Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | LAURA GOULART MAURÍCIO | ||
Descritores: | REGIME DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO EXIGÊNCIAS DE PREVENÇÃO GERAL DEFESA DA ORDEM JURÍDICA E DA PAZ SOCIAL | ||
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Data do Acordão: | 07/12/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | I. O regime de permanência na habitação tem justamente por finalidade limitar o mais possível os efeitos criminógenos da privação total da liberdade, evitando ou, pelo menos, atenuando os efeitos perniciosos de uma curta detenção de cumprimento parcial ou continuado, nos casos em que não é possível renunciar à ideia de prevenção geral. II. Num caso como o dos autos, em que ao arguido já foram aplicadas penas de substituição, a execução em regime de permanência na habitação da pena de prisão aplicada não iria satisfazer a finalidade primordial de restabelecer a confiança comunitária na validade da norma violada e na eficácia do sistema jurídico-penal. III. Neste caso o efeito de sharp-short-shock da pena de prisão, mesmo que de curta duração, configura-se como única forma de convencer o agente da gravidade do crime praticado e mesmo de estabilizar as expectativas comunitárias na manutenção da validade da norma infringida (Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, p. 360 e 390 e segs.). | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora Relatório No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, – Juízo Local Criminal de Loulé – Juiz 3, no âmbito dos autos com o NUIPC nº1364/22.0GBLLE foi o arguido AA submetido a julgamento em Processo Abreviado. Após realização de audiência de discussão e julgamento, o Tribunal, por sentença de 16 de março de 2023, decidiu “julgar a acusação deduzida pelo Ministério Público procedente por provada e, em consequência, a) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido nos termos do artigo 3.º, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei 2/98, de 3 de janeiro, na pena de 1 ano e 2 meses de prisão.” * Inconformado com a decisão, o arguido interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões:1. O douto tribunal a quo decidiu que “… neste sentido, e neste momento, há que aplicar ao arguido uma pena privativa de liberdade.” 2. Esta ponderação e decisão é despropositada, desproporcional e, por isso, conduz a uma pena injusta, excessiva, inapropriada e ilegal. 3. Pois que: a. Não se asseguram as necessidades de prevenção geral, nem os seus critérios basilares e estruturantes. b. A segurança rodoviária não foi posta em causa… c. O Arguido interveio em acidente de viação, tão pouco violou o Código da Estrada, nem legislação ou disposição aplicável, à circulação rodoviária, na via pública. d. Não há razões de ciência ou fundamentos para a afirmação proferida, “… em particular, a segurança na circulação rodoviária, directamente afectada com a práctica deste tipo de ilícito – ainda para mais numa Comarca como a de Faro, onde a sua práctica é frequente - …”. e. Não há, facto ou indício que sustente a afirmação proferida. Por outro lado f. Também, não se asseguram as necessidades de prevenção especial, nem os seus critérios basilares e estruturantes. g. Não se especificam ou escalpelizam os fundamentos e razões para se optar pela pena privativa de liberdade, em atenção as - alegadas - necessidades de prevenção especial… h. O Arguido está inscrito e frequenta formação legal para obtenção do título que o habilite à condução de veículos a motor, na via pública, i. Quais foram as razões de ciência e os concretos fundamentos para a afirmação proferida, “… denotando que as referidas penas não surtiram o efeito dissuasor …”? j. Inexiste fundamentação, facto ou indício que sustente a afirmação proferida. Ao mesmo tempo 4. O douto tribunal a quo decidiu, também, que “… não podemos concluir senão que por meio da execução da pena em regime de permanência na habitação não se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão.” 5. Esta ponderação e decisão é despropositada, desproporcional e, por isso, conduz a uma pena injusta, por excessiva, inapropriada e ilegal. 6. Pois que: a) Estão asseguradas, nos Autos, “… a existência de condições mínimas compatíveis com a execução da pena de prisão em análise, em regime de permanência na habitação,…” b) E as reais necessidades de prevenção geral e especial, para assegurar a defesa da sociedade e de prevenir a práctica de crimes pelo Arguido!!! c) Estaria afastado da via pública, inibido de usar veículos a motor e permanecendo na sua habitação, já ficavam asseguradas, todas as preocupações e fins do processo penal, desta Sentença e do Tribunal a quo. d) A segurança rodoviária estaria salvaguardada, e) A defesa da sociedade e a confiança da comunidade, também… f) A reintegração e prevenção da reincidência do Arguido igualmente, por maioria de razão. g) Não se verificam razões de facto, do ponto de vista da comunidade (em geral) ou deste indivíduo (em particular) que aconselhem ou justifiquem a posição assumida e a decisão proferida. h) Não há razões de ciência e fundamentos para a afirmação proferida, “… Assim, apenas a execução da pena de 1 ano e 2 meses de prisão, em reclusão, é susceptível de assegurar a defesa da sociedade e de prevenir a práctica de crimes pelo arguido - …”. i) Não há, facto ou indício que sustente a afirmação proferida. Por outro lado j) Também não se asseguram as reais necessidades de prevenção especial, nem, tão pouco, os seus critérios basilares e estruturantes. k) Não se especificam ou escalpelizam os fundamentos e razões para se optar pela pena privativa de liberdade, em atenção as - alegadas – necessidades de prevenção especial … l) O Arguido está inscrito e frequenta formação legal para obtenção do título que o habilite à condução de veículos a motor, na via pública, que poderá concluir (com - hipotético - sucesso), antes da decisão deste Recurso… m) Quais foram as razões de ciência e os concretos fundamentos para a afirmação proferida, “… não podemos concluir senão que por meio da execução da pena em regime de permanência na habitação não se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão.”? n) Inexiste fundamentação, facto ou indício que sustente a afirmação proferida. o) O douto tribunal a quo não se deve conformar com um “mero” raciocínio silogístico e conclusões genéricas, vagas, teóricas e de “puro achismo”, p) Inferindo, das anteriores condutas, penas e reincidências, pela inaplicabilidade de uma pena não privativa da liberdade ou uma pena em regime de permanência na habitação … q) A liberdade, em geral, e sua privação, a um indivíduo concreto, em reclusão, em particular, não se pode compaginar com decisões levianas, pouco ponderadas e insuficientemente cautelosas, ou imprudentemente preocupadas com a reinserção social, recuperação individual e mobilização do Arguido para a sua ressocialização e integração comunitária, r) Prejudicando, senão impedindo, a possibilidade de uma praxis conforme o ordenamento jurídico em vigor e as melhores condutas sociais… s) Mais uma vez, o silogismo da ponderação e a consequente decisão está inquinada e é insustentável, derivando, numa pena excessiva, desproporcionada, injustificada e, a final, injusta e ilegal, por falta de fundamentação de facto e de direito Epilogando: 7. O tribunal a quo fundamenta, criando convicção de que decidiria, em sentido inverso e contrário, aplicando uma pena não privativa de liberdade, 8. O tribunal a quo fundamenta, criando convicção de que decidiria, em sentido inverso e contrário, aplicando uma pena em regime de permanência na habitação, 9. Por parcos, inconsistentes e insuficientes, os argumentos, fundamentos e raciocínios que ancoram a douta decisão ora em crise, 10. Se conclui pela necessidade de reparar a presente Sentença, revogando-a, e substituindo-a por outra, em que se opte pela aplicação de uma pena não privativa de liberdade ou pena em regime de permanência na habitação, 11. Assim proferindo decisão consentânea ao caso concreto e às necessidades de prevenção geral e especial. 12. Revertendo, por sustentada e em conformidade, não só com a “Lei”, como com o ordenamento jurídico em geral, a douta Decisão proferida, no que à aplicação do Direito se refere, relativamente à aplicação de uma pena não privativa de liberdade ou, subsidiariamente, uma pena privativa de liberdade em regime de permanência na habitação. Termos em que, nos melhores de direito e sempre com o Mui Douto Suprimento de V. Exas., I. Deve a douta sentença ser revogada, e substituído por outra, nos seguintes termos: a. Deverão V. Exas. Venerandos Desembargadores aplicar uma pena não privativa de liberdade ou, Ou, caso assim não se entenda, o que não se aceita, nem se admite, apenas se equaciona como hipótese de raciocínio, e subsidiariamente b. Deverão V. Exas. Venerandos Desembargadores aplicar uma pena privativa de liberdade em regime de permanência na habitação c. Pois que, V. Exas. Venerandos Desembargadores, revogando e revertendo, por sustentada e em conformidade, não só com a “Lei”, como com o ordenamento jurídico em geral, a douta Decisão proferida, no que à aplicação do Direito se refere, relativamente à aplicação de uma pena não privativa de liberdade ou, subsidiariamente, uma pena privativa de liberdade em regime de permanência na habitação, só assim farão a costumada e premiada JUSTIÇA! * O Ministério Público respondeu ao recurso interposto, pugnando pela respetiva improcedência e formulando as seguintes conclusões:1º – Somos de parecer que a douta sentença recorrida doseou equilibradamente a pena aplicada ao arguido. 2º - Nos presentes autos a aplicação de uma pena não privativa da liberdade não realiza de forma adequada as finalidades da punição, não sendo adequada às necessidades de prevenção geral e de ressocialização do arguido, impondo-se como tal a aplicação de uma pena de prisão para assegurar as finalidades das penas que no caso concreto se exige, pelo que andou bem em condenar o arguido nos moldes que o fez, não merecendo a sentença qualquer reparo. 3º - O tribunal a quo ponderou e explicou o motivo de ter afastado a aplicação do regime de permanência na habitação. Por tudo o exposto, deverá o recurso em apreciação improceder e confirmar-se a douta sentença. * No Tribunal da Relação o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso.* Foi cumprido o disposto no art.417º, nº2, do CPP, não tendo sido apresentada resposta.* Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos legais foram os autos à conferência.* FundamentaçãoDelimitação do objeto do recurso O âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, só sendo lícito ao Tribunal “ad quem” apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410º, nº2, do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (cfr. Ac. do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19/10/1995, DR I-A Série, de 28/12/1995 e artigos 403º, nº1 e 412º, nºs 1 e 2, ambos do CPP). São, pois, as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões da respetiva motivação que o Tribunal ad quem tem de apreciar. No caso sub judice o recorrente limita o recurso à espécie da pena aplicada e conclui que deverá ser a sentença revogada e substituída por outra que aplique uma pena não privativa de liberdade ou, caso assim não se entenda, e subsidiariamente, aplicar uma pena privativa de liberdade em regime de permanência na habitação. * Da decisão recorrida – Factos e Motivação (transcrição)“II. DOS FACTOS a) Factos Provados Com relevância para a decisão da causa deram-se como provados os seguintes factos: 1. No dia 5 de Dezembro de 2022, pelas 22 horas e 10 minutos, na Rua David Teixeira, em Loulé, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula XX-XX-XX, sem que para o efeito estivesse habilitado com a necessária carta de condução ou qualquer outro tipo de documento que, nos termos da legislação vigente, o habilitasse a conduzir tal veículo. 2. Na ocasião acima relatada, o arguido sabia que não era possuidor de documento que legalmente o habilitasse a conduzir o sobredito veículo e que, nessas condições, lhe estava vedada tal atividade na via pública. 3. Ainda assim, conhecendo as características da via onde conduzia, quis conduzir o veículo nas condições supra descritas. 4. O arguido agiu de forma voluntária e consciente, e com a liberdade necessária para conformar a sua atuação, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. Mais se provou que, 5. O arguido admitiu a totalidade dos factos. 6. O arguido encontra-se desempregado, sendo que anteriormente laborava numa oficina, e atualmente fazendo biscates. 7. O arguido qualquer rendimento fixo. 8. O arguido tem como despesas de relevo empréstimos a título pessoal, nos montante de EUR 36,00, EUR 52,00, EUR 150,00 e EUR 178,00. 9. O arguido tem o 8.º ano de escolaridade. 10. O arguido reside sozinho no espaço habitacional da entidade patronal, o correspondente a uma quinta de cerca de dez mil metros quadrados situada no Sítio do Barranco - Loulé. A habitação onde pernoita, embora com acesso a luz elétrica e água canalizada, é detentora de lacunas em termos de habitabilidade. Descrito como detentor de características de imaturidade emocional, o arguido tem vindo a patentear diversas uniões maritais das quais regista o nascimento de três descendentes, ainda menores, que integram os agregados das respetivas progenitoras e com os quais raramente contacta. A mãe continua a constituir-se o seu principal pilar em termos afetivos. 11. O arguido abandonou os estudos após a conclusão do 8º ano de escolaridade, altura em que passou a integrar o mercado de trabalho de forma descontinuada, com e sem contrato de trabalho, em diversos setores de atividade - construção civil, jardinagem e mecânica. 12. O arguido apresenta um fraco juízo crítico relativamente ao seu passado criminal. AA já efetuou algumas tentativas de obtenção da habilitação legal para conduzir, sem sucesso uma vez que acaba, por constrangimentos vários onde se incluem, de acordo com o próprio, questões económicas, por não concluí-las. Na sequência do presente envolvimento judicial o arguido inscreveu-se na Escola de Condução Do Emigrante, sedeada em Santa Comba Dão, uma vez que a mesma lhe garante, de forma intensiva e célere a obtenção da carta de condução, e cuja frequência iniciou a 25/12/2022. Contudo, após permanecer naquela localidade mais de um mês, AA regressou à atual morada a fim de auferir rendimentos que lhe permitam saldar o remanescente do valor em dívida (cerca de €200,00). Neste contexto, logo que aufira tal quantia é sua intenção regressar a Santa Comba Dão a fim de concluir o processo de obtenção de licença válida para conduzir. No que concerne ao presente envolvimento judicial, o arguido verbalizou alguma capacidade de análise e de descentração face aos fatores internos e externos que de alguma forma estiveram na base da alega prática dos factos. Pese embora AA expresse consciência face à gravidade de mais um envolvimento com o sistema de justiça, tende a externalizar a sua responsabilidade. 13. Quanto à possibilidade de ser condenado em pena de prisão na habitação com vigilância eletrónica, existirem condições mínimas compatíveis com a execução da pena de prisão em análise. 14. O arguido regista as seguintes condenações: a) Por sentença datada de 19/01/2015, transitada em julgado em 04/03/2015, no âmbito dos autos com o n.º 868/12.8GBFAR, foi o arguido condenado, pela prática, a 03/08/2012, de um crime de furto qualificado, na pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução por igual período. b) Por Acórdão datado de 26/02/2016, transitado em julgado a 05/04/2016, no âmbito dos autos com o n.º 960/12.9GBLLE, foi o arguido condenado, pela prática, a 21, 22 e 23/08/2012, de um crime de furto de uso de veículo, de um crime de furto, de três crimes de condução sem habilitação legal, de um crime de furto qualificado e de um crime de introdução em lugar vedado ao público, na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova. c) Por sentença datada de 23/09/2016, transitada em julgado a 14/10/2016, no âmbito dos autos com o n.º 986/14.8GBLLE, foi o arguido condenado, pela prática, a 30/11/2014, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 50 dias de multa, à taxa diária de EUR 5,00. d) Por sentença datada de 25/01/2018, transitada em julgado a 11/04/2018, no âmbito dos autos com o n.º 81/17.8GGODM, foi o arguido condenado, pela prática, a 27/07/2017, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 180 dias de multa, à taxa diária de EUR 5,00. e) Por sentença datada de 01/06/2021, transitada em julgado a 01/06/2021, no âmbito dos autos com o n.º 218/21.2GAOLH, foi o arguido condenado, pela prática, a 10/04/2021, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 1 ano de prisão, em regime de permanência na habitação com vigilância eletrónica. f) Por sentença datada de 24/04/2018, transitada em julgado a 24/05/2018, no âmbito dos autos com o n.º 11/18.0GDLGS, foi o arguido condenado, pela prática, a 13/04/2018, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de EUR 5,00. g) Por sentença datada de 15/01/2019, transitada em julgado a 26/02/2019, no âmbito dos autos com o n.º 61/18.6GBLGS, foi o arguido condenado, pela prática, a 24/05/2018, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, sujeita a regime de prova. h) Por sentença datada de 26/03/2019, transitada em julgado a 06/05/2019, no âmbito dos autos com o n.º 12/18.8GBLGS, foi o arguido condenado, pela prática, a 24/01/2018, de um crime de condução sem habilitação legal e de duas contraordenações rodoviárias, na pena de 8 meses de prisão, substituída por 240 horas de trabalho. * b) Factos não provadosCom relevância para a decisão da causa, não se deram como não provados quaisquer factos. * c) Motivação da matéria de factoO tribunal formou a sua convicção relativamente aos factos considerados como provados, tendo em consideração os seguintes meios de prova: Os factos 1 a 4, dados como provados no âmbito do presente processo, foram dados como provados com base na confissão livre, integral e sem reservas do arguido. No que respeita ao facto provado 5, deu-se o mesmo como provado com base na postura apresentada pelo arguido em sede de audiência. No que respeita aos factos 6 a 9, deram-se os mesmos como provados com base nas declarações prestadas pelo arguido, em sede de audiência de julgamento, os quais mereceram credibilidade por parte do tribunal. Por outro lado, os factos 10 a 13, da factualidade provada, deram-se como provados com base no relatório social elaborado pela DGRSP, e junto aos autos na referência 10979672. Finalmente, o facto provado 8, relativo aos antecedentes criminais do arguido, deu-se como provado com recurso ao Certificado de Registo Criminal daquele, junto na referência 10948423. Não existem quaisquer factos não provados, na medida em que não constavam da acusação e não tendo sido suscitados quaisquer outros em sede de audiência de discussão e julgamento, com relevo para a decisão da causa.” * Apreciando- Da espécie da pena O recorrente dirige primeiramente a sua discordância para a espécie da pena aplicada. O arguido mostra-se condenado pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido nos termos do artigo 3.º, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei 2/98, de 3 de janeiro, na pena de 1 ano e 2 meses de prisão. Dispõe o artigo 3.º , nºs 1 e 2 do decreto-Lei 2/98, de 3 de janeiro que: 1 - Quem conduzir veículo a motor na via pública ou equiparada sem para tal estar habilitado nos termos do Código da Estrada é punido com prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias. 2 - Se o agente conduzir, nos termos do número anterior, motociclo ou automóvel a pena é de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias. Deste modo, importa optar por uma delas, de acordo com o princípio orientador expresso no art.70º do C.P., que impõe a preferência pelas penas não detentivas, desde que se mostrem suficientes para realizar de forma adequada as finalidades da punição nos termos do art.40º, nº1, do C.P., que tem em vista a "proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade". Quando existem penas alternativas ou de substituição, a escolha pela pena de prisão ou pela pena de multa é algo que não tem diretamente a ver com o grau de culpa, mas com as finalidades da punição. "Quer dizer, a escolha entre a pena de prisão e a alternativa ou de substituição depende unicamente de considerações de prevenção geral e especial"- Maia Gonçalves, em anotação ao art.70º do Código Penal. A primeira questão a resolver, perante a alternativa proposta pelo preceito punitivo, é, pois, a da escolha da pena, aplicando-se os critérios definidos no artº 70º do Código Penal. Assim, se ao crime forem aplicáveis pena privativa ou pena não privativa da liberdade, deve o Tribunal dar preferência fundamentada à segunda sempre ela se mostre suficiente para promover a recuperação social do delinquente e satisfaça as exigências de reprovação e de prevenção do crime. Significa, pois, que são finalidades exclusivamente preventivas, de prevenção especial e de prevenção geral, que justificam e impõem a pena não detentiva. Com efeito, com a referência feita às exigências de reprovação quis-se apenas individualizar o limite mínimo de prevenção geral constituído pela defesa irrenunciável do ordenamento jurídico, isto é, chamou-se a atenção para que uma pena alternativa não poderá ser aplicada, se com ela sofrer inapelavelmente, o sentimento de reprovação social do crime. Prevalência decisiva não pode deixar de ser atribuída a considerações de prevenção especial de socialização, por serem, sobretudo elas que justificam, na perspetiva político-criminal, todo o movimento de luta contra a pena de prisão. Assim, o Tribunal só deixará de aplicar uma pena não detentiva quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou mais conveniente, o que só raramente sucede, atento o carácter criminógeno da prisão, em especial, da pena de prisão de curta duração. A prevenção geral constitui, por seu lado, um limite à atuação das exigências de prevenção especial de socialização. Deste modo, desde que imposta ou aconselhada à luz de exigências de socialização, a pena não detentiva só não será aplicada se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam irremediavelmente postas em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias, isto é, a defesa do ordenamento jurídico. Em suma, a escolha da pena terá assim de ser perspetivada em função da adequação, proporção e potencialidade para atingir os objetivos estipulados no artigo 40º do Código Penal. Assim, como referido na decisão recorrida, há a considerar: “Assim, e tendo em conta, em primeiro lugar, os critérios de prevenção geral, são os mesmos elevados, considerando os bens jurídicos que se protegem com a incriminação em crise, e, em particular, a segurança na circulação rodoviária, diretamente afetada com a prática deste tipo de ilícito – ainda para mais numa Comarca como a de Faro, onde a sua prática é frequente - existindo um sentimento geral de impunidade em relação a este tipo de crime, sendo que a comunidade dificilmente conseguiria ser atingida pelas finalidades de prevenção especial se quem, como o arguido, conduz um veículo sem habilitação legal, e saísse impune, pelo que se conclui por uma elevada necessidade de prevenção geral. E já no que respeita aos critérios de prevenção especial, mostram-se os mesmos igualmente elevados, considerando, em primeiro lugar, que o arguido possui várias condenações anteriores, pela prática deste e de outros diversos, a saber, 8, sendo que 7 das referidas condenações são pela prática do crime em análise, em penas de multa e de prisão, o último dos quais, datado de 2021, já em regime de permanência na habitação, e, tal denotando que as referidas penas não surtiram o efeito dissuasor do arguido relativo à prática de crimes, pois que o mesmo pugna por pautar a sua conduta por uma desadequação perentória ao direito, no que respeita à prática de crimes. Neste sentido, e neste momento, há que aplicar ao arguido uma pena privativa da liberdade.” Ora, um dos vetores da escolha da espécie da pena é a proteção dos bens jurídicos violados e, naturalmente, a proteção da própria vítima e da sociedade em relação aos agentes do crime, de modo que, responsabilizando suficientemente estes últimos, se possa esperar que os mesmos não venham a adotar novas condutas desviantes (função de prevenção especial defensiva ou negativa). Na proteção dos bens jurídicos, será igualmente de destacar que a reação penal a aplicar deve, tanto quanto possível, neutralizar o efeito do delito, passando este a surgir, sem sombra de dúvidas, como um exemplo negativo para a comunidade e contribuindo, ao mesmo tempo, para fortalecer a consciência jurídica da mesma (função de prevenção geral). Pretende-se, assim, dar satisfação ao sentimento de justiça do mundo circundante que rodeia o arguido, através do mínimo de prevenção geral de defesa da ordem jurídica [Ac. STJ de 2007/Set./26, (Recurso n.º 2579/07), acessível em www.colectaneadejurisprudência.com]. Daí que, muitas vezes, e sobrepondo-se à ressocialização, seja necessária a aplicação de pena detentiva para defesa do ordenamento jurídico, designadamente quando o comportamento desviante for revelador de uma atitude generalizada e consequente de não se tomar a sério o desvalor de certas condutas relevantemente ofensivas da vida comunitária, de acordo com os princípios constitucionais relevantes de um Estado de Direito Democrático. Assim, considerando a atuação do arguido, com dolo direto, a culpa, elevada atenta a intensidade do dolo revelada, bem como a ilicitude dos factos, que assume grau elevado, face ao bem jurídico protegido e à sua posição na hierarquia axiológico-normativa da tutela penal, e as exigências de prevenção especial, elevadas, entende-se, tal como o tribunal recorrido entendeu, que apenas a aplicação de uma pena de prisão satisfaz convenientemente as finalidades da punição, optando por esta. Com efeito, tudo ponderado, não é possível neste caso fazer um juízo de prognose favorável relativo ao comportamento do arguido no sentido de que a aplicação de uma pena não detentiva, designadamente pena de multa, como o mesmo propugna, satisfaria as finalidades da punição. Deste modo, ponderando os factos na sua globalidade e considerando o tipo de criminalidade a que nos atemos, entendemos que as expectativas comunitárias não serão plenamente reafirmadas através da aplicação de pena de multa, havendo especiais necessidades de ressocialização a atender, pelo que a opção pela pena não detentiva não surgiria como capaz de se justificar do ponto de vista das exigências de prevenção geral e especial, o que impede a aplicação ao arguido de pena não privativa de liberdade. * - Do pretendido cumprimento da pena em regime de permanência na habitaçãoAlega o recorrente que a pena imposta pode ser cumprida em regime de permanência na habitação. Com as alterações introduzidas pela Lei nº 94/2017 de 23/08, o regime agora previsto no artigo 43º do Código Penal passou a constituir não só uma pena de substituição em sentido impróprio, mas também uma forma de execução ou de cumprimento da pena de prisão. A nova lei traduz o entendimento generalizado de que as penas curtas de prisão devem ser evitadas por não contribuírem necessariamente para a ressocialização efetiva do condenado. Foi, inclusivamente, na senda desse pensamento, que se procedeu à abolição da prisão por dias livres e do regime de semidetenção, alterando-se (através da ampliação do respetivo campo de aplicação) o regime de permanência na habitação. Diz-nos o atual artigo 43.º do Código Penal, no seu número 2, que o regime de permanência na habitação consiste na obrigação de o condenado permanecer na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, sem prejuízo das ausências autorizadas. São pressupostos da sua aplicação, nos termos do número um do mesmo preceito legal, para além dos requisitos gerais das penas substitutivas da prisão, a conclusão de que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão, o consentimento do próprio arguido/condenado e face à previsão das seguintes situações: a)- A pena de prisão efetiva não superior a dois anos; b)- A pena de prisão efetiva não superior a dois anos resultante do desconto previsto nos artigos 80.º a 82.º; c)- A pena de prisão não superior a dois anos, em caso de revogação de pena não privativa da liberdade ou de não pagamento da multa previsto no n.º 2 do artigo 45.º. Nos termos do n.º 4 desse mesmo artigo 43.º, diz-se que o tribunal pode subordinar o regime de permanência na habitação ao cumprimento de regras de conduta, suscetíveis de fiscalização pelos serviços de reinserção social e destinadas a promover a reintegração do condenado na sociedade, desde que representem obrigações cujo cumprimento seja razoavelmente de exigir, nomeadamente: a)- Frequentar certos programas ou atividades; b)- Cumprir determinadas obrigações; c)- Sujeitar-se a tratamento médico ou a cura em instituição adequada, obtido o consentimento prévio do condenado; d)- Não exercer determinadas profissões; e)- Não contactar, receber ou alojar determinadas pessoas; e f)- Não ter em seu poder objetos especialmente aptos à prática de crimes. Por isso, admite-se agora expressamente que o condenado em pena de prisão efetiva não superior a dois anos possa cumprir a pena em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, se o tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir. Este regime de permanência na habitação tem potencialidades para realizar a tutela do bem jurídico protegido pela norma que pune o crime em causa – assim satisfazendo as exigências de prevenção geral – e facilitar a ressocialização do arguido, sem estender, de forma gravosa, as consequências da punição ao seu agregado, assim se evitando as consequências perversas da prisão continuada, não deixando de, com sentido pedagógico, constituir forte sinal de reprovação para o crime em causa. O regime de permanência na habitação tem justamente por finalidade limitar o mais possível os efeitos criminógenos da privação total da liberdade, evitando ou, pelo menos, atenuando os efeitos perniciosos de uma curta detenção de cumprimento parcial ou continuado, nos casos em que não é possível renunciar à ideia de prevenção geral. A filosofia do preceito assenta numa evidente reação contra os consabidos inconvenientes das penas curtas de prisão (apoiando-se em razões de cariz humanitário na letra do seu n.º 2), situando-se a meio caminho entre a suspensão da execução da pena de prisão e a reclusão efetiva do delinquente, a qual se pretende evitar, pela rutura com o ambiente familiar, social e profissional que representaria, verificados que sejam os seus pressupostos, mas sem deixar de prevenir-se a adequação desta pena substitutiva às finalidades das penas em geral. Mas a ideia apoia-se também em considerações que transcendem o condenado. É, antes de mais, indesejável que se projetem sobre a família deste, consequências económicas desastrosas, sendo ainda indesejável a rutura prolongada com o meio profissional e social. A obrigação de permanência na habitação assenta, assim, em pressupostos e requisitos, previstos no artigo 43º do Código Penal, na sua nova redação, como a viabilidade de instalação de meios técnicos de controlo à distância e o consentimento do próprio condenado, que terão de ser obtidos e verificados pela 1ª instância, depois de devidamente equacionada a “adequação e suficiência” desta forma de execução ou de cumprimento da pena de prisão a cumprir pelo condenado, eventualmente subordinada ao cumprimento de regras de conduta previstas no nº 4 do citado artigo 43º. Está assim imposto ao juiz o dever de indagar e justificar a razão porque aplica ou o que impõe o afastamento desta forma de execução ou de cumprimento da pena desde que verificados os respetivos pressupostos formais de aplicabilidade. Com efeito, o tribunal não é livre de aplicar ou deixar de aplicar tal forma de execução ou de cumprimento da pena, pois não detém uma faculdade discricionária; antes, o que está consagrado na lei é um poder/dever ou um poder vinculado; uma vez verificados os respetivos pressupostos formais, o tribunal não pode deixar de ponderar tal aplicação e fundamentar a razão porque a aplica ou a afasta. E esta ponderação mostra-se efetuada na decisão recorrida. Com efeito, aí se mostra plasmado que: “ Cumpre ainda tecer algumas considerações quanto à possibilidade de aplicação ao arguido do regime de permanência na habitação. Dispõe o artigo 43.º, do CP, que: “1 - Sempre que o tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir, são executadas em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância: a) A pena de prisão efectiva não superior a dois anos; 2 - O regime de permanência na habitação consiste na obrigação de o condenado permanecer na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, sem prejuízo das ausências autorizadas. 3 - O tribunal pode autorizar as ausências necessárias para a frequência de programas de ressocialização ou para actividade profissional, formação profissional ou estudos do condenado. 4 - O tribunal pode subordinar o regime de permanência na habitação ao cumprimento de regras de conduta, susceptíveis de fiscalização pelos serviços de reinserção social e destinadas a promover a reintegração do condenado na sociedade, desde que representem obrigações cujo cumprimento seja razoavelmente de exigir, nomeadamente: a) Frequentar certos programas ou actividades; b) Cumprir determinadas obrigações; c) Sujeitar-se a tratamento médico ou a cura em instituição adequada, obtido o consentimento prévio do condenado; d) Não exercer determinadas profissões; e) Não contactar, receber ou alojar determinadas pessoas; f) Não ter em seu poder objectos especialmente aptos à prática de crimes.” De facto, resulta de tal artigo que sempre que o tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir, são executadas em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância a pena de prisão efetiva não superior a dois anos. Ora, pese embora tenha sido relatada a existência de condições mínimas compatíveis com a execução da pena de prisão em análise, em regime de permanência na habitação, a verdade é que, em face do passado criminógeno do arguido, patente nas oito condenações registadas no seu certificado de registo criminal, sete das quais por crime idêntico ao dos autos e a última das quais datada do ano de 2021, tendo cumprido a mesma em regime de permanência na habitação – que de nenhum efeito surtiu, veja-se, no sentido de afastar o arguido da prática de crimes, e ainda, à sua personalidade marcadamente antijurídica – revelada na prática deste e de outros crimes, não podemos concluir senão que por meio da execução da pena em regime de permanência na habitação não se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão. Assim, apenas a execução da pena de 1 ano e 2 meses de prisão, em reclusão, é suscetível de assegurar a defesa da sociedade e de prevenir a prática de crimes pelo arguido.” Verifica-se assim que a execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação já foi ponderada e afastada pela 1ª instância, com os fundamentos aí expostos. Ora, resulta da decisão recorrida que: “ 14. O arguido regista as seguintes condenações: a) Por sentença datada de 19/01/2015, transitada em julgado em 04/03/2015, no âmbito dos autos com o n.º 868/12.8GBFAR, foi o arguido condenado, pela prática, a 03/08/2012, de um crime de furto qualificado, na pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução por igual período. b) Por Acórdão datado de 26/02/2016, transitado em julgado a 05/04/2016, no âmbito dos autos com o n.º 960/12.9GBLLE, foi o arguido condenado, pela prática, a 21, 22 e 23/08/2012, de um crime de furto de uso de veículo, de um crime de furto, de três crimes de condução sem habilitação legal, de um crime de furto qualificado e de um crime de introdução em lugar vedado ao público, na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova. c) Por sentença datada de 23/09/2016, transitada em julgado a 14/10/2016, no âmbito dos autos com o n.º 986/14.8GBLLE, foi o arguido condenado, pela prática, a 30/11/2014, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 50 dias de multa, à taxa diária de EUR 5,00. d) Por sentença datada de 25/01/2018, transitada em julgado a 11/04/2018, no âmbito dos autos com o n.º 81/17.8GGODM, foi o arguido condenado, pela prática, a 27/07/2017, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 180 dias de multa, à taxa diária de EUR 5,00. e) Por sentença datada de 01/06/2021, transitada em julgado a 01/06/2021, no âmbito dos autos com o n.º 218/21.2GAOLH, foi o arguido condenado, pela prática, a 10/04/2021, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 1 ano de prisão, em regime de permanência na habitação com vigilância eletrónica. f) Por sentença datada de 24/04/2018, transitada em julgado a 24/05/2018, no âmbito dos autos com o n.º 11/18.0GDLGS, foi o arguido condenado, pela prática, a 13/04/2018, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de EUR 5,00. g) Por sentença datada de 15/01/2019, transitada em julgado a 26/02/2019, no âmbito dos autos com o n.º 61/18.6GBLGS, foi o arguido condenado, pela prática, a 24/05/2018, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, sujeita a regime de prova. h) Por sentença datada de 26/03/2019, transitada em julgado a 06/05/2019, no âmbito dos autos com o n.º 12/18.8GBLGS, foi o arguido condenado, pela prática, a 24/01/2018, de um crime de condução sem habilitação legal e de duas contraordenações rodoviárias, na pena de 8 meses de prisão, substituída por 240 horas de trabalho.” Foram assim evidenciadas pelo tribunal a quo os antecedentes criminais do arguido e a natureza das penas que lhe foram anteriormente aplicadas e cumpridas pelo mesmo, as quais não serviram de advertência para a prática de novos crimes. As exigências de prevenção geral são fortes, sendo de atender à conduta anterior do arguido, onde sobressaem as condenações já sofridas, averbando o arguido condenações por factos praticados entre 2012 e 2021, por oito vezes, sendo sete delas por crimes de condução de veículo sem habilitação lega, em penas de multa, penas de prisão suspensas na execução, pena de prisão substituída por multa e pena de prisão em regime de permanência na habitação com vigilância eletrónica, o que permite concluir que as penas em que foi condenado não foram de molde a que não voltasse a violar o concreto bem jurídico tutelado. Todos estes fatores agravam a prognose de prevenção especial relativa ao arguido e propendem para elevar de forma relevante os fatores de risco de prática de novos ilícitos criminais. Com efeito, as sucessivas condenações do arguido não lograram que este se afastasse da prática de crimes. A situação em presença constitui exemplo de ineficácia das penas substitutivas para atingir contra motivação idónea a prevenir a reincidência e que, a repetir-se, deixaria no cidadão perplexidade e desconfiança sobre a eficácia da norma penal infringida e da capacidade da administração da Justiça para a aplicar. Num caso como o dos autos, em que ao arguido já foram aplicadas penas de substituição, a execução em regime de permanência na habitação da pena de prisão aplicada não iria satisfazer a finalidade primordial de restabelecer a confiança comunitária na validade da norma violada e na eficácia do sistema jurídico-penal. Neste caso o efeito de sharp-short-shock da pena de prisão mesmo que de curta duração configura-se como única forma de convencer o agente da gravidade do crime praticado e mesmo de estabilizar as expectativas comunitárias na manutenção da validade da norma infringida (Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, págs. 360 e 390 e segs..). Esta conclusão relativa às exigências de prevenção especial, a que acrescem as citadas exigências de prevenção geral, afastam a aplicação ao arguido de qualquer pena não detentiva, como já supra dito. Afastada a ressocialização do arguido em liberdade em face de nova condenação, entendemos assim que o regime de permanência na habitação não é uma pena ou forma de cumprimento adequada à realização das exigências de prevenção especial e geral que o presente caso encerra pois, por um lado, o arguido já foi condenado a diversas penas de substituição, e nem isso o fez parar na repetição de comportamento delituoso e, por outro lado, a comunidade não compreenderia que, nestas circunstâncias, o arguido não cumprisse pena de prisão institucionalizada ( - São finalidades exclusivamente preventivas – de prevenção especial de socialização e de prevenção geral de defesa do ordenamento jurídico – que justificam a preferência por uma pena de substituição – Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, págs. 331 a 333.). Pode assim concluir-se que as condenações que lhe foram impostas não serviram de suficiente advertência para inibir o arguido da prática de novos crimes. Com efeito, tais condenações não deixam de revelar uma personalidade do arguido indiferente ao ordenamento jurídico e ao sistema de justiça penal, acrescendo não se vislumbrar que nenhuma das condenações já impostas tenha sido idónea à cabal interiorização por parte do arguido da necessidade de se inserir socialmente e passarem a pautar a sua conduta em conformidade com o direito. Assim, considerando o tipo de criminalidade a que nos atemos e as condenações já sofridas pelo arguido, entendemos que as expectativas comunitárias não serão plenamente reafirmadas através do deferimento da pretensão do recorrente, havendo especiais necessidades de ressocialização a atender, pelo que a opção pelo cumprimento da pena em regime de permanência na habitação, ainda que com controlo eletrónico, não surgiria como capaz de se justificar do ponto de vista das exigências de prevenção especial, o que impede o cumprimento da pena pelo arguido do modo pelo mesmo propugnado. Assim, face à gravidade e reiteração dos factos praticados pelo arguido, à circunstância de ter já sido condenados oito vezes, e face à circunstância de nada se ter apurado indiciador de o arguido projetar vir a assumir perante si mesmos e os outros uma maior responsabilidade, é de concluir não interiorizar o arguido o desvalor do resultado das suas condutas. Efetivamente, atentas as particularidades do caso concreto ressaltam prementes razões tanto de prevenção geral positiva como de prevenção especial, mostrando-se mais conveniente e adequada às finalidades da punição o cumprimento efetivo da pena de prisão em detrimento do pretendido cumprimento em regime de permanência na habitação, ainda que com controlo eletrónico. Cremos pois, configurar o caso "sub judice" um caso em que a defesa da ordem jurídica, na afetação séria da fidelidade ao direito por parte da comunidade, levaria a entender-se o deferimento do pretendido cumprimento em regime de permanência na habitação, ainda que com controlo eletrónico, como uma injustificada cedência perante a criminalidade e ao abalo da confiança da comunidade na inviolabilidade do direito. Assim sendo, entendemos que o pretendido cumprimento em regime de permanência na habitação, ainda que com controlo eletrónico, afetaria valores que a comunidade tem, fundadamente, como essenciais, pelo que a levaria a um afastamento da confiança nas instituições judiciais. Termos em que improcede o recurso. * DecisãoFace a tudo o exposto, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em: - negar provimento ao recurso interposto pelo arguido, mantendo a decisão recorrida. - Condenar o recorrente em custas, fixando-se em 3 UC’s a taxa de justiça . * Elaborado e revisto pela primeira signatáriaÉvora, 12 de julho de 2023 Laura Goulart Maurício J. F. Moreira das Neves Nuno Garcia |