Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
3962/16.2T8PRT.E1
Relator: SÍLVIO SOUSA
Descritores: DANOS NÃO PATRIMONIAIS
SOCIEDADE COMERCIAL
Data do Acordão: 02/14/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário:
É infundado e deduzido de forma dolosa (dolo eventual), o pedido de insolvência formulado pelo credor contra o devedor, como meio de coação ou pressão para conseguir o pagamento do seu crédito; sendo o processo de insolvência publicitado através do portal CITIUS e dos “serviços de informação financeira e avaliação de risco de empresas”, ainda que por poucos dias, o prestígio e credibilidade do devedor (sociedade comercial) foi colocado em causa, de forma grave, dano este não avaliável em dinheiro e a reparar a título de dano não patrimonial e não como “dano patrimonial indireto”.
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Évora:

BB, Lda., com sede na Zona Industrial do Cartaxo, lote …, CC, residente na rua …, Cartaxo, e DD, morador na avenida …, nº …-A, 1º esq., Cartaxo, intentaram a presente ação declarativa, na forma de processo comum, contra EE - Lda., com sede na via …, Porto, pedindo, nomeadamente, a sua condenação no pagamento das importâncias de €100.000,00 e €125.000,00, à demandante sociedade, a título de reparação de danos patrimoniais e não patrimoniais, respetivamente, e €15.000,00 a cada um dos requerentes pessoas físicas, a título de compensação, por danos não patrimoniais, articulando factos (alegada dedução de pedido infundado de declaração de insolvência / artigo 22º. do CIRE) que, em seu critério, conduzem à sua procedência, a qual foi julgada parcialmente procedente, sendo, em consequência, a demandada condenada no pagamento das quantias de €60.000,00 à demandante pessoa coletiva - sendo €30.000,00 a título de indemnização por danos patrimoniais e outro tanto como compensação, por danos não patrimoniais, e € 15.000,00 a cada um dos requerentes pessoas singulares, a título de idêntica compensação.
Inconformada com o decidido, recorreu a demandada, com as seguintes conclusões[1]:
- sentença impugnada é nula, “nos termos gerais do artigo 195º nº 1 CPC, por violação dos artigos 155º e 607º nºs 3 primeira parte e nº 4 CPC” - “(…no essencial o dispositivo condenatório não está suportado em fundamentos de facto; em rigor o que foi especificado como provado foi o teor de artigos da Petição Inicial, mas não os prejuízos, já que aquele teor não corresponde a verdadeiros factos. O Tribunal não tem fundamentos para concluir que “(d)a matéria de facto atrás referida resulta claro terem existido danos de caráter patrimonial e não patrimonial”. Pelo contrário, a ausência dessa prova deveria ter conduzido à absolvição da R. dos pedidos. Nunca é demais repetir: os danos não se presumem, pois ou se deram em concreto, com uma certa medida, ou não se deram”);
- mesma sentença é, também, nula, “por expressa violação do disposto no nº 3 do artigo 566º do CPC[2] - “( …) pelo que temos de concluir que a Recorrida BB incumpriu o ónus de alegação e prova dos factos que alegou e, mal andou o Tribunal a quo ao substituir-se à Recorrida neste mesmo ónus, por intermédio (errado, diga-se desde já) da aplicação do disposto no nº 3 do artigo 566º do CPC)”;
- É, ainda, a mesma sentença nula, “(…) por falta de fundamentação do nexo causal nos termos do disposto no artigo 615º, nº 2 al. b) do CPC”- “(Apesar de termos que uma declaração de insolvência infundada é causa bastante para que existam danos na verdade tal não configura, per si, que os mesmos existam. E, como tal, a necessidade de alegação e prova, da determinação do nexo causal que suporta os danos que, efetivamente, possam ter ocorrido, não pode assentar em critérios de “tabua rasa” sobre os ditames da lei, máxime do instituto da responsabilidade civil”);
- É, também, a mesma sentença, “na parte do julgamento da matéria de facto”, nula, por omissão de pronúncia, “por força do artigo 615º nº 2 als. c) e d) CPC” - “ (Tribunal a quo, aceitou sem reservas, factos provados e considerou outros como não provados, sem ter feito a devida valoração da prova testemunhal da Recorrente, pois que caso assim fosse, tais factos teriam que ser considerados provados (….), pelo que existe omissão de pronúncia e, consequentemente, a sentença é nula na parte do julgamento da matéria de facto (…)”);
- Os pontos 15, 21, 22, 24, 26, 28, 29, 30, 42, 43, 44, 46, 50, 51, 52, 53, 54, 55 e 56 dos factos provados encontram-se mal jugados;
- Estes pontos deveriam ter obtido respostas de provados;
- Os pontos 44, 48 e 49 da petição inicial, 58, 59, 60, 66 e 68 da contestação dos factos não provados encontram-se, também, mal julgados;
- Estes pontos deveriam ter recebido respostas de provados;
- A requerida modificação da matéria de facto fundamentam-se nos elementos probatórios indicados;
- Ocorreu um erro na aplicação do direito aos factos apurados.

Contra-alegaram os recorridos, votando pela manutenção da sentença impugnada.


O recurso tem por objeto as seguintes questões: a) a alegada nulidade da sentença; b) o invocado erro na apreciação da prova, que determine a alteração da matéria de facto constante dos pontos 15, 21, 22, 24, 26, 28, 29, 30, 42, 43, 44, 46, 50, 51, 52, 53, 54, 55 e 56 dos factos provados e 44, 48, 49 da petição inicial, 58, 59, 60, 66 e 68 da contestação dos factos não provados; c) o alegado erro na aplicação do direito aos factos apurados.


Foram colhidos os vistos legais.

Fundamentação

A-Factos
Na sentença impugnada, foram considerados os seguintes factos:
1 - A Autora BB, Lda. é uma sociedade comercial cujo objeto é a fabricação e comercialização de alimentos compostos para animais, cereais e seus derivados, subprodutos animais e vegetais, importação e exportação;
2 - Os Autores CC e DD são sócios e gerentes da BB, Lda., desde a data da sua constituição, em 1995;
3 - A Ré EE, Lda. dedica-se ao comércio de automóveis e acessórios;
4 - A Autora BB, Lda. e a Ré EE, Lda. mantiveram, durante anos, relações comerciais, que decorreram com normalidade;
5 - Até que, no dia 28 de fevereiro de 2013, a Autora BB, Lda. é informada por Ana C…, funcionária da Caixa Geral de Depósitos, balcão de empresas de Santarém, que havia sido requerida a sua insolvência, pela empresa EE, Lda., ora Ré, conforme consulta pública da distribuição de processos no portal Citius e através do alerta dos serviços de informação financeira e avaliação de risco de empresas;
6 - Tendo a Autora BB, Lda. sido absolutamente surpreendida com tal situação;
7 - Que confirmou, mediante o acesso à pauta pública do portal Citius, onde detetou que ao processo de insolvência foi atribuído o nº 533/13.1TBSTR, do 2º juízo do Tribunal Judicial de Santarém;
8 - A Ré EE, Lda. requereu a declaração de insolvência da sociedade comercial BB, Lda., ora Autora, no dia 26 de fevereiro de 2013, pelas 17 horas e 35 minutos, tendo a referida ação sido autuada no dia seguinte;
9 - O pedido formulado pela Ré EE, Lda. deu origem ao processo nº 523/13.1 TBSTR, que correu termos no Tribunal Judicial de Santarém, 2º juízo;
10 - A Ré EE, Lda., no mesmo dia 28 de fevereiro de 2013, que foi contactada pela Autora BB, Lda., veio apresentar requerimento de desistência da instância, isto sem que esta conhecesse sequer o conteúdo da petição inicial;
11- Tendo, na mesma data (28 de fevereiro de 2013) sido entregues pela Autora BB, Lda. diversos cheques, para pagamento da conta corrente, que mantinha em aberto com a Ré EE, Lda.,
12 - A Autora BB, Lda. emitiu os seguintes cheques: cheque nº 8522754222, no valor de €3.176,02; cheque nº 8322754233, no valor de €3.150,00; cheque nº 8122754244, no valor de €3.150,00; cheque nº792275455, no valor de €3.150,00; cheque nº7722754266, no valor de €3.150,00; cheque nº4122754270, no valor de €3.150,00; cheque nº3922754281, no valor de €3.150,00; cheque nº3722754292, no valor de €3.150,00; cheque nº3522754303, no valor de €3.150,00; cheque nº3322754314, no valor de €3.150,00; cheque nº3122754325, no valor de €3.150,00; cheque nº2922754336, no valor de €3.150,00;
13 - O valor entregue, indicado pela Ré EE, Lda., englobaria o valor da conta corrente e o valor dos juros;
14 - A Ré EE, Lda. fundou o pedido de declaração de insolvência da Autora BB, Lda., nos termos e fundamentos que infra se passa a descrever, juntando os documentos que titularam os créditos da ora Ré:
“ Da identificação das partes
1.
A ora participante é uma sociedade comercial dedicada ao comércio e reparação de veículos automóveis.
2.
A requerida, por sua vez, tem por objeto social o fabrico de alimentos para animais de criação (exceto para aquicultura).

II - Da situação de insolvência
A - Dívidas para com a requerente
3.
No exercício da sua atividade, a Requerente forneceu à requerida, mediante pedido e no interesse desta, diversos produtos por si comercializados e destinados a serem utlizados pela requerida no âmbito do seu regular funcionamento.
4.
Em consequência dos referidos fornecimentos a requerente emitiu e entregou à requerida as faturas adiante discriminadas, que se juntam como Docs. nº 1 a 31 e aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais.
5.
Nas datas dos respetivos vencimentos e já na posse de toda a mercadoria, a requerida não procedeu, como deveria, ao pagamento das faturas supra identificadas;
6.
Totaliza, assim, a dívida da requerida à requerente o montante de €33.886,57 de capital (trinta e três mil oitocentos e oitenta e seis euros e cinquenta e sete cêntimos).
7.
A requerente promoveu diversas diligências no sentido de receber a quantia supra referida, alertando para o facto de a dívida se estar a avolumar, até que cessou os fornecimentos (Doc. nº 32 e 33).
8.
Nunca a ora requerente obteve qualquer resposta às suas solicitações.
9.
Por outro lado, atento o valor elevado do débito da sociedade ora requerida, a requerente promoveu igualmente diligências para indagar sobre a situação económica e financeira e patrimonial daquela empresa e da possibilidade de esta vir realizar o pagamento.
10.
Embora o estabelecimento comercial da requerida se mantenha em funcionamento, esgotou a requerente todas as vias negociais para receber o seu crédito;
11.
E não obstante todos os contactos efetuados pela requerente no sentido de continuarem a ser efetuados pagamentos parciais pela requerida, não recebeu esta qualquer quantia, nem qualquer resposta.
12.
Ora, não tendo a requerida pago as faturas mencionadas no art. 4º antecedente na data do seu vencimento, constituiu-se a mesma em mora nos termos do disposto no art. 805º., nº 2 a) do C. Civil.
13.
À data da presente ação encontram-se vencidos juros de mora, contados às taxas legais comerciais aplicáveis (9,50%, 8,00%, 8,00%, 8,00% e 8,25%) desde a data do seu vencimento, no valor de €4.409,59 (quatro mil quatrocentos e nove Euros e cinquenta e nove cêntimos).
14.
É, assim, de €38.296,16 (trinta e oito mil duzentos e noventa e seis Euros e dezasseis cêntimos) o valor total que a requerida deve à requerente;
15.
Desconhece a requerente a existência de bens imóveis ou móveis sujeitos a registo na titularidade da requerida.
16.
Verifica-se, assim, que o património da requerida é manifestamente insuficiente, senão mesmo inexistente, para fazer face às obrigações assumidas perante a requerente.

B - Dívidas para com terceiros
17.
Sabe a requerente que a requerida contraiu outras dívidas para com terceiras entidades, as quais originaram já ações judiciais competentes (3 ações judiciais registadas) e nomeadamente as contantes do documento que ora se junta como Doc.34 e que aqui se dá por integralmente reproduzido.
18.
Fica, pois, claro que a requerida não irá cumprir as suas obrigações para com a requerente atento o montante atualmente em dívida.

III - O Direito
19.
Dos factos descritos no presente articulado quanto às tentativas infrutíferas de acordar o pagamento da divida da requerida para com a requerente, bem como da ausência de bens suscetíveis de assegurar a dívida da requerida, apenas se pode concluir que esta se encontra em situação de insolvência.
20.
Já que está objetivamente impossibilitada de cumprir as suas obrigações vencidas, algumas há quase quatro anos.
21.
Nos termos do artigo 3º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), ”é considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas”.
22.
O presente tribunal é competente para apreciar e decidir a presente ação de insolvência (cfr. artigo 7º., nº 1, CIRE).
23.
A ora requerente tem legitimidade para requerer a declaração de insolvência da requerida (cf. artigo 20º., nº 1 CIRE).
24.
No caso vertente, o presente pedido de declaração de insolvência assenta, pelo menos, nos pressupostos que constam do artigo 20º., nº1, als. a) e b) do CIRE.
25.
Os factos conhecidos parecem demonstrar de forma clara que a requerida deixou de cumprir as suas obrigações, sendo que o montante dos créditos assinalados, pelo seu volume e importância, revela a impossibilidade de aquela estar em condições de poder satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações (…).
15 - A Ré EE, Lda. conhecia a Autora BB, Lda. e sabia que não se tratava de uma empresa insolvente ou em risco de insolvência;
16 - Na sua petição inicial, a Ré EE, Lda. faz um relato do seu crédito e refere que “e não obstante todos os contactos efetuados pela requerente no sentido de continuarem a ser efetuados pagamentos parciais pela requerida, não recebeu esta qualquer quantia, nem qualquer resposta”;
17 - Por outro lado, em 15 do mesmo documento, a Ré EE, Lda. refere que desconhece a existência de bens imóveis ou móveis sujeitos a registo na titularidade da requerida;
18 - Concluindo que “o património da requerida é manifestamente insuficiente, senão mesmo inexistente, para fazer face às obrigações assumidas perante a requerente”;
19 - Refere a Ré EE, Lda. no seu pedido de insolvência da Autora BB, Lda.: “No caso vertente, o presente pedido de declaração de insolvência assenta, pelo menos, nos pressupostos que constam do artigo 20º., nº1, als. a) e b) do CIRE”;
20 - E que: “Os factos conhecidos parecem demonstrar de forma clara que a requerida deixou de cumprir as suas obrigações, sendo que o montante dos créditos assinalados, pelo seu volume e importância, revela a impossibilidade de aquela estar em condições de poder satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações”;
21- A Autora BB, Lda. é empresa muito conhecida pelos representantes da Ré EE, Lda. e designadamente dos seus comerciais, que sabem que se encontra em plena atividade, aumentando a cada dia a produtividade, nível de implementação no mercado, assim como a sua reputação comercial;
22 - Não existindo qualquer indício de decadência da empresa, seja por diminuição dos trabalhadores, seja por encerramento de instalações, seja, inclusivamente, pela ideia generalizada do mercado de que a empresa atravessava dificuldades;
23 - A Autora BB, Lda. mantinha em aberto com a Ré EE, Lda. uma conta corrente que rondava o valor de €30.000,00;
24 - Existindo desde há muito uma divergência no acerto da conta-corrente e que respeitava ao pagamento de uma fatura com o nº 76010230, emitida pela Ré EE, Lda., e referente à reparação de um veículo que lhe havia sido vendido, em retoma, pela Autora BB, Lda.;
25 - Em dezembro de 2008, a Autora BB, Lda. entregou para retoma, na aquisição de um veículo novo, a viatura de matrícula …-…-VG;
26 - Tendo a Ré EE, Lda. vindo a emitir a supra descrita fatura, numa altura em que o veículo já lhe pertencia e sem que tivesse sido acordado entre as empresas que a reparação seria feita a expensas da Autora BB, Lda., uma vez que o negócio da Ré EE, Lda. é a compra e venda de veículos, não faria sentido que após a aquisição onerasse a Autora BB, Lda. com o pagamento de uma reparação;
27 - A Ré EE, Lda. interpelou a Autora BB, Lda., conforme os documentos juntos a folhas 313, 314 e 363;
28 - A Autora BB, Lda. deu, por várias vezes a conhecer à Ré EE, Lda. que o pagamento da conta corrente só iria ocorrer, após esta correção e eliminação da dita fatura 7600230, no valor de €3.262,20;
29 - A Ré EE, Lda. conhecia a Autora BB, Lda. e sabia que esta jamais tinha negado o pagamento;
30 - A verdade é que a Ré EE, Lda. tão pouco diligenciou para obter qualquer informação, relativamente ao património da Autora BB, Lda.;
31 - A Ré EE, Lda. alegou a existência de 3 ações judiciais (nenhuma delas correspondente a processo executivo), cujo valor global seria de €8.724,29;
32 - E que segundo o documento que junta, retirado da base de dados de serviços de informação financeira, refere uma ação proposta contra a Autora BB, Lda., no ano de 201º, e duas no ano de 2011, nenhuma com caráter executivo;
33 - A Ré EE, Lda. assenta o pedido de insolvência formulado contra a Autora BB, Lda. no referido no seu artigo 20º., que se passa a citar “Já que está objetivamente impossibilitada de cumprir as suas obrigações vencidas, algumas há quase quatro anos”;
34 - Referindo-se às ações judiciais pendentes para justificar tal alegação, que como já se indicou tratava-se de ações de reduzido valor;
35 - A Autora BB, Lda. é dona o imóvel onde se encontra a sua unidade fabril, sobre a qual não incide qualquer ónus ou encargo;
36 - Assim como imobilizado sobre o qual não incidia qualquer ónus ou encargo, entre o que se contam diversos veículos automóveis, ligeiros e pesados;
37 - Assim como um quadro de pessoal composto por cerca de 30 trabalhadores;
38 - A empresa sempre gozou de boa reputação junto dos seus trabalhadores, oferecendo-lhes confiança e segurança quanto ao seu posto de trabalho;
39 - Assim como junto dos seus fornecedores e instituições bancárias;
40 - O pedido de insolvência deduzido pela Ré EE, Lda. obrigou a Autora BB, Lda. a explicar-se junto dos bancos, fornecedores, seguradoras de crédito e clientes, pondo em causa a confiança dos fornecedores, do mercado e das entidades bancárias;
41 - É do conhecimento geral e dispensa alegação que o mero rumor de que sobre alguém recaiu um pedido de insolvência é, por si só, suscetível de afetar as relações com a banca;
42 - A imagem comercial da Autora BB, Lda. sofreu também um profundo golpe, tendo a situação sido aproveitada pela concorrência do sector para ir transmitindo aos clientes da dita Autora e potenciais clientes que e a empresa se encontrava numa situação difícil e que não poderia assegurar os fornecimentos;
43 - Empresas concorrentes da Autora BB, Lda. chegaram a munir-se da informação constante das bases de dados de informação financeira, onde consta a existência de um pedido de insolvência e respetivo número de processo, para a exibirem aos clientes da mesma;
44 - Os vendedores da Autora BB, Lda. foram-se deparando com inúmeras dificuldades na prospeção de mercado, com a conclusão de contratos que se encontravam em vias de celebrar, passando meses a dar explicações do sucedido;
45 - A Autora BB, Lda. teve, inclusivamente, de socorrer-se de corretor de seguros que a acompanham na celebração e obtenção de seguros de crédito para contactar quer com empresas de seguros, quer com fornecedores para se justificar da situação;
46 - Um dos seus fornecedores, a empresa C…, com quem mantém relações comerciais, desde a sua constituição, impôs à Autora BB, Lda., após tomar conhecimento do pedido de insolvência, a liquidação total da conta-corrente para manter o fornecimento;
47 - O mercado onde atua a Autora BB, Lda. movimenta mutos milhões de euros e é extremamente sensível a qualquer questão relacionada com pedidos de insolvência ou PER;
48 - A Autora BB, Lda. teve de promover pela exibição a tais entidades do pedido de desistência da instância formulado pela Ré EE, Lda.;
49 - Reunindo com alguns dos seus maiores fornecedores para esclarecer a situação;
50 - Explicando aos funcionários que o pedido apresentado pela Ré EE, Lda. era absolutamente destituído de fundamento;
51- A dimensão dos danos não patrimoniais sofrido pela Autora BB, Lda. só poderá ser compreendido à luz do setor onde atua, que é o comércio de alimentos para animais, e no qual a quase totalidade das matérias primas é adquirida a multinacionais que atuam na importação de cereais vindos de todo o mundo e os prazos de pagamento são muito curtos e controlado ao dia;
52 - Trata-se de um mercado profundamente concorrencial, até no que à abordagem da clientela diz respeito, sendo essencial à manutenção das empresas no mercado, a perceção relativa à solvabilidade das mesmas;
53 - O prestígio comercial da Autora BB, Lda. e de outros agentes do mercado passa pela capacidade da mesma gerar confiança por parte dos agentes com quem interage (fornecedores, clientes, banca e trabalhadores);
54 - O mero boato de que possa encontrar-se numa situação de insolvência é, por si, condicionador de tal confiança;
55 - No caso concreto, o boato concretizou-se no conhecimento público da existência de uma ação dessa natureza contra a Autora BB, Lda.;
56 - Os danos só não vieram a ser de maior relevo e passiveis de afetar toda a atividade da empresa, dado o relevo social da mesma e a confiança depositada pelos seus fornecedores, imagem construída ao longo dos anos de trabalho e de honra dos seus compromissos;
57 - O Autor CC passou inúmeras noites sem dormir, temendo o futuro da empresa;
58 - Assim como o Autor DD;
59 - Os Autores CC e DD são reputados como gente séria e de palavra.

Na mesma sentença, foram julgados não provados os seguintes factos, nomeadamente:
De petição inicial
44 - Ora, nenhuma das ações indicadas pela Ré tinha feito cair sobre a Autora qualquer obrigação de pagamento ou originado qualquer condenação.
48 - A Autora não tinha qualquer obrigação vencida aquando do pedido de insolvência da Ré.
49 (parte) - Sendo certo que não tinha nenhuma das enunciadas na petição inicial.

Da contestação
58 - Todas as faturas foram entregues à 1ª Autora e não mereceram qualquer oposição desta face aos serviços prestados pela Ré a pedido da 1ª Autora.
59 - A fatura nº 76010230, emitida em junho de 2009, foi alvo de retificação após conferência com a 1ª Autora, obtendo o valor final de €2.174,82.
60 - Todas as faturas que compunham a conta corrente da 1ª Autora e que se encontravam por liquidar, encontravam-se vencidas desde 2009 e 2011.
66 - A 1ª Autora recebeu e aceitou o teor de todas as faturas, pelo que reconheceu ser devedora das mesmas.
68 - Mediante consulta de informação empresarial da 1ª Autora, concretamente, se sobre a mesma impediam eventuais litígios em tribunal movidos por entidades terceiras.

B - O direito/jurisprudência/doutrina
Quanto à alegada nulidade da sentença
- “Não pode deixar de considerar-se taxativa a menção feita no art. 668º (…) Desde que o artigo não insere as palavras “entre outras” ou “além de outras” ou palavras semelhantes que imprimam à enumeração caráter exemplificativo, tem de entender-se que a sentença do tribunal singular só é nula quando se verifique algum dos casos previstos no artigo” [3];
- Os vícios que geram a nulidade de uma sentença são, nomeadamente, os seguintes: ausência total de fundamentos de direito e de facto (falta de motivação); contradição entre os fundamentos e a decisão; omissão de pronúncia, pronúncia indevida; condenação ilegal[4];
- “Ao juiz cabe especificar os fundamentos de facto e de direito da decisão (…). Há nulidade (no sentido lato de invalidade, usado pela lei) quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos de facto ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão” [5];
- Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é de espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao rico de ser revoada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade” [6];
- O juiz deve “(…) conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (…); assim, “(…) o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença, que as partes hajam invocado” [7];
-“Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta pra determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que seja a juridicamente correta, a nulidade verifica-se” [8].

Quanto o invocado erro na apreciação da prova, que determine a alteração da matéria de facto constante dos pontos 15, 21, 22, 24, 26, 28, 29, 30, 42, 43, 44, 46, 50, 51, 52, 53, 54, 55 e 56 dos factos provados e 44, 48, 49 da petição inicial, 58, 59, 60, 66 e 68 da contestação dos factos não provados
- “A prova, no processo, pode (…) definir-se como a atividade tendente a criar no espírito do juiz a convicção (certeza subjetiva) da realidade de um facto. Para que haja prova é essencial esse grau especial de convicção, traduzido na certeza subjetiva[9];
- “Se o juiz fica em dúvida sobre determinado facto, por não saber se ele ocorreu ou não, o non liquet do julgador converte-se, na sequência da diretiva traçada pelo nº 1 do artigo 8º. do Código Civil, num liquet contra a parte a quem incumbe o ónus da prova do facto” [10];
- “A quem invoca um direito em juízo incumbe fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado, quer o facto seja positivo, quer negativo. À parte contrária compete provar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse direito” [11];
- “A reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem de ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância pois só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição; para que o segundo grau reaprecie a prova, não basta a alegação por banda dos recorrentes em sede de recurso de apelação que houve erro manifesto de julgamento e por deficiência na apreciação da matéria de facto devendo ser indicados quais os pontos de facto que no seu entender mereciam resposta diversa, bem como quais os elementos de prova que no seu entendimento levariam à alteração daquela resposta” [12];
-“No uso dos poderes relativos à alteração da matéria de facto (…), a Relação deverá formar e fazer refletir na decisão a sua própria convicção, na plena aplicação e uso do princípio da livre apreciação das provas, nos mesmos termos em que o deve fazer a 1ª instância, sem que se lhe imponha qualquer limitação, relacionada com convicção que serviu de base à decisão impugnada, em função do princípio da imediação da prova” [13];
- A Relação deve alterar a decisão proferida sobre pontos concretos da matéria de facto, indicados pelo recorrente, se os factos não impugnados, a prova produzida, a indicar, também, pelo recorrente, ou documento superveniente, impuserem decisão diversa da recorrida e com o conteúdo requerido[14].

Quanto ao invocado erro na aplicação do direito aos factos apurados
- Incorre em responsabilidade civil extracontratual, o credor que, dolosamente, deduza pedido infundado de insolvência do devedor[15];
- “1. A dedução de pedido de declaração de insolvência ou a apresentação à insolvência só devem ter lugar quando existam fundamentos para tal. 2. A dedução de pedido infundado de declaração de insolvência, ou de indevida apresentação por parte do devedor, gera responsabilidade civil pelos prejuízos causados ao devedor ou aos credores, mas apenas em caso de dolo. Assim, só existe a responsabilidade civil nele prevista, relativamente aos casos em que exista uma atuação dolosa, ainda que em qualquer das suas vertentes: direto, necessário ou eventual” [16];
- “O devedor não deve apresentar-se à insolvência apenas para obter alguma proteção perante os credores e estes não devem requerer a insolvência daquele apenas como meio de pressão para conseguirem o pagamento dos seus créditos” [17];
- “A responsabilidade prevista no artº. 22º, do CIRE, restringe-se aos casos de dolo e abrange tanto a dedução de pedido infundado de declaração de insolvência por parte de um credor como a apresentação indevida por parte do devedor. 2. Existirá dolo eventual se o resultado não foi diretamente querido nem previsto como consequência lateral necessária, mas se puder dizer que o agente o aceita na eventualidade de ele se vir a produzir, verificando-se, assim, uma sobreposição do seu interesse (em vista da obtenção de uma certa finalidade do atuar), ao desvalor do ilícito e suas consequências, ou, dito de outra forma, manifestando-se a sua indiferença pela realização do facto, a sua conformação com o risco de produção do resultado ilícito. 3. Demonstrando-se que a requerente/credora instaurou o processo de insolvência movida pelo único propósito de cobrar o seu alegado “crédito” sobre a devedora, não se coibindo de configurar quadro fatual, pelo menos, por aquela desconhecido e suscetível de “justificar” a instauração e o prosseguimento dos autos, mas contrário à realidade (dada a evidente solvência da sociedade requerida), não podemos deixar de concluir por atuação dolosa por parte da requerente, ante a deliberada sobreposição do seu interesse e a indiferença pela verificação das previsíveis consequências danosas, para a requerida, advindas da existência e publicitação dos autos de insolvência corporizando pretensão infundada de declaração de insolvência. 4. Provocando esse pedido infundado de insolvência danos ao devedor, deve a requerente dessa insolvência indemnizar tais danos, nos termos dos arts. 22º, do CIRE, e 483º, nº 1do Código Civil.”[18];
-“1. As sociedades comerciais podem ser compensadas por danos não patrimoniais. 2. A sua natureza leva, no entanto, a que surjam especificidades. 3. Entre elas, a maior exigência, quanto à gravidade merecedora da tutela do direito do que a relativa às pessoas singulares” [19];
-“I - A responsabilidade civil a que alude o artigo 22º do CIRE não pode deixar de ter em conta qualquer das modalidades de dolo - direto, necessário e eventual. II - Não se verificando a situação legal enunciada no art. 3º do CIRE nem qualquer dos requisitos vazados no art. 20º do CIRE, não pode deixar de considerar-se infundado o pedido de declaração de insolvência. III - A declaração infundada do pedido de declaração de insolvência é geradora responsabilidade civil na modalidade de danos patrimoniais e não patrimoniais” [20];
- “IV - A ofensa ao bom nome e reputação de pessoa coletiva não releva apenas com dano patrimonial indireto, podendo também relevar como dano não patrimonial” [21];
-“ 1. A ofensa ao bom nome e reputação das pessoas coletivas não releva apenas com dano patrimonial indireto, refletido na diminuição da potencialidade de lucro, podendo relevar ainda enquanto dano não patrimonial. 2.- Nas pessoas coletivas, o bom nome apresenta uma densidade instrumental, funcionando como um elemento indispensável à prossecução dos seus fins. 4.- Se o ato ilícito puser em causa o prestígio e a credibilidade da pessoa coletiva a tal ponto que afete gravemente a sua capacidade de prossecução do seu fim e esse dano não for avaliável em dinheiro, aí sim, podemos falar num dano não patrimonial[22];
- “1.-Independentemente da questão de saber se as pessoas coletivas e, em particular, as sociedades comerciais, enquanto realidade técnico-jurídica, têm personalidade moral que possa ser atingida, é inequívoco que podem ser lesadas na sua boa imagem, no seu crédito comercial, reclamado como prestígio da sua atuação negocial perante o mercado dos seus clientes, na aquisição dos seus produtos ou na prestação dos seus serviços, que leva a estabelecer a ligação de tal realidade com os danos de natureza patrimonial, a indemnizar, porquanto toda a ofensa ao bom nome comercial acaba por se projetar num dano patrimonial, revelado pelo afastamento da clientela e na consequente frustração de vendas, a partir da repercussão negativa que à sociedade advém por causa da sua má imagem. 2.- A ofensa ao bom nome, reputação e imagem comercial de uma sociedade comercial apenas pode produzir um dano patrimonial indireto refletido na diminuição da potencialidade de lucro, não sendo, por isso, suscetível de indemnização por danos não patrimoniais” [23];
- “Os danos por sociedades comerciais em virtude da lesão do seu bom nome ou do seu crédito são indemnizáveis enquanto dano de natureza não patrimonial” [24];
- Em sede de responsabilidade civil extracontratual, são vários os pressupostos que condicionam a obrigação de indemnizar imposta ao lesante, a saber: facto objetivamente controlável ou dominável pela vontade (facto); violação de direitos de personalidade ou absolutos (ilicitude); censurabilidade do agente, por, sendo titular de discernimento e liberdade de determinação, ter agido de determinado modo, quando, face às circunstâncias concretas do caso, podia e devia ter agido de outro modo (imputação do facto ao lesante); prejuízo in natura que o lesado sofreu, com o consequente reflexo na sua situação patrimonial ou no campo dos valores de ordem moral (dano); aptidão abstrata e condicionalidade concreta entre o facto e o dano (nexo de causalidade entre o facto e o dano)[25].

C - Aplicação do direito aos factos

Quanto à alegada nulidade da sentença
Os vícios da sentença alegados pela recorrente EE, Lda. - “violação dos artigos 155º e 607º nºs 3 primeira parte e nº 4 CPC”; violação do disposto no nº 3 do artigo 566º do CPC”, digo, Código Civil; “falta de fundamentação do nexo causal nos termos do disposto no artigo 615º, nº 2 al. b) do CPC”; omissão de pronúncia, “na parte do julgamento da matéria de facto”, por violação do “ artigo 615º nº 2 als. c) e d) CPC”- não são suscetíveis de enquadramento na menção taxativa do artigo 615º., nº 1, b), c), 1ª parte, d) e e) do Código de Processo Civil.
Como tal, não geram a nulidade da sentença impugnada.
Eventualmente, podem afetar o seu valor doutrinal, com as inerentes consequências.
Assim sendo, improcede este segmento da apelação.

Quanto o invocado erro na apreciação da prova, que determine a alteração da matéria de facto constante dos pontos 15, 21, 22, 24, 26, 28, 29, 30, 42, 43, 44, 46, 50, 51, 52, 53, 54, 55 e 56 dos factos provados e 44, 48, 49 da petição inicial, 58, 59, 60, 66 e 68 da contestação dos factos não provados

Devendo a Relação “formar e fazer refletir na decisão a sua própria convicção, na plena aplicação e uso do princípio da livre apreciação das provas, nos mesmos termos em que o deve fazer a 1ª instância, sem que se lhe imponha qualquer limitação, relacionada com a convicção que serviu de base à decisão impugnada, em função do princípio da imediação da prova”, procedeu-se à audição do registo de todos os depoimentos prestados.
No essencial, é possível extrair dos mesmos as seguintes notas:
(…).
Não existem, pois, depoimentos contraditórios, sendo certo, ainda, que não se vislumbram motivos para questionar a credibilidade das testemunhas.
Face aos elementos probatórios antes mencionados, não infirmados, por sinal, pelos documentos juntos, tem esta Relação a seguinte “certeza subjetiva”:

Pontos 15, 21 e 22 dos factos provados
Tem a Relação a convicção da sua realidade.
Fundamenta-a, nos depoimentos das testemunhas Ricardo S…, Margarida M…, Ana M…, Domingos A… e José M….
São, pois, mantidas as respostas dadas, improcedendo, em consequência, a impugnação.

Pontos 24 e 26 dos factos provados
Improcede este segmento da impugnação, mantendo-se, em consequência, a matéria facto em causa.
A improcedência fundamenta-se nos depoimentos das testemunhas Margarida M… e Elsa C….

Ponto 28 dos factos provados
Não tem a Relação a “certeza subjetiva” deste facto.
Na verdade, o mesmo não foi mencionado nos depoimentos prestados, nomeadamente, do da testemunha Ricardo S….
Procede, assim, esta parte da impugnação, transitando esta matéria de facto para o rol dos factos não provados.

Ponto 29 dos factos provados
Improcede esta parte da impugnação.
Na verdade, a dívida nunca foi negada, pela BB, Lda., com decorre dos depoimentos das testemunhas Ricardo S… e Margarida M….
Mantém, pois, a Relação a resposta dada.

Ponto 30 dos factos provados
Tem a Relação a “certeza subjetiva” da realidade aqui mencionada,
Fundamenta-a, no depoimento da testemunha Ricardo S….
Improcede, pois, este segmento da apelação, com a consequente manutenção desta matéria de facto, no âmbito dos factos provados.

Pontos 42, 43 e 44 dos factos provados
Procede, parcialmente, esta parte da impugnação.
Efetivamente, com resulta dos depoimentos dos “comerciais” da BB, Lda. - as testemunhas Artur G… e Fernando I… - apenas alguns negócios atrasaram-se, em consequência do conhecimento da instauração do processo de insolvência, por parte de clientes.
Assim sendo, a resposta a estes pontos fica circunscrita a dificuldades na conclusão de contratos que se encontravam em vias de celebração.

Ponto 46 dos factos provados
Procede esta parte da impugnação.
Na verdade, o depoimento da testemunha António P… rejeita “a liquidação total da conta-corrente para manter o fornecimento”.
Assim sendo, esta matéria de facto é retirada do rol dos factos provados.

Ponto 50 dos factos provados
Improcede este segmento da impugnação.
Esta improcedência fundamenta-se nos depoimentos das testemunhas Artur G…, Fernando I…, Ana M… e Elsa C….
Mantém, por isso, a Relação a resposta dada.

Pontos 51, 52 e 53 dos factos provados
Estes pontos contemplam uma facticidade que não foi colocada às testemunhas inquiridas.
Procede, por isso, esta parte da apelação, transitando estes factos para o rol dos factos não provados.

Ponto 54 dos factos provados
Improcede este segmento da impugnação.
O fundamento desta improcedência decorre dos depoimentos das testemunhas Artur G…, Fernando I…, e Ana M….
É, pis, mantida a resposta dada.

Ponto 55 dos factos provados
Decorre dos depoimentos prestados que o conhecimento da instauração do processo de insolvência foi do conhecimento da banca que colaborava com a BB, Lda., de fornecedores e clientes seus e de alguma concorrência.
Procede, ainda que parcialmente, esta parte da impugnação., com as inerentes consequências.

Ponto 56 dos factos provados
A primeira parte dos factos vertidos neste ponto não foi colocada à consideração das testemunhas inquiridas, tendo esta Relação a “certeza subjetiva” de que a BB, Lda. tinha, a quando da instauração do processo de insolvência, relevo social, nela confiando os seus fornecedores.
Fundamenta-se esta circunstância no depoimento da testemunha Ricardo S….
Procede, parcialmente, este segmento da impugnação, com a consequente resposta restritiva.

Ponto 48 da petição inicial dos factos não provados
Procede este segmento da impugnação.
Na verdade, conforme decorre dos depoimentos das testemunhas Margarida M… e Ricardo S…, as dívidas da BB, Lda. que ocasionaram o pedido de insolvência, encontravam-se vencidas.
Por isso, a esta matéria de facto transita para o rol dos factos provados.

Pontos 44 e 49 (parte) da petição inicial dos factos não provados
A facticidade vertida nestes pontos não foi colocada às testemunhas inquiridas, sendo certo que não foi produzida prova documental.
Mantém, por isso, a Relação as respostas de não provado.

Ponto 60 da contestação dos fatos não provados
Esta matéria de facto foi já objeto de resposta no âmbito da resposta ao ponto 48 da petição inicial dos factos não provados.
Como tal, remete-se para o teor da resposta antes referida.

Pontos 58, 59 e 66 da contestação dos factos não provados
Procede, parcialmente, este segmento da impugnação, com exceção da fatura que foi objeto de retificação.
A procedência antes referida não só está em linha com anteriores respostas, como resulta, também, dos depoimentos das testemunhas Margarida M… e Ricardo S….
Adita-se, pois, matéria de facto em causa ao rol dos factos provados.

Ponto 68 da contestação dos factos não provados
Esta matéria de facto não foi contemplada nos depoimentos das testemunhas, nomeadamente, o da Ricardo S….
Improcede, assim, esta parte da impugnação, mantendo-se a resposta dada.

Quanto ao invocado erro na aplicação do direito aos factos apurados
A Ré EE, Lda., depois de, a propósito do pagamento da dívida a que aludem os autos, ameaçar, em finais de 2012, a Autora BB, Lda., com um “processo judicial e consequente penhora de bens” [26], optou, por, em princípios de 2013, requerer a insolvência desta.
Como é evidente o processo antes referido situou-se na mesma lógica: a de coação ou pressão, para conseguir o pagamento do seu crédito.
Sendo este o objetivo, é normal que a Ré EE, Lda., antevendo o pagamento imediato da dívida, que, no caso concreto, não podia deixar de acontecer - como aconteceu - não se tenha preocupado, antes de dar impulso à insolvência, em saber se se verificavam os apertados requisitos para tal exigidos, não obstante não ignorar os efeitos gravosos, em termos abstratos, para a requerida BB, Lda. de tal ação.
Conformou-se a dita demandada/recorrente com tais efeitos.
Esta circunstância, conjugada com a efetiva não verificação, no caso concreto, dos requisitos para a instauração de uma ação de insolvência, permite a esta Relação concluir, com segurança, que a Ré EE, Lda. deduziu, em fevereiro de 2013, de forma dolosa (dolo eventual), um pedido infundado de insolvência contra a Autora BB, Lda..
Provocando este pedido, incorreu a referenciada na obrigação de indemnizar os danos porventura causados à requerida, ora Autora, BB, Lda. - e apenas a esta -, nos termos do artigo 483º., nº 1 do Código Civil.
Sendo a credora da obrigação de indemnizar, somente, a sociedade ora Autora, é evidente que a ação terá de improceder, relativamente aos pedidos formulados pelos seus sócios, CC e DD.
Um dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual coincide com os prejuízos que a lesada BB, Lda. teria sofrido, em consequência da instauração do processo de insolvência.
Acontece que, apesar da aptidão abstrata da dita conduta da Ré EE, Lda. para causar danos patrimoniais à referida demandante/recorrida, a realidade que emergiu da discussão causa demonstra que assim não aconteceu.
Acontece, porém, que o bom nome e reputação da demandante/recorrida BB, Lda. não deixaram de ser colocados em causa, de forma grave, com a interposição, da dita da ação de insolvência, por parte da recorrente/ demandada EE, Lda., dano este não avaliável em dinheiro.
Na verdade, importa recordar que a mencionada interposição da ação de insolvência, constou, embora por poucos dias, do portal CITIUS e dos “serviços de informação financeira e avaliação de risco de empresas”, o que ofendeu a sua credibilidade e prestigio da BB, Lda..
Em causa um dano indemnizável de forma autónoma e não como “dano patrimonial indireto”.
É, pois, de subscrever a sentença impugnada, mas, apenas, na parte referente à compensação arbitrada à demandante/recorrida BB, Lda. pelos danos não patrimoniais, cujo montante - €30.000,00 - se afigura justo e adequado ao caso concreto.

Em síntese[27]: é infundado e deduzido de forma dolosa (dolo eventual), o pedido de insolvência formulado pelo credor contra o devedor, como meio de coação ou pressão para conseguir o pagamento do seu crédito; sendo o processo de insolvência publicitado através do portal CITIUS e dos “serviços de informação financeira e avaliação de risco de empresas”, ainda que por poucos dias, o prestígio e credibilidade do devedor (sociedade comercial) foi colocado em causa, de forma grave, dano este não avaliável em dinheiro e a reparar a título de dano não patrimonial e não como “dano patrimonial indireto”.

Decisão
Pelo exposto, decidem os Juízes desta Relação, julgando a apelação parcialmente procedente, revogar a sentença impugnada, na parte respeitante às indemnizações arbitradas aos demandantes CC e DD e BB, Lda., esta quanto à reparação dos danos patrimoniais, mantendo-a, na parte restante (compensação relativa aos danos não patrimoniais causados à sociedade comercial).
Custas pelas partes, tendo em atenção o seu decaimento.

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Évora, 14 de fevereiro de 2019
Sílvio José Teixeira de Sousa
Manuel António do Carmo Bargado
Albertina Maria Gomes Pedroso

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[1] Conclusões elaboradas por esta Relação, a partir das longas (57) e prolixas “conclusões” da recorrente.
[2] Verifica-se um lapso de escrita, quanto à referência ao diploma; a recorrente pretendeu escrever Código Civil.
[3] Prof. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 1984, págs. 137 e 138.
[4] Prof. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 1984, págs. 139 a 147, e artigo 615º., nº. 1, b), c), d), 1ª parte, e e) do mesmo diploma.
[5] José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, in Código de Processo Civil, vol. II, 2ª edição, pág. 703, e artigo 609º., nº 3 do mesmo diploma.
[6] Prof. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 1984, pág. 140.
[7] José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, in Código de Processo Civil, vol. II, 2ª edição, pág. 704, e artigo 608º., nº 2 do mesmo diploma.
[8] José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, in Código de Processo Civil Anotado, vol. II, 2ª edição, pág. 704.
[9] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 436.
[10] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 452, e artigo 342º., nºs 1 e 2 do Código Civil.
[11] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 552, e artigo 342º., nºs 1 e 2 do Código Civil.
[12] Acórdão do STJ, de 2 de dezembro de 2013 (processo nº 34/11.0 TBPNL.L1.S1), in www.dgsi.pt..
[13] Acórdão do STJ de 14 de fevereiro de 2012 (processo nº 6823/09.3 TBBRG.G1.S1.), in www.dgsi.pt. (no mesmo sentido, os acórdãos do STJ, de16 de outubro de 2012 (processo nº 649/04.2 TBPDL.L1.S1), 6 de julho de 2011 (processo nº 450/04.3 TCLRS.L1.S1), 6 de julho de 2011 (processo nº 645/05.2 TBVCD.P1.S1), 24 de maio de 2011 (processo nº 376/2002.E1.S1), 2 de março de 2001 (processo nº 1675/06.2 TBPRD.P1.S1), 16 de dezembro de 2010 (processo nº 2410/06.1 TBLLE.E1.S1) e 28 de maio de 2009 (processo nº 4303/05.0 TBTVD.S1), no mesmo sítio), e artigo 662º., nº 1 do Código de Processo Civil).
[14] Artigos 640º., nº 1 e 662º., nº 1 do Código de Processo Civil.
[15] Artigo 22º. do CIRE.
[16] Acórdão da Relação de Coimbra de 20 de março de 2018 (processo nº 2330/16.0 T8LRA.C1), in www.dgsi.pt..
[17] Alexandre de Soveral Martins, im Curso de Direito da Insolvência, 2015, pág. 75.
[18] Acórdão da Relação de Coimbra de 27 de janeiro de 2015 (processo nº 173/14.5 TBCVL-A.C1), in www.dgsi.pt..
[19] Acórdão do STJ de 9 de julho de 2014 (processo nº 366/12.0 TVLSB.L1.S1), in www.dgsi.pt..
[20] Acórdão da Relação de Coimbra de 19 fevereiro de 2013 (processo nº 1194/09.5 TBVNO.C1), in www.dgsi.pt..
[21] Acórdão da Relação de Lisboa de 12 de julho de 2018 (processo nº 672/13.6 TBSCR-G.L1.1), in www.dgsi.pt..
[22] Acórdão da Relação de Coimbra de 24 abril de 2017 (processo nº 289/14.8 T8FND.C1), in www.dgsi.pt..
[23] Acórdão da Relação de Coimbra de 24 de fevereiro de 2015 (processo nº 7825/08.7TBOER.C2), in www.dgsi.pt..
[24] Acórdão da Relação do Porto de 7 de julho de 2016 (processo nº 12/15.0 GAMCN.P1), in www.dgsi.pt..
[25] Artigo 483º., nºs 1 e 2 do Código Civil e Prof. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 3ª edição, págs. 417 e segs..
[26] Ponto 27 dos factos provados e fls. 314.
[27] Artigo 713º., nº7 do Código de Processo Civil.