Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1847/14.6TBPTM-C.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO
PLANO DE RECUPERAÇÃO
Data do Acordão: 03/08/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: A extinção da execução é a única solução possível para este caso, sob pena de o processo especial de revitalização se transformar num conjunto de actos inúteis, pois o prosseguimento da fase executiva poderia conduzir virtualmente à inviabilização do plano homologado pelo Tribunal, mesmo nos casos em que o bem penhorado não se mostre afecto a essa massa revitalizada.
Decisão Texto Integral: Processo nº 1847/14.6TBPTM-C.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo Central de Execução de Silves – J1
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
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I – Relatório:
Na presente execução para pagamento de quantia certa proposta por “Banco (…), SA – Sociedade Aberta” contra “RT (…), SGPS, SA” (anteriormente designada “… SGPS, SA”), (…), (…), “(…) – Hotelaria e Turismo, SA” e (…), o exequente veio interpor recurso do despacho datado de 23/05/2017. *
Nesse despacho foi declarada extinta a instância executiva por aprovação do plano de recuperação quanto à executada “(…) – Hotelaria e Turismo, SA” e ordenado o levantamento da penhora sobre a fracção autónoma designada pelas letras AP do prédio constituído em propriedade horizontal sito no Sítio do (…) – Amoreira lote (…), freguesia de Alvor e concelho de Portimão, cuja aquisição está registada a favor da “(…) – Hotelaria e Turismo, SA”, pela Ap. (…) de 2011/05/23.
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Inconformada com tal decisão, a sociedade recorrente apresentou recurso de apelação e formulou as seguintes conclusões:
1) O despacho recorrido de 24/05/2017 declarou extinta a instância “por aprovação do plano de recuperação quanto à executada (…) – Hotelaria e Turismo SA, nos termos do artigo 17º-E, n.º 1, parte final, do CIRE” e que, consequentemente, ordenou o “cancelamento da penhora sobre a fracção autónoma designada pelas letras AP do prédio constituído em propriedade horizontal sito em Sítio do (…) – Amoreira, Lote (…), freguesia de Alvor e concelho de Portimão, cuja aquisição está registada a favor da (…) – Hotelaria e Turismo SA pela Ap. (…) de 2011/05/23. Certo é que o Exequente foi notificado da publicitação da homologação do plano de recuperação e permaneceu silente em relação a estes autos”.
2) A presente acção executiva foi interposta contra a sociedade (…) – Hotelaria e Turismo, SA (adiante designada por …), nos termos do disposto no artigo 54.º, n.º 2, do CPC, ou seja, apenas pelo facto de o imóvel supra descrito, penhorado nos presentes autos e propriedade de tal sociedade, garantir o pagamento de uma dívida da sociedade RT (…), SGPS, S.A. (também executada), correspondente à dívida exequenda.
3) A dívida exequenda não é, nem nunca foi da responsabilidade da (…), sendo que, consequentemente, o objectivo e finalidade da presente acção executiva não é, nem nunca foi cobrar qualquer dívida à sociedade (…) mas sim cobrar uma dívida da responsabilidade dos demais executados dívida essa garantida por um bem da sociedade (…).
4) O artigo 17.º, n.º 1, do CIRE determina a extinção das acções executivas para cobrança de dívidas contra o devedor, ou outras com idêntica finalidade, logo que seja aprovado e homologado o plano de recuperação, ou seja, apenas se extinguem as acções destinadas à cobrança de dívidas da revitalizada e não outras acções que não tenham essa finalidade.
5) A presente acção está claramente excluída do âmbito do que foi consagrado pelo legislador naquele normativo legal, uma vez que a mesma não visa a cobrança de qualquer dívida da sociedade (…), mas tão só e apenas a cobrança de uma dívida dos demais executados, cujo pagamento está garantido por um imóvel da (…).
6) Como tal, o aqui exequente não reclamou a dívida peticionada nos presentes autos no âmbito do Processo Especial de Revitalização daquela sociedade, nem o seu pagamento foi por qualquer forma previsto pela sociedade (…) no âmbito do plano aprovado e homologado naquele processo, que não poderia prever o pagamento de uma dívida, relativamente ao qual a Devedora não era responsável pelo seu pagamento.
7) O plano de recuperação apresentado pela sociedade (…), que foi aprovado e homologado no âmbito do Processo Especial de Revitalização que correu termos quanto à mesma, não só não prevê o pagamento do crédito do Recorrente, aqui executado, por não ser uma dívida da sociedade (…), como também nem sequer é mencionado no plano a existência do imóvel penhorado nos presentes autos ou qualquer destino a dar ao mesmo, uma vez que a sociedade (…), no plano de recuperação que apresentou, não considerou que o imóvel penhorado nos presentes autos era essencial ou sequer necessário para a sua revitalização.
8) A não se entender desta forma, estaria encontrado um mecanismo para os devedores salvarem o seu património, no caso de o mesmo responder por uma dívida de terceiro.
9) Ou seja, o credor, que tem o seu crédito garantido por uma entidade terceira e diversa da entidade mutuária, não vê o seu crédito reconhecido no processo de revitalização dessa entidade terceira garante, uma vez que tal terceira não é devedor do crédito em causa, não estando, por esse facto, obrigada a pagar qualquer montante ao credor e, por outro lado, o credor vê-se coarctado de recuperar o seu crédito através da execução do património da devedora/terceira garante, porque foi aprovado e homologado um plano de revitalização quanto a esta.
10) Com este mecanismo o credor ficaria impossibilitado de recuperar o seu crédito por via da execução do património da revitalizada, mesmo quando tal património não seja considerado pela mesma como essencial à manutenção da sua actividade e da sua revitalização.
11) Não foi esse certamente o espírito do legislador quando previu no artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE a extinção das acções para cobranças de dívidas da revitalizada.
12) O plano de recuperação da sociedade (…), que foi aprovado e homologado por sentença proferida em 15/11/2016 apenas transitou em julgado em 29/05/2017, após confirmação pelo Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão notificado às partes em 08/05/2017, pelo que não poderia ter o aqui Recorrente vindo aos presentes autos peticionar o que quer que seja antes daquela data de 29/05/2017.
13) O despacho recorrido violou, no mínimo, o disposto nos artigos 17.º-E, n.º 1, do CIRE e 54.º, n.º 2, do Código Processo Civil.
14) Deve, desta forma, ser o mencionado despacho recorrido revogado.
Nestes termos e nos mais de direito, que V. Exas., Senhores Desembargadores, doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se, em consequência, o despacho recorrido, substituindo-se o mesmo por Acórdão deste Tribunal que determine o prosseguimento da presente acção executiva contra a sociedade executada (…) – Hotelaria e Turismo, S.A. e a manutenção da penhora sobre a fracção autónoma designada pelas letras AP do prédio constituído em propriedade horizontal sito em Sítio do (…) – Amoreira, Lote (…), freguesia de Alvor e concelho de Portimão.
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Foram apresentadas contra-alegações, nas quais a recorrida pugna pela improcedência do recurso. *
II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigo 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do NCPC), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do NCPC).
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação dos efeitos que a aprovação e a homologação do plano de recuperação têm no andamento de uma acção executiva.
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III – Dos factos apurados:
Dos elementos constantes dos autos e da análise do histórico do processo, com interesse para a decisão da apelação, deve ser considerada a seguinte factualidade:
1 – O “Banco (…), SA – Sociedade Aberta” (actualmente designado por “… Banco, SA”) propôs acção executiva para pagamento de quantia certa contra “RT (…), SGPS, SA” (anteriormente designada “… SGPS, SA”), (…), (…), “(…) – Hotelaria e Turismo, SA” e (…), solicitando no âmbito dos presentes autos o reembolso da quantia de € 1.441.969,04 (um milhão, quatrocentos e quarenta e um mil, novecentos e sessenta e nove euros e quatro cêntimos), acrescida de juros vincendos calculados sobre o montante da livrança em dívida.
2 – A “(…) – Hotelaria e Turismo, SA” constituiu a favor do “Banco (…), SA – Sociedade Aberta” hipoteca voluntária sobre a fracção autónoma designada pelas letras AP do prédio constituído em propriedade horizontal sito no Sítio do (…) – Amoreira, lote (…), freguesia de Alvor e concelho de Portimão, cuja aquisição está registada a favor daquela pela Ap. (…) de 2011/05/23. O imóvel está inscrito na respectiva matriz sob o artigo (…) e a hipoteca destinou-se a garantir as obrigações emergentes do Contrato de Financiamento “FEC (…)/11” celebrado entre o Banco e a “(…) – SGPS, SA” e o montante máximo assegurado é de € 1.575.500,00 (um milhão e quinhentos e setenta e cinco mil e quinhentos euros).
3 – Nos termos do contrato de financiamento acima identificado foi accionada a cláusula de vencimento antecipado das obrigações assumida pelos outorgantes junto do “Banco (…), SA – Sociedade Aberta” com fundamento no incumprimento de obrigação pecuniária (incluindo cessação ou suspensão de pagamento), por tal obrigação se encontrar vencida, reclamada e não ter sido regularizada.
4 – Foi preenchida a livrança de caução prevista no contrato de financiamento, a qual foi subscrita por “(…), SGPS, SA” e avalizada por (…) e (…).
5 – Em 14/03/2016, foi lavrado auto de penhora relativamente à fracção autónoma designada pelas letras AP do prédio constituído em propriedade horizontal sito no Sítio do (…) – Amoreira, lote (…), freguesia de Alvor e concelho de Portimão, cuja aquisição está registada a favor da “(…) – Hotelaria e Turismo, SA”, pela Ap. (…) de 2011/05/23.
6 – Por sentença datada de 13/11/2016, proferida no âmbito do processo registado sob o nº …/16.2T8LSB, que corre termos no Juízo Central de Comércio de Lisboa (J5), foi homologado o plano de revitalização apresentado por “(…) – Hotelaria e Turismo, SA”. Por acórdão prolatado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 04/05/2017, foi julgado improcedente o recurso interposto, confirmando-se a referida sentença.
7 – No âmbito do processo especial de revitalização, o “(…) Banco, SA” reclamou a quantia de € 178.692,74 (cento e setenta e oito mil e seiscentos e noventa e dois euros e setenta e quatro cêntimos), com base noutro título.
8 – Naqueles autos não foi reclamado o crédito que resultou da hipoteca destinada a garantir as obrigações emergentes do contrato de financiamento “FEC …/11” celebrado entre o Banco e a (…), SGPS,SA.
9 – Não foi requerida a continuação da instância no processo de revitalização, nos termos e para os efeitos previstos na parte final do número 1 do artigo 17º-E do CIRE.
10 – Por despacho datado de 23/05/2017 foi declarada extinta a instância executiva por aprovação do plano de recuperação quanto à executada “(…) – Hotelaria e Turismo, SA” e ordenado o levantamento da penhora sobre a fracção autónoma designada pelas letras AP do prédio constituído em propriedade horizontal sito no Sítio do (…) – Amoreira, lote (…), freguesia de Alvor e concelho de Portimão, cuja aquisição está registada a favor da “(…) – Hotelaria e Turismo, SA”, pela Ap. (…) de 2011/05/23.
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IV – Fundamentação:
O processo especial de revitalização é um processo autónomo e pré-insolvencial que está regulado nos artigos 17º-A a 17º-I do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Esta medida tem a sua origem na revisão do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa introduzida pela Lei nº 16/2012, de 20 de Abril, em cumprimento do acordado no “Portugal Memorandum of Understanding on Specific Economic Policy Conditions” celebrado entre a República Portuguesa e a União Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional.
Este mecanismo destina-se a permitir à empresa que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja susceptível de recuperação, estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização, tal como se extraí da simples leitura do nº 1 do artigo 17º-A do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Este processo traduz-se num instrumento processual, sobretudo de cariz negocial, que foi instituído pelo legislador com o objectivo específico de contribuir para a recuperação de uma empresa que seja ainda passível de viabilização económico-financeira. Daquela definição legal supra transcrita resulta que o processo especial de revitalização prossegue o objectivo imediato de negociação entre o devedor e os seus credores e tem como desiderato final a conclusão do acordo de revitalização.
A instituição deste processo especial representa uma verdadeira mudança de paradigma do regime da insolvência com vista à prossecução do interesse público, ligado ao funcionamento da economia e à satisfação dos interesses colectivos dos credores, de evitar a liquidação de patrimónios e o desaparecimento de agentes económicos.
Nos termos do artigo 17º-E do CIRE, a aprovação e a homologação do plano de recuperação no âmbito do Processo Especial de Revitalização obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação.
O plano apresentado no processo especial de revitalização nº (…)/16.2T8LSB foi aprovado e por decisão judicial foi homologado. E, com base nesse pressuposto, o Juízo Central de Execução de Silves declarou extinta a instância quanto à executada “(...) – Hotelaria e Turismo, SA”, ao abrigo do disposto na parte final do nº 1 do artigo 17º-E[1] do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
É progressivamente maioritário o entendimento que a expressão «acções para cobrança de dívidas» abrange não apenas as acções executivas para pagamento de quantia certa, mas contempla igualmente as causas declarativas em que se pretenda obter a condenação do devedor no pagamento de um crédito que se pretende ver reconhecido[2] [3].
Madalena Perestrelo de Oliveira advoga que o objectivo deste processo é facultar ao devedor o espaço necessário para levar a cabo a recuperação, com a consequente proibição da prossecução de outras acções, até das próprias acções executivas, como forma de protecção do devedor que fica com a faculdade de tentar a recuperação da empresa, liberto de outras tentativas de os credores se fazerem pagar e da pressão do mercado que os levou até aquela situação económica depauperada e de insolvibilidade[4] [5].
No mesmo sentido apontam Catarina Serra[6] e João Aveiro Pereira[7]. E na jurisprudência nacional a tendência caminha no sentido de integrar as acções declarativas para cumprimento de obrigações pecuniárias no raio de aplicação da sobredita norma[8] [9].
Por tudo isto, a nosso ver, por força dos objectivos primários atrás enunciados, em coligação com a filosofia legal presente na introdução da medida especial de recuperação, a expressão acções para cobranças de dívidas engloba qualquer acção judicial – declarativa ou executiva – destinada a exigir o cumprimento de um direito de crédito resultante da actividade económica do devedor e que seja susceptível de afectar o seu património.
Feito este intróito sobre a noção, os objectivos, as finalidades e a aplicabilidade do processo especial de revitalização importa saber se os efeitos processuais previstos no nº 1 do artigo 17º-E abrangem as acções executivas propostas ao abrigo do disposto no artigo 54º do Código de Processo Civil.
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Pergunta-se então se é a qualidade de executado ou a natureza da dívida que deve prevalecer na fixação do alcance normativo da proibição inscrita no artigo 17º-E do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas?
A resposta a esta questão judicanda encerra assim uma dupla interpretação do quadro normativo aplicável. Primeiro, importa decifrar se o terceiro demandado em acção executiva cujos bens ficam onerados integra o conceito legal de devedor. Depois, numa segunda fase, a ser afirmativa a resposta, cuida-se de apurar se, em sede deste processo especial, o referido crédito tem de ser obrigatoriamente reclamado ou, se não o fazendo, sobeja a possibilidade de a revitalizada instaurar – ou fazer prosseguir – a acção executiva.
A presente acção executiva foi interposta contra a sociedade “(…) – Hotelaria e Turismo, SA”, nos termos do disposto no artigo 54º, nº 2[10] do Código de Processo Civil. Nos termos da lei de processo a execução por dívida provida de garantia real sobre bens de terceiro segue directamente contra este se o exequente pretender fazer valer a garantia, sem prejuízo de poder desde logo ser também demandado o devedor.
Na acepção de Maria Isabel Helbing Menéres Campos a hipoteca genérica é uma garantia voluntária em que se convenciona que o devedor a constitui para todas e quaisquer dívidas que tenha assumido ou venha a assumir com o credor, independentemente da sua causa ou natureza, caracterizando-se, assim, «por garantir uma dívida que não está determinada ab initio sendo apenas determinado o montante máximo que assegura»[11].
Constituída e registada a hipoteca, esta garantia confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, pertencentes ao devedor ou a terceiro, com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo.
O credor hipotecário tem assim o direito de ser pago pelo produto dos bens hipotecados, com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo (artigo 686º, nº 1, do Código Civil), pelo que a acção executiva, sob pena de ilegitimidade, tem de ser proposta necessariamente contra o proprietário do bem (artigo 735º, nº 2, e 818º do Código Civil), como resulta do artigo 54º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Civil.
O artigo 54º do Código de Processo Civil contém um desvio à regra geral da determinação da legitimidade na acção executiva. Na análise desta norma Lopes do Rego considera que o artigo «concedeu legitimidade passiva para a execução, tanto ao proprietário dos bens onerados com a garantia, como ao respectivo possuidor, naturalmente nos casos em que o devedor pretende efectivar a garantia real (sem actuar contra o devedor), sem, todavia, se impor o litisconsórcio necessário, quer entre os referidos proprietário ou possuidor, quer relativamente ao próprio devedor; considerou-se, para tal, que cumpria ao exequente avaliar, em termos concretos e pragmáticos, quais as vantagens e inconvenientes que emergem de efectivar o seu direito no confronto de todos aqueles interessados passivos, ou de apenas algum ou alguns deles»[12].
Permite este normativo que o exequente que queira fazer valer a garantia real, quando os bens dados em garantia pertençam a terceiro, possa optar entre propor desde logo a execução contra terceiro e o devedor, numa óbvia situação de litisconsórcio voluntário, ou ser mais expectante intentando a execução apenas contra terceiro, para, posteriormente se os bens se revelarem insuficientes, chamar o devedor para alcançar a completa satisfação do crédito exequendo[13].
Porém, o dispositivo em causa não esgota a sua amplitude na questão da legitimidade. Efectivamente, como sublinha Lebre de Freitas, o executado garante «trata-se de terceiro perante a relação obrigacional, mas não de terceiro perante a execução, pois esta terá sempre de ser contra ele movida, sob pena de os seus bens não poderem ser penhorados»[14]. Ou, na formulação apresentada por Miguel Mesquita trata-se de «terceiro-parte»[15].
Assim, em caso de incumprimento da obrigação garantida por hipoteca, o meio de o credor hipotecário tornar efectivo o seu direito em relação aos bens hipotecados é a execução. E, por isso, perante esta possibilidade de responder por dívida de terceiro, em caso de vencimento da obrigação e de não regularização da prestação em dívida por parte dos devedores originários, por se tratar de um «terceiro-parte», o proprietário do bem hipotecado assume a obrigação de pagar, avocando uma posição equivalente à do devedor primário logo que se inicia a acção executiva.
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A sociedade recorrente entende que a revitalizada apenas foi demandada pela circunstância de o imóvel penhorado nos presentes autos garantir o pagamento de uma dívida da sociedade “RT (…), SGPS, SA” correspondente à dívida exequenda. Em função desta premissa, em sede de recurso, entende que o plano aprovado e judicialmente homologado no processo que corre termos no Juízo Central de Comércio de Lisboa não poderia prever o pagamento dessa dívida. Neste enquadramento, a recorrente conclui que a sociedade “(…) – Hotelaria e Turismo, SA” não era responsável pelo seu pagamento.
A recorrente adianta que o objectivo e a finalidade da presente acção executiva não é nem nunca foi cobrar qualquer dívida à sociedade Enfis, mas sim cobrar uma dívida da responsabilidade dos demais executados. Todavia, numa análise simplista, se assim fosse, a decisão de declarar extinta a execução não traria qualquer prejuízo relevante à sociedade bancária recorrente. E não é disso que se trata.
Em contraponto, a recorrida dá o seu beneplácito à solução encontrada pelo Tribunal «a quo», porquanto, na sua leitura, os créditos que resultam de dívidas garantidas pelo património de terceiros constituem créditos subordinados ou condicionados, a que deve ser aplicado o regime estabelecido no artigo 50º[16] do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
O conceito de credores da insolvência e a enunciação das classes de créditos sobre a insolvência estão provisionados no artigo 47º[17] do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Da interacção entre as alíneas a) e b) do número 4º do artigo 47º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas resulta que estamos perante um crédito que beneficia de garantia real e que deve ser equiparado a uma dívida da sociedade revitalizada, pois o património desta responde directamente pelo pagamento da dívida em caso de incumprimento contratual, quando a prestação se encontre vencida, reclamada e não haja sido regularizada. E é incontroverso que isso sucede na presente hipótese, pois a existência do processo executivo é anterior ao da instauração do procedimento de revitalização.
Assim, se estiverem verificadas as condições de accionamento de garantias reais, o beneficiário de uma hipoteca prestada pela empresa revitalizada a favor de terceiro deve ser classificado como credor e o proprietário do prédio hipotecado assume a posição de devedor, devendo assim o primeiro ser chamado para efeitos de negociação do plano especial de revitalização nos termos do nº 1 do artigo 17º-D do CIRE.
Com efeito, declarada a insolvência, todos os titulares de créditos de natureza patrimonial sobre o insolvente, ou garantidos por bens integrantes da massa insolvente, cujo fundamento seja anterior à data dessa declaração, são considerados credores da insolvência, qualquer que seja a sua nacionalidade e domicílio. E esta asserção é mutatis mutandis aplicável aos processos de revitalização com as necessárias adaptações.
A natureza e fins do processo de revitalização pretendem trazer ao processo todos os credores e respectivos direitos[18]. Da letra da lei resulta que qualquer credor pode reclamar o seu crédito, sendo indiferente que o mesmo seja classificado como comum, garantido, privilegiado ou subordinado[19].
Numa leitura integrada entre as normas especificamente estabelecidas para o processo especial de revitalização e as suas ligações com as regras estatuídas para os casos similares previstas no âmbito da insolvência – mormente nos artigos 88º e 217º – impõem a conclusão que o direito perante o devedor garantido pode ser exercido nos mesmos termos em que o credor da insolvência o possa exercer contra qualquer responsável pelo pagamento fora do contexto do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas[20] [21].
E tal apenas não ocorreria se o plano de recuperação tivesse previsto que a acção continuasse os seus termos. Além do mais, na situação sub judice não se pode afirmar a falta de conhecimento por parte do exequente, uma vez que em sede de revitalização a ora recorrente reclamou o pagamento de outro crédito existente sobre a sociedade revitalizada.
David Sequeira Dinis e Constança Borges Soeiro[22] sublinham que devem ser afectados pelo PER e pelo plano de recuperação todos os créditos constituídos até ao termo do prazo para reclamar créditos, pois essa é a data relevante para efeitos de delimitação do universo de potenciais participantes e votantes no PER[23].
Na realidade, os efeitos processuais e substantivos decorrentes do recurso aos Tribunais para cobrança de uma dívida munida de garantia real sobre bens de terceiros assumem significado axiológico-normativo idêntico ao da interposição de acção executiva para pagamento de quantia certa por dívida da responsabilidade pessoal e as consequências práticas dessa execução ao nível dos reflexos directos de potencial afectação do património do insolvente são absolutamente similares àquelas que resultam de outra qualquer outra providência promovida pelo credor que se destine à realização coactiva de uma obrigação que lhe é devida.
Nesta óptica não existe assim qualquer distinção finalisticamente relevante entre a cobrança de uma dívida de natureza eminentemente pessoal da revitalizada e a realização coactiva junto de terceiro de um crédito vencido que goza de garantia real sobre o património de sociedade beneficiária do processo de revitalização.
E não se invoque o argumento de que, a ser assim, o credor ficaria impossibilitado de recuperar o seu crédito por via da execução do património da sociedade revitalizada. Com efeito, mesmo nos casos em que está vedada a instauração ou o prosseguimento de acções idóneas a afectar o património de uma sociedade revitalizada, a legislação do direito da insolvência viabiliza, em relação aos credores, a garantia do acesso ao direito e à tutela jurisdicional, através dos mecanismos de impugnação e reclamação de créditos previstos nos nºs 2 e 3 do artigo 17º-D do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
E, por isso, ao ser aceite a possibilidade de reclamar o pagamento de créditos subordinados ou condicionais no âmbito do processo especial de revitalização, a manutenção de uma atitude de inércia na acção especial de revitalização que é imputável ao aqui credor obsta ao prosseguimento de uma acção executiva. Aliás, tratando-se de uma acção de natureza executiva, deve aqui prevalecer o aforismo interpretativo ubi lex non distinguit, nec nos distinguere debemus.
Pode assim concluir-se que as acções executivas propostas ao abrigo do disposto no artigo 54º, nº 2, do Código de Processo Civil estão abrangidas pela esfera de protecção da limitação inscrita no nº 1 do artigo 17º-E do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
A extinção da execução é a única solução possível para este caso, sob pena de o processo especial de revitalização se transformar num conjunto de actos inúteis, pois o prosseguimento da fase executiva poderia conduzir virtualmente à inviabilização do plano homologado pelo Tribunal, mesmo nos casos em que o bem penhorado não se mostre afecto à essa massa revitalizada[24]. São os princípios estruturantes de protecção do devedor e de defesa do interesse público subjacentes à defesa da economia que inspiraram a introdução da medida no espaço jurídico interno que assim o exigem.
E, neste horizonte interpretativo, a decisão que declarou extinta a instância por aprovação do plano de recuperação da executada “(…) – Hotelaria e Turismo, SA” e a consequente determinação de cancelamento da penhora mostram-se correctas à luz do actual quadro legislativo português.
A questão da tempestividade não tem autonomia relevante neste contexto, uma vez que o Tribunal «a quo» está autorizado a actuar oficiosamente num caso como o vertente sem necessidade de impulso processual de qualquer parte.
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V – Sumário:
1. A natureza e fins do processo de revitalização pretendem trazer ao processo todos os credores e respectivos direitos. Se estiverem verificadas as condições de accionamento de garantias reais, o beneficiário de uma hipoteca prestada pela empresa revitalizada a favor de terceiro deve ser classificado como credor e o proprietário do prédio hipotecado assume a posição de devedor.
2. Mesmo nos casos em que está vedada a instauração ou o prosseguimento de acções idóneas a afectar o património de uma sociedade revitalizada, a legislação do direito da insolvência viabiliza, em relação aos credores, a garantia do acesso ao direito e à tutela jurisdicional, através dos mecanismos da impugnação e reclamação de créditos previstos nos nºs 2 e 3 do artigo 17º-D do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
3. Os efeitos processuais e substantivos decorrentes do recurso aos Tribunais para cobrança de uma dívida munida de garantia real sobre bens de terceiros assumem significado axiológico-normativo idêntico ao da interposição de acção executiva para pagamento de quantia certa por dívida da responsabilidade pessoal e as consequências práticas dessa execução ao nível dos reflexos directos de potencial afectação do património do insolvente são absolutamente similares àquelas que resultam de outra qualquer outra providência promovida pelo credor que se destine à realização coactiva de uma obrigação que lhe é devida.
4. As acções executivas propostas ao abrigo do disposto no artigo 54º, nº 2, do Código de Processo Civil, estão abrangidas pela esfera de protecção da limitação inscrita no nº 1 do artigo 17º-E do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar improcedente o recurso interposto, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da apelante nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 527º do Código de Processo Civil.
Notifique.
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(acto processado e revisto pelo signatário nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 138º, nº 5, do Código de Processo Civil).
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Évora, 08/03/2018

José Manuel Galo Tomé de Carvalho

Mário Branco Coelho

Isabel Matos Peixoto Imaginário
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[1] Artigo 17.º-E (Efeitos)
1 - A decisão a que se refere o n.º 4 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra a empresa e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto à empresa, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação.
2 - Caso o juiz nomeie administrador judicial provisório nos termos do n.º 4 do artigo 17.º-C, a empresa fica impedida de praticar actos de especial relevo, tal como definidos no artigo 161.º, sem que previamente obtenha autorização para a realização da operação pretendida por parte do administrador judicial provisório.
3 - A autorização a que se refere o número anterior deve ser requerida por escrito pela empresa ao administrador judicial provisório e concedida pela mesma forma.
4 - Entre a comunicação da empresa ao administrador judicial provisório e a recepção da resposta ao peticionado previstas no número anterior não podem mediar mais de cinco dias, devendo, sempre que possível, recorrer-se a comunicações electrónicas.
5 - A falta de resposta do administrador judicial provisório ao pedido formulado pela empresa corresponde a declaração de recusa de autorização para a realização do negócio pretendido.
6 - Os processos de insolvência em que anteriormente haja sido requerida a insolvência da empresa suspendem-se na data de publicação no portal Citius do despacho a que se refere o n.º 4 do artigo 17.º-C, desde que não tenha sido proferida sentença declaratória da insolvência, extinguindo-se logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação.
7 - A decisão a que se refere o n.º 4 do artigo 17.º-C determina a suspensão de todos os prazos de prescrição e de caducidade oponíveis pela empresa, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações e até à prolação dos despachos de homologação, de não homologação, caso não seja aprovado plano de recuperação até ao apuramento do resultado da votação ou até ao encerramento das negociações nos termos previstos nos nºs 1 e 5 do artigo 17.º-G.
8 - A partir da decisão a que se refere o número anterior e durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, não pode ser suspensa a prestação dos seguintes serviços públicos essenciais:
a) Serviço de fornecimento de água;
b) Serviço de fornecimento de energia eléctrica;
c) Serviço de fornecimento de gás natural e gases de petróleo liquefeitos canalizados;
d) Serviço de comunicações electrónicas;
e) Serviços postais;
f) Serviço de recolha e tratamento de águas residuais;
g) Serviços de gestão de resíduos sólidos urbanos.
9 - O preço dos serviços públicos essenciais prestados durante o período referido no número anterior que não sejam objecto de pagamento pela empresa será considerado dívida da massa insolvente em insolvência da mesma que venha a ser decretada nos dois anos posteriores ao termo do prazo de negociações, sem prejuízo do disposto no artigo 10.º da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, alterada e republicada pela Lei n.º 12/2008, de 26 de Fevereiro, e alterada pelas Leis nºs 24/2008, de 2 de Junho, 6/2011, de 10 de Março, 44/2011, de 22 de Junho, e 10/2013, de 28 de Janeiro.
[2] De acordo com a jurisprudência uniformizada (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2014, publicada no DR nº 39, Série I, de 25/02/2014) «transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a acção declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. 287.º do C.P.C».
[3] Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa Anotado, 3ª edição, Lisboa, 2015, pág. 160, assinalam que «... diferentemente do que ocorre em sede de processo de insolvência, a paralisação aqui determinada deve abranger todas as acções para cobrança de dívidas e não apenas as executivas, incluindo-se, assim, as acções declarativas condenatórias. Mas comunga com ele o facto de se abrangerem também acções com processo especial e procedimentos cautelares».
[4] O Processo Especial de Revitalização: o novo CIRE”, RDS III, 2012, 707-726.
[5] Limites da autonomia dos credores na recuperação da empresa insolvente, Almedina, Coimbra, 2013.
[6] Revitalização – a designação e o misterioso objecto designado. O processo Homónimo (PER) e as suas ligações com a insolvência (situação e processo) e com o SIREVE, Almedina, Coimbra, 2013, pág. 99.
[7] A revitalização económica dos devedores, in “O Direito”, ano 145, 2013-I/II, Almedina, Coimbra, pág. 37.
[8] Neste particular, é impressiva a solução adiantada por um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21/12/2012, in www.dgsi.pt.quando afirma que «destinando-se este processo a concluir um acordo do devedor com os credores, de modo a possibilitar a recuperação económica do primeiro, esta finalidade ficaria seriamente comprometida se qualquer credor pudesse continuar a exigir judicialmente os seus créditos. Com efeito, não será prudente olvidar a intenção declarada do legislador, ao instituir o processo especial de revitalização, de permitir ao devedor, com o acordo total ou maioritário dos credores, a sua recuperação da situação económica difícil, caracterizada pela dificuldade séria em cumprir pontualmente as suas obrigações. Por outro lado, tal acordo, depois de homologado judicialmente, vincula todos os credores, mesmo que não hajam participado nas negociações com o devedor (artigo 17.º-F, n.º 6, do CIRE). Ora, se qualquer acção contra o devedor não fosse suspensa, estar-se-ia privilegiar, sem razão justificativa, um credor, sendo certo que o objectivo do legislador consistiu em proporcionar condições para a recuperação económica da empresa, com um tratamento igualitário dos credores. Se a pretensão da recuperação económica do devedor, encontrado numa situação económica difícil ou de insolvência meramente iminente, é iniciativa daquele, já a viabilização da recuperação cabe aos credores, sendo certo que, pelas relações económicas estabelecidas com o devedor, estão em condições privilegiadas para o fazerem e, por essa via, poderem salvaguardar, porventura de forma mais eficaz, a solvabilidade dos seus créditos, para além de outras vantagens sociais relevantes»
[9] Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 27/02/2014 e de 23/06/2017, do Tribunal da Relação de Évora de 16/01/2014, do Tribunal da Relação de Lisboa de 27/11/2013 e 18/06/2014, do Tribunal da Relação do Porto de 30/09/2013 e 18/12/2013 e do Supremo Tribunal de justiça de 05/01/2016 e 17/03/2016, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[10] Artigo 54º (a que correspondia o artigo 56.º do CPC de 1961) (Desvios à regra geral da determinação da legitimidade)
1 - Tendo havido sucessão no direito ou na obrigação, deve a execução correr entre os sucessores das pessoas que no título figuram como credor ou devedor da obrigação exequenda; no próprio requerimento para a execução o exequente deduz os factos constitutivos da sucessão.
2 - A execução por dívida provida de garantia real sobre bens de terceiro segue directamente contra este se o exequente pretender fazer valer a garantia, sem prejuízo de poder desde logo ser também demandado o devedor.
3 - Quando a execução tenha sido movida apenas contra o terceiro e se reconheça a insuficiência dos bens onerados com a garantia real, pode o exequente requerer, no mesmo processo, o prosseguimento da acção executiva contra o devedor, que é demandado para completa satisfação do crédito exequendo.
4 - Pertencendo os bens onerados ao devedor, mas estando eles na posse de terceiro, pode este ser desde logo demandado juntamente com o devedor.
[11] Da Hipoteca Caracterização, Constituição e Efeitos, Almedina, Reimpressão, págs. 103-108.
[12] Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, em notas ao artigo 56º, a que corresponde actualmente o artigo 54º da Lei nº 54/2013, de 26/06.
[13] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/01/2015, in www.dgsi.pt.
[14] A Acção Executiva, À luz do Código de Processo Civil de 2013, Coimbra Editora, 6ª edição, pág. 235, nota 13.
[15] Miguel Mesquita, Apreensão de Bens em Processo Executivo e Oposição de Terceiro, 2ª ed., págs. 39-40.
[16] Artigo 50º (Créditos sob condição):
1 - Para efeitos deste Código consideram-se créditos sob condição suspensiva e resolutiva, respectivamente, aqueles cuja constituição ou subsistência se encontrem sujeitos à verificação ou à não verificação de um acontecimento futuro e incerto, por força da lei, de decisão judicial ou de negócio jurídico.
2 - São havidos, designadamente, como créditos sob condição suspensiva:
a) Os resultantes da recusa de execução ou denúncia antecipada, por parte do administrador da insolvência, de contratos bilaterais em curso à data da declaração da insolvência, ou da resolução de actos em benefício da massa insolvente, enquanto não se verificar essa denúncia, recusa ou resolução;
b) Os créditos que não possam ser exercidos contra o insolvente sem prévia excussão do património de outrem, enquanto não se verificar tal excussão;
c) Os créditos sobre a insolvência pelos quais o insolvente não responda pessoalmente, enquanto a dívida não for exigível.
[17] Artigo 47.º (Conceito de credores da insolvência e classes de créditos sobre a insolvência):
1 - Declarada a insolvência, todos os titulares de créditos de natureza patrimonial sobre o insolvente, ou garantidos por bens integrantes da massa insolvente, cujo fundamento seja anterior à data dessa declaração, são considerados credores da insolvência, qualquer que seja a sua nacionalidade e domicílio.
2 - Os créditos referidos no número anterior, bem como os que lhes sejam equiparados, e as dívidas que lhes correspondem, são neste Código denominados, respectivamente, créditos sobre a insolvência e dívidas da insolvência.
3 - São equiparados aos titulares de créditos sobre a insolvência à data da declaração da insolvência aqueles que mostrem tê-los adquirido no decorrer do processo.
4 - Para efeitos deste Código, os créditos sobre a insolvência são:
a) ‘Garantidos’ e ‘privilegiados’ os créditos que beneficiem, respectivamente, de garantias reais, incluindo os privilégios creditórios especiais, e de privilégios creditórios gerais sobre bens integrantes da massa insolvente, até ao montante correspondente ao valor dos bens objecto das garantias ou dos privilégios gerais, tendo em conta as eventuais onerações prevalecentes;
b) ‘Subordinados’ os créditos enumerados no artigo seguinte, excepto quando beneficiem de privilégios creditórios, gerais ou especiais, ou de hipotecas legais, que não se extingam por efeito da declaração de insolvência;
c) ‘Comuns’ os demais créditos.
[18] Luís Martins, Recuperação de Pessoas Singulares, vol I-2013, pág. 38.
[19] Neste sentido, consultar Maria do Rosário Epifânio, O Processo Especial de Revitalização, Almedina, Coimbra, 2016, pág. 44.
[20] Maria do Rosário Epifânio, O Processo Especial de Revitalização, Almedina, Coimbra, 2016, pág. 83.
[21] Carvalho Fernandes, João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação da e Empresas Anotado, 3ª edição, Quid Juris Editora, Lisboa, 2015, págs. 792-794.
[22] Créditos Pré e Pós Per, in Revista do Direito da insolvência, nº 1, 2017, Almedina, págs. 70-76.
[23] No plano jurisprudencial esta posição pode ser percepcionada nos Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 28/09/2016, do Tribunal da Relação do Porto de 05/01/2015 e 29/02/2016.
[24] Aliás, esta preocupação é partilhada por Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código da insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª edição, Quid Juris Editora, Lisboa, 2015, pág. 161, que, ao proporem a interpretação extensiva da solução contida no artigo 17º-E, defendem que «a continuação fragmentada de tais acções, ao contrário do que é desejável, pode convocar posteriores entropias do processo».