tem pois razão Castanheira Neves quando ensina que na suficiência dos indícios está contida a mesma exigência de verdade requerida pelo julgamento final, só que a instrução (…) não mobiliza os mesmos elementos probatórios que estarão ao dispor do juiz na fase do julgamento, e por isso, mas só por isso, o que seria insuficiente para a sentença pode ser bastante ou suficiente para a acusação.»
Também Germano Marques da Silva, em «Curso de Processo Penal», vol. II, 3.ª edição, Verbo, 2.002, pág. 103-104, diz que por indiciação suficiente se deve entender «a possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, em razão dos meios de prova já existentes, uma pena ou medida de segurança». Trata-se da «probabilidade, fundada em elementos de prova que, conjugados, convençam da possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicável uma pena ou medida de segurança criminal ... »
E Luís Osório que «devem considerar-se indícios suficientes aqueles que fazem nascer em quem os aprecia a convicção de que o réu poderá vir a ser condenado» – «Comentário ao Código de Processo Penal Português», vol. IV, pág. 441.
Também a jurisprudência vêm entendendo que aquela possibilidade razoável de condenação é uma possibilidade mais positiva do que negativa; o juiz só deve pronunciar o arguido quando, pelos elementos de prova recolhidos nos autos, forma a sua convicção no sentido de que é mais provável que o arguido tenha cometido o crime do que o não tenha cometido, isto é, os indícios são suficientes quando haja uma alta probabilidade de futura condenação do arguido ou, pelo menos, uma probabilidade mais forte de condenação do que de absolvição.
(A tal respeito, cf.: acórdão da Relação de Coimbra de 10-4-85, Colectânea de Jurisprudência, 1985, II-81; acórdão da Relação de Coimbra de 31-3-93, Colectânea de Jurisprudência, 1993, II-66; acórdão da Relação do Porto de 12-2-97, Colectânea de Jurisprudência, 1997, I-263; acórdão da Relação do Porto de 13-11-74, sumariados no Boletim do Ministério da Justiça n.º 241, pág. 347; acórdão da Relação de Lisboa de 17-2-99, Colectânea de Jurisprudência, 1999, I-145).
Ora em face da prova a tal respeito recolhida no processo, também comungamos da decisão da Senhora Juíza de Instrução em que não existem indícios suficientes de que os arguidos tenham cometido, em co-autoria, os crimes de roubo agravado, furto qualificado, sequestro, receptação e usurpação de funções por que foram acusados.

E as razões desse nosso convencimento são iguais às explanadas na decisão recorrida.

Na verdade, a acusação é uma mão cheia de nada, de suposições, algumas coincidências e diversos atropelos a princípios básicos de um Estado de Direito, como o é desde logo uma violação, com o devido respeito, grosseira do princípio da presunção da inocência quando no ponto 2.º da acusação se fez constar que O arguido FGC, conhecido por "CC", já estava referenciado como estando ligado ao furto de viaturas e assaltos ao transporte de tabaco (objeto de investigações nos processos ns° 506/10.3JAPRT, 2494/04.6JAPRT, 1184105.7GBAMT, 473/06.8GAMAI, 507/08.6GNPRT, 10108.0JAAVR, 48/08.7GAVLP, 179/08.3GAAMR, 555/09.4JAPRT, 1153109.8JACBR e 96/10.7JAPRT), tendo conhecimentos pessoais na região de Montalegre, onde residem os arguidos JMGP e JMM.
Mas o que é isto?
Por esta ordem de ideias, bem podia ter-se de seguida acrescentado qualquer coisa do género: Aliás, que já o pai dele, na década de cinquenta do século passado, também …
Portanto, até já se ultrapassou o aforismo de quem faz um cesto, faz um cento, para se passar ao nível do de quem se suspeita que tenha feito um cesto, pode-se concluir ter já feito um cento.
A acusação não tem testemunhas que identifiquem os arguidos, não tem perícias positivas, os arguidos não confessam e da recolha, análise e comparação de vestígios biológicos a que procedeu não resultou qualquer prova em que a acusação se pudesse estribar.
No fundo, o que a acusação apenas tem é a referência a uma série de chamadas telefónicas efectuadas a partir da área geográfica de várias dezenas de quilómetros quadrados aonde ocorreram os crimes – áreas nas quais decerto estariam, além dos arguidos, muitas centenas de outras pessoas também a contactarem entre si e algumas delas igualmente detentoras de cadastros criminais no âmbito dos crimes então em curso.
E tem dois dos arguidos a quem, quase 4 anos depois das ocorrências, foram encontrados, a um deles, uma caçadeira, 6 cartuchos e 10 munições de revólver .32 e ao outro, um crachá da GNR e 13 munições de pistola 6,35. Ora caçadeiras, cartuchos e munições .32 ou 6,35 (ainda que no caso ilegalmente detidos por não estarem cumpridos os respectivos requisitos para a sua posse legal, a qual é possível aos civis), é o que mais há nas casas das gentes de Trás-os-Montes. Crachás já não; mas também o motorista do camião assaltado não falou em que algum dos assaltantes tenha exibido qualquer crachá e, depois, é preciso não esquecer que tinham passado 3 anos e 10 meses após os factos quando o crachá foi encontrado ao arguido ECGP.
Além disso, sabe-se hoje que o facto de um telemóvel accionar uma determinada antena, não significa com uma certeza absoluta que o telemóvel que a accionou esteja na área geográfica dessa antena, porque se a antena mais próxima do telemóvel estiver sobrecarregada de tráfego, a comunicação será assegurada por outra antena mais longínqua mas mais folgada de serviço.
Assim, se o confronto comparado das comunicações telefónicas que foram no passado estabelecidas a partir da área geográfica aonde se situavam os locais dos factos, permite restringir o universo de suspeitos, não os põe, contudo, no exacto local do crime, nem, porque não foram gravadas, descreve a participação no mesmo de quem faz as chamadas, faltando portanto o resto, isto é, falta que através de outros meios de prova se consiga indiciariamente preencher os vazios que sobram. Não havendo preenchimento com outras provas desses vazios, continua a não haver nada de suficientemente concreto para levar a julgamento.
Com o que existe em termos de provas, o julgamento seria apenas uma indigna formalidade, em que, não obstante inexistirem indícios suficientes, se molestariam os cidadãos fazendo-os passar gratuitamente pelas provações públicas e pessoais de um julgamento – o que não é desiderato sustentável num Estado de Direito, em que a aspiração constitucionalmente garantida a um julgamento justo implica também que haja motivos sérios, isto é, indícios suficientes, para sujeitar o cidadão a um julgamento.
Assim, bem andou, pois, o tribunal a quo ao proferir o despacho de não pronúncia dos arguidos pelos crimes de roubo agravado, furto qualificado, sequestro, receptação e usurpação de funções.

E posto o que irrelevante se torna para o caso o resultado que pudesse ser dado à 1.ª das questões, a da validade da prova recolhida pelo confronto comparado das comunicações telefónicas estabelecidas a partir da área geográfica aonde se situaram os locais dos factos.

III
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção Criminal em negar provimento ao recurso, mantendo na íntegra a decisão recorrida.
Não é devida tributação (art.º 522.º, do Código de Processo Penal).

Évora, 05-05-2015
(elaborado e revisto pelo relator, que escreve com a ortografia antiga)


João Martinho de Sousa Cardoso

Ana Maria Barata de Brito