Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2165/07.1TBPTM-F
Relator: SILVA RATO
Descritores: INCUMPRIMENTO DO REGIME DE VISITAS
RECUSA DE CUMPRIMENTO
Data do Acordão: 02/02/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recorrido: TRIBUNAL FAMÍLIA E MENORES DE PORTIMÃO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Área Temática: RESPONSABILIDADES PARENTAIS
Sumário:
1 - O incumprimento das responsabilidades parentais, quanto ao direito de visitas, só se verifica uma situação de incumprimento quando um dos progenitores, intencionalmente, materializa, grave e reiteradamente, uma situação de obstaculização do direito a visitas do outro progenitor, que permita imputar-lhe um efectivo juízo de censura
2 - Não se provando que a mãe é a responsabilidade pelo incumprimento do definido judicialmente quanto ao regime de visitas do seu progenitor, mas que são as menores, à data com 12 e 14 meses que se recusam a ver o pai o incidente de incumprimento terá que improceder.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
I. O Ministério Público em representação das menores L… e C… veio requerer contra A… o presente incidente de incumprimento.
O Ministério Público proferiu o parecer de fls. 187 e 188, no sentido da verificação do incumprimento.

Foi proferida sentença, em que se decidiu:
“Pelo exposto, julga-se extinta por inutilidade superveniente da instância quanto a L...
Julgam-se improcedentes as nulidades invocadas pela requerida.
Apesar de se considerar que o regime de visitas não tem estado a ser cumprido, não se responsabiliza a requerida por esse incumprimento.”

Inconformado, veio o Progenitor J… a interpor recurso de apelação, cujas alegações terminou com a formulação das seguintes conclusões:
A) “No caso concreto está dado como assente o incumprimento do acordo de exercício das responsabilidades parentais das menores, no que ao regime de visitas e estadias fixado concerne.
B) A ausência de visitas e estadias das menores ao pai ocorre desde 29.04.2010.
C) O exercício das responsabilidades parentais no que à gestão da vida corrente das menores concerne compete à mãe, requerida, com a qual se encontram a viver.
D) Foi dado como provado que as menores se recusam a visitar o pai e, que a irmã já maior manifesta desejo de não ter relação de proximidade com o pai, que até à maioridade e, desde 29.04.2010, se recusou a visitar.
E) A questão em apreço nos presentes autos de incumprimento prende-se única e exclusivamente com a existência ou não de visitas.
F) Está provada a ausência de visitas.
G) Atenta a matéria de facto fixada e, que consta da alínea b) e d) supra, mal andou o Tribunal "a quo" ao decidir como decidiu.
H) Além de ter sido dado como provado o incumprimento do acordo de regulação das responsabilidades parentais das menores, no que ao regime de visitas fixado concerne, em virtude da ausência das mesmas desde 29.04.2010, deveria a requerida ter sido considerada responsável pelo mesmo.
1) Mostrando-se provada a recusa da parte das menores em visitar o pai, estando estas a residir com a mãe a quem ficou incumbido o exercício das responsabilidades parentais no que concerne à gestão do quotidiano daquelas, recai sobre esta a obrigação de as educar no sentido de incentivar as mesmas ao convívio com o seu progenitor, o que não fez.
J) As menores não podem determinar a sua própria educação e pura e simplesmente dizer que não querem visitar o pai ou manifestar desejo de não o fazer e, tal desejo ser aceite e, consequentemente incentivado pelo progenitor com quem residem, ao não as incentivar ao contrário.
K) No caso concreto estão verificados todos os pressupostos de facto e de direito do incumprimento alegado e, de que requerida é responsável pelo mesmo por se ter abstido do seu papel de educadora quanto a esta questão específica.
L) Deveria o Tribunal "a quo" ter responsabilizado a requerida pelo incumprimento que deu como provado e, ordenado que a mesma contribui-se para a educação das filhas no sentido de as educar a conviver com o pai, no que à ainda menor concerne.
M) Fez-se errada aplicação do artigo 181 da O.T.M.
Termos em que e, nos demais de direito que V.Ex.a doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, e revogando-se a decisão recorrida deve condenar-se a requerida.
Com que se fará a costumada, JUSTIÇA

O M.º P.º deduziu alegações pugnando pela procedência do recurso.
Cumpre decidir.
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II. Em 1ª instância, foi dada como provada a seguinte matéria factual :
1. L… e C…, nasceram respectivamente em 24/05/1993 e em 12/12/1996 e são filhas de J… e de A….
2. Por acordo homologado por sentença proferida em 18/02/2009 e por despacho judicial proferido em 22/07/2010 nos autos de RRP n.º 2165/07.1TBPTM-B, que correu termos neste tribunal, foi regulado o exercício das responsabilidades parentais relativamente às referidas L… e C…, ficando estas a residir com a mãe, a quem compete o exercício daquelas responsabilidades, no que concerne à gestão do seu quotidiano.
3. Foi calendarizado um regime de visitas e estadias com o progenitor.
4. Desde 29/04/2010 que não ocorreram mais visitas entre o progenitor e as filhas.
5. A menor C… tem manifestado a intenção de não ver o pai.
6. A irmã L…, agora já maior de idade, manifesta não desejar relação de proximidade com o pai.
7. A requerida foi alvo de participação criminal por parte do requerido, tendo corrido inquérito na Procuradoria-geral Distrital de Évora, com o n.º 687/10.6TAABF, vindo a ser proferido despacho de arquivamento o qual consta de fls. 73 a 79 destes autos e que se dá por integralmente reproduzido.
8. A menor e a sua irmã L… têm hoje mais duas irmãs, filhas do seu pai e da actual esposa deste.
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III. Nos termos do disposto nos art.ºs 684º, n.º 3, e 690º, n.º 1, ambos do C.P.Civil, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n.º 2 do art.º 660º do mesmo Código.
A questão a decidir resume-se, pois, a saber se pode ser assacada culpa à Progenitora pelo incumprimento do regime de visitas ao Progenitor.

Como é jurisprudência dominante, a propósito da questão do incumprimento das responsabilidades parentais, quanto ao direito de visitas, só se verifica uma situação de incumprimento quando um dos progenitores, intencionalmente, materializa, grave e reiteradamente, uma situação de obstaculização do direito a visitas do outro progenitor, que permita imputar-lhe um efectivo juízo de censura (neste sentido vide Ac. do TRP de 30/01/2006 Ac. do TRP de 03/10/2006, AC. TRP de 07/04/2011, AC TRL 21.06.2007, AC TRL de 14/09/2010, AC TRG 06/01/2011 e AC TRC 27/11/2007, todos publicados no site da DGSI).
E para qualificar a situação em apreço no presente Incidente de Incumprimento, temos que nos ater à matéria dada como provada na 1ª Instância, que não foi impugnada pelas partes, deixando de lado as conjecturas que se possam fazer sobre a situação.
Resultou provado que o regime de visitas do progenitor às duas filhas do casal, foi interrompido a partir de 29/04/2010, manifestando as mesmas a vontade de não continuar o regime de visitas até então em vigor, chegando mesmo ao ponto, conforme está dado como provado, de não querer ter uma relação de proximidade com o seu progenitor.
E se as filhas do dissolvido casal, enquanto menores, devem obediência à mãe (n.º2, primeira parte, do art.º 1878º do Cód. Civ.), à guarda de quem estão confiadas _ e nesse sentido a mãe devia esforçar-se por implementar o regime de visitas judicialmente estabelecido _, não é de despiciendo que a mãe tenha atendido à posição das mesmas, dado que elas têm hoje 14 e 18 anos (n.º 1 do art.º 12º da Convenção Sobre os Direitos da Criança, ratificada pela Resolução da AR n.º 20/90 e alínea b), do art.º 3º da Convenção Europeia Sobre o Exercício dos Direitos da Criança, assinada por Portugal em 06/03/1997, n.º2, 2ª parte, do art.º 1878º do Cód. Civ.).
O que é certo, é que não se provou a verdadeira razão da interrupção do regime de visitas.
E era essa prova, e não conjecturas, que importava trazer ao processo.
Não estando provada matéria de facto que permita assacar à mãe da C… e da L… a responsabilidade pelo incumprimento do definido judicialmente quanto ao regime de visitas do seu progenitor, nos termos que acima balizámos, apenas nos resta confirmar a decisão sob recurso.
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IV. Decisão
Pelo acima exposto, decide-se pela improcedência do recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo Apelante.
Registe e notifique.
Évora, 02 de Fevereiro de 2012
(Silva Rato - Relator)
(Abrantes Mendes - 1º Adjunto) (dispensei o visto)
(Mata Ribeiro - 2º Adjunto) (dispensei o visto)