Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
402/10.4GCBNV-A.E1
Relator: MARTINHO CARDOSO
Descritores: NULIDADES DO INQUÉRITO
Data do Acordão: 02/07/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário:
I – Constituem nulidades do inquérito, dependentes de arguição, a omissão de constituição de pessoa determinada como arguido, bem como a falta do respectivo interrogatório nessa qualidade.
Decisão Texto Integral:
I
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

Nos presentes autos de recurso independente em separado do Processo Comum com intervenção de tribunal singular acima identificados, do J3 da Secção Criminal da Instância Central da Comarca de Santarém, em que são arguidos A., B. e “A… – Imobiliários, Ld.ª”, decidiu a Senhora Juíza, ao abrigo do art.º 311.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, indeferir a arguição de nulidades processuais cometidas no inquérito invocadas pela arguida "A…- Imobiliária, Lda." e receber a acusação, designando dia para julgamento.
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Inconformada com o assim decidido, a arguida "A… - Imobiliária, Lda." interpôs o presente recurso, apresentando as seguintes conclusões:

A. No douto despacho objecto do presente Recurso:

a. Foi violada e / ou errada e inadequadamente interpretada e aplicada a previsão do artigo 119.º, alíneas c) e d) do Código de Processo Penal;

b. Foi violada e / ou errada e inadequadamente interpretada e aplicada a previsão do artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do Código de Processo Penal;

c. Foram violadas e / ou errada e inadequadamente interpretadas e aplicadas as disposições dos artigos 118.º, n.º 2 e 123.º, ambos do Código de Processo Penal;

d. Foi violada e / ou errada e inadequadamente interpretada e aplicada a previsão do artigo 122.º, n.º 1 do Código de Processo Penal;

e. Foi violada e / ou errada e inadequadamente interpretada e aplicada a previsão do artigo 120.º, n.º 3, alínea c) do Código de Processo Penal;

f. Foi violada e / ou errada e inadequadamente interpretada e aplicada a previsão do artigo 105.º, n.º 1 do Código de Processo Penal;

g. Foi violada e / ou errada e inadequadamente interpretada e aplicada a previsão do artigo 139.º, n.º 5, alínea c) e n.º 6 do Código de Processo Civil aplicável ex vi do artigo 107.º, n.º 5 do Código de Processo Penal;

h. Foram violadas as garantias de defesa dos arguidos, consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da República;

i. Foi violado o direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República; e

j. Foi violado o princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República.

B. A omissão de constituição da Recorrente como arguida e da sua inquirição nessa qualidade, em sede de inquérito, assim como a omissão de notificação àquela e à sua Ilustre Advogada constituída nos autos, dos despachos de arquivamento e de acusação, deveram-se unicamente a vários erros e culpa grosseira e indesculpável, exclusivamente imputáveis ao titular do inquérito.

C. Para a concretização da constituição da Recorrente como arguida e para a sua inquirição nessa qualidade existiam, nos autos, todos os elementos necessários, a saber: Certidão Comercial Permanente da Recorrente com registo actualizado da sede social da mesma, identificação e residência do seu legal representante e identificação e domicílio profissional da Ilustre Advogada por ela constituída no Processo.

D. A omissão de constituição da Recorrente como arguida determinou a ausência do arguido (e) do seu defensor (a actos) em que a lei exige a respectiva comparência e consubstancia efectiva falta de inquérito, na medida em que contra aquela foi deduzida uma acusação, sem que lhe fosse antes permitido intervir no Processo como arguida, se pronunciar sobre e contribuir constitutivamente para co-determinar o objecto do inquérito e se defender, exercendo os direitos que a lei, nomeadamente no artigo 61.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, lhe reconhece.

E. A omissão de constituição da Recorrente como arguida e da sua inquirição nessa qualidade são impeditivas do exercício do contraditório e do direito de defesa à mesma reconhecidos legal e constitucionalmente e ocasionaram evidente prejuízo para a realização integral da justiça, dando causa às nulidades insanáveis previstas nas alíneas c) e d) do artigo 119.º do Código de Processo Penal.

F. Ao decidir no sentido que consta do douto despacho impugnado, entendendo que as nulidades de omissão de consituição da Recorrente como arguida e de interrogatório nessa qualidade deviam ser consideradas sanáveis, incorreu o Tribunal de 1ª Instância em erro de julgamento por violação e / ou errada e inadequada interpretação e omissão de aplicação do disposto no artigo 119.º, alíneas c) e d) do Código de Processo Penal e ainda por violação e / ou errada e inadequada interpretação e aplicação do disposto no artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do mesmo Código;

G. Tendo ainda incorrido em violação do direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República, em violação do princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República e em violação das garantias de defesa dos arguidos, consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da República, o que resulta da impossibilidade da Recorrente, totalmente inimputável a esta e provocada por erro grosseiro e indesculpável do Ministério Público, de ter intervindo na fase de inquérito, de ter estado presente em todos os actos processuais que directamente lhe disseram respeito, de ter oferecido provas e requerido as diligências que se lhe afigurassem necessárias, de ter exercido eficazmente o seu direito de defesa e de ter contribuído para a descoberta da verdade.

Sem prescindir;

H. A constituição como arguido constitui acto legalmente obrigatório a praticar na fase de inquérito, sob pena de nulidade por insuficiência de tal fase processual.

I. A omissão de constituição como arguida da Recorrente sempre configuraria, pelo menos, a nulidade sanável prevista no artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do Código de Processo Penal.

J. O interrogatório do arguido, nessa qualidade, constitui acto legalmente obrigatório a praticar na fase de inquérito, sob pena de nulidade por insuficiência de tal fase processual.

K. A falta de interrogatório da Recorrente na qualidade de arguida, em sede de inquérito, sendo possível (como manifestamente era) a sua notificação, também constituiria sempre, pelo menos, a nulidade sanável prevista no artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Penal.

L. A nulidade de omissão de notificação à Ilustre Advogada constituída nos autos, pela Recorrente, do despacho de arquivamento é subsumível na previsão do artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do Código de Processo Penal.

M. A nulidade de omissão de notificação à Recorrente do despacho de arquivamento é subsumível na previsão do artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do Código de Processo Penal.

N. O despacho acusatório se reveste de tal importância para o arguido que o mesmo deve ser notificado ao seu Defensor e também ao próprio arguido.

O. A nulidade de omissão de notificação à Ilustre Advogada constituída nos autos, pela Recorrente, do despacho de acusação é subsumível na previsão do artigo 119.º, alíneas c) e d) do Código de Processo Penal, isto porque tal omissão teve como consequência uma flagrante violação do direito de defesa da Recorrente consagrado no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da República, decorrente da violação do direito da Recorrente, de escolher a sua Mandatária judicial, legalmente consagrado no artigo 61.º, n.º 1, alínea e) da lei penal adjectiva.

P. A nulidade de omissão de notificação à Recorrente do despacho de acusação - nas circunstâncias concretas em que tal omissão se verificou, portanto, devido à flagrante, grosseira e indesculpável preterição, pelo titular do inquérito, de actos legalmente obrigatórios, para cuja prática regular existiam nos autos e ao seu dispor todos os elementos necessários e sem que pudesse (ou possa) ser assacada à Recorrente qualquer responsabilidade na dita omissão de notificação - constitui nulidade insanável, subsumível na previsão do artigo 119.º, alíneas c) e d) do Código de Processo Penal, já que a omissão em causa impediu o exercício, pela Recorrente, do direito de defesa, o mais elementar e essencial dos direitos dos arguidos, com consagração constitucional e legal.

Q. Constituindo o contraditório um direito inviolável, é inadmissível que a sua violação ostensiva, através da omissão de notificação da acusação ao arguido, constitua uma nulidade sanável ou uma simples irregularidade processual.

R. A omissão de notificação da acusação ao arguido, sendo possível tal notificação, dizendo respeito à própria substância dos direitos constitucionais, constituindo uma omissão de fundo constitucional, revela-se uma violação da lei processual muito mais grave que aquelas às quais se reportam as nulidades insanáveis expressamente previstas na lei processual penal.

S. As nulidades previstas na lei são simples vícios processuais. Para além delas, existem inúmeras situações em que os actos ou omissões processuais podem ser nulos, e assim acontece, em especial, quando são afectados direitos e garantias constitucionalmente consagrados.

T. Integrando a ausência do defensor a nulidade insanável prevista no artigo 119.º, n.º 1, alínea c), a ausência do próprio arguido, afinal, aquele em nome de quem os direitos são proclamados, também tem que integrar este tipo de nulidade.

U. Constituindo a ausência dos assistentes ou das partes civis, por falta de notificação, uma nulidade relativa, e atendendo à maior gravidade da ausência dos arguidos, face à necessidade de maior protecção de direitos, tem todo o sentido que a sua ausência por razões que se lhe não possam imputar, seja cominada com nulidade mais severa.

V. Se a ausência do Ministério Público é qualificada como nulidade insanável, o mesmo tem que se reconhecer para a ausência dos arguidos.

W. Por maioria de razão, a não notificação da acusação ao arguido, quando possível, e sobretudo quando tal falta lhe não é imputável, tem que ser entendida como ferida de nulidade insanável.

X. O Tribunal de 1ª Instância ao considerar como mera irregularidade a falta de notificação à Recorrente dos despachos de arquivamento e de acusação, incorreu o em erro de julgamento, por violação e / ou errada e inadequada interpretação e omissão de aplicação do disposto no artigo 119.º, alíneas c) e d) do Código de Processo Penal, por violação e / ou errada e inadequada interpretação e omissão de aplicação do disposto no artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do Código de Processo Penal e ainda por violação e / ou errada e inadequada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 118.º, n.º 2 e 123.º, ambos do Código de Processo Penal;

Y. Tendo ainda incorrido em violação do direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República, em violação do princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República e em violação das garantias de defesa dos arguidos, consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da República, o que resulta da impossibilidade da Recorrente, totalmente inimputável a esta, de ter exercido o seu direito de defesa, o mais crucial e elementar direito que lhe é reconhecido legal e constitucionalmente.

Z. O despacho impugnado padece de nulidade, por omissão de pronúncia, relativamente ao pedido formulado pela Recorrente no sentido da declaração da nulidade decorrente da omissão de notificação, à Ilustre Advogada por aquela constituída nos autos, dos despachos de arquivamento e de acusação.

AA. A omissão de constituição da Recorrente como arguida e de interrogatório nessa qualidade, assim como a omissão de notificação, àquela e à sua Ilustre Mandatária constituída nos autos, do despacho de acusação, têm como efeito a invalidade de todos os actos de inquérito produzidos depois da primeira tentativa de notificação da Recorrente para efeitos da sua constituição como arguida e de interrogatório.

BB. A partir da primeira tentativa de notificação da Recorrente para efeitos da sua constituição como arguida e de interrogatório, entende-se que o Ministério Público considerou que existiam os pressupostos necessários para a Recorrente adquirir o referido estatuto processual e passar a gozar dos direitos aludidos no artigo 61.º, n.º 1 da lei penal adjectiva, mormente, os consagrados nas alíneas a) e g) do n.º 1 do citado normativo legal.

CC. Todos os actos praticados a partir da primeira tentativa de notificação da Recorrente foram-no em violação do direito de defesa daquela.

DD. O douto despacho objecto do presente recurso - através do qual o Tribunal de 1ª Instância não julgou inválidos os actos de inquérito posteriores à primeira tentativa de notificação da Recorrente, frustrada devido a erro grosseiro e indesculpável do Ministério Público, que impediu que aquela fosse constituída como arguida e interrogada nessa qualidade antes do encerramento do inquérito - enferma de erro de julgamento, por violação e / ou errada e inadequada interpretação do disposto no artigo 122.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, tendo ainda incorrido tal Tribunal em violação das garantias de defesa dos arguidos, consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da República.

EE. A omissão de constituição da Recorrente como arguida e de interrogatório nessa qualidade, assim como a omissão de notificação, àquela e à sua Ilustre Mandatária constituída nos autos, do despacho de acusação, consituindo nulidades insanáveis podiam (e podem) ser arguidas, pelos sujeitos processuais interessados, a todo tempo e podem e devem ser oficiosamente declaradas, pela autoridade competente, em qualquer fase do procedimento.

Sem prescindir;

FF. Não tendo sido a Recorrente notificada dos despachos de arquivamento e de acusação, não seria lógico, nem razoável, que a invocação, pela mesma, das nulidades de insuficiência do inquérito tivesse lugar no prazo de cinco dias ao qual alude o artigo 120.º, n.º 3, alínea c) do Código de Processo Penal.

GG. Deverá resultar aplicavél ao caso sub iudice, a regra geral de arguição das nulidades sanáveis ou seja, a arguição no prazo de 10 dias, nos termos previstos no artigo 105.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, prazo que deveria começar a contar da efectiva notificação da Recorrente para qualquer termo posterior do Processo ou da intervenção da mesma em acto nele praticado.

HH. Admitindo que todas as nulidades arguidas pela Recorrente, no seu Requerimento de 19 de Fevereiro de 2015, fossem sanáveis e considerando que aquela tomou conhecimento da acusação contra ela deduzida, em 09 de Fevereiro de 2015, tendo, na mesma data, constituído Mandatário judicial, deveria ter arguido as ditas nulidades no prazo de dez dias a contar do referido 09 de Fevereiro de 2015, portanto até ao 19 de Fevereiro de 2015.

II. O entendimento defendido pelo Tribunal a quo em sentido divergente ao constante da alínea precedente, revela-se violador das disposições dos artigos 105.º, n.º 1 e 120.º, n.º 3, alínea d), ambos do Código de Processo Penal e ainda violador do direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República, do princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República e ainda das garantias de defesa dos arguidos, consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da República.

Ainda sem prescindir;

JJ. A admitir-se que a Recorrente deveria ter arguido as nulidades em causa no prazo de cinco dias a contar do 09 de Fevereiro de 2015, deverá entender-se que o fez no terceiro dia útil a contar do termo do prazo de cinco dias (correspondente o dito terceiro dia útil ao 19 de Fevereiro de 2015), pelo que tal acto devia ter sido considerado como praticado no terceiro dia útil posterior ao termo do prazo legalmente previsto para o efeito, impendendo sobre a Secretaria do Tribunal, e por inerência, sobre o próprio Tribunal, a obrigação de notificar à Recorrente, na pessoa do seu Mandatário, para pagar a multa à qual alude a alínea c) do artigo 139.º, n.º 5 do Código de Processo Civil acrescida da penalização de 25 % do valor da multa, aplicável in casu ex vi do artigo 107.º, n.º 5 do Código de Processo Penal.

KK. Ao omitir a notificação aludida na alínea precedente, incorreu o Tribunal de 1ª Instância, em violação, por omissão de aplicação, do disposto no artigo 139.º, n.º 5, alínea c) e n.º 6 do Código de Processo Civil aplicável ex vi do artigo 107.º, n.º 5 do Código de Processo Penal e ainda em violação do direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República, em violação do princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República e em violação das garantias de defesa dos arguidos, consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da República.

LL. São inconstitucionais, por violação do direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República, do princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República e ainda das garantias de defesa dos arguidos consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Lei Fundamental, os artigos 119.º, alíneas c) e d) e 120.º, n.º 2, alínea d), ambos do Código de Processo Penal, quando interpretados no sentido de deverem ser consideradas como nulidades sanáveis a omissão de constituição como arguida e o interrogatório nessa qualidade de pessoa colectiva determinada contra a qual exista a suspeita de prática de crime, cuja notificação apenas tenha sido tentada em morada não correspondente à da sua sede social, sem ter sido realizada qualquer diligência para concretização da aludida notificação na sede social da suspeita, ou na residência do seu legal representante ou na pessoa da Ilustre Advogada por ela constituída nos autos.

MM. São inconstitucionais, por violação do direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República, do princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República e ainda das garantias de defesa dos arguidos consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Lei Fundamental, os artigos 118.º, n.º 2, 123.º, 119.º, alíneas c) e d) e 120.º, n.º 2, alínea d), todos do Código de Processo Penal, quando interpretados no sentido de dever ser considerada como mera irregularidade a falta de notificação ao arguido dos despachos de arquivamento e de acusação.

NN. São inconstitucionais, por violação do direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República, do princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República e ainda das garantias de defesa dos arguidos consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Lei Fundamental, os artigos 118.º, n.º 2, 119.º, alíneas c) e d), 120.º, n.º 2, alínea d) e 123.º, todos do Código de Processo Penal, quando interpretados no sentido de dever ser considerada como mera irregularidade a falta de notificação a Advogado constituído nos autos, pelo arguido, dos despachos de arquivamento e de acusação.

OO. É inconstitucional, por violação das garantias de defesa dos arguidos consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Lei Fundamental, o artigo 61.º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de permitir a nomeção oficiosa de Defensor a arguido com Advogado constituído no Processo e de considerar válida e equiparável à notificação de arguido a notificação da acusação ao Defensor oficioso, com preterição da obrigatória notificação de tal peça processual ao Advogado constituído.

PP. É inconstitucional, por violação das garantias de defesa dos arguidos consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Lei Fundamental, o artigo 122.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de não considerar inválidos os actos de inquérito posteriores à primeira tentativa de notificação do arguido, frustrada devido a erro grosseiro e indesculpável do Ministério Público, que impediu que tal arguido fosse constituído como tal e interrogado nessa qualidade antes do encerramento do inquérito.

QQ. É inconstitucional, por violação do direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República, do princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República e ainda das garantias de defesa dos arguidos consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Lei Fundamental, o artigo 119.º, alíneas c) e d) do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de impedir que as nulidades de omissão de constituição como arguida e o interrogatório nessa qualidade de pessoa colectiva determinada contra a qual exista a suspeita de prática de crime, cuja notificação apenas tenha sido tentada em morada não correspondente à da sua sede social, sem ter sido realizada qualquer diligência para concretização da aludida notificação na sede social da suspeita, ou na residência do seu legal representante ou na pessoa da Ilustre Advogada por ela constituída nos autos, assim como as nulidades de omissão de notificação do despacho de acusação à dita sociedade e à Ilustre Advogada por ela constituída nos autos possam ser arguidas a todo tempo, qualquer que seja a fase na qual se encontre o procedimento.

RR. É inconstitucional, por violação do direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República, do princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República e ainda das garantias de defesa dos arguidos consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Lei Fundamental, o artigo 120.º, n.º 3, alínea d) do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de cominar a arguido não notificado do despacho de acusação, a arguir as nulidades de insuficiência do inquérito no prazo de cinco dias a contar da notificação do dito despacho a Defensor oficioso nomeado.

SS. É inconstitucional, por violação do direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República, do princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República e ainda das garantias de defesa dos arguidos consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Lei Fundamental, o artigo 105.º, n.º 1, do Código de Processo Penal quando interpretado no sentido de não permitir que o arguido não notificado do despacho de acusação, possa arguir as nulidades de insuficiência do inquérito no prazo de 10 dias a contar da efectiva notificação daquele para qualquer termo posterior do processo ou da intervenção do mesmo em acto nele praticado.

TT. É inconstitucional, por violação do direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República, do princípio do devido processo legal, reconhecido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República e ainda das garantias de defesa dos arguidos consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Lei Fundamental, o artigo 139.º, n.º 5, alínea c) e n.º 6 do Código de Processo Civil aplicável ex vi do artigo 107.º, n.º 5 do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de não permitir que, sendo arguidas nulidades, pelo arguido, no terceiro dia útil posterior ao termo do prazo legalmente previsto para o efeito, o Tribunal julgue intempestivo o acto praticado, em lugar de ordenar a notificação daquele para pagar a multa à qual alude a alínea c) do citado artigo 139.º, n.º 5, acrescida da penalização de 25 % do valor da multa.

TERMOS EM QUE SE PEDE A VOSSAS EXCELÊNCIAS:

1. A REVOGAÇÃO DO DOUTO DESPACHO OBJECTO DO PRESENTE RECURSO, COM AS DEVIDAS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, MORMENTE, COM A DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE TODOS OS ACTOS DE INQUÉRITO PRATICADOS NO PROCESSO, DEPOIS DA PRIMEIRA TENTATIVA DE NOTIFICAÇÃO DA RECORRENTE PARA SER CONSTITUÍDA ARGUIDA E INTERROGADA NESSA QUALIDADE E DE TODOS OS ACTOS PRATICADOS DEPOIS DO ENCERRAMENTO DO INQUÉRITO QUE FIQUEM PREJUDICADOS PELA REQUERIDA DECLARAÇÃO DE NULIDADE.

2. SEJA ORDENADA A CONSTITUIÇÃO COMO ARGUIDA DA RECORRENTE E O SEU INTERROGATÓRIO NESSA QUALIDADE, SEGUINDO-SE OS ULTERIORES TRÂMITES DO PROCESSO A PARTIR DESSE MOMENTO PROCESSUAL.

EM TODO CASO,

3. SEJA DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE - POR VIOLAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO AO DIREITO CONSAGRADO NO ARTIGO 20.º, N.º 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, RECONHECIDO NO ARTIGO 6.º DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM E NO ARTIGO 20.º, N.º 4 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AINDA DAS GARANTIAS DE DEFESA DOS ARGUIDOS CONSAGRADAS NO ARTIGO 32.º, N.º 1 DA LEI FUNDAMENTAL - DOS ARTIGOS 119.º, ALÍNEAS C) E D) E 120.º, N.º 2, ALÍNEA D), AMBOS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, QUANDO INTERPRETADOS NO SENTIDO DE DEVEREM SER CONSIDERADAS COMO NULIDADES SANÁVEIS A OMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO COMO ARGUIDA E O INTERROGATÓRIO NESSA QUALIDADE DE PESSOA COLECTIVA DETERMINADA CONTRA A QUAL EXISTA A SUSPEITA DE PRÁTICA DE CRIME, CUJA NOTIFICAÇÃO APENAS TENHA SIDO TENTADA EM MORADA NÃO CORRESPONDENTE À DA SUA SEDE SOCIAL, SEM TER SIDO REALIZADA QUALQUER DILIGÊNCIA PARA CONCRETIZAÇÃO DA ALUDIDA NOTIFICAÇÃO NA SEDE SOCIAL DA SUSPEITA, OU NA RESIDÊNCIA DO SEU LEGAL REPRESENTANTE OU NA PESSOA DA ILUSTRE ADVOGADA POR ELA CONSTITUÍDA NOS AUTOS.

4. SEJA DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE - POR VIOLAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO AO DIREITO CONSAGRADO NO ARTIGO 20.º, N.º 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, RECONHECIDO NO ARTIGO 6.º DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM E NO ARTIGO 20.º, N.º 4 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AINDA DAS GARANTIAS DE DEFESA DOS ARGUIDOS CONSAGRADAS NO ARTIGO 32.º, N.º 1 DA LEI FUNDAMENTAL, DOS ARTIGOS 118.º, N.º 2, 123.º, 119.º, ALÍNEAS C) E D) E 120.º, N.º 2, ALÍNEA D), TODOS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, QUANDO INTERPRETADOS NO SENTIDO DE DEVER SER CONSIDERADA COMO MERA IRREGULARIDADE A FALTA DE NOTIFICAÇÃO AO ARGUIDO DOS DESPACHOS DE ARQUIVAMENTO E DE ACUSAÇÃO.

5. SEJA DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE - POR VIOLAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO AO DIREITO CONSAGRADO NO ARTIGO 20.º, N.º 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, RECONHECIDO NO ARTIGO 6.º DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM E NO ARTIGO 20.º, N.º 4 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AINDA DAS GARANTIAS DE DEFESA DOS ARGUIDOS CONSAGRADAS NO ARTIGO 32.º, N.º 1 DA LEI FUNDAMENTAL, DOS ARTIGOS 118.º, N.º 2, 119.º, ALÍNEAS C) E D), 120.º, N.º 2, ALÍNEA D) E 123.º, TODOS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, QUANDO INTERPRETADOS NO SENTIDO DE DEVER SER CONSIDERADA COMO MERA IRREGULARIDADE A FALTA DE NOTIFICAÇÃO A ADVOGADO CONSTITUÍDO NOS AUTOS PELO ARGUIDO DOS DESPACHOS DE ARQUIVAMENTO E DE ACUSAÇÃO.

6. SEJA DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE - POR VIOLAÇÃO DAS GARANTIAS DE DEFESA DOS ARGUIDOS CONSAGRADAS NO ARTIGO 32.º, N.º 1 DA LEI FUNDAMENTAL, DO ARTIGO 61.º, N.º 1, ALÍNEA E) DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, QUANDO INTERPRETADO NO SENTIDO DE PERMITIR A NOMEÇÃO OFICIOSA DE DEFENSOR A ARGUIDO COM ADVOGADO CONSTITUÍDO NO PROCESSO E DE CONSIDERAR VÁLIDA E EQUIPARÁVEL À NOTIFICAÇÃO DE ARGUIDO A NOTIFICAÇÃO DA ACUSAÇÃO AO DEFENSOR OFICIOSO, COM PRETERIÇÃO DA OBRIGATÓRIA NOTIFICAÇÃO DE TAL PEÇA PROCESSUAL AO ADVOGADO CONSTITUÍDO.

7. SEJA DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE - POR VIOLAÇÃO DAS GARANTIAS DE DEFESA DOS ARGUIDOS CONSAGRADAS NO ARTIGO 32.º, N.º 1 DA LEI FUNDAMENTAL, DO ARTIGO 122.º, N.º 1 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, QUANDO INTERPRETADO NO SENTIDO DE NÃO CONSIDERAR INVÁLIDOS OS ACTOS DE INQUÉRITO POSTERIORES À PRIMEIRA TENTATIVA DE NOTIFICAÇÃO DO ARGUIDO, FRUSTRADA DEVIDO A ERRO GROSSEIRO E INDESCULPÁVEL DO MINISTÉRIO PÚBLICO, QUE IMPEDIU QUE TAL ARGUIDO FOSSE CONSTITUÍDO COMO TAL E INTERROGADO NESSA QUALIDADE ANTES DO ENCERRAMENTO DO INQUÉRITO.

8. SEJA DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE - POR VIOLAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO AO DIREITO CONSAGRADO NO ARTIGO 20.º, N.º 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, RECONHECIDO NO ARTIGO 6.º DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM E NO ARTIGO 20.º, N.º 4 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AINDA DAS GARANTIAS DE DEFESA DOS ARGUIDOS CONSAGRADAS NO ARTIGO 32.º, N.º 1 DA LEI FUNDAMENTAL, DO ARTIGO 119.º, ALÍNEAS C) E D) DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, QUANDO INTERPRETADO NO SENTIDO DE IMPEDIR QUE AS NULIDADES DE OMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO COMO ARGUIDA E DE INTERROGATÓRIO NESSA QUALIDADE DE PESSOA COLECTIVA DETERMINADA CONTRA A QUAL EXISTA A SUSPEITA DE PRÁTICA DE CRIME, CUJA NOTIFICAÇÃO APENAS TENHA SIDO TENTADA EM MORADA NÃO CORRESPONDENTE À DA SUA SEDE SOCIAL, SEM TER SIDO REALIZADA QUALQUER DILIGÊNCIA PARA CONCRETIZAÇÃO DA ALUDIDA NOTIFICAÇÃO NA SEDE SOCIAL DA SUSPEITA, OU NA RESIDÊNCIA DO SEU LEGAL REPRESENTANTE OU NA PESSOA DA ILUSTRE ADVOGADA POR ELA CONSTITUÍDA NOS AUTOS, ASSIM COMO AS NULIDADES DE OMISSÃO DE NOTIFICAÇÃO DO DESPACHO DE ACUSAÇÃO À DITA SOCIEDADE E À ILUSTRE ADVOGADA POR ELA CONSTITUÍDA NOS AUTOS POSSAM SER ARGUIDAS A TODO TEMPO, QUALQUER QUE SEJA A FASE NA QUAL SE ENCONTRE O PROCEDIMENTO.

9. SEJA DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE - POR VIOLAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO AO DIREITO CONSAGRADO NO ARTIGO 20.º, N.º 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, RECONHECIDO NO ARTIGO 6.º DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM E NO ARTIGO 20.º, N.º 4 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AINDA DAS GARANTIAS DE DEFESA DOS ARGUIDOS, CONSAGRADAS NO ARTIGO 32.º, N.º 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO ARTIGO 120.º, N.º 3, ALÍNEA D) DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, QUANDO INTERPRETADO NO SENTIDO DE COMINAR A ARGUIDO NÃO NOTIFICADO DOS DESPACHOS DE ARQUIVAMENTO E DE ACUSAÇÃO, A ARGUIR AS NULIDADES DE INSUFICIÊNCIA DO INQUÉRITO NO PRAZO DE CINCO DIAS A CONTAR DA NOTIFICAÇÃO DO DITO DESPACHO A DEFENSOR OFICIOSO NOMEADO.

10. SEJA DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE - POR VIOLAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO AO DIREITO CONSAGRADO NO ARTIGO 20.º, N.º 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, RECONHECIDO NO ARTIGO 6.º DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM E NO ARTIGO 20.º, N.º 4 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AINDA DAS GARANTIAS DE DEFESA DOS ARGUIDOS, CONSAGRADAS NO ARTIGO 32.º, N.º 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO ARTIGO 105.º, N.º 1, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL QUANDO INTERPRETADO NO SENTIDO DE NÃO PERMITIR QUE O ARGUIDO NÃO NOTIFICADO DOS DESPACHOS DE ARQUIVAMENTO E DE ACUSAÇÃO, POSSA ARGUIR AS NULIDADES DE INSUFICIÊNCIA DO INQUÉRITO NO PRAZO DE 10 DIAS A CONTAR DA EFECTIVA NOTIFICAÇÃO DAQUELE PARA QUALQUER TERMO POSTERIOR DO PROCESSO OU DA INTERVENÇÃO DO MESMO EM ACTO NELE PRATICADO.

11. SEJA DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE - POR VIOLAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO AO DIREITO CONSAGRADO NO ARTIGO 20.º, N.º 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, RECONHECIDO NO ARTIGO 6.º DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM E NO ARTIGO 20.º, N.º 4 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AINDA DAS GARANTIAS DE DEFESA DOS ARGUIDOS, CONSAGRADAS NO ARTIGO 32.º, N.º 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, DO ARTIGO 139.º, N.º 5, ALÍNEA C) E N.º 6 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL APLICÁVEL IN CASU EX VI DO ARTIGO 107.º, N.º 5 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, QUANDO INTERPRETADO NO SENTIDO DE NÃO PERMITIR QUE, SENDO ARGUIDAS NULIDADES, PELO ARGUIDO, NO TERCEIRO DIA ÚTIL POSTERIOR AO TERMO DO PRAZO LEGALMENTE PREVISTO PARA O EFEITO, O TRIBUNAL JULGUE INTEMPESTIVO O ACTO PRATICADO, EM LUGAR DE ORDENAR A NOTIFICAÇÃO DAQUELE PARA PAGAR A MULTA À QUAL ALUDE A ALÍNEA C) DO CITADO ARTIGO 139.º, N.º 5, ACRESCIDA DA PENALIZAÇÃO DE 25 % DO VALOR DA MULTA.
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A Exma. Magistrada do M.º P.º do tribunal recorrido respondeu, concluindo da seguinte forma:

1. A falta de constituição como arguida da recorrente, não é caso de nulidade absoluta;
2. Devendo ser arguida pela interessada após notificação pessoal da acusação;
3. Não tendo sido arguida dentro do prazo, há que considerar sanada tal nulidade;
4. Por força do princípio da tipicidade consagrado no n.º 1 do art. 118.º do CPP, não se descortinando a falta de notificação da acusação à Ilustre Advogada constituída nos autos pela recorrente, no elenco das nulidades insanáveis (cfr. artigo 119.º), nem tão pouco nos das nulidades sanáveis (cfr. artigo 120.º), a mesma seria reconduzível a uma mera irregularidade, a arguir nos termos e prazo do n.º 1 do art. 123.º do mesmo diploma legal;
5. Pelo que não tendo sido arguida atempadamente, se encontra sanada;
6. O despacho recorrido não padece de qualquer nulidade;
7. Não se mostra violado e/ou errada e inadequada a interpretação do disposto nos arts.º 119.º, als. c) e d), 120.º, ns.º 2, al. d) e 3, al. c), 118.º, n.º 2, 122., n.º 1, e 123.º todos do CPP;
8. Não se mostra violado o direito fundamental de acesso ao Direito consagrado no art.º 20.º, n.º 1 da CRP;
9. Não se mostram violadas as garantias de defesa dos arguidos, consagrados no art.º 32.º, n.º 1 da CRP;
10. Nem, tão pouco, se mostram violados quaisquer outros preceitos legais;
11.Não se verifica qualquer inconstitucionalidade;
12. Não merecendo o despacho recorrido qualquer censura

Pelo que deverá ser confirmado.
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Nesta Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da procedência, pelo menos parcial, do recurso.

Cumpriu-se o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

Procedeu-se a exame preliminar.

Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

II
De acordo com o disposto no art.º 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (diploma do qual serão todos os preceitos legais citados sem menção de origem), o objecto do recurso é definido pelas conclusões formuladas pelo recorrente na motivação e é por elas delimitado, sem prejuízo da apreciação dos assuntos de conhecimento oficioso de que ainda se possa conhecer.

De modo que as questões postas ao desembargo desta Relação são as seguintes:

Se durante o inquérito foram cometidas nulidades quando ocorreu:

A) A omissão de constituição da recorrente "A… - Imobiliária, Lda." como arguida;

B) A omissão de interrogatório da recorrente "A… - Imobiliária, Lda." como arguida; e

C) A omissão de notificação à "A…. - Imobiliária, Lda." e à sua advogada constituída dos despachos de arquivamento e acusação.

Vejamos:
O despacho recorrido tem o teor que a seguir se reproduzirá, na parte que agora interessa ao caso.

E porque o assunto é, em termos de circunstancialismo dos factos a ter em conta, de tratamento algo intrincado e – desde já se diga – o recurso é para proceder, para melhor exposição de razões e mais fácil apreensão das questões que importa resolver, faremos a reprodução do despacho recorrido acompanhada por algumas notas de rodapé em que de imediato resolveremos ou apontaremos aspectos que importa fiquem desde logo já tratados ou pelo menos melhor sinalizados.

Eis o despacho recorrido:

[ 2. Das nulidades invocadas sob a ref.ª 853039:
“A…. – Imobiliários, Ld.ª” veio arguir a nulidade dos despachos de arquivamento e acusação deduzidos e de todos os actos processuais subsequentes à dedução dos mesmos com fundamento na omissão da sua constituição como arguida na fase de inquérito[1] e na omissão da notificação à arguente[2] dos despachos cuja invalidade invoca[3] (fls. 450 e ss).

O Ministério Público promoveu o indeferimento do requerido por considerar que está em causa uma mera irregularidade processual, que se encontra sanada por não ter sido arguida pelo interessado tempestivamente (cfr. fls. 475 e ss).

Cumpre apreciar e decidir.
Compulsados os autos, assume relevância a seguinte factualidade para a decisão da questão sub judice:

1) No dia 30 de Julho de 2010 procedeu-se à inquirição do legal representante de “A… – Imobiliários, Ld.ª”, A… (cfr. fls. 53 e ss). [4]

2) No dia 25 de Julho de 2013 A… foi constituído arguido e interrogado nessa qualidade (cfr. fls. 255 a 258). [5]

3) A… assume a qualidade de sócio-gerente da “A… – Imobiliários, Ld.ª” desde 16 de Dezembro de 2009 (cfr. certidão de fls. 345 e ss).

4) Foram realizadas diligências com vista à constituição de “A…– Imobiliários, Ld.ª” como arguida, que se revelaram infrutíferas, mas a correspondência tendente à notificação da mesma não foi enviada para a morada da respectiva sede (cfr. certidão de fls. 345 e ss e carta precatória reproduzida a fls. 370 e ss).

5) No dia 19 de Janeiro de 2015 foi nomeada a Dr.ª C… como defensora de “A… – Imobiliários, Ld.ª [6] e foi deduzido despacho de arquivamento e de acusação (cfr. fls. 399 e ss).

6) A Ilustre Defensora oficiosa da “A… – Imobiliários, Ld.ª” foi notificada do despacho de arquivamento e acusação proferido em 23 de Janeiro de 2015 (cfr. fls. 411). [7]

7) “A… – Imobiliários, Ld.ª” veio juntar procuração forense aos autos em 9 de Fevereiro de 2015 (cfr. fls. 423 e ss).[8]

8) No dia 19 de Fevereiro de 2015 “A… – Imobiliários, Ld.ª” juntar aos autos o requerimento em que arguiu as nulidades em apreço (cfr. fls. 445 e ss).
*
A invalidade dos actos pode ser entendida como uma categoria geral que engloba, primeiro, a inexistência, depois, as nulidades absolutas, com um regime aplicável aos casos mais graves, um grupo intermédio de nulidades relativas, e um terceiro grupo, com carácter residual, “que o legislador reputou mais leves e, em consequência, apetrechou com mecanismos de destruição mais fracos” (cfr. João Conde Ferreira, in “Contributo para a análise da inexistência e das nulidades processuais penais”, Stvdia Ivridica 44, 1999).

As nulidades absolutas, que devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do processo, só resultam sanadas com a formação do caso julgado e encontram-se discriminadas nas diversas alíneas do artigo 119.º do Código de Processo Penal, ao passo que as nulidades sanáveis devem ser arguidas pelos interessados e ficam sujeitas à disciplina prevista nos artigos 120.º e 121.º do mencionado diploma legal.

A relevância que a matéria das nulidades assume radica nos efeitos que as mesmas produzem: as nulidades tornam inválido o acto em que se verificarem, bem como os que dela dependerem e aquelas puderem afectar, sendo que a declaração de nulidade determina quais os actos que possam considerar-se inválidos e determina, sempre que necessário e possível, a sua repetição (cfr. artigo 122.º do Código de Processo Penal).
*
No que tange à primeira das invalidades arguidas, cumpre, desde logo, atentar na jurisprudência fixada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1 /2006, publicado no Diário da República de 2 de Janeiro de 2006, I.ª série, A, pág. 10, segundo o qual “a falta de interrogatório como arguido, no inquérito, de pessoa determinada contra quem o mesmo corre, sendo possível a notificação, constitui a nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do Código de Processo Penal”.

Na verdade, quando o inquérito se processe contra pessoa determinada e seja possível a sua notificação, o artigo 272.º, n,º 1, do Código de Processo Penal, impõe a obrigatoriedade de interroga-a como arguida, o que mais não é do que um corolário lógico, por um lado, dos fins e do âmbito do inquérito e, por outro lado, das garantias de defesa que a Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 32.º, n.º 1, proclama o processo criminal dever assegurar.

Na senda de Figueiredo Dias, in Direito Processual Penal, tomo I, 1981, pág. 157, refira-se que “o direito de audiência é expressão necessária do direito do cidadão à concessão da justiça, das exigências inscritas num Estado de direito, da essência do direito como tarefa do homem e, finalmente, do espírito do processo como “comparticipação” de todos os interessados

na criação da decisão; direito cujo âmbito não se circunscreve só para a parte do processo que decorre perante o tribunal, devendo ser assegurado perante quaisquer decisões, sejam do juiz ou de entidades instrutórias (investigatórias), nomeadamente o Ministério Público, sempre que aquelas atinjam directamente a esfera jurídica de pessoas”.

Este direito, aliás, encontra-se genericamente atribuído ao arguido, concretamente no artigo 61.º, n.º1, alínea b), do Código de Processo Penal, ao estabelecer que “o arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo, e salvas as excepções da lei”, o direito de “ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte.”

Analisando a expressão legal “actos processuais que lhe disserem respeito”, José António Barreiros, In “Inquérito e Instrução”, I Congresso de Processo Penal – Memórias, Almedina, 2005, pág. 145, defende que não é fácil interpretar esta limitação, posto que, em pura lógica, ela exclui praticamente nada, porquanto todo o processamento penal, a partir do momento em que houver arguido, visa precisamente a pessoa deste, procurando determinar a existência de ilícito e a responsabilidade do arguido na sua ocorrência, pelo que todos os actos processuais dizem directamente respeito ao arguido. No entanto, de um ponto de vista prático o alcance gizado pela lei foi o de definir o direito de presença do arguido quanto a actos de produção probatória, excluindo todos os restantes actos do processo e, dentro destes actos, apenas haverá que considerar aqueles que visarem a produção de prova que possa ter relevo para o apuramento e a definição do ilícito pelo qual possa ser responsabilizado o arguido de cuja presença se trate.

No caso vertente, não tendo sido interrogada como arguida em sede de inquérito a “A… – Imobiliários, Ld.ª”, nem tendo sido encetadas quaisquer diligências no sentido de proceder à correspondente notificação na sua sede social, não restam dúvidas que se verifica a mencionada nulidade sanável de insuficiência de inquérito, importando, pois, apurar os seus efeitos.

Neste contexto, importa referir que com a declaração de nulidade o juiz estabelece a ligação entre o plano jurídico, onde se move a invalidade, e o plano real onde se vai verificar a ineficácia dos actos processuais inválidos.

Só a declaração de nulidade destrói os efeitos que o acto inválido tenha, eventualmente, produzido. O acto imperfeito, com a declaração de nulidade, torna-se também ineficaz.

Conforme refere João Conde Correia, in Contributo para a análise da inexistência e das nulidades processuais penais”, Stvdia Ivridica 44, 1999, a declaração de nulidade limita-se a verificar a desconformidade entre a actividade empreendida num dado acto processual e o seu modelo legal e a destruir os efeitos jurídicos já produzidos ou a evitar a sua produção. Na esteira do seu pensamento a declaração de nulidade não produz nenhuma invalidade pois que ele já o era desde a sua génese.

O juiz vai é declarar a ineficácia do acto, assim, vê nas nulidades formas de tornar ineficazes os actos inválidos.

A declaração de nulidade torna aquele acto desconforme ineficaz bem como todos aqueles que dele dependerem e que tenham sido contaminados com a invalidade definitivamente ineficazes.

O artigo 122.º n.º 1 do Código de Processo Penal consagra o conceito de invalidade derivada/efeito à distância e assenta na negação da extensão automática da invalidade a todos os actos contemporâneos ou posteriores de alguma forma conexionados com o acto inválido. Todavia reconhece-se que os actos inválidos têm inequívoca influência sobre o procedimento podendo contaminá-lo. Ou seja, procede-se à anulação do acto viciado e aqueles que dele dependem.

Essencial é compreendermos que em causa não está uma dependência cronológica mas, e outrossim, uma dependência real ou efectiva. Deve haver um nexo funcional entre o acto inválido e a actividade sucessiva por forma a que a validade de um seja imprescindível à validade do outro.

Os actos que constituam elementos necessários ao desenvolvimento do processo comunicam a invalidade que os afecte aos restantes – por força do referido nexo de dependência necessária existente entre eles – pelo que o remédio consistirá no retorno do processo ao ponto onde foi praticado o acto inválido.

Dúvidas não restam que o legislador procurou circunscrever os efeitos da declaração de nulidade, estendendo a invalidade apenas aos actos dependentes daquele em que foi julgado nulo e determinando a sua renovação e aproveitamento, sempre que estes ainda sejam possíveis e necessários.

Em decorrência da declaração da nulidade cometida no processo quer o acto em que a mesma ocorreu quer os que com ela se encontram conexos – dele dependentes ou afectados – ficam inválidos.

Em suma, a declaração de nulidade produz a destruição dos actos imperfeitos pelo que se torna imperiosa a sua renovação, a menos que a mesma não seja possível nem necessária e deve ainda proceder-se ao aproveitamento dos actos que podem ser subtraídos ao efeito da nulidade, isto pressupondo a hipótese de no caso estes existirem – o comando do artigo 122º n.º 3 do Código de Processo Penal insere-se no princípio da economia processual.

A renovação surge como o único remédio para a inexistência e para as nulidades – absolutas e relativas não sanadas – sendo necessária sempre que se tratar de uma acção da qual depende o ulterior andamento do processo – ex.: actos correspondentes aos seus momentos fundamentais, sem os quais ele não pode prosseguir (sem acusação, pronuncia ou sentença).

Na opinião de Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal”, Vol. II, pág. 102, a renovação só será necessária quando os efeitos derivados do acto não tenham sido produzidos doutro modo ou o desenvolvimento do procedimento não tenha evidenciado a sua inutilidade, a renovação só será possível quando subsistam ainda os elementos materiais ou os pressupostos de facto para a repetição do acto. Muitas vezes a repetição do acto implica a regressão na marcha do procedimento ao estádio em que o acto nulo foi praticado.

Outras vezes já não é possível (porque expirou o prazo peremptório para a prática do acto ou pela alteração das condições naturais e humanas, imprescindíveis para aquela) ou necessária (por terem sido alcançados os elementos que este devia fornecer ou por ter sido demonstrada a sua inutilidade) a renovação.

Relevante para aferir da (des)necessidade ou (im)possibilidade de renovar o acto nulo são os elementos contidos no processo no momento em que é detectada e declarada a invalidade.

No caso sub judice, de acordo com o entendimento preconizado, a falta de interrogatório como arguida da “A… – Imobiliários, Ld.ª” até ao encerramento do inquérito constitui nulidade sanável que, caso tivesse sido tempestivamente arguida, determinaria a invalidade dos actos processuais que dizem directamente respeito ao arguido, ou seja, os actos de produção probatória ocorridos desde o encerramento do inquérito até presente (uma vez que ainda não se procedeu à sua constituição como arguida).[9]

Na verdade, a omissão de tal acto em sede de inquérito não afecta a validade da acusação deduzida na medida em que este acto assume autonomia em relação àquele. Com efeito, afigura-se que não só a acusação não se baseou no acto omitido mas na valoração dos demais indícios recolhidos em sede de inquérito, mas também, e sobretudo, o acto omitido não se mostra determinante para a dedução da acusação, tal como, aliás, se depreende da circunstância da lei consagrar expressamente, no próprio artigo 272.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, a cessação da obrigatoriedade de tal interrogatório no caso de não ser possível a notificação do arguido e, a contrario, a possibilidade de ser deduzida acusação contra pessoa determinada que não foi interrogada como arguido.

Não obstante, sempre se dirá que a declaração de invalidade dos actos praticados subsequentemente dependeria da arguição tempestiva do vício, concretamente da sua invocação no prazo de cinco dias após a notificação do despacho de encerramento do inquérito previsto no artigo 120.º, n.º 3, alínea c), do Código de Processo Penal.

Sucede que, no caso sub judice, não só não foram produzidas quaisquer diligências probatórias após a dedução da acusação, mas sobretudo a nulidade em apreço foi arguida após o termo do mencionado prazo de cinco dias, contado quer da data da notificação do despacho de encerramento de inquérito à Ilustre Defensora nomeada[10], quer da data da constituição de mandatário pela sociedade arguida, pelo que se encontra manifestamente sanado o invocado vício processual.
*
No que concerne à segunda invalidade processual invocada, refira-se que, nos termos do artigo 119.º, alínea c), do Código de Processo Penal, constitui nulidade insanável, “a ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência”.

O que está em causa, porém, não é a falta da arguida a diligência processual em que seja obrigatória a sua presença, mas apenas a falta de notificação à mesma do despacho de encerramento do inquérito.

A jurisprudência tem-se pronunciado uniformemente no sentido do enquadramento deste tipo situação sub judice no regime da mera irregularidade processual (cfr., designadamente, acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Junho de 1991, in Col. Jur., Ano XVI, Tomo III, pág. 26; do Tribunal da Relação de Lisboa de 17 de Janeiro de 1995, in Col. Jur., Tomo I, pág. 155; do Tribunal da Relação do Porto de 18 de Novembro de 2009 (Proc. 32/07.8TABAO), e do Tribunal da Relação de Coimbra de 6 de Novembro de 2013 (Proc. 25/12.3EACTB.C1)[11], os últimos mencionados disponíveis in www.dgsi.pt).

Contudo, tal irregularidade teria de ser arguida pelo interessado no próprio acto, ou nos três dias seguintes a contar daquele em que tiver sido notificado para qualquer termo do processo.

Na verdade, a arguição da nulidade sanável terá de que ser feita no prazo que a lei estabelece, mas também terá de ser feita pelo participante processual dotado da necessária legitimidade, ou seja, pelos interessados na anulação, os quais, na concepção preconizada por Maia Gonçalves, in Código de Processo Penal Anotado, 13.ª Edição, pág. 326, se traduzem em “todos os participantes processuais que possam legitimamente tirar proveito da prática dos facto sem que ele enferme de nulidade”.

No caso vertente, não obstante a arguida tenha legitimidade para arguir a irregularidade, a alegada nulidade processual não foi invocada tempestivamente, concretamente no prazo de 3 (três) dias contado, pelo menos, da data em que teve intervenção no processo, constituído como seu Ilustre mandatário o subscritor do requerimento em apreciação, pelo que manifestamente se encontra igualmente sanada a invocada irregularidade processual.

Por fim, cumpre salientar que não se compreende que, estando a arguida plenamente conhecedora de todas as vicissitudes processuais - uma vez que o seu representante legal assume concomitantemente a qualidade de arguido nos presentes autos, que este foi sempre regularmente notificado de todos os actos processuais e que a Ilustre Defensora nomeada teve igualmente regular conhecimento da acusação deduzida -, nada diga em tempo, guardando o trunfo para utilizar quando melhor lhe convier. Trata-se de uma manifesta violação do princípio da boa fé processual e uma permissão para se prevalecer de uma vicissitude processual. Numa altura em que tanto se apregoa que a verdade material deve prevalecer sobre a justiça formal, seria premiar a habilidade de quem procura os subterfúgios formais, em vez de vir aos autos exigir a rectificação dos erros.

Face a todo o exposto, julgo improcedente o presente pedido de declaração de nulidades processuais.]

Ora bem.

Os erros de procedimento cometidos no inquérito são, pois, os seguintes:

Ter sido omitida a constituição da recorrente "A… - Imobiliária, Lda." como arguida, bem como o seu interrogatório nessa qualidade, porque, não obstante ter a fls. 344 do processo principal[12] sido pedida pelo M.º P.º certidão do registo comercial da "A… - Imobiliária, Lda." e a mesma ter sido junto a fls. 345-350, da qual consta, logo no início da mesma, a morada da sua sede (a qual, aliás, corresponde à que já existia em numerosos documentos juntos durante o inquérito, como, verbi gratia, na procuração que passara a advogada a fls. 10, e também a fls. 69, 165, 166, 168, 173, 192), o M.º P.º andou a notificá-la noutra morada, como aconteceu logo a fls. 352, na carta precatória para a sua constituição como arguida e interrogatório nessa qualidade, na pessoa do seu legal representante, o co-arguido A. Claro que, por isso, a "A… - Imobiliária, Lda." não foi constituída nem ouvida como arguida (cf. fls. 382 e 384 e 388), tendo o M.º P.º de seguida lavrado o despacho de arquivamento da queixa apresentada pela "A… - Imobiliária, Lda." e de acusação da mesma (fls. 399 e ss.), despacho que foi notificado à "A… - Imobiliária, Lda." de novo na morada errada (fls. 363) e a uma defensora oficiosa, apesar de a fls. 10 a "A… - Imobiliária, Lda." ter constituído advogada.

Estes erros de procedimento levantam agora as seguintes questões, suscitadas em recurso, e que são:

Ø Se tais erros de procedimento são nulidades insanáveis ou nulidades sanáveis ou meras irregularidades;

Ø Se a "A… - Imobiliária, Lda." estava ainda em tempo para as suscitar quando em 19-2-2015, a fls. 445, apresentou o requerimento em que o fazia; e

Ø No caso das questões anteriores terem tido resposta positiva, quais as consequências para o processo de tais erros de procedimento.

Vejamos:

No tocante à questão de se tais erros de procedimento são nulidades insanáveis ou nulidades sanáveis ou meras irregularidades:

Quanto à questão da omissão de constituição da recorrente "A… - Imobiliária, Lda." como arguida, resulta do art.º 120.º, n.º 2 al.ª d), citado apenas na parte que agora interessa ao caso, que constitui nulidade dependente de arguição a insuficiência do inquérito, por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios.

Ora um dos actos legalmente obrigatórios no inquérito é, precisamente, o da constituição como arguido nos termos dos art.º 58.º e 59:º (art.º 58.º, 1: … é obrigatória a constituição de arguido …).

Assim: Paulo Pinto de Albuquerque, "Código de Processo Penal Anotado", 2007, pág. 313, nota 6.a ao art.º 120.º; Código de Processo Penal comentado por Conselheiros do STJ, Almedina, 2014, pág. 400; Germano Marques da Silva, “Curso de Processo Penal”, 2002, II-84; e ac. TRL de 21-10-99, CJ, 1999, IV-155.

Quanto à questão da omissão de interrogatório da recorrente "A… - Imobiliária, Lda." como arguida, a mesma encontra resposta no acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 1/2006, publicado no DR 1 SÉRIE I-A, de 2-1-2006, do qual não vemos razões para divergir e que fixou a seguinte jurisprudência, que entendemos, com Paulo Pinto de Albuquerque, "Código de Processo Penal Anotado", 2007, pág. 690, nota 4 ao art.º 272.º, se mantém valida em face da lei nova (Lei n.º 48/2007, de 29-8): A falta de interrogatório como arguido, no inquérito, de pessoa determinada contra quem o mesmo corre, sendo possível a notificação, constitui a nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Penal.

De acordo com o art.º 120.º, n.º 3 al.ª c), estas nulidades relativas de omissão de constituição como arguido e de interrogatório como arguido, tinham de ser arguidas até 5 dias após a notificação do despacho que tivesse encerrado o inquérito.

A recorrente assumiu a fls. 24 da motivação de seu recurso que tomou conhecimento em 9-2-2015 da acusação contra ela deduzida, data em que interveio num acto praticado no processo (art.º 123.º, n.º 1) e que foi a junção pela mesma de procuração a advogado diferente do que já constituíra a fls. 10 (e apesar de até então nunca ter sido notificada da acusação).

O prazo de 5 dias esgotou-se em 16-2-2015.

O requerimento a suscitar a nulidade é de 19-2-2015.

Não obstante, a recorrente estava ainda em prazo para o fazer, por força do disposto no art.º 139.º, n.º 5 al.ª c), do Código de Processo Civil, "ex vi" art.º 107.º-A al.ª c), do Código de Processo Penal, nos termos dos quais é possível ao sujeito processual praticar o acto dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de uma multa[13], a qual, se não se mostrava paga (como foi o caso), obrigava a secretaria do tribunal aonde o acto foi praticado a notificar o requerente para a pagar (o que não foi feito, sem que disso, porém, possa agora ser penalizada a requerente).

Assim e em resumo, procedem pois as nulidades relativas de omissão de constituição como arguido e de omissão de interrogatório da recorrente "A… - Imobiliária, Lda." como arguida.

Sob a epígrafe de efeitos da declaração de nulidade, prescreve o art.º 122.º, citado apenas na parte que agora interessa ao caso:

1 - As nulidades tornam inválido o acto em que se verificarem, bem como os que dele dependerem e aquelas puderem afectar.

2 - A declaração de nulidade determina quais os actos que passam a considerar-se inválidos e ordena, sempre que necessário e possível, a sua repetição, (…)

3 - Ao declarar uma nulidade o juiz aproveita todos os actos que ainda puderem ser salvos do efeito daquela.

Assim, do presente processo e em resultado das nulidades sanáveis de que temos vindo a tratar, a de omissão da constituição da "A… - Imobiliária, Lda" como arguida e a de omissão do seu interrogatório nessa qualidade, anula-se a acusação e toda a tramitação posterior à mesma, de forma a ser propiciado à "A… - Imobiliária, Lda." a sua constituição como arguida e o seu interrogatório como arguida, retirando-se do teor deste interrogatório as consequências necessárias em termos de eventuais diligências posteriores e/ou reformulação dos termos da acusação e dos trâmites que processualmente se lhe podem seguir.

Quanto à questão da omissão de notificação à "A… - Imobiliária, Lda." e à sua advogada constituída dos despachos de arquivamento e acusação:

O conhecimento da parte da questão referente à omissão de notificação à "A… - Imobiliária, Lda." e à sua advogada constituída do despacho de acusação, encontra-se prejudicado pela solução dada à questão anterior e da qual resultou a anulação dessa acusação.

Subsiste pois a parte da questão relativa à omissão de notificação à A… - Imobiliária, Lda." e à sua advogada constituída do despacho de arquivamento.

Estabelece o art.º 277.º, n.º 3, citado apenas na parte que agora interessa ao caso, que o despacho de arquivamento é comunicado (…) ao denunciante com faculdade de se constituir assistente [como é o caso da "A… - Imobiliária, Lda." em relação à queixa por roubo que apresentou] (…), bem como ao respectivo defensor ou advogado.

Já vimos que, podendo tal ter sido feito, por constarem do processo os elementos para tanto necessários, a "A… - Imobiliária, Lda." não foi notificada, porque a notificação seguiu para uma morada que não era a sua sede (apesar de a sede correcta constar da certidão do registo comercial junta aos autos) e a advogada que constituíra a fls. 10 também não foi notificada por o ter sido um defensor oficioso entretanto sem qualquer justificação nomeado nos autos à recorrente.

Tais erros de procedimento obstaram a que se propiciasse à "A… - Imobiliária, Lda." a possibilidade legal que tinha de impugnar o despacho de arquivamento (isto, independentemente do resultado prático que viesse a resultar de tal impugnação), quer na vertente de, constituindo-se assistente, requerer a abertura de instrução (art.º 287.º, n.º 1 al.ª b)), quer suscitando a intervenção hierárquica (art.º 278.º).

Estas faltas de notificação constituem uma irregularidade que afecta o direito e garantia constitucional fundamental do acesso ao direito (art.º 20.º, n.º 1, da Constituição) e torna inválido o valor das notificações efectuadas no inquérito do despacho de arquivamento, irregularidade que agora e ao abrigo do art.º 123.º, n.º 2, se repara, anulando tais notificações e ordenando a sua repetição da forma correcta que se tem vindo a assinalar, bem como anulando os trâmites processuais que se lhe seguiram.

E como as irregularidades foram cometidas na fase de inquérito, compete ao M.º P.º a sua reparação.

Em face do exposto, fica prejudicado o conhecimento das várias inconstitucionalidades invocadas pela recorrente para o caso de improcedência das suas pretensões no âmbito do direito adjectivo.

III
Termos em que, concedendo provimento ao recurso, se decide:

1.º
Anular o despacho de acusação e todos os trâmites processuais que se lhe seguiram.

2.º
Anular as notificações do despacho de arquivamento feitas à "A… - Imobiliária, Lda." numa morada que não é a sua sede, bem como todas as notificações efectuadas à defensora oficiosa que lhe foi nomeada.

3.º
Ordenar a devolução do inquérito ao M.º P.º para que possa suprir as apontadas nulidades de omissão de constituição da "A… - Imobiliária, Lda." como arguida, de omissão do seu interrogatório nessa qualidade e de omissão de notificação à "A… - Imobiliária, Lda." e ao seu advogado do despacho de arquivamento, seguindo-se os demais termos que de tais suprimentos possam advir.

4.º
Não é devida tributação (art.º 513.º, n.º 1, do Código de Processo Penal).
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Évora, 7-2-2017

JOÃO MARTINHO DE SOUSA CARDOSO
ANA BARATA BRITO
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[1] E ainda omissão de interrogatório da recorrente "A…. - Imobiliária, Lda." como arguida.

[2] Bem como à advogada que constituíra no processo a fls. 10.

[3] Despachos esses que são o de arquivamento da queixa apresentada pela "A… - Imobiliária, Lda." e o de acusação da mesma.

[4] A qual, porém, foi ouvida a título de queixosa e não de arguida.

[5] Ou seja, foi ouvido em seu nome pessoal e não como legal representante da "A… - Imobiliária, Lda.".

[6] Mas esta nomeação de uma defensora oficiosa era desnecessária, porque a "A… - Imobiliária, Lda." tinha advogada constituída nos autos com procuração junta a fls. 10. Certo que quando foi passada essa procuração, a "A…. - Imobiliária, Lda." estava no processo na veste de ofendida; mas não é por ter sido posteriormente transformada em arguida que o mandato conferido por essa procuração ficou sem efeito. A despropositada nomeação de defensora oficiosa à "A… - Imobiliária, Lda." teve como consequência que as notificações posteriores fossem feitas à defensora nomeada, em detrimento de o serem à advogada constituída.

[7] A despropositada nomeação de defensora oficiosa à "A… - Imobiliária, Lda." teve como consequência que a notificação do despacho de arquivamento e acusação, fosse feita à defensora nomeada, em detrimento de o ser à advogada constituída.

E falta aqui a menção de que a própria "A… - Imobiliária, Lda." também nunca foi notificada deste despacho de arquivamento e acusação, por as notificações serem remetidas para uma morada errada, como se constata de fls. 408, isto apesar de a fls. 345, que é a primeira folha de uma certidão do registo comercial da "A… - Imobiliária, Lda.", constar a morada correcta da sede da arguida!

[8] Pois. Mas em 30-7-2010 já tinha junto aos autos, a fls. 10, uma outra procuração forense.

[9] Acontece que quando em 19-2-2015, a fls. 445 e ss., a "A… - Imobiliária, Lda." invocou as nulidades, ela não tinha ainda sido notificada do despacho de arquivamento e de acusação. Nem a sua advogada, constituída a fls. 10 (embora a recorrente admita a fls. 24 da motivação de seu recurso que tomou conhecimento da acusação em 9-2-2015, por nessa altura ter junto aos autos nova procuração).

[10] Nomeada, mas que não o devia ter sido, por a "A… - Imobiliária, Lda." ter mandatado advogada nos autos, a fls. 10.

[11] Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 6 de Novembro de 2013 (Proc. 25/12.3EACTB.C1) que não vemos como possa servir de apoio ao despacho recorrido, pois o sumário respectivo diz assim:

Tendo o arguido constituído mandatário e não tendo este sido notificado da data designada para julgamento, o decurso da audiência sem a sua presença, ainda que feita com a presença da defensora indevidamente nomeada, constitui a nulidade insanável, prevista na alínea c), do art. 119º, do C. Processo Penal.

[12] Quando mencionarmos fls. do processo, estaremos sempre a referirmo-nos às do processo principal e não às da certidão que enforma o presente recurso em separado, o que fazemos por aquelas serem mais facilmente identificáveis no confronto entre as da presente certidão e as do processo principal.

[13] Acs. STJ de 26-9-2007, processo 07P2052, em www.dgsi.pt; e de 4-1-2006, proc. n.º 1834/05 - 3.ª, citado no anterior aresto e sumariado nas anotações ao art.º 123.º do Código de Processo Penal comentado por Conselheiros do STJ, Almedina, 2014, pág. 414.