Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
275/22.4GCSTB-A.E1
Relator: BEATRIZ MARQUES BORGES
Descritores: METADADOS
DADOS DE TRÁFEGO
DADOS DE BASE
PROVA DIGITAL
CIBERCRIME
Data do Acordão: 05/09/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I. O ordenamento processual penal português previa uma trilogia de fontes de prova digital:
a) A dos artigos 187.º a 190.º do CPP, relativa a interceções digitais visando captar e gravar conversações ou comunicações em trânsito, ou seja, a ocorrerem em tempo real entre presentes (obtenção essencialmente de dados de conteúdo).
b) A da Lei do Cibercrime (Lei 109/2009 de 15.9) atinente a pesquisa de dados eletrónicos preservados e conservados em sistemas informáticos constantes de telemóveis, computadores e outros equipamentos informáticos apreendidos.
c) A da Lei dos Metadados (Lei 32/2008 de 17.7), respeitante a dados de tráfego, decorridos no passado, conservados ou armazenados em arquivo pelas operadoras telefónicas.
II. Os metadados, apesar de não abrangerem “dados de conteúdo das comunicações”, incluem “dados de base” e “dados de tráfego” armazenados.
III. Através dos “dados de base” consegue-se identificar o utilizador de certo equipamento (nome, morada, número de telefone).
IV. Já os “dados de tráfego” abarcam dados funcionais necessários ao estabelecimento de uma ligação de comunicação e os dados gerados pela utilização da rede permitindo identificar em tempo real ou a posteriori (desde que os dados fiquem armazenados), os utilizadores incluindo os destinatários, a sua localização, a frequência da utilização, a data, a hora e a duração das comunicações efetuadas ou tentadas efetuar.
V. O Acórdão do TC 268/2022 de 19.4.22 declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória geral do artigo 4.º, em conjugação com o artigo 6.º, e do artigo 9.º da Lei dos Metadados, pois a conservação generalizada e indiferenciada dos “dados de tráfego” e de todos os dados de localização de quaisquer assinantes e utilizadores registados em relação a todos os meios de comunicação eletrónica revelavam a qualquer momento aspetos da vida privada e familiar de todos os cidadãos, independentemente de serem suspeitos, constituindo uma agressão aos seus direitos fundamentais.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

I. RELATÓRIO
No Processo de Inquérito n.º 275/22.4GCSTB do Tribunal Judicial da Comarca ... – Juízo de Instrução Criminal ... – Juiz ..., onde é investigada a prática de um crime de sequestro, foi proferido despacho judicial indeferindo o pedido formulado pelo MP no qual este requereu se solicitasse às operadoras telefónicas todos os eventos de rede referentes a duas antenas BTS durante um concreto período temporal.

1. Do requerimento apresentado pelo MP que deu origem à decisão recorrida
Em 1.2.2023 o MP remeteu os autos ao Mm. Juiz de Instrução Criminal para apreciação da seguinte promoção:
“Os presentes autos tiveram início com base no auto de notícia de fls. 2 e seguintes, no que se reportou que desconhecidos terão sequestrado AA, no interior de um veículo automóvel.
A referida vítima foi abordada por quatro suspeitos em 22/12/2022, cerca das 23H00, enquanto se encontrava a circular apeado pela Avenida ..., em .... De imediato foi forçada a entrar no automóvel em que os suspeitos se faziam transportar, foi-lhe colocado um saco de plástico preto na cabeça que lhe ocultou a visão na totalidade e lhe causou bastante pânico e dificuldades na respiração.
Ato contínuo, foi descalçado e sentado no banco traseiro do automóvel, entre os dois suspeitos que o abordaram na via pública, que prontamente o obrigaram a baixar a sua cabeça e o mantiveram naquela posição durante toda a viagem.
Concomitantemente, os suspeitos de identidade desconhecida começaram também a agredir violentamente a vítima na cabeça com murros e palmadas e a pisar-lhe os pés, cfr. fls. 48 a 50 e 117 a 122.
Entretanto, os suspeitos pararam em local que a vítima não consegue precisar, porque estava vendado, e continuaram a espancá-lo, juntamente com outros suspeitos que já ali se encontravam a espera da chegada do veículo automóvel com os suspeitos e AA.
Durante as várias agressões aludidas, os suspeitos iam questionando AA sobre o paradeiro de vários indivíduos a quem se referiam como "EE", e BB, "CC", e "DD" de ..., advertindo-o de que "ou os levava ao EE, ou seria o próprio a pagar", cfr. fls. 117 a 122.
A vítima não conseguiu adiantar informações que os suspeitos considerassem pertinentes e aqueles acabaram por transportá-lo até à praia fluvial de ..., em ..., onde o libertaram, mas não sem antes lhe retirar a sua roupa à força, deixando-o apenas de boxers. No decurso de todo o trajeto, um dos suspeitos ia batendo na vítima e tecendo ameaças, dirigindo-lhe expressões atemorizadoras, nomeadamente "vamos deixar-te numa cave e trancar-te lá".
As agressões de que AA foi alvo fizeram o ofendido sangrar abundantemente do nariz e um dos suspeitos entregou-lhe um lenço para que "não lhes sujasse o carro com sangue”. Já na praia fluvial, os suspeitos começaram a agredi-lo de modo mais veemente, atingindo-lhe o corpo com socos e pontapés, deixando-o com vários hematomas na cabeça, um corte no nariz e um deslocamento na clavícula, que lhe provocou fortes dores e o obrigou a receber tratamento.
No período de tempo em que se encontrou com os suspeitos nesta zona, estes terão fumado cigarros, soprando várias vezes o fumo para dentro do saco de plástico que envolvia a cabeça da vítima, de modo a humilhá-lo, sufocando-o e ainda terão arremessado para a água as suas botas "... 5" (que avalia em cerca de 200€) e o seu telemóvel "..." (que avalia em cerca de 40€). Subtraíram-lhe ainda uma bolsa tiracolo da marca ..., de cor ..., a chave da sua viatura da marca ..., modelo ...06, com a matrícula ..-..-LR (com valor estimado em cerca de 2000€, cfr. fls. 65, 99, 143 e 144), um cartão de crédito, que o ofendido o cancelou posteriormente e um molho de chaves, onde se incluíam as chaves da sua casa em ... e da casa da sua avó.
AA viu-se assim forçado a vaguear pela zona de mato adjacente à praia fluvial de ..., ferido, assustado e com frio, já que se encontrava apenas com roupa interior e estava bastante frio naquela madrugada de 23/12/2022. Andou descalço durante cerca de uma hora até conseguir auxílio junto de umas residências, onde um habitante comunicou os factos e levou a que a vítima fosse transportada para o hospital, onde recebeu assistência médica, cfr. fls. 64, 77 a 99, 117 a 122 e 123.
Dois dias após os factos descritos, a viatura da vítima foi furtada, suspeitando-se que terá sido pelos autores do crime terão sido os aludidos agressores, que tinham na sua posse a chave do veículo, cfr. fls. 121, 129 a 132.
Inquirido AA, o mesmo explicou que terá sido abordado pelos suspeitos que partilhou, no passado, uma relação de amizade com EE, seu conhecido da localidade de ..., que tem conhecimento que já teve alguns problemas relacionados o tráfico de estupefacientes. Este indivíduo foi identificado como EE, nascido a .../.../1999, verificando-se que o mesmo viajou para o ... em .../.../2023, cfr. fls. 126 a 128, 137 e 138.
Tais factos são suscetíveis de consubstanciar, em abstrato, a prática de um crime de sequestro agravado, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 158.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b) do Código Penal, em concurso real e efetivo com a prática do crime de roubo, p. e p.., pelo artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal.
Apesar da confirmação dos factos sob investigação, não existe, por ora, quaisquer indícios que permitam identificar os indivíduos que praticaram os factos acima referidos, ou, sequer, que permitam abrir uma qualquer linha de investigação capaz de atingir tal desiderato, para além dos eventuais exames perícias de ADN para análise dos vestígios apreendidos na referida praia, para comparação com perfis registados nas bases de dados, que infra se irá determinar, sendo que é pouco provável que os mesmos venham a surtir qualquer efeito prático.
Ademais, os factos acima expendidos revestem elevada gravidade e enquadram-se, nos termos do artigo 1.º, alínea l), do Código de Processo Penal, na criminalidade altamente violência, exigindo a utilização de todos os meios de prova legalmente disponíveis para determinar a identidade dos seus autores.
Ora, a utilização de telemóveis é, nos dias que correm, algo de banal, atendendo ao nosso contexto cultural e temporal, nomeadamente no nosso país onde o número destes aparelhos já ultrapassa o número de habitantes.
Desta forma, é possível supor, de forma razoável e bastante segura, que os indivíduos que praticaram os factos supra descritos se fizessem acompanhar de telemóveis, no momento em que os praticaram, aliás atendendo que os suspeitos que esperavam pelo ofendido, precisamente no local da praia isolado, levado pelos demais indivíduos de identidade desconhecida no interior do veículo, tudo indica que os mesmos estariam acompanhados de telemóveis de forma a combinarem e partilharem o local exato, na praia, onde teriam de esperar por AA.
Assim sendo, os agentes dos crimes praticaram os factos acima descritos num período temporal definido, em local da prática dos factos acima expendidos totalmente identificável, mais precisamente, de um local à beira-rio, numa estrada em terra batida, perto do ..., na ..., local ermo e isolado do resto das populações, onde a passagem de indivíduos, no período do final da noite/madrugada é bastante reduzido, senão quase inexistente, conforme melhor resulta do relatório fotográfico e características apuradas do local, junto aos autos.
Mais, circunstanciando o evento no tempo, no dia 22/12/2022 pelas 22h00 e às 0h00 do dia 23/12/2022 de madrugada, mês de dezembro, com frio e nas vésperas das festas natalícias, é muito pouco provável que, no período das horas em que os suspeitos circularam, outras pessoas estivessem também presentes, considerando as características da localidade, as condições meteorológicas e a altura do ano. Pelo que unicamente os 4 (quatro) suspeitos por si protagonizados e insuscetíveis de serem confundidos com qualquer outra pessoa, pelo que é possível individualizar os telemóveis que tenham estas características muito particulares e, desta forma, chegar à identificação dos seus utilizadores, os agentes dos factos em investigação.
Assim sendo, entendemos ser necessária a aquisição dos eventos de rede obtidos e registos através das antenas de BTS que fazem a cobertura do local dos factos, no período compreendido entre às 22h00 do dia 22/12/2022 e às 0h00 do dia 23/12/2022.
Estes elementos, – eventos de rede -, são capazes de permitir a individualização dos números de telemóvel que podem estar a ser utilizados pelos autores dos factos e em período alargado naquela mesma área. Trata-se de elementos essenciais à prossecução da presente investigação, não sendo passíveis de obter de outra forma. A obtenção dos dados de tráfego das células das antenas das operadoras móveis tem por único objetivo a identificação dos números de telefone e IMEI’s que foram registados nas referidas células e não o conteúdo das comunicações ou das conversas realizadas.
Pretende-se exclusivamente a identificação do número de telefone ou IMEI que esteve naquela área, não pressupondo qualquer ato de comunicação, bastando, para o efeito, determinar que o aparelho telemóvel esteve naquela área e àquela hora.
Desta forma, no presente instante, a única linha de investigação possível que pode permitir lograr apurar a identidade dos agentes dos factos consiste em determinar a utilização de telemóveis, no momento e local da prática dos factos e esperar que uma destas identificações conduza à identificação dos suspeitos.
Ora, atento ao facto de esta constituir a única linha de investigação, nos presentes autos colocar-se-á a problemática de saber se os elementos que se pretende obter constituem prova proibida, nos termos dos artigos 125.º, e 126.º, n.º 3, ambos do Código de Processo Penal, e artigos 26.º, n.º 1, e 35.º, n.ºs 1 e 4, ambos da Constituição da República Portuguesa, por força da posição adotada pelo Plenário do Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 268/2022.
O mencionado Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 268/2022 judiciou pela declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 3.º, da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, conjugada com o artigo 6.º, da Lei n.º 32/2008, e pela declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 9.º, da Lei n.º 32/2008, no que concerne à “transmissão de dados armazenados às autoridades competentes para investigação, deteção e repressão de crimes graves, na parte em que não prevê uma notificação ao visado de que os dados conservados foram acedidos pelas autoridades de investigação criminal, a partir do momento em que tal comunicação não seja suscetível de comprometer as investigações nem a vida ou integridade física de terceiros”.
Porém, e salvo melhor opinião, somos do entendimento de que a posição exarada no Acórdão n.º 268/2022, proferido pelo Plenário do Tribunal Constitucional, não tem aplicação no presente caso.
Senão vejamos.
Os dados recolhidos pelas antenas de BTS constituem dados de tráfego, porquanto são dados que permitem a localização dos aparelhos em comunicação, bem como a direção, destino, trajeto e duração dessas comunicações (cfr. artigo 2.º, n.º 1, alínea c), da Lei nº 109/2009, que aprovou a Lei do Cibercrime).
Com efeito, a obtenção de dados recolhidos pelas antenas de BTS regia-se, até à entrada em vigor da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, pelo regime da extensão das escutas, plasmado no artigo 189.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, que determina a admissibilidade da obtenção de tais dados na investigação de crimes do catálogo, previstos no artigo 187.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, e que respeitem às pessoas indicadas no artigo 187.º, n.º 4, do Código de Processo Penal, não se estabelecendo qualquer prazo limite para o acesso a esses dados.
Após a entrada em vigor da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, que procedeu à transposição para a ordem jurídica interna, da Diretiva n.º 2006/24/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, o regime exarado no artigo 189.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, foi tacitamente revogado.
Ora, neste âmbito, o artigo 2.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, procedeu à definição, conforme se exigia no Considerado 10 da mencionada Diretiva, de “crimes graves”, criando um catálogo de crimes mais restrito do que o plasmado pelo artigo 187.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal.
Acontece que, a supra mencionada Diretiva veio, posteriormente, a ser julgada inválida, pelo Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 21 de dezembro de 2016, porquanto se mostrava incompatível com o Direito da União Europeia, visto ferir o princípio da proporcionalidade na restrição dos direitos ao respeito pela vida privada e familiar e à proteção de dados pessoas, respetivamente consagrados nos artigos 7.º e 8.º, da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais.
Na esteira deste Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, foi proferido pelo Tribunal Constitucional o já aludido Acórdão n.º 268/2022, que judiciou pelas inconstitucionalidades acima mencionadas.
Deste modo, a única conclusão possível, no que ao regime legal aplicável aos dados recolhidos pelas antenas de BTS diz respeito é que, com o trânsito em julgado do Acórdão n.º 268/2022, proferido pelo Plenário do Tribunal Constitucional, o regime previsto pelo artigo 189.º, n.º 2, do Código de Processo Penal voltou a estar em vigor, por via da repristinação, ao abrigo do artigo 282.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, sob pena de, caso contrário, cairmos num vazio legal.
Pelo que, entendemos que o regime plasmado pelo artigo 189.º, n.º 2, do Código de Processo Penal voltou a entrar em vigor, com as declarações de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, judiciadas pelo Acórdão n.º 268/2022.
Assim, tal extensão do regime das escutas telefónicas, plasmado pelo artigo 189.º, do Código de Processo Penal, aplicável aos dados que se pretende obter nos presentes autos, por força do seu n.º 2, não constitui uma norma cuja desconformidade constitucional é invocada, permanecendo, atento aos argumentos acima expostos, válida e diretamente aplicável.
Mais, face à declaração feita a final, no Acórdão n.º 268/2022, proferido pelo Plenário do Tribunal Constitucional, as declarações de inconstitucionalidade judiciadas não inviabilizem, ou sequer abrangem, toda a demais legislação que tutela o direito constitucional à segurança dos cidadãos – artigo 35.º, da Constituição da República Portuguesa -, relativa à recolha de prova digital, nomeadamente o consagrado pelo Código de Processo Penal, que no caso em apreço se aplica, por via da repristinação, bem como o previsto tanto pela Lei n.º 41/2004, como pela Lei do Cibercrime, aprovada pela Lei n.º 109/2009.
No que ao presente caso diz respeito, em face dos normativos atualmente em vigor, a recolha dos dados de tráfego das antenas de BTS rege-se pelo artigo 189.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, onde se prevê a extensão do regime de escutas para “A obtenção e junção aos autos de dados sobre a localização celular”
Quanto ao primeiro pressuposto previsto pelo artigo 187.º, n.º 1 do Cód. Proc. Penal – indispensabilidade para a descoberta da verdade, sendo a prova, de outra forma, muito difícil de obter – já está justificado nos parágrafos antecedentes.
Considerando que os factos que aqui se encontram em investigação são suscetíveis de consubstanciar, em abstrato, a prática de um crime de sequestro agravado, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 158.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b) do Código Penal, em concurso real e efetivo com a prática do crime de roubo, p. e p.., pelo artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal- estes constituem crimes de catálogo, ao abrigo do artigo 187.º, n.º 1, alíneas a) e c), do Código de Processo Penal.
Mais, os dados que ora se pretendem recolher respeitam apenas aos agentes dos factos em investigação- os quatro suspeitos de identidade desconhecida, cumprindo-se, assim, o artigo 187.º, n.º 4, alínea a), do Código de Processo Penal.
Em concreto, considerando os pressupostos do artigo 187..º n.º 4 do Cód. Proc. Penal, aos dados que se requerem, tem por objetivo visar os suspeitos da prática do crime.
A al. e) do artigo 1.º do Código de Processo Penal define suspeito como sendo “toda a pessoa relativamente à qual exista indício de cometeu ou se prepara para cometer um crime, ou nele participou ou se prepara para participar.”
Seguindo de perto, neste ponto, a jurisprudência maioritária, o suspeito basta ser uma pessoa determinável ou identificável- refere-se a título meramente ilustrativo o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11/02/2015, Juiz Desembargador Neto Moura, disponível in www.dgsi.pt. Assim, o conceito de “suspeito” deve gozar de “determinabilidade”.
Esta característica verifica-se no caso concreto porque os suspeitos do crime supra aludidos só podem ser os quatro utilizadores, que grandes probabilidades terão comunicado entre si e/ou com um terceiro utilizador de forma a conseguirem organizarem, rececionar e aguardar o ofendido AA, numa praia não frequentada, no período da noite, em pleno mês de dezembro, próxima da altura das festas natalícias, num caminho/terreno de terra batida, tendo em consideração o local da prática dos factos, isolado, afastado das populações e sem passagem de peões, utilizadores e pessoas- só os suspeitos estariam presente naquela hora, naquele local.
Mais, atendendo ao lapso temporal necessário para conseguir localizar os quatro utilizadores, suspeitos da prática do crime em investigação, um período temporal muito curto e muito circunscrito, às 22h00 do dia 22/12/2022 e às 0h00 do dia 23/12/2022, ao que acresce as características do local em anteriormente enunciada do modus operandi de comunicações que se pretende rastrear, a forte determinabilidade dos suspeitos torna-se concretizável.
A jurisprudência tem entendido como admissível a utilização de dados de tráfego das antenas BTS, nomeadamente, é o que melhor resulta da decisão do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra datado de 01-06-2022, Relatora ALCINA DA COSTA RIBEIRO, disponível em www.dgsi.pt: «I– A investigação dos crimes elencados no n.º 1 do artigo 187.º do CP – não previstos no catálogo do artigo 2.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 32/2008, de 17-07 –, não admite o recurso aos ficheiros criados ao abrigo do último dos dois diplomas referidos, conservados durante 1 (um) ano após o termo da comunicação.
II – No âmbito dessa investigação apenas é permitida a utilização da base de dados das empresas fornecedoras de serviços de comunicações electrónicas referida no artigo 6.º da Lei n.º 41/2004, de 18-08, mas só quando não tenha decorrido, após o termo da comunicação em causa, o prazo de 6 (seis) meses, período esse determinante da eliminação dos dados de tráfego.»
Nestes termos, atento à Diretiva da PGR n.º 5/2000, de 28 de agosto de 2000, e nos termos do disposto nos artigos 187.º, n.º 1, alínea a) e 189.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, promovo que se solicite às operadoras ALTICE, VODAFONE e NOS os eventos de rede referentes às antenas BTS indicadas a fls. 127 a 131 dos autos no período compreendido entre as às 22h00 do dia 22/12/2022 e às 0h00 do dia 23/12/2022 (…)”.

2. Do despacho recorrido
Na sequência do requerimento apresentado pelo MP foi proferido despacho judicial com o seguinte teor (transcrição):
“Nos presentes autos, vem o Ministério Público requerer: “Nestes termos, atento à Diretiva da PGR n.º 5/2000, de 28 de agosto de 2000, e nos termos do disposto nos artigos 187.º, n.º 1, alínea a) e 189.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, promovo que se solicite às operadoras ALTICE, VODAFONE e NOS os eventos de rede referentes às antenas BTS indicadas a fls. 127 a 131 dos autos no período compreendido entre as às 22h00 do dia 22/12/2022 e às 0h00 do dia 23/12/2022.”
Tais informações reportam-se a localização celular e registos da realização de conversações, e encontram regulação no disposto no artigo 189º, número 2, do Código de Processo Penal.
De sublinhar todavia, que o que se pede é que se informe indiscriminadamente sobre a localização celular e registos de realização de conversações de pessoas anónimas, entre as quais, poderão incluir-se suspeitos (pede-se informação relativamente a números pertencentes a pessoas anónimas que estiveram numa determinada área geográfica).
Ora o disposto no artigo 189º, número 2, do Código de Processo Penal apenas tem aplicação relativamente a pessoas que assumam uma das qualidades referidas no número 4 do artigo 187º do Código de Processo Penal.
Muitos dos visados pela informação não terão, certamente, nenhuma dessas qualidades, sendo simples cidadãos cujos telefones se teriam registado nas referidas antenas.
Pelo exposto, não é possível deferir o requerido.
Salienta-se que questões de idênticos contornos têm sido sobejamente submetidas à apreciação do Tribunal da Relação ..., tendo sido, invariavelmente, a posição do mesmo no sentido do que aqui se decide – vide:
a) acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 18-10-2011, proc. número 19/11.6GGEVR-A.E1, relator Fernando Ribeiro Cardoso, in www.dgsi.pt (também sumariado em http://www.pgdlisboa.pt/pgdl/leis/lei_mostra_articulado.php?artigo_id=199A0189&nid=199&tabela=leis&pagina=1&ficha=1&nversao=#artigo);
b) Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14/7/2010, processo 241/10.2GBABF-A.E1, relatado por Alves Duarte, in www.dgsi.pt;
c) Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 30/9/2010, processo 49/10.5JAFAR-A.E1, relatado por António João Latas, in www.dgsi.pt;
d) Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 21/5/2013, processo 199/12.3GTSTB-A.E1, relatado por João Gomes de Sousa, in www.dgsi.pt;
e) Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 30/9/2010, processo 49/10.5JAFAR-A.E1, relatado por António João Latas, in www.dgsi.pt ;
Sendo que se concorda na íntegra com entendimento expresso.
Pelo exposto, indefere-se o requerido
Notifique e devolva os autos ao Ministério Público. (…)”.

3. Do recurso
3.1. Das conclusões do Ministério Público
Inconformado com a decisão o MP interpôs recurso extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões (transcrição):
“1º Nos presentes autos investigam-se factos que consubstanciam a prática por quatro agentes desconhecidos, dos crimes de roubo e dano, p. e p. pelos artigos 210.º, n.ºs 1 e 2 al. b) e 212.º, n.º 1, ambos do Código Penal.
2º No decurso da investigação, foi possível apurar que quatro indivíduos sequestraram e roubaram AA, no período compreendido entre às 22h00 do dia 22 de dezembro de 2022 e às 0h00 do dia 23 de dezembro de 2022, no ..., na ..., do parque natural do ..., sendo que não foi possível à investigação recolher mais elementos probatórios, encontrando-se num impasse inultrapassável;
3º Nessa medida, foi promovido ao Mm. Juiz de Instrução que solicitasse às operadoras telefónicas ALTICE, VODAFONE e NOS a junção aos autos das listagens de todas as chamadas e mensagens recebidas e efetuadas, registo trace-back e localização celular (hora e duração de cada comunicação) referente aos quatro suspeitos nos pressentes autos, no período compreendido entre às 22h00 do dia 22 de dezembro de 2022 e às 0h00 do dia 23 de dezembro de 2022, no ..., na ..., do parque natural do ...;
4º Não obstante, o Mm. Juiz de Instrução indeferiu o requerido, justificando que «que o que se pede é que se informe indiscriminadamente sobre a localização celular e registos de realização de conversações de pessoas anónimas, entre as quais, poderão incluir-se suspeitos (pede-se informação relativamente a números pertencentes a pessoas anónimas que estiveram numa determinada área geográfica). Ora o disposto no artigo 189º, número 2, do Código de Processo Penal apenas tem aplicação relativamente a pessoas que assumam uma das qualidades referidas no número 4 do artigo 187º do Código de Processo Penal. Muitos dos visados pela informação não terão, certamente, nenhuma dessas qualidades, sendo simples cidadãos cujos telefones se teriam registado nas referidas antenas».
5º Consideramos que não assiste razão ao Mm. Juiz de Instrução, porquanto os elementos probatórios existentes nos autos já permitem suspeitar, tendo em conta a definição legal, que só os quatro suspeitos que praticaram os factos suscetíveis de se integrar no crime de sequestro agravado e de roubo, naquele local com as características que lhe são particulares, é que terão estado envolvidos na prática do crime investigado, nomeadamente tendo consideração os seguintes fatores:
a. os quatro agentes dos crimes praticaram os factos acima descritos num período temporal curto, em local totalmente identificável, mais precisamente à beira-rio, numa estrada em terra batida, perto do ..., na pequena praia fluvial de ..., local ermo e isolado do resto da população, onde a passagem de indivíduos alheios ao processo, no final da noite e madrugada, sobretudo em pleno inverno, com frio, é bastante reduzida, senão quase inexistente, conforme melhor apreensível no relatório fotográfico.
b. é altamente expectável que, a terem sido acionadas as antenas BTS naquele local as mesmas tenham sido acionadas pelos agentes dos crimes investigados;
c. as células identificadas abrangem o ..., na ..., não abarcando mais vilas desta zona, sendo o ... uma zona isolada da reserva natural do ..., com campos de terra batida, usada para piqueniques no verão, sem habitações por perto e visitantes regulares, encontrando-se praticamente abandonada, sendo, por isso, através do meio de obtenção de prova indeferido;
6º Nos termos do art. 1.º, al. e) do Código de Processo Penal, suspeito é “toda a pessoa relativamente à qual exista indício de cometeu ou se prepara para cometer um crime, ou nele participou ou se prepara para participar”, preenchendo-se assim os quatro suspeitos que venham a ser identificados estas características em concreto;
7º Assim, relativamente aos possíveis registos nas antenas de BTS identificados, caso venham a ser identificados alguns números de telemóvel, com muita probabilidade, pertencerão aos quatro agentes do crime, tornando-se, assim, imediatamente identificados, sendo praticamente inexistente a violação dos direitos constitucionalmente previstos de terceiros, não atingindo a diligência pretendida um universo ilimitado e indiferenciado de cidadãos que não se integram no conceito jurídico-penal de “suspeitos”, nem desrespeitando os princípios da proporcionalidade e da adequação cuja observância o n.º 4 o art. 9.º da Lei n.º 32/2008, de 17/07 e o art. 18.º, n.º 2, da CRP impõem.
8º Resulta da jurisprudência, nomeadamente do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 30-09-2010, Relator António João Latas, disponível em www.dgsi.pt que: «A exigência de individualização do suspeito enquanto interveniente processual, designadamente para efeitos do n.º4 do art. 187º do CPP, não se confunde com a sua identificação completa, mas não dispensa a existência de dados factuais tendentes a essa identificação, com base nos quais possa individualizar-se uma pessoa determinada.»
9º Veja-se também a este propósito o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22/06/2016, do Juiz Desembargador Sérgio Calheiros da Gama disponível em www.dgsi.pt: “(…) poder-se-ia porventura aceitar num caso em que desconhecendo-se quem eram os suspeitos a diligência requerida presumivelmente não atingisse um grande e incerto número de cidadãos mas tão só os potenciais autor(es) do crime e sua(s) vítima(s), como sucederia perante uma baixíssima densidade populacional no território para o qual se pretendia que as operadoras de telemóveis facultassem os dados conservados de tráfego e de localização celular relativos a comunicações telefónicas.”
10º Há, no processo, um aglomerado de suspeitas fundadas de que considerando as características do local identificado, os vestígios recolhidos na inspeção ao mesmo, bem como o mês do ano (Dezembro), no período entre as 22h00 e as 00h00, numa praia da reserva natural do ..., local usado da primavera ao verão para piqueniques, existem fortes suspeitas de que só os quatro suspeitos que estiveram naquele local com AA, são os autores dos fatos em apreço, sendo altamente improvável existirem mais pessoas com telemóveis, àquela hora, neste local, nestas circunstâncias, que tenham acionado as antenas de dados BTS, para além dos quatro suspeitos em investigação.
11º Assim, encontrando-se os suspeitos cabalmente determináveis, consideramos que estão reunidos todos os pressupostos legais para a obtenção da informação pretendida (cfr. artigos 189.º, n.º 2 e 187.º, n.ºs 1 e 4, al. a) do Código de Processo Penal).
12º Ao indeferir o requerimento do Ministério Público que solicitou a obtenção de informação da localização celular e registos da realização de conversações ou comunicações dos quatro suspeitos, num determinado período, num determinado local, o Mm. Juiz de Instrução violou o disposto nos artigos 189.º, n.º 2, 187.º, n.º 4, al. a) e 1.º, al. e), todos do Código de Processo Penal.
Nesta conformidade, deverá o Venerando Tribunal da Relação revogar o despacho recorrido, ordenando a prolação de outro que solicite às operadoras telefónicas ATICE, VODAFONE NOS a junção aos autos dos eventos de rede, nomeadamente das listagens de todas as chamadas e mensagens recebidas e efetuadas, registo trace-back e localização celular (hora e duração de cada comunicação) pertencentes aos quatro suspeitos, no período compreendido entre às 22h00 do dia 22 de dezembro de 2022 e às 0h00 do dia 23 de dezembro de 2022, no ..., na ..., do parque natural do .... (…)”.


3.2. Da sustentação do despacho pelo Tribunal a quo
Na 1.ª instância o Tribunal a quo admitiu o recurso e sustentou o despacho proferido pela seguinte forma (transcrição):
“Nos termos do disposto no artigo 414º, número 4, do Código de Processo Penal, decido sustentar a decisão recorrida, com base na fundamentação que dela consta, que aqui dou, brevitatis causa, por integralmente reproduzida.
Todavia, o teor do recurso apresentado, suscita a este tribunal algumas considerações adicionais.
A Digna Sra. Procuradora recorrente vem, a final, solicitar do venerando Tribunal da Relação ... que revoge o despacho recorrido, “ordenando a prolação de outro que solicite às operadoras ALTICE, VODAFONE, NOS a junção dos eventos de rede, nomeadamente as listagens de todas as chamadas e mensagens recebidas e efectuadas, registo de trace back e localização celular (hora e duração de cada comunicação) pertencentes aos quatro suspeitos, no período compreendido entre as 22h00 do dia 22 de dezembro de 2022 e às 0.00 do dia 23 de dezembro de 2022, no ..., na ..., do parque natural do ....”
Mas, não foi isso que foi pedido – e indeferido – no despacho recorrido.
O que foi então pedido – e indeferido - foi o seguinte, cfr. promoção ref. ...01: “Nestes termos, atento à Diretiva da PGR n.º 5/2000, de 28 de agosto de 2000, e nos termos do disposto nos artigos 187.º, n.º 1, alínea a) e 189.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, promovo que se solicite às operadoras ALTICE, VODAFONE e NOS os eventos de rede referentes às antenas BTS indicadas a fls. 127 a 131 dos autos no período compreendido entre as às 22h00 do dia 22/12/2022 e às 0h00 do dia 23/12/2022.”
Sublinhou-se no pedido agora formulado em sede de recurso aquela que se considera ser a adição mais significativa.
Quatro suspeitos (agora indicados no pedido efectuado em sede de recurso)? Quais?
Com que números de telefone? Com que aparelhos telefónicos?
Alguma vez foram identificados esses suspeitos?
Aliás, a ser dado provimento ao recurso, como identificar os suspeitos, a fim de solicitar às operadoras os dados (agora) explicitados, restringidos a esses quatro indivíduos?
Com todo o respeito - alguma confusão deverá ter havido.
O que a Digna Sra. Procuradora sempre pretendeu é o acesso por parte da investigação – seja ela o Órgão de Polícia Criminal, a Autoridade Judiciária, ou quem mais tiver acesso ao processo – aos “eventos de rede” registados em diversas antenas de telecomunicações, o mesmo é dizer, identificação dos aparelhos que aí se registaram e o que fizeram, que comunicações efectuaram e para que aparelhos, quando tal aconteceu e a duração das chamadas.
E obviamente, nessas antenas se registaram não só “os quatro suspeitos” mas também um número indeterminado de cidadãos que não são suspeitos de coisa alguma.
Na realidade, tais dados apenas podem, legalmente, ser obtidos quanto a suspeitos.
Suspeitos, artigos 187º, número 4, al. a), e 189º do Código de Processo Penal.
Adquire-se a qualidade de suspeito num processo criminal apenas porque se tem um telemóvel que a determinada altura se ligou a uma determinada célula de modo de, quanto a si, deixa de ter qualquer relevância a proteção constitucional do sigilo das telecomunicações – artigo 34º, número 4, da Constituição da República Portuguesa?
Se a lei ordinária o permitisse, poderíamos até discutir essa protecção constitucional. Mas, a verdade é que, não é necessário, o legislador que tantas vezes é acossado, nunca tal considerou aceitável. Porque, no artigo 1º, al. e) do Código de Processo Penal se define «Suspeito» como “toda a pessoa relativamente à qual exista indício de que cometeu ou se prepara para cometer um crime, ou que nele participou ou se prepara para participar”.
Estar numa determinada área geográfica, alargada, correspondente à área de cobertura de uma antena de telecomunicações, num determinado lapso temporal, é indício de que se cometeu um crime?
Crê-se bem que não.
Se qualquer um de nós, cidadãos, tiver estado na área geográfica das antenas em causa no período temporal definido pelo Ministério Público, e o nosso telefone se tiver ligado a uma dessas antenas, isso torna-nos suspeitos do crime em investigação, ao ponto de todos os que agora ou mais tarde tiverem acesso ao processo poderem aceder aos nossos dados de localização e identificação de comunicações efectuadas?
Não se pode perder o que está em causa, independemente da redacção que se dê ao pedido: a obtenção de dados de telecomunicações passíveis de identificação relativos a um número indeterminado de cidadãos que não são, nem nunca poderiam ser, suspeitos de qualquer crime.
E nesta senda, refere o Ministério Público a fls. 7 do recurso, aparentemente em jeito de justificação da sua pretensão que “Caso venham a ser identificados alguns números de telemóvel, com muita probabilidade, pertencerão aos agentes do crime, tornando-se, assim, imediatamente identificados, sendo praticamente inexistente a violação dos direitos constitucionalmente previstos de terceiros, não atingindo a diligência pretendida um universo ilimitado e indiferenciado de cidadãos (…)”.
Como pode garantir isto o Ministério Público? Apenas aqueles quatro indivíduos suspeitos se ligaram às antenas naquele período temporal? Então e se, ordenada a diligência, vierem identificados 20 números, por hipótese? Ou mesmo… 5? Será, então “praticamente inexistente a violação dos direitos constitucionalmente previstos de terceiros”?
Ou é proporcional que se violem esses direitos, para, eventualmente, descobrir os agentes do crime? É proporcional que, para, eventualmente, descobrir os agentes do crime, se viole a lei processual penal, apelidando-se de suspeito quem não o é, obtendo e fazendo constar ilegitimamente do processo – sem o seu conhecimento -, dados não só relativos à sua localização num determinado momento, mas também relativos às comunicações que fez, às pessoas com quem falou, e por quanto tempo?
Crê-se bem, e com todo o respeito por diversa opinião, mas sem necessidade de mais considerações, que não. A busca da verdade penal não se pode fazer a todo o custo, e menos ainda, da desconsideração da lei positivada, o que aconteceria (mais uma vez, com todo o respeito por diversa opinião) caso se deferisse o pretendido pelo Ministério Público – em sede de primeira instância e em sede de recurso - e que se reconduz, na realidade, ao mesmo, como não poderia deixar, aliás, de ser, pese embora as discrepâncias das redacções dos pedidos.
Deste modo, sou a concluir que à luz do quadro jurídico convocável, a decisão recorrida não contém qualquer ilegalidade nem deve ser reparada, e sustento-a nos seus precisos termos, a que acrescem os que aqui se deixaram agora expressos. (…)”.

3.3. Da posição adotada pelo MP em 2.ª instância
Na Relação a Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta apôs visto no processo.

3.4. Da tramitação subsequente
Foi observado o disposto no n.º 2 do artigo 417.º do CPP.
Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos teve lugar a conferência.
Cumpre apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO
1. Objeto do recurso
De acordo com o disposto no artigo 412.º do CPP e atenta a Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no DR I-A de 28/12/95 o objeto do recurso define-se pelas conclusões apresentadas pelo recorrente na respetiva motivação, sem prejuízo de serem apreciadas as questões de conhecimento oficioso.

2. Questão a examinar
Analisadas as conclusões de recurso a questão a conhecer prende-se em apurar se deve ser admitido o requerimento do Ministério Público que pediu fosse solicitada junto das operadoras telefónicas a obtenção de informação dos eventos de rede (designadamente listagens de todas as chamadas e mensagens recebidas e efetuadas, registo trace-back e localização celular - hora e duração de cada comunicação) referentes a duas antenas BTS, tudo ao abrigo dos artigos 189.º, n.º 2, 187.º, n.º 4, alínea a) e 1.º, alínea e) do CPP.

3. Apreciação do recurso interposto pelo Ministério Público
Cumpre, agora, conhecer, a questão suscitada pelo MP, relacionada com a obtenção de prova digital, começando por fazer um breve enquadramento legal da mesma.

3.1. Enquadramento legal
No ordenamento jurídico português, como é assinalado no Acórdão do STJ de 6.9.2022[1], encontrava-se prevista uma trilogia de fontes de prova digital.
A primeira prevista nos artigos 187.º a 190.º do CPP, relativa a interceções digitais visando captar e gravar conversações ou comunicações em trânsito, ou seja, a ocorrerem em tempo real (obtenção de dados de conteúdo).
A segunda plasmada na Lei do Cibercrime (Lei 109/2009 de 15.9) atinente a pesquisa de dados eletrónicos preservados e conservados em sistemas informáticos constantes de telemóveis, computadores e outros equipamentos informáticos apreendidos.
A terceira prevista na designada Lei dos Metadados (Lei 32/2008 de 17.7), respeitante a dados de tráfego, decorridos no passado, conservados ou armazenados pelas operadoras telefónicas (ALTICE/MEO; NOS e VODAFONE).
Em relação à Lei dos Metadados, que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva 2006/24/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 15.3[2], verificou-se que, na sequência da declaração da sua invalidade pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (Acórdão de 8.4.2014)[3], o Tribunal Constitucional Português (Acórdão do TC 268/2022 de 19.4.22[4]) declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória geral do artigo 4.º da Lei dos Metadados em conjugação com o artigo 6.º e do artigo 9.º. Daqui resultou ter de se considerar prova proibida o acesso a metadados conservados pelos fornecedores de serviços de comunicações.
Mas em que consistem estes metadados? Apesar de não abrangerem “dados de conteúdo das comunicações”, incluem “dados de base” e “dados de tráfego” armazenados. Quanto aos primeiros através deles consegue-se identificar o utilizador de certo equipamento (nome, morada, número de telefone). Já relativamente aos segundos que abarcam dados funcionais necessários ao estabelecimento de uma ligação de comunicação e os dados gerados pela utilização da rede obtém-se a localização do utilizador, a localização do destinatário, a duração da utilização, a data e hora da utilização e a frequência da utilização.
Em relação a estes últimos, os “dados de tráfico”, o acesso a eles permite identificar em tempo real ou a posteriori (desde que os dados fiquem armazenados), como se disse os utilizadores, a sua localização, a frequência, a data, a hora e a duração das comunicações efetuadas ou tentadas efetuar.
O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), a propósito da citada Diretiva 2006/24/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 15.3, entendeu que a obrigação imposta aos fornecedores de serviço de comunicação eletrónicas de conservarem dados gerados ou tratados no contexto de serviços de comunicação eletrónicas publicamente disponíveis constituía uma ingerência nos direitos fundamentais de proteção da vida privada (artigo 7.º da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais da EU) e da proteção de dados pessoais (artigo 8.º CEDFUE).
Para o TJUE a conservação generalizada e indiferenciada de todos os dados de tráfego e de todos os dados de localização de todos os assinantes e utilizadores registado em relação a todos os meios de comunicação eletrónica não se justificava numa sociedade democrática e era violadora da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia[5].
Na verdade, permitindo-se o armazenamento pelas operadoras telefónicas de todos aqueles dados qualquer pessoa que transportasse consigo o seu telemóvel ou outro dispositivo eletrónico de acesso à internet estava sempre sujeita a ser possível reconstituir aqueles que foram ao longo de um ano (no caso português) todos os lugares em que esteve, quanto tempo esteve em cada um desses lugares e cruzando essa informação com dados respeitantes a outros utilizadores com quem esteve, onde esteve quando esteve.
O TJUE declarou, pois, como já acima assinalado, a invalidade da Diretiva 2006/24/CE na sua totalidade, considerando que os dados assim obtidos revelavam a todo o momento aspetos da vida privada e familiar dos cidadãos permitindo inferir com precisão informação detalhada sobre, designadamente, padrões de vida do individuo, círculos sociais de pertença, inclinações político partidárias, aspetos da vida pessoal (rotinas, hobbies, e até vulnerabilidades, por exemplo, em matéria de saúde)[6].
A este propósito, embora se possa afirmar que a informação contida em dados de tráfego e de localização é menos evasiva do que o conteúdo das comunicações em si mesmas, a verdade é que tais dados, apesar de revelarem aspetos da vida privada e familiar dos cidadãos, eram também bastantes úteis à investigação criminal. Através deles era possível obter pontos de referência em relação ao momento do crime, à localização do agente antes e depois do crime, às relações existentes entre eventuais suspeitos, itinerário de fuga e indiciação de outros suspeitos.
Concomitantemente com esta mais valia para a investigação criminal, tais dados, todavia, permitiam, ainda, a leitura do passado de qualquer cidadão facilitando a identificação de pessoas que nem sequer eram suspeitas e que, em rigor, eram tratadas como potenciais criminosas. Por outras palavras, o armazenamento destes dados pressupunha que todo o cidadão utilizador de meios de comunicação seria, a título preventivo, de forma indiscriminada e de modo continuo e sistemático vigiado (mesmo pessoas cujas comunicações estivessem sujeitas a segredo profissional), não sendo tal tolerável nem justificado numa sociedade designada de democrática.
O armazenamento destes metadados implicaria momentos distintos de agressão aos direitos fundamentais. Logo inicialmente com a imposição aos operadores de telecomunicações da obrigação de conservação de dados. Depois através do acesso e utilização por parte das entidades publicas competentes desses dados. Por fim, com o desconhecimento por parte dos cidadãos anónimos “apanhados” na investigação criminal que as suas comunicações haviam sido analisadas pelas entidades públicas competentes, sem sequer serem suspeitas da prática de qualquer ilícito.
Em Portugal através da transposição daquela Diretiva 2006/24/CE os fornecedores de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis (Vodafone; Altice e Meo), por força da Lei dos Metadados (Lei 32/2008 de 17.7), tinham o dever de conservar pelo período de um ano, os dados de tráfego e de localização de todas as comunicações eletrónicas, os quais vinham especificados no artigo 4.º do mesmo diploma, entretanto julgado inconstitucional.
Antes da decisão do TJUE e do TC, perante os diversos meios de prova existentes, a doutrina e a jurisprudência portuguesa pugnavam pela necessidade de harmonizar os regimes previstos nos artigos 187.º a 189.º do CPP e na Lei nº 32/2008, de 17/07.
A propósito desta temática cumpre referir, mais uma vez, que os artigos 187.º a 189.º do CPP têm o seu campo de aplicação na interceção de comunicações, obtida em tempo real, a decorrer, entre presentes. Já o regime da Lei dos Metadados tinha como âmbito de aplicação a obtenção de dados relativos ao passado, ou seja, conservados ou armazenados, em arquivo (cf. artigo 1.º, n.º 1 da Lei nº 32/2008, de 17/07)[7].
Tais meios de prova não podiam nem podem ser confundidos. O primeiro orientado para a finalidade de obtenção de “dados de conteúdo” em tempo real era e é regulado nos artigos 187.º a 190.º do CPP. O segundo estava previsto nos artigos 4.º, 6.º e 9.º[8] da Lei dos Metadados (Lei 32/2008), agora declarados inconstitucionais nos termos do Acórdão TC nº 268/2022 de 19.4.2022, e que era destinado à obtenção de “dados de tráfego” armazenados pelas operadoras telefónicas, ou seja, relativos ao passado.
É verdade que o artigo 189.º, n.º 2 do CPP também permite aceder a “dados de tráfego”, neste caso, dados sobre a localização celular ou de registos da realização de conversações ou comunicações. Neste caso, porém, o acesso é realizado em tempo real durante a investigação criminal e não por acesso a dados armazenados nem abarca um número indeterminado de utilizadores. No âmbito da previsão deste artigo também estão incluídos os “dados de base” relacionados, com a identificação dos titulares dos cartões de telemóvel, que, se tem entendido, não contenderem com a violação intolerável do direito à vida privada e à privacidade das comunicações.
Como é pertinentemente referenciado no recente Acórdão da Relação do Porto de 1.2.2023 os fundamentos de inconstitucionalidade declarada, com força obrigatória geral, no Acórdão do TC n.º 268/2022, de 19.04, “(…) não têm aplicação na interceção de “dados de tráfego”, incluída localização celular, em tempo real durante a investigação.[9]
“(…) A interceção de dados de tráfego, como a faturação detalhada, onde constem as chamadas efetuadas e recebidas (trace-back), as localizações celulares e a identificação dos números que os contactem e as comunicações em roaming, quando obtidas em tempo real, durante a investigação, em relação a suspeitos ou arguidos (nº 4, al. a) do art. 187º, do CPP), não implica uma ingerência desproporcional nos direitos fundamentais ao respeito pela vida privada e familiar e à proteção de dados pessoais previstos nos art.ºs 7.º e 8.º da C.D.F.U.E., bem assim nos nºs 1 e 4 do art.35.º e do n.º 1 do art.26.º, da C.R.P.
III – À semelhança dos dados de conteúdo (escutas telefónicas), a interceção de dados de tráfego, incluídas localizações celulares, em tempo real, durante a investigação, pressupõe a interceção ou monitorização dos mesmos, à semelhança das escutas telefónicas, e não o recurso a base de dados de conservação ou armazenamento das operadoras relativas a todos os assinantes e utilizadores registados, situação, única, a que se refere o ac TC 268/2022 e a Lei nº32/2008, de 17 de julho.
(…) V – Relativamente aos dados de tráfego, incluídas localizações celulares, em tempo real, o regime de extensão contido no artigo 189.º, nº2, continua a ter a aplicação aos crimes de catálogo previsto no art.187º, nº1, ambos do Código Processo Penal. Nesse caso, também o regime especial do art.18º, nº1 e 3, da Lei n.º 109/2009, de 05.09 (Lei do Cibercrime) continua a ter a aplicação aos crimes de catálogo previstos nesse normativo.
VI – O arguido ou suspeito, cujos dados de tráfego e dados de localização virão a ser intercetados, beneficia das garantias de controlo estabelecidas para as escutas telefónicas nos art.s 187º e 188º, do CPP, aqui aplicáveis mutatis mutandi, não havendo razão para impor à interceção de dados de tráfego, em tempo real, uma comunicação que é dispensada na interceção de dados de conteúdo (escutas telefónicas), a pretexto do direito à autodeterminação informativa e tutela jurisdicional efetiva previstos no n.º 1 do art.35.º e do n.º 1 do art.20.º, da C.R.P..”.
Explanado o quadro legal e a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória dos apontados artigos da Lei dos Metadados, cumpre, apreciar, agora, o caso concreto.

3.2. Apreciação do caso concreto
No requerimento apresentado ao JIC o MP pediu que, nos termos do disposto nos artigos 187.º, n.º 1, alínea a) e 189.º, n.ºs 1 e 2, do CPP, se solicitasse às operadoras ALTICE, VODAFONE e NOS os eventos de rede referentes às antenas BTS (fls. 127 a 131) no período compreendido entre as 22h00 do dia 22/12/2022 e as 0h00 do dia 23/12/2022.
Depois no recurso o MP pediu a prolação de outro despacho que solicitasse às operadoras telefónicas ALTICE, VODAFONE e NOS a junção aos autos dos eventos de rede, nomeadamente das listagens de todas as chamadas e mensagens recebidas e efetuadas, registo trace-back e localização celular (hora e duração de cada comunicação) pertencentes aos quatro suspeitos, no período compreendido entre às 22h00 do dia 22 de dezembro de 2022 e às 0h00 do dia 23 de dezembro de 2022, no ..., na ..., do parque natural do ....
O pretendido pelo MP é, pois o de aceder aos “dados de tráfego” armazenados pelas operadoras e regulados pela Lei dos Metadados, cujos artigos 4.º, conjugada com o artigo 6.º, e 9.º foram declarados inconstitucionais.
Por outro lado, a pretendida aplicação do artigo 189.º do CPP não tem qualquer suporte legal, pois como já se salientou em 3.1. deste Acórdão, nesse preceito a interceção dos dados é realizada em tempo real e não para dados armazenados pelas operadoras telefónicas.
Acresce que no caso nem sequer se sabe quem são os indivíduos que sequestraram a vítima ou se transportavam telemóveis à data da prática dos factos.
Em rigor o pretendido pelo MP é aceder aos dados armazenados nas operadoras telefónicas de todos os eventos de rede referentes a duas antenas BTS (fls. 127 e 131), ou seja, aos “dados de tráfego” de um número indeterminado de cidadãos que nem sequer são suspeitos de um crime. Sendo, que embora uma das antenas se situe num local mais isolado a outra fica localizada perto do ..., na Av. ..., ..., em plena zona urbana da Vila de ...
É evidente, pois, não ter fundamento legal o pretendido pelo MP, julgando-se improcedente o recurso interposto e em consequência mantém-se a decisão proferida, embora por fundamento distinto.

III. DECISÃO
Nestes termos e com os fundamentos expostos:
1. Nega-se provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e em consequência, mantém-se a decisão recorrida, embora por fundamento distinto.
2. Sem custas.
Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 94.º, n.º 2 do CPP consigna-se que o presente Acórdão foi elaborado pela relatora e integralmente revisto pelos signatários.
Évora, 9 de maio de 2023.
Beatriz Marques Borges - Relatora
João Carrola
Gomes de Sousa

_____________________________________
[1] Proferido no P. 618/16.0SMPRT-B.S1, relatado por Vaz Pereira e disponível para consulta em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/.
[2] Disponível para consulta em https://eur-lex.europa.eu/legal-conte.
[3] Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 8 de abril de 2014, Digital Rights Ireland Ltd contra Minister for Communications, Marine and Natural Resources e o e Kärntner Landesregierung, Pedidos de decisão prejudicial apresentados pela High Court (Irlanda) e pelo Verfassungsgerichtshof. Comunicações eletrónicas — Diretiva 2006/24/CE — Serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações — Conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta desses serviços — Validade — Artigos 7.°, 8.° e 11.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, disponível para consulta em
https://eur-lex.europa.eu/legal-content/pt/TXT/?uri=CELEX%3A62012CJ0293.
[4] Disponível para consulta em https://dre.pt/dre/detalhe/acordao-tribunal-constitucional/268-2022-184356510.
[5] Disponível para consulta em https://op.europa.eu/webpub/com/carta-dos-direitos-fundamentais/pt/.
[6] Ver requerimento da Provedora de Justiça transcrito no AC TC de 3.6.2022.
[7] Esta Lei dos Metadados regula a conservação e a transmissão dos dados de tráfego e de localização relativos a pessoas singulares e a pessoas coletivas, bem como dos dados conexos necessários para identificar o assinante ou o utilizador registado, para fins de investigação, deteção e repressão de crimes graves…", e enuncia no seu artigo 4.º, as categorias de dados a conservar e, no artigo 6.º, o período de conservação (um ano a contar da data da conclusão da comunicação).
[8] O artigo 4.º identifica as categorias de dados a armazenar pelos fornecedores de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de uma rede pública de comunicações; o artigo 6.º determina a obrigação da sua conservação pelo período de um ano, a contar da data da conclusão da comunicação; e o artigo 9.º estabelece as condições de transmissão de dados armazenados ao Ministério Público ou à autoridade de polícia criminal competente:
[9] Acórdão da RP de 1.2.2023, proferido no P. 2748/22.0JAPRT-A.P1, relatado por João Pedro Pereira Cardoso.