Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
114/16.5T8EVR.E1
Relator: MOISÉS SILVA
Descritores: FILIAÇÃO
CRÉDITO DE HORAS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 02/02/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: i) quando não está em causa a filiação ou a idade das pessoas, estes factos não carecem de ser provados por documento autêntico ou autenticado, podendo sê-lo através de qualquer outro meio de prova.
ii) em caso de condenação da empregadora a reintegrar o trabalhador despedido, este não tem direito ao pagamento do equivalente pecuniário correspondente às horas de formação em falta.
iii) merecem a tutela do direito e devem ser compensados os danos não patrimoniais decorrentes do despedimento do trabalhador e sofridos por este.
(sumário do relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 114/16.5T8EVR.E1

Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO

Apelante: CC, SA (ré).
Apelado: BB (autor).

Tribunal Judicial da comarca de Évora, Évora, Instância Central, Secção de Trabalho, Juiz 1.

1. O A. veio intentar a ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra a ré pedindo que a ação seja julgada procedente e em consequência:
a) Considerar-se ilícita a cessação do contrato de trabalho por caducidade nos termos em que a ré o fez, declarando-se a final que o A., se encontra vinculado à ré, mediante contrato de trabalho sem termo, desde a data do início da prestação de trabalho ocorrida em 26.6.2010 até à presente data;
b) Ser a ré condenada no pagamento dos danos patrimoniais ora apurados no quantitativo de € 3.404,54 e aqueles que se vencerem até trânsito em julgado da decisão em causa;
c) Ser a ré condenada no pagamento dos danos não patrimoniais no valor de € 2.000,00;
d) Ser ainda condenada ao pagamento dos juros à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento;
e) Condenar-se a ré a reintegrar o A. no mesmo posto de trabalho, na mesma localidade onde nos últimos anos prestou o seu trabalho, em Évora.
Alega em síntese que foi admitido em 26 de julho de 2010, para sob as ordens, direção e por conta da CC, SA, a exercer as funções no âmbito da conservação da rede rodoviária, mediante contrato de trabalho a termo certo, com a duração de 12 meses, cujo termo inicial ocorreria em 25 de julho de 2011, que entretanto foi sucessivamente, renovado por períodos de 6 meses.
Desde a última renovação (26 de julho de 2012), que a ré apelida de renovação extraordinária, que o A. se manteve ininterruptamente em funções ao serviço da ré até ao dia 25 de janeiro de 2015, sem que lhe tenha sido efetuada qualquer comunicação.
A contratação do A., bem como as sucessivas renovações contratuais que tiveram, inculcam precisamente o contrário, ou seja, que tal posto de trabalho, não tem nenhuma caraterística de excecionalidade, destinando-se sim a satisfazer, manter e assegurar as necessidades da ré.
Significando que a aposição desta justificação do termo bem como o tempo de duração deste contrato de trabalho, se destinou a iludir as disposições que regulam o contrato sem termo, tendo como consequência legal que o referido contrato se deva considerar celebrado sem termo.
Mais alega que a ré apenas comunicou ao autor apenas com 13 dias de antecedência a caducidade do contrato de trabalho.
Alega ainda que auferia à data da cessação do contrato de trabalho, a quantia mensal ilíquida de € 673,00, e que no período compreendido entre 3 de maio a outubro de 2015, com um vencimento ilíquido de € 566,90 tendo auferido a quantia de apenas € 3.401,40.
Mais alega que a partir do dia 26 de janeiro de 2015 e até 30 de abril de 2015 beneficiou de subsídio de desemprego no valor de € 17,46/dia, num total de € 1.658,70.
O A. apenas frequentou 50horas de formação durante o ano de 2011, sendo que no restante período da vigência total do seu contrato de trabalho não lhe foram ministradas mais horas de formação, nem foi atribuído um crédito de horas correspondente à formação obrigatória.
O A. é casado e tem um filho menor que à data dos factos tinha apenas 2 anos de idade, sendo que o seu vencimento mensal constituía o principal sustento da família, pelo que se sentiu bastante angustiado pela sua situação profissional e por se ver privado do seu trabalho, o que lhe causou grande inquietação e tormento.
Tais factos determinaram que o A. se sinta igualmente muito ofendido na sua honra e brio profissional, com claros reflexos no bem-estar do seu agregado familiar.
Foi designada data para uma audiência de partes na qual não foi possível a conciliação das mesmas.
A ré foi regularmente citada para contestar e deduziu contestação alegando em síntese que o motivo justificativo da contratação a termo foi circunstanciado no contrato e encontra-se previsto na alínea a) do n.º 4 do artigo 140.º do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009 de 12 de fevereiro, virtude do lançamento pela ré de nova atividade de duração incerta, relacionada com a criação de atividades com suporte nas Brigadas de Intervenção.
Este motivo originário manteve-se durante todo o tempo decorrido por força das renovações ordinárias e extraordinárias do contrato de trabalho a termo, deixando de se encontrar limitado a duas renovações e o período máximo de dois anos em virtude das renovações extraordinárias, permitidas tanto por força da Lei n.º 3/2012 como da Lei n.º 7/2013, cujo objeto se circunscrevia aos contratos de trabalho a termo certo celebrados ao abrigo do Código do Trabalho e portanto a todos eles sem discriminação.
Mais alega que o não recebimento atempado, da comunicação da denúncia do contrato celebrado, pelo A. deveu-se exclusivamente a facto imputável a si próprio.
Alega ainda que o A. no ano de 2011 recebeu da ré 50horas de formação, mas no ano de 2013 também recebeu 4horas de formação e, no ano de 2014 recebeu mais 4,5horas de formação
Conclui pedindo a improcedência da ação por falta de fundamento e prova e, consequentemente, ser a ré absolvida dos pedidos formulados pelo autor.
O autor ofereceu resposta à contestação alegando em síntese que desconhece a existência da 5.ª e última renovação extraordinária porquanto nunca foi notificado da mesma, nem assinou qualquer aditamento ao contrato de trabalho.
O motivo justificativo invocado não configurava no caso concreto, "duração incerta" mas sim permanente e duradoura.
Conclui pedindo a improcedência das exceções invocadas, determinando-se a final a ilicitude do despedimento de que o A. foi vítima, reconhecendo-se que o A. se encontra vinculado à ré, mediante contrato de trabalho sem termo, desde a data do início da prestação de trabalho, ocorrida em 26.7.2010.
Foi proferido despacho saneador que considerou a instância válida e regular e relegou para a decisão final o conhecimento da invocada exceção de prescrição.
Procedeu-se a julgamento com observância das formalidades legais, como consta da respetiva ata e de seguida foi proferida sentença com a seguinte decisão:
Pelo exposto julgo a ação parcialmente procedente por provada e em consequência:
a) Declaro a ilicitude da cessação do contrato de trabalho, por caducidade, celebrado em 26 de julho de 2010 entre a ré CC, SA e o autor BB.
b) Condeno a ré CC, SA a reintegrar o autor BB, no mesmo posto, local de trabalho, categoria e antiguidade.
c) Mais condeno a ré a pagar ao autor a quantia de € 4.015,15 (quatro mil e quinze euros e quinze cêntimos) correspondente aos danos patrimoniais efetivamente sofridos pelo autor e € 750,00 (setecentos e cinquenta euros) correspondente aos danos não patrimoniais sofridos em consequência do despedimento ilícito no montante global de € 4.765,15 (quatro mil setecentos e sessenta e cinco euros e quinze cêntimos) acrescido de juros desde a citação à taxa legal até efetivo pagamento.
d) Vai a ré ainda condenada a pagar ao autor os danos patrimoniais por este sofridos que se vencerem desde a data da sentença até ao trânsito em julgado da mesma, descontando-se o subsídio de desemprego entretanto recebido ou quaisquer outras quantia que venha a receber por trabalho prestado e a liquidar em execução de sentença.
e) Custas por ambas as partes na proporção do decaimento.

2. Inconformada, veio a ré interpor recurso motivado com as conclusões que se seguem:
1. A prova da filiação só é admissível mediante apresentação de certidão de nascimento, que no caso não se encontra junta aos autos, não lhe bastando a prova testemunhal aludida sob os pontos 1 e 2 das alegações acima;
2. Os factos “nascimento” e “filiação” só podem ser provados por certidão de nascimento e não por testemunhas, conforme disposto nas normas conjugados dos artigos 1.º n.º 1, alíneas a) e b), 4.º e 211.º, todos do Código do Registo Civil e, ainda, do disposto no artigo 364.º n.º 1 do Código Civil.
3. Consequentemente, não pode ser dado como provado sob o número 16, dos Factos Provados, que o A. “… tem um filho menor de idade que em 2015 tinha dois anos de idade …”, pelo que este segmento deve ser considerado como não escrito.
4. Decidiu o tribunal a quo declarar nulo o termo certo aposto ao contrato de trabalho celebrado entre o A. e a R. e, consequentemente, declarar esse contrato sem termo vigorando por tempo indeterminado, condenando a R. no pagamento ao A. de uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais;
5. Nomeadamente, com os demais efeitos previstos no artigo 390.º do Código do Trabalho, nomeadamente, os da alínea b), do n.º 2, desse normativo (conforme se refere no 2.º parágrafo, de folhas 11, da sentença).
6. Tal segmento da sentença encerra um manifesto erro de julgamento, porquanto, as retribuições que o A. deixou de auferir desde 26.01.2015 (momento do despedimento do A.) até 18.12.2015 (30.º dia anterior ao da propositura desta ação judicial), na importância total de Eur. 7.571,85 apurada pelo tribunal, é quantia a deduzir nas retribuições que o A. houvesse de auferir até ao momento do trânsito em julgado, em virtude de a ação não haver sido interposta os 30 dias subsequentes ao despedimento, conforme dispõe o artigo 390.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), do Código do Trabalho.
7. Assim, essa importância de Eur. 7.571,85 é que deverá ser deduzida nas retribuições vencidas até à data do trânsito em julgado, conjuntamente com as importâncias auferidas pelo A. em virtude da cessação do contrato de trabalho (ou sejam, as auferidas em virtude da concessão de prestações de subsídio de desemprego, as auferidas em virtude de rendimentos do trabalho prestado pelo A. por conta de outrem e, ainda, a auferida em consequência do pagamento pela R. da importância correspondente à compensação por caducidade do contrato de trabalho a termo que vigorava entre A. e R.), conforme disposto nas alíneas do n.º 2 do artigo 390.º do Código do Trabalho, a liquidar em execução de sentença;
8. Por outro lado, perante a decisão de reintegração do A., não é desde logo curial entender-se que a os créditos de horas emergentes da formação em falta hajam cessado e se transmutado em créditos retributivos, conforme foram reclamados nos autos no contexto da causa do seu pedido, ou seja, a cessação da relação contratual (que não se verifica, pois, por força da sentença em recurso acaba de ser reconstituída).
9. Nenhum crédito de horas cessou, uma vez que as horas não asseguradas pela R. se transformam em crédito de horas para formação passados dois anos sobre o seu vencimento, como disposto no artigo 132.º n.º 1 do Código do Trabalho;
10. Face ao disposto naquele artigo 132.º e à decisão de sua reintegração, o A. não tem o direito a receber um montante equivalente à remuneração horária multiplicada pelo número de horas em falta, mas sim o direito a utilizar livremente essa quantidade de tempo em formação organizada por si, sem que a R. lhe possa descontar remuneração, conforme alegado sob os pontos 17, 18 e 20, das alegações acima.
11. Pelo que a R. ainda não pode ser declarada devedora dos montantes referido na sentença a título de formação não dada, desde logo, porque poderá o A. vir solicitar a formação ou a utilizar o crédito de horas correspondente, ou a própria R. ainda vir a proporcionar-lhe aquela formação.
12. Logo, também aqui a decisão do tribunal a quo é, manifestamente, errada e deve ser revogada, uma vez que não se aplica ao caso em recurso o artigo 134.º, do Código de Trabalho, uma vez que a relação contratual não cessou porque o tribunal a quo determinou a reintegração do A. na R..
13. Se perante a cessação do seu contrato o A. passou a andar triste e angustiado, o que poderá configurar dano de natureza não patrimonial, o certo é que de acordo com o n.º 1, do artigo 496.º referido, apenas são atendíveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, o que não acontece com os danos não patrimoniais em apreciação, por falta de elementos de facto que permitam ajuizar sobre o correspondente grau de gravidade, conforme alegado nos pontos 28 e 29 acima.
14. Ora, não tendo o A. provado que os danos não patrimoniais alegadamente sofridos merecem a tutela do direito, ónus que lhe cabia nos termo previsto no n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil, não se verifica um dos pressupostos legais que permitiriam a fixação da indemnização a esse título, devendo ser revogada a decisão que os declarou e fixou sua indemnização na quantia de Eur. 750,00.
15. Nestes termos e nos demais de Direito aplicável, sem prescindir do mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência: 1) ser revogada a decisão proferida pelo tribunal a quo na parte em que condenou a R. no pagamento ao A. da quantia indemnizatória de Eur. 4.015,15 relativa a danos patrimoniais e, consequentemente, se digne modificar essa decisão em consonância com o disposto no artigo 390.º n.ºs 1 e 2 do Código do Trabalho; 2) ser revogada a decisão que condenou a R. no pagamento ao A. da quantia indemnizatória de Eur. 750,00 e, por fim, 3) ser modificada a parte da decisão de facto contida no seu número 16, por falta de prova, eliminando-se o segmento que dela carece.

3. O A. não apresentou resposta.

4. O Ministério Público junto desta relação deu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento, pelas razões apontadas na decisão recorrida, a qual deve ser confirmada.
As partes foram notificadas do parecer referido no ponto anterior e apresentaram resposta onde a apelante remete para os argumentos já aduzidos com as alegações de recurso e o autor adere ao mesmo.

5.Colhidos os vistos, em conferência, cumpre decidir.

6. Objeto do recurso

O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das alegações formuladas, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso.
As questões a decidir são as seguintes:
1. Reapreciação do ponto 16 da matéria de facto dada como provada.
2. Danos patrimoniais e danos não patrimoniais.

II - FUNDAMENTAÇÃO
O tribunal recorrido considerou provada a seguinte a matéria de facto, que se transcreve:
1 – O autor foi admitido ao serviço da ré em 26 de julho de 2010 para sob as ordens, direção e por conta da CC, S.A., exercer as funções no âmbito da conservação da rede rodoviária mediante contrato de trabalho a termo certo celebrado pelo período de 12 meses.
2 – Este contrato foi renovado em 26 de julho de 2011 pelo período de 6 meses até 25 de janeiro de 2012.
3 – O âmbito do contrato foi alargado ao distrito de Évora e abrangendo a Brigada de Intervenção a operar nos distritos de Beja e Évora.
4 – Em 26 de janeiro de 2012 foi o contrato renovado pelo período de 6 meses.
5 – O motivo justificativo da aposição do termo foi “… em virtude do lançamento pela 1.ª contraente de nova atividade de duração incerta, relacionada com a criação de atividades com suporte nas brigadas de intervenção …”.
6 – Este contrato foi renovado em 26 de julho de 2012 pelo prazo de 6 meses, tendo em 26 de janeiro de 2013 sido renovado pelo prazo de 12 meses.
7 – Esta renovação pelo prazo de 12 meses foi celebrada por aditamento ao contrato e assinada pelo autor.
8 – Em 26 de janeiro de 2014 foi renovado uma última vez pelo prazo de 12 meses.
9 – O motivo justificativo da celebração do contrato manteve-se em todas as renovações do contrato.
10 – Por carta registada com A/R datada de 9 de janeiro de 2015 e recebida pelo autor em 15.1.2015 a ré comunicou-lhe a caducidade do contrato no dia 25 de janeiro de 2015.
11 – O autor auferia à data da cessação do contrato a quantia mensal ilíquida de € 673,00.
12 – O autor no período compreendido entre 3 de maio e outubro de 2015 trabalhou nos CTT Correios de Portugal auferindo um vencimento mensal ilíquido de € 566,90.
13 – De 26 de janeiro e até 30 de abril de 2015 o autor beneficiou de subsídio de desemprego no valor € 17,46/dia num total de € 1.658,70.
14 – Após cessar em 30 de outubro de 2015 a sua relação laboral com os CTT o autor passou a beneficiar de subsídio de desemprego no valor mensal de € 523,80.
15 – O autor frequentou 50 horas de formação no ano de 2011, 4 horas de formação no ano de 2013 e 4,5horas no ano de 2014.
16 – O autor é casado e tem um filho menor de idade que em 2015 tinha dois anos de idade e a sua mulher auferia o ordenado mínimo nacional.
17 – O autor após a cessação do contrato passou a andar triste, angustiado tinha a expetativa de continuar por já lá estar há 5 anos.
18 – As brigadas de intervenção mantém-se e manter-se-ão.

B) APRECIAÇÃO

As questões a decidir são as seguintes:
1. Reapreciação do ponto 16 da matéria de facto dada como provada.
2. Danos patrimoniais e danos não patrimoniais.

B1) Reapreciação do ponto 16 da matéria de facto dada como provada
A apelante pretende que se altere a matéria de facto dada como provada no ponto 16 dos factos provados da sentença, por em seu entender a filiação e a idade só poderem ser provadas através da certidão emitida pelo registo civil.
Na presente ação não está em causa o estado nem a filiação de pessoas. A alegação do autor de que tem um filho de dois anos de idade a seu cargo não visa comprovar a filiação para efeitos da sua constituição, modificação ou extinção, mas apenas como elemento para provar a sua situação familiar para contextualizar as circunstâncias em que ocorreu a cessação da relação laboral com a empregadora.
Neste contexto, a prova da existência de um filho e a sua menoridade não carecem de ser provados por documento autêntico ou autenticado emitido pelo registo civil competente. A prova testemunhal pode incidir sobre estes factos para a sua demonstração circunstancial.
Nesta conformidade, improcede a apelação na parte em que pede a alteração da matéria de facto dada como provada no ponto 16 dos factos provados da sentença.

B2) Danos patrimoniais e não patrimoniais
O art.º 390.º do CT prescreve que sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento (n.º 1).
Às retribuições referidas no número anterior deduzem-se: a) As importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento;
b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da ação, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento;
c) O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º 1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.
A sentença não explicita de forma clara como apurou o montante de € 4 015,15 correspondente aos danos patrimoniais efetivamente sofridos pelo autor.
O despedimento ocorreu em 25 de janeiro de 2015 (data da comunicação da cessação do contrato de trabalho a termo por caducidade).
A ação deu entrada em juízo em 18.01.2016 (fls. 32).
Assim, as retribuições só são devidas desde 20.12.2015 (inclusive), ou seja, desde os 30 dias anteriores à data da propositura da ação.
O autor está a receber subsídio de desemprego e trabalhou para os CTT durante algum tempo.
Os rendimentos auferidos por via do trabalho prestado a outras entidades e pela via do subsídio de desemprego têm que ser deduzidos ao montante a que o autor tem direito desde os 30 dias anteriores à data da propositura da ação.
A ré, nas alegações de recurso, alega que deve ser também deduzida a quantia correspondente à compensação por caducidade do contrato de trabalho a termo que vigorava entre A. e R..
Todavia, a ré não alega na contestação que pagou tal quantia. Trata-se de uma obrigação que decorre da lei e que deve ser cumprida quando o contrato a termo cessa por iniciativa da empregadora. Se fosse uma quantia que nascesse após a cessação do contrato, aplicar-se-ia sem mais o art.º 390.º n.º 2, alínea a). Mas como é uma obrigação imposta à empregadora que deve ser cumprida no momento em que o contrato de trabalho a termo cessa por sua iniciativa, cabe-lhe a alegação e prova de que pagou a compensação, o que não se verifica no caso concreto, pelo que esta quantia não pode ser deduzida àquelas a que o autor tem direito.
A apelante conclui que uma vez que o trabalhador é reintegrado, não tem direito ao pagamento do crédito de horas.
A apelante tem razão. Só no caso de cessação do contrato de trabalho é que o trabalhador tem direito a receber a retribuição correspondente ao número de horas de formação que não lhe tenha sido proporcionado, ou ao crédito de horas para formação de que seja titular à data da cessação (art.º 134.º do CT).
No caso dos autos, o autor é reintegrado no seu posto de trabalho, pelo que se aplica o disposto no art.º 132.º CT para a sua efetivação, sem conversão em dinheiro.
A apelante conclui que não é devida ao autor a compensação pelos danos não patrimoniais, por não serem neste caso merecedores de tutela jurídica.
Sobres esta questão provou-se que o autor após a cessação do contrato passou a andar triste, angustiado tinha a expetativa de continuar por já lá estar há 5 anos.
A expetativa do autor em continuar ao serviço da ré, dado tempo em que aí prestou a sua atividade, justifica-se. Não é uma expetativa infundada. Embora o contrato de trabalho fosse a termo certo, a verdade é que se apurou que não existia fundamento para a aposição do termo.
A tristeza e angústia sofridas pelo trabalhador são aquelas que qualquer trabalhador colocado na sua situação sentiria. São factos subjetivos, de índole emocional, mas objetiváveis quando referidos ao sentir comum de outro trabalhador colocado na sua posição.
A comunicação da caducidade do contrato de trabalho promovida pela empregadora constitui um ato contrário ao Direito, que causou tristeza e angústia objetivável e não meramente devida a eventual sensibilidade do autor, pelo que merece a tutela do direito, nos termos dos art.ºs 494.º e 496.º n.ºs 1 e 4 do CC.
Ponderadas as circunstâncias do caso concreto, entendemos que a quantia de € 750 fixada pelo tribunal de primeira instância se mostra adequada e proporcional à compensação do dano não patrimonial sofrido pelo autor, pelo que se mantém.
Nesta conformidade, procede em parte a apelação e alteram-se as alíneas c) e d) da parte decisória da sentença, nos seguintes termos:
“c) Condena-se a ré a pagar ao autor as retribuições que se vencerem desde 20.12.2015 (inclusive) até ao trânsito em julgado da decisão final, descontando-se o subsídio de desemprego entretanto recebido ou quaisquer outras quantias que tenha recebido ou venha a receber por trabalho prestado, a liquidar em execução de sentença, acrescidos dos juros de mora à taxa legal vencidos desde a data em que cada prestação deveria ter sido posta à sua disposição até pagamento.
d) Condena-se a ré a pagar ao autor a quantia de € 750 (setecentos e cinquenta euros), acrescida dos juros de mora à taxa legal desde a data da sentença de primeira instância até pagamento.
Sumário: i) quando não está em causa a filiação ou a idade das pessoas, estes factos não carecem de ser provados por documento autêntico ou autenticado, podendo sê-lo através de qualquer outro meio de prova.
ii) em caso de condenação da empregadora a reintegrar o trabalhador despedido, este não tem direito ao pagamento do equivalente pecuniário correspondente às horas de formação em falta.
iii) merecem a tutela do direito e devem ser compensados os danos não patrimoniais decorrentes do despedimento do trabalhador e sofridos por este.

III - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência:
1. Alteram as alíneas c) e d) da parte decisória da sentença nos seguintes termos:
c) Condena-se a ré a pagar ao autor as retribuições que se vencerem desde 20.12.2015 (inclusive) até ao trânsito em julgado da decisão final, descontando-se o subsídio de desemprego entretanto recebido ou quaisquer outras quantias que tenha recebido ou venha a receber, por trabalho prestado, a liquidar em execução de sentença, acrescidos dos juros de mora à taxa legal vencidos desde a data em que cada prestação deveria ter sido posta à sua disposição até pagamento.
d) Condena-se a ré a pagar ao autor a quantia de € 750 (setecentos e cinquenta euros), acrescida dos juros de mora à taxa legal desde a data da sentença de primeira instância até pagamento.
2. Confirmam quanto ao mais a sentença recorrida.
Custas pela apelante e apelado em partes iguais, sem prejuízo do apoio judiciário de que este beneficia.
Notifique.
(Acórdão elaborado e integralmente revisto pelo relator).

Évora, 02 de fevereiro de 2017.
Moisés Silva (relator)
João Luís Nunes
Alexandre Ferreira Baptista Coelho