Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA JOÃO SOUSA E FARO | ||
Descritores: | PERSI CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE EXCEPÇÃO DILATÓRIA INOMINADA HERANÇA JACENTE | ||
Data do Acordão: | 05/08/2023 | ||
Votação: | DECISÃO SUMÁRIA | ||
Texto Integral: | S | ||
Sumário: | O regime do PERSI, constante do D.L. nº 227/2012, de 25-10 não é de aplicar à herança jacente do mutuário e, por conseguinte, o incumprimento do mesmo pela Instituição Bancária não se configura como obstativo ao prosseguimento da execução. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
Decisão Texto Integral: | 1. RELATÓRIO 1. PROMONTORIA MARS DESIGNATED ACTIVITY COMPANY instaurou execução para pagamento de quantia certa contra a Herança Jacente de AA, alegando, designadamente, para o justificar que mutuária faleceu em .../.../2013, no estado de divorciada, e sem ter disposto válida e eficazmente, no todo ou em parte, dos bens de que poderia dispor para depois da morte e que o seu único herdeiro – BB – repudiou à herança. Tendo o herdeiro legitimário repudiado, não sendo conhecidos quaisquer outros sucessores/herdeiros e não tendo ainda o Ministério Público intentado o processo previsto no art. 938.º do CPC, a herança encontra-se jacente.”. Em sede liminar, a exequente foi notificada para, em 10 dias, juntar aos autos PERSI, bem como os respetivos documentos comprovativos do envio das cartas em causa, designadamente registos postais e/ou respetivos avisos de receção. I. A ora Recorrente não se conforma com a douta decisão a quo quando, ao considerar procedente a excepção dilatória inominada de falta de integração no PERSI, julgou extinta a execução. II. A invocada excepção de que se socorre a douta sentença recorrida está, assim, irremediavelmente, limitada à integração automática e imperativa da herança no regime do PERSI. III. A definição legal de Cliente Bancário não é extensível à herança e/ou os herdeiros – esse alcance, que a douta sentença recorrida lhe atribui, extravasa flagrantemente o permitido por Lei. IV. A sujeição dos herdeiros no PERSI não está expressamente consagrada na lei, por opção do legislador. V. Dispondo os autos de elementos probatórios irrefutáveis que permitem concluir que a herança foi repudiada pelo único herdeiro da mutuária falecida em .../.../2014 – ou seja, muito antes do incumprimento do contrato de mútuo -, o Tribunal a quo não poderia ter ignorado o facto de a herança se manter jacente. VI. Ou seja, no caso dos presentes autos, não só não existiam herdeiros, como inexiste cabeça-de-casal da herança a quem pudesse ter sido comunicada a integração/extinção do PERSI. VII. Não tendo a herança jacente personalidade jurídica, nunca poderá ser considerada como sucessora de pessoa falecida e, por conseguinte, responsável nos termos do artigo 2071.º do Código Civil. VIII. A situação actual da herança (aberta, mas não aceite) não permite preencher um dos pressupostos do regime do PERSI, nomeadamente a qualidade de Cliente Bancário. IX. Como tal, os direitos e obrigações atribuídos ao Cliente Bancário não podem ser estendidos à herança, que não dispõe de personalidade jurídica. X. Sendo certo que as garantias previstas no artigo 18.º, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro estão asseguradas na medida da aceitação da herança, o que determinaria a aquisição de tais direitos e obrigações. XI. A execução não poderia ter sido extinta, por inexistir sentido, lógica e fundamento para a integração automática no regime do PERSI da situação sub judice, em virtude de a herança jacente não dispor de personalidade jurídica. XII. A douta decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que julgando não verificada a exceção dilatória inominada de incumprimento do PERSI, determine o prosseguimento dos autos. NESTES TERMOS E NOS DEMAIS DE DIREITO, que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, prosseguindo os autos de execução os seus ulteriores termos. Assim se fazendo a costumada e sã JUSTIÇA!
3. Considerando que a questão a decidir é simples passa-se a proferir, ao abrigo do disposto art.º 656º do CPC, decisão singular.
II. FUNDAMENTAÇÃO
5.1. No âmbito da sua actividade, a 28 de setembro de 2010, a Caixa Geral de Depósitos S.A., a quem o ora Exequente adquiriu os créditos, celebrou com AA um contrato de mútuo com hipoteca, na Conservatória do Registo Predial de Tomar, mediante o qual lhe concedeu um empréstimo no montante de € 80.900.00 (oitenta mil e novecentos euros), importância que nessa data lhe foi entregue e da qual se confessou logo devedora; 5.2. Para garantia do pagamento do capital mutuados, dos respectivos juros e despesas, a mutuária constituiu hipoteca, devidamente registada, sobre o prédio urbano sito na Rua ..., ..., freguesia ..., concelho de Tomar, inscrito na matriz sob o artigo ...24, descrito na Conservatória do Registo Predial de Tomar sob o número .... 5.3. 5.3. A mutuária AA faleceu em .../.../2013, no estado de divorciada, 5.4. O herdeiro legal da mutuária, seu filho, BB, repudiou a herança de sua mãe;
Como se viu, a execução foi movida contra a herança jacente da falecida mutuária.
O art.º 12.º, alínea a), do CPC, atribui personalidade judiciária à herança jacente, que assim se mostra susceptível de ser parte.
Como esclarece art.º2046º do Cód. Civil, herança jacente é a herança aberta, mas ainda não aceita nem declarada vaga para o Estado.
Tendo resultado provado que o sucessível chamado à herança da mutuária falecida, seu filho, a repudiou e não havendo notícia da existência de outros herdeiros que a tenham aceitado e bem assim, da propositura pelo Ministério Público de uma acção especial de liquidação da herança vaga em benefício do Estado, a qual visa pôr termo à situação de jacência da herança, a única conclusão a retirar é que tal situação de jacência da herança da falecida mutuária se mantém, desde o seu óbito, incólume.
E a questão que se coloca é, como dissemos, se o D.L. nº 272/2012, de 25 de Outubro que veio instituir o Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento, doravante designado por PERSI, é aplicável à herança jacente.
Como se sabe, tal regime é aplicável a todos os clientes bancários que se encontrem em mora no cumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito e da qual emerge “graves consequências para o cliente bancário e para o seu agregado familiar[1]”.
Por todo o exposto se decide revogar a decisão recorrida e determinar o prosseguimento da execução em apreço. |