Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1338/17.3T8PTG.E1
Relator: ISABEL PEIXOTO IMAGINÁRIO
Descritores: PROCESSO DE ADOPÇÃO
CONSENTIMENTO
DISPENSA
Data do Acordão: 06/28/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Atentas as diligências desenvolvidas no processo com vista à audição do progenitor da menor, que vieram a revelar-se infrutíferas, entorpecendo o regular processamento do processo de adopção, violando flagrantemente o dever de colaboração no sentido da sua boa decisão, e impondo-se que prevaleça o interesse da menor, cabe concluir no sentido de existir grave dificuldade em ouvir o progenitor e, portanto, dispensar-se o seu consentimento para a adopção.
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO

Acordam os Juízes no Tribunal da Relação de Évora


I – As Partes e o Litígio

Recorrentes /Requerentes: (…) e (…)

Menor: (…)

Os presentes autos consistem em ação judicial intentada à luz do disposto no art. 52.º do Regime Jurídico do Processo de Adoção aprovado pela Lei n.º 143/2015, de 8 de setembro com vista à adoção plena da menor pelos Requerentes.

Foram juntos documentos.

Promovida que foi a audição do progenitor com fundamento no facto de não ter prestado o seu consentimento para a adoção, embora tenha mencionado a possibilidade de a aceitar, determinou-se a tomada de declarações ao mesmo. Ao que não se procedeu por não ter comparecido em juízo, apesar de pessoalmente notificado para o efeito, e por não ter sido encontrado, emitidos que foram mandados de comparência.

II – O Objeto do Recurso

Neste enquadramento processual, o M.º P.º promoveu a prolação de decisão de indeferimento da requerida adoção por inadmissibilidade legal, invocando não estarem reunidos os requisitos legalmente exigidos para a adoção pelo facto de faltar o consentimento para a adoção por parte do progenitor da adotanda e por não se verificar qualquer uma das circunstâncias legais em face das quais se pode dispensar esse consentimento.

Ouvidos os Requerentes, apelaram ao superior interesse da criança, vincando a vinculação afetiva estabelecida e consolidada da menor junto dos Requerentes.

Foi proferida sentença julgando a ação totalmente improcedente. Dela consta, designadamente, o seguinte:
«Ora, no presente caso, verifica-se que a menor, através de medida de promoção e protecção, não foi confiada a pessoa seleccionada para a adopção, mas a pessoa idónea, pelo que se afigura necessário o consentimento dos progenitores para a adopção da menor.
No caso sub judice, a mãe prestou o consentimento mas o pai não, sendo muito claro que só o faria se pudesse continuar a conviver com a sua filha, o que como se viu, não é legalmente permitido.
É certo que no âmbito deste processo existiu grave dificuldade em voltar a ouvir o progenitor, mas tal não significa que o tribunal possa dispensar o seu consentimento dado que o mesmo já se havia pronunciado expressamente, perante tribunal, em sentido contrário.
Assim se conclui que não se encontram reunidos os pressupostos necessários para ser considerada a adopção da menor, afigurando-se inútil proceder às restantes diligências previstas no artigo 54.º, n.º 1, do Regime Jurídico da Adopção, por força do disposto no artigo 130.º do NCPC ex vi artigo 33.º do RGPTC.»

Inconformados, os Requerentes apresentaram-se a recorrer, pugnando pela revogação da decisão recorrida, a substituir por outra que decrete o prosseguimento dos autos. Concluem a sua alegação de recurso nos seguintes termos:
«I - Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos em referência que julgou a ação improcedente por não provada e, consequentemente, não decretou a adoção plena da menor (…).
II - Salvo melhor entendimento, a douta decisão recorrida violou por falta de fundamentação e erro de interpretação e /ou aplicação, entre outras, as normas dos 3º, 54º, 55º e 56º do Regime Jurídico do Processo de Adoção, o artigo 1981º do Código Civil e o artigo 3º do atual CPC, pelo que deve ser revogada.
III - A decisão ora recorrida foi prematura, antes deveria o Tribunal a quo e, bem assim, o Ministério Público, de ter tomado em os princípios orientadores em matéria de adoção, constantes do artigo 3º do referido RJPA, conjugados com os demais elementos de facto do processo.
IV - Desse modo, e previamente à prolação de decisão final, impunha-se ao Tribunal a quo que desse seguimento aos autos, nos termos do artigo 54º do RJPA, determinando a audição da menor e do progenitor, por forma a ser obtida a sua atual posição sobre o futuro da criança, prestando ou não, de forma inequívoca, o respetivo consentimento, perante a MM Juiz titular do processo e no Tribunal onde o mesmo corre termos, desconsiderando-se a posição por este manifestada há praticamente 20 meses atrás, em 7/9/2016.
V - De facto, resultando por demais evidente nos autos a instabilidade socioeconómica deste progenitor, ao qual são referenciadas 6 moradas em 6 localidades diferentes, desde que o presente processo teve o seu início, sensato seria confirmar a atual vontade / consentimento do progenitor sobre a adoção, sem se partir à priori do pressuposto de que a posição do progenitor seria a mesma que havia comunicado no Tribunal de Loures, há quase dois anos a esta parte, em 7/09/2016.
VI - Ao ordenar e insistir pela efetiva comparência do progenitor para efeitos de prestar o respetivo consentimento, não estaria o Tribunal a quo a ordenar a prática de atos inúteis, ao contrário do propugnado na douta decisão sob recurso,
VII - Ao invés, estaria o Tribunal a quo a materializar aquilo que é o superior interesse da criança nestes autos, executando os princípios basilares que norteiam o mesmo, designadamente, os princípios da audição obrigatória da criança, da cooperação e do primado da continuidade das relações psicológicas profundas.
VIII - Pois sempre poderiam ser repetidos os mandados de detenção e condução do progenitor ao Tribunal, ou averiguadas as causas do não cumprimento dos referidos mandados, ou mesmo a atual morada do progenitor.
IX - Por outro lado, mesmo que assim não se entenda, de acordo com o princípio da obrigatoriedade de informação, aos recorrentes haveria que ter sido prestada informação quanto ao teor do artigo 55º do RJPA, informando-os de que poderiam requerer a dispensa do consentimento do progenitor, seguindo o processo os seus termos para apuramento dos pressupostos de que depende a dispensa deste consentimento, porquanto tal possibilidade não poderia ser descartada uma vez que
X - O processo de adoção não foi precedido da aplicação da medida de confiança com vista a futura adoção, mas sim da medida de confiança a pessoa idónea.»

O M.º P.º, em sede de contra-alegações, pugna pela manutenção da decisão recorrida, alinhando as seguintes conclusões:
«1 - Os Recorrentes vieram interpor recurso de Apelação da douta decisão judicial, datada de 09.04.2018, que julgou improcedente, por não provada, a acção de adopção, não decretando a adopção plena da menor (…), nascida em 09-06-2006.
2 - A douta sentença proferida não decretou a adopção por falta de consentimento para a mesma, da parte do progenitor, inexistindo motivos para a dispensa de consentimento.
3 - No âmbito das suas Alegações, os Recorrentes põem em crise o mérito da douta decisão, defendendo, em síntese, que a douta sentença proferida não teve em consideração os princípios consagrados no artigo 3.º do Regime Jurídico da Adopção, no que respeita à audição da menor, a qual não foi determinada e ainda a nova audição do progenitor, o qual já havia aliás sido ouvido e não deu o consentimento para a adopção, mediante nova emissão de mandados de condução.
4 - O vínculo de adopção plena, para que possa constituir-se, além da verificação dos princípios atinentes à adopção e à salvaguarda do superior interesse da criança, exige o preenchimento de requisitos gerais e especiais.
5 - Os requisitos gerais para o decretamento da adopção são os enunciados no artigo1974.º do Código Civil.
6 - Para além de tais requisitos gerais, a lei exige ainda requisitos especiais, quer quanto aos candidatos a adopção, elencados no artigo 1979.º do Código Civil, quer quanto aos adoptandos, referidos no artigo 1980.º do Código Civil e quer ainda quanto aos progenitores, exigindo o requisito especial do consentimento, ínsito no artigo 1981.º do mesmo diploma legal.
7 - No caso em apreciação, verifica-se, em concreto que os requerentes cumprem os requisitos previstos no artigo 1979.º do CC, têm a idade exigida e relativamente ao teor do artigo 1981.º do CC, estão reunidos os consentimentos dos adoptantes e da progenitora, mas não quanto ao progenitor.
8 - De acordo com o preceituado do artigo 1981.º do CC, a dispensa de consentimento dos progenitores só é possível em caso de aplicação da medida de promoção e protecção de confiança com vista à adopção, no âmbito de processo de promoção e protecção, privação das faculdades mentais do progenitor, grave dificuldade em ouvir o mesmo ou inibição do exercício das responsabilidades parentais.
9 - O progenitor, ouvido no âmbito do apenso de consentimento prévio para adopção, veio declarar expressamente opor-se à adopção da filha.
10 - No caso em apreço, falta pois o consentimento do progenitor da adoptanda para a adopção desta pelos requerentes e por outro lado, não se verificam nenhumas das circunstâncias passíveis de fundar a dispensa de consentimento para a adopção, o que em termos legais obsta à adopção da menor pelos requerentes, por não se encontrarem reunidos os requisitos legalmente exigidos para a adopção.
11 - A audição da criança, prevista no artigo 3.º, alínea c), do Regime Jurídico da Adopção, como o próprio normativo indica, é obrigatória “tendo em atenção a sua idade, grau de maturidade e capacidade de compreensão”.
12 - A audição da menor, que tem somente 11 anos, seria porém, a nosso ver e nesta fase processual da tramitação dos autos, prematura e inútil sem que se encontrassem reunidos os demais pressupostos necessários para a adopção e poderia inclusivamente criar na menor expectativas que iriam previsivelmente vir a ser goradas perante a não prestação de consentimento, pelo seu progenitor, o que não seria certamente do seu superior interesse.
13 - Assim sendo, havia efectivamente fundamentos de facto e de direito para ser proferida tal decisão, encontrando-se a mesma devidamente fundamentada.»

Assim, atentas as conclusões da alegação de recurso, que definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso[1], e bem assim as questões de conhecimento oficioso[2], são as seguintes as questões a decidir:
- da falta de fundamento e de oportunidade para a prolação de decisão de improcedência do pedido de adoção;
- da dispensa do consentimento do progenitor.


III – Fundamentos

A – Dados a considerar, documentados no processo

1 – (…) nasceu a 09-06-2006.
2 – É filha de (…) e de (…).
3 – A menor encontra-se a residir com os Recorrentes desde o ano e meio de idade.
4 – A menor foi confiada aos Recorrentes por decisão da Comissão de Protecção de Crianças e de Jovens de Monforte, que procedeu à aplicação da medida de promoção e protecção de confiança a pessoa idónea.
5 - Os Recorrentes exercem em conjunto as responsabilidades parentais, o que foi regulado em Tribunal.
6 – O Centro Distrital da Segurança Social de Portalegre deu início ao período de pré-adoção a 05/06/2017, o qual foi dado por concluído a 25/10/2017.
7 – A mãe da criança prestou o consentimento prévio para a adoção perante o tribunal a 22/06/2016, para a adoção da sua filha, o qual foi julgado válido.
8 – O pai da criança, ouvido em tribunal a 7/09/2016, afirmou que não prestava o seu consentimento, referindo que só aceitaria a adoção se a filha pudesse continuar a conviver consigo.
9 - Devidamente notificados, os Recorrentes vieram esclarecer que solicitaram ao Ministério Público a confiança judicial da menor com vista à adoção, processo que foi arquivado na sequência da entrada em vigor da Lei n.º 143/2015, de 8 de setembro, alegando-se que com a nova lei a ação de confiança judicial havia desaparecido, sendo aconselhados a desencadear o processo junto da segurança social.
10 – Assim fizeram os Recorrentes, vindo a ser proferida, a 02/06/2017, decisão de confiança administrativa da menor aos candidatos à adoção, ora Recorrentes.
11 – A equipa de adoção do Centro de Segurança Social de Portalegre emitiu parecer no sentido de que os adotantes reúnem condições para adotar a menor, exarando designadamente o seguinte:
«O tempo já decorrido indica que a relação de vinculação entre a (…) e esta família se revela de qualidade e é caraterizada por inequívocos laços de afetividade.
(…) e (…) são figuras de referência parental de (…), uma vez que são percecionados como pai e mãe. São quem garante a sua subsistência e bem-estar.
(…)
A (…) chama pai e mãe aos candidatos. A relação de vinculação é de qualidade gerando estabilidade emocional. Verifica-se que a (…) é uma criança feliz e apresenta-se de um modo geral estável e equilibrada.
A (…) faz parte integrante da família dos candidatos.
(…) a menina vive no agregado dos candidatos desde um ano e meio de idade e encontra-se emocionalmente estável e segura e a relação afetiva estabelecida é de qualidade idêntica à relação de filiação biológica.»
12 – O M.º P.º promoveu a audição do progenitor, invocando que «embora não tendo prestado o seu consentimento, mencionou a possibilidade de aceitar a adoção.»
13 – Designou-se data para o efeito.
14 – Não se realizou a diligência porque o progenitor, que não tinha reclamado a carta de notificação que lhe foi enviada para a morada constante nas bases de dados disponíveis nos serviços do Tribunal, não compareceu.
15 – O M.º P.º promoveu a designação de nova data, com notificação pessoal do progenitor por OPC junto da morada indicada na pesquisa da base de dados da segurança social.
16 – Enviado o ofício, o progenitor foi notificado para comparecer no Tribunal da data designada com vista a ser ouvido na qualidade de progenitor da menor.
17 – Não compareceu na diligência para que estava notificado.
18 – Não tendo justificado a falta, foram emitidos mandados de comparência sob custódia para assegurar a sua presença no Tribunal na data designada.
19 – Não foi conduzido a Tribunal por não ter sido localizado na área da sua residência.

B – O Direito

Nos termos do Regime Jurídico do Processo de Adoção (RJPA) aprovado pela Lei n.º 143/2015, de 8 de setembro, atento o estatuído no art. 3.º, «a intervenção em matéria de adoção obedece aos seguintes princípios orientadores:
a) Interesse superior da criança – em todas as decisões a proferir, no âmbito do processo de adoção, deve prevalecer o interesse superior da criança;
b) Obrigatoriedade de informação – a criança e os candidatos à adoção devem ser informados com precisão e clareza sobre os seus direitos, os objetivos da intervenção inerente ao processo e a forma como esta última se processa, bem como sobre as possíveis consequências de qualquer decisão que venha a ser tomada no âmbito do processo;
c) Audição obrigatória – a criança, tendo em atenção a sua idade, grau de maturidade e capacidade de compreensão, deve ser pessoalmente ouvida no âmbito do processo de adoção;
d) Participação – a criança, bem como os candidatos à adoção, têm o direito de participar nas decisões relativas à concretização do projeto adotivo;
e) Cooperação – todos os intervenientes no processo e, designadamente, as entidades com competência em matéria de adoção, bem como os candidatos à adoção, têm o dever de colaborar no sentido da boa decisão do processo;
f) Primado da continuidade das relações psicológicas profundas – a intervenção deve respeitar o direito da criança à preservação das relações afetivas estruturantes de grande significado e de referência para o seu saudável e harmónico desenvolvimento, devendo prevalecer as medidas que garantam a continuidade de uma vinculação securizante.»

São estes os princípios que, por imposição legal, hão de nortear todo o ato e intervenção levados a cabo no âmbito da adoção, designadamente aqueles que sejam desenvolvidos no processo de judicial de adoção, processo este de jurisdição voluntária (cfr. art. 31.º do RJPA) que constitui a fase final do processo de adoção (cfr. arts. 52.º e ss do RJPA).

Pese embora tais princípios orientadores não contemplem menção aos progenitores das crianças, o que por si só não deixa de ser significativo, certo é que o processo não prescinde da colaboração destes, cuidando de acautelar a sua posição. Assim, estabelece-se que as pessoas cujo consentimento a lei exija e não haja sido previamente prestado ou dispensado sejam ouvidas pelo juiz, com a presença do Ministério Público (cfr. art. 54.º, n.º 1, al. b), do RJPA). Entre essas pessoas constam os «pais do adotando, ainda que menores e mesmo que não exerçam as responsabilidades parentais, desde que não tenha havido medida de promoção e proteção de confiança com vista a futura adoção» – artigo 1981.º, n.º 1, al. c), do CC.

Mais se estabelece que «sempre que o processo de adoção não tiver sido precedido de aplicação de medida de confiança com vista a futura adoção, no âmbito de processo de promoção e proteção, a averiguação dos pressupostos da dispensa do consentimento dos pais do adotando ou das pessoas que o devam prestar em sua substituição, nos termos do artigo 1981.º do Código Civil, deve ser efetuada no próprio processo de adoção, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, ou dos adotantes, ouvido o Ministério Público.» – artigo 55.º, n.º 1, do RJPA.

No caso em apreço, o processo de adoção não foi precedido de aplicação de medida de confiança com vista a futura adoção. A progenitora da menor prestou o consentimento para a adoção. O progenitor, por seu turno, declarou fazer depender o consentimento da manutenção de relação de convívio com a menor; logo, o progenitor não prestou previamente consentimento para adoção.

Assim sendo, e os dados processuais documentam que assim é, importa atuar conforme estipulam os arts. 54.º e 55.º do RJPA, ouvindo-se obrigatoriamente o progenitor a não ser que, ainda que oficiosamente, se constate encontrarem-se reunidos os requisitos legais de que depende a dispensa do consentimento do mesmo progenitor.

Aliás, assim entendeu fazer a 1.ª Instância, com a promoção e concordância do M.º P.º, que assinalou a posição do progenitor que «embora não tenha prestado o seu consentimento, mencionou a possibilidade de aceitar a adoção».[3] Determinou, em conformidade, a realização de diligências várias para audição do progenitor.

Desenvolvidas essas diligências, não houve qualquer possibilidade de ouvir o progenitor, que não compareceu em Tribunal apesar de regular e pessoalmente notificado para o efeito. O que culminou com a decisão recorrida que (contrariamente ao entendimento que vinha propugnando, manifestado através das diligências encetadas com vista à audição do progenitor, no sentido de que a falta de consentimento prévio para a adoção implicava na obrigatoriedade de o ouvir neste processo ou de averiguar os pressupostos da dispensa do consentimento), veio a decretar que a prévia declaração do progenitor consubstanciava recusa do consentimento, o que inviabilizava irremediavelmente a pretensão adotiva dos Requerentes.

Decisão que não se acompanha e se impõe revogar.

Ora, nos termos do disposto no art. 1981.º, n.º 3, al. a) do CC, o tribunal pode dispensar o consentimento das pessoas que o deveriam prestar nos termos dos números anteriores, se estiverem privadas do uso das faculdades mentais ou se, por qualquer outra razão, houver grave dificuldade em as ouvir.

Conforme reconhecido na decisão recorrida, «no âmbito deste processo existiu grave dificuldade em voltar a ouvir o progenitor».[4] Atentas as diligências supra enunciadas, desenvolvidas no processo com vista à audição do progenitor da menor, que vieram a revelar-se infrutíferas, entorpecendo o regular processamento do processo de adoção, violando flagrantemente o dever de colaboração no sentido da boa decisão do processo de adoção relativo à sua filha, cujo interesse superior se impõe prevaleça (cfr. art. 3º, als. a) e e), do RJPA), cabe concluir ser de acompanhar a apreciação tecida em 1.ª Instância no sentido de existir grave dificuldade em ouvir o progenitor da menor.

Em face do exposto, por exercício oficioso das incumbências legais[5], sendo certo que os intervenientes processuais cuja auscultação se mostra viável se pronunciaram já sobre a questão[6], decide-se pela dispensa do consentimento do progenitor da menor (…).

Deverá o processo judicial de adoção prosseguir os seus regulares termos, observando-se designadamente o regime inserto no art. 54.º do RJPA, com exceção do versado na al. b) de tal disposição legal, julgando-se a causa, oportunamente, conforme for de direito.

Sem custas – art. 4.º, n.º 2, al. f), do RCP.

IV – DECISÃO

Nestes termos, decide-se pela procedência do recurso, em consequência do que se revoga a decisão recorrida, declarando-se a dispensa do consentimento para adoção de (…) por parte do seu progenitor (…), determinando-se o prosseguimento dos regulares termos do processo, observando-se designadamente o regime inserto no art. 54.º do RJPA, com exceção do versado na al. b) de tal disposição legal, julgando-se a causa, oportunamente, conforme for de direito.
Sem custas.
Évora, 28 de Junho de 2018
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
Maria Domingas Simões
Vítor Sequinho dos Santos
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[1] Cfr. arts. 637.º, n.º 2 e 639.º, n.º 1, do CPC.
[2] Cfr. art. 608.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi art. 663.º, n.º 2, do CPC.
[3] Cfr. vista de fls. 33.
[4] Cfr. fls. 53 vs.
[5] Cfr. arts. 55.º, n.º 1, do RJPA e 608.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, do CPC.
[6] Cfr. promoção do M.º P.º de fls. 47 vs. e alegações dos Recorrentes.