Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
882/17.7T8ENT-B.E1
Relator: CONCEIÇÃO FERREIRAS
Descritores: EXECUÇÃO DE LETRA DE CÂMBIO
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
Data do Acordão: 06/27/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Se a garantia hipotecária abrange a livrança dada à execução, o título complexo assim formado beneficia do grau de segurança que o legislador entendeu ser o suficiente para que o credor possa avançar com a penhora sem prévio aviso aos devedores.
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 882/17.7T8ENT-B.E1 (2ª Secção Cível)



ACORDAM OS JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA


Na ação executiva, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém (Juízo de Execução do Entroncamento - Juiz 1), instaurada por Banco Comercial Português, S.A. contra (…), (…) – Sociedade de (…), SA, (…) – Sociedade Imobiliária, S.A. e (…), veio a (…), por apenso, deduzir embargos de executado por exceção e por impugnação invocando, para além do mais, naquela sede, a existência de erro na forma do processo.
A embargada/exequente apresentou contestação concluindo pela improcedência dos embargos.
Em sede de saneador apreciou-se a aludida exceção de erro na forma do processo, julgando-se a mesma procedente e, em consequência, declarou-se nulo todo o processo executivo, absolvendo-se os executados da instância.
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Inconformada com a sentença, interpôs, a embargada, o presente recurso de apelação, terminando, nas respetivas alegações, por formular as seguintes conclusões:
1. O presente recurso é admissível ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 644.º, no n.º 1 do artigo 638.º, na alínea a) do n.º 1 do artigo 645.º e no n.º 4 do artigo 647.º do CPC.
2. O ora Recorrente instaurou o presente processo executivo no passado dia 12 de Março de 2017, peticionando o pagamento da quantia total de € 1.723.507,16 acrescida dos respetivos juros e demais despesas previstas até efetivo e integral pagamento.
3. Para tanto, apresentou uma livrança já vencida e não paga, subscrita pela sociedade Executada (…) – Sociedade de (…), S.A. e avalizada pelos Executados (…) e (…).
4. Juntou ainda, em sede de requerimento executivo, uma garantia hipotecária constituída pela também Executada (…) – Sociedade Imobiliária S.A para “(…) garantia do pagamento pontual: a) Das responsabilidades assumidas ou a assumir pela sociedade comercial sua acionista única, denominada “(…) – Sociedade de (…), S.A. (…) perante o mesmo Banco até ao limite de 2.110.000,00 (dois milhões cento e dez mil euros) em capital, em euros ou em divisas, provenientes de garantias bancárias prestadas ou a prestar pelo Banco a seu pedido, créditos documentários, operações cambiais à vista ou a prazo, operações de derivados de cobertura de risco, empréstimos de qualquer natureza, aberturas de crédito sob a forma de conta corrente, livranças, letras e seus descontos, avales em títulos de crédito, fianças, débitos devidos em virtude da utilização de quaisquer cartões de pagamento, de crédito ou de débito, e de financiamentos concedidos pela permissão da utilização a descoberto de contas de depósitos à ordem, de operações de locação financeira, mobiliária ou imobiliária e de quaisquer operações de factoring, empréstimos obrigacionistas e emissões de papel comercial, até ao indicado limite”.
5. Trata-se de uma hipoteca “genérica” ou global que se caracteriza por garantir dívidas que não estão inicialmente determinadas, nem muitas vezes ainda constituídas.
6. Não se trata, portanto, de um contrato de mútuo com hipoteca, como se refere no primeiro parágrafo da segunda página da sentença ora em crise.
7. Dúvidas não há que a referida hipoteca genérica garante o pagamento da livrança dada à execução.
8. No que concerne à forma de processo executivo para pagamento de quantia certa, a regra é a citação dos executados em momento prévio à penhora, ou seja, a forma ordinária do processo.
9. Contudo, o CPC prevê a possibilidade de citação posterior à penhora, mediante a aplicação da forma sumária, concretamente nos casos do n.º 2 do artigo 550.º do CPC ou após o deferimento do requerimento de dispensa de citação prévia, previsto no artigo 727.º do CPC.
10. Ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 550.º do CPC, emprega-se a forma sumária às execuções baseadas em título extrajudicial de obrigação pecuniária vencida garantida por hipoteca ou penhor.
11. Assim, quaisquer execuções em que haja garantia real sobre o bem a penhorar, ou seja, quando haja sido constituída uma garantia real sobre a obrigação, a execução deve seguir a forma sumária, independentemente até do valor da quantia exequenda.
12. Ora, no requerimento executivo apresentado pelo Exequente é precisamente isso que se verifica, porquanto o ora Recorrente apresentou um título extrajudicial de obrigação pecuniária vencida (a livrança) garantida por hipoteca (o documento particular autenticado de constituição de hipoteca genérica).
13. Não se verificando nenhuma das exceções do n.º 3 do mencionado artigo – como é o caso – a presente execução segue a forma de processo sumário, tal como indicado no requerimento executivo.
14. Por outro lado, também não existe cumulação de execuções ao abrigo do disposto no artigo 709.º do CPC, pelo que é inaplicável o disposto no n.º 5 da mencionada disposição.
15. Salvo o devido respeito, carece de sentido dizer-se que um documento particular de constituição de hipoteca genérica se trata de um título extrajudicial de obrigação vencida, garantida por hipoteca.
16. Por outro lado, a hipoteca genérica não se trata de um título extrajudicial de obrigação pecuniária vencida, porquanto, tratando-se na verdade de uma garantia, por si só, não importa a constituição de uma obrigação, carecendo obrigatoriamente de ser complementada por outro documento que comprove a efetiva constituição da obrigação pecuniária vencida (a obrigação exequenda), in casu, a livrança apresentada.
17. Desta constatação resulta que a hipoteca genérica não poderia, por exemplo, servir – isoladamente – de base à ação executiva, por não revestir as qualidades necessárias para assumir a qualidade de título executivo.
18. De facto, conforme referiu o Tribunal da Relação de Lisboa “para que seja executivo um título tem que constituir ou certificar a existência da obrigação, não bastando que preveja a constituição dela”.[1]
19. Este entendimento encontra adesão na própria lei processual, concretamente no n.º 5 do artigo 10.º do CPC, que exige que o título determine o fim e os limites da ação executiva – segurança que não é possível alcançar quando se toma por referência exclusiva uma hipoteca genérica.
20. O referido documento particular de constituição de hipoteca é necessariamente complementado pela livrança que é o título executivo constitutivo da obrigação pecuniária vencida, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 703.º do CPC.
21. Estas duas realidades – livrança garantida por hipoteca genérica – formam um título complexo.
22. Refira-se ainda que, contrariamente ao que se refere na sentença, o Exequente não alegou na Contestação à Oposição à Execução apresentada que havia cumulação de título executivos.
23. Contudo, aqui chegados, facilmente se compreende que, contrariamente ao afirmado pelo douto tribunal a quo não só a hipoteca genérica não se trata de um contrato de mútuo com hipoteca, como também não existem diferentes títulos, nem tão pouco autonomia entre os mesmos.
24. Neste sentido, decidiu o Tribunal da Relação de Lisboa: A pluralidade de títulos executivos é, no caso em apreço, aparente. Com efeito, a escritura pública, os documentos relativos ao desconto bancário, a livrança subscrita por (…) … Lda., não obstante ela seja envolvida de força executiva própria, funcionam, por força do estatuído no n.º 2 do art. 50.º do CPC, como uma unidade. Dir-se-á, pois, que é uma situação de unidade de título executivo consubstanciado em pluralidade de documentos.”[2] (nosso destacado).
25. De tudo quanto vem dito é igualmente possível concluir que não se trata de um caso de cumulação de execuções, permitida ao abrigo do disposto no artigo 709.º do CPC.
26. Rui Pinto refere que, com o disposto no artigo 709.º do CPC “(…) quer dizer-se que o exequente pode deduzir num mesmo processo uma pluralidade de pedidos executivos contra o devedor ou grupo litisconsorcial pretendendo que todos sejam contemporaneamente procedentes. Trata-se, pois, de um regime especial de cumulação simples de execuções”.[3] (nosso destacado).
27. O Recorrente não procedeu à cumulação de execuções, porquanto não deduziu no mesmo processo uma pluralidade de pedidos executivos contra os mesmos “devedores”; o pedido é único e consiste tão só no pagamento coercivo da quantia aposta na livrança, acrescidos dos respetivos juros, devendo o ora Recorrente ser ressarcido, em primeiro lugar, pelo valor do bem sobre o qual incide a garantia real constituída a seu favor.
28. De facto, é preciso não esquecer que a situação de litisconsórcio voluntário passivo (pluralidade de partes e unidade da obrigação exequenda), que se verifica quando o Exequente pretende, desde logo, propor a execução contra o devedor e o terceiro proprietário do bem, para fazer valer de imediato a garantia real, situação expressamente permitida pelo n.º 2 do artigo 54.º do CPC, não implica necessariamente uma cumulação de execuções (possível pluralidade de partes e necessária pluralidade de pedidos).
29. Diferentemente, no caso do artigo 709.º do CPC – cumulação de execuções – permite-se ao Exequente (ou aos Exequentes litisconsortes) cumular pedidos contra o mesmo Executado (ou contra os mesmos Executados litisconsortes).
30. O que significa que o Exequente teria de ter deduzido dois (ou mais) pedidos contra todos os executados (em litisconsórcio), o que manifestamente se compreende que não ocorreu.
31. Salvo melhor opinião, o douto tribunal a quo interpretou erradamente o artigo 709.º, considerando que há cumulação de execuções, por no seu entender existirem dois títulos executivos que originam diferentes responsabilidades, hipótese que já se afastou supra. De facto, “é preciso não confundir a cumulação de títulos executivos com a prova complementar do título (…)”.[4]
32. E concluiu assim o douto tribunal que existiam duas execuções, no sentido – acreditamos – de dois pedidos diferentes contra cada um dos executados.
33. Contudo, nos autos, não só não há pedidos diferentes para cada um dos executados, pois tal consubstanciaria uma coligação (e não um litisconsórcio, que é a figura indiscutivelmente aplicável), como mesmo que existissem tal nunca consubstanciaria uma cumulação de execuções, ao abrigo do disposto no artigo 709.º do CPC, por não haver dois (ou mais) pedidos contra os mesmos executados litisconsortes.
34. Assim, não tendo o Exequente procedido à cumulação de execuções, porquanto não deduziu uma pluralidade de pedidos executivos, conforme supra se pretendeu demonstrar, não é aplicável à presente ação executivo o disposto no n.º 5 do artigo 709.º do CPC, mas sim o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 550.º do CPC.
35. Não se poderá ainda deixar de notar que o entendimento perfilhado pelo douto tribunal a quo pretende introduzir uma distinção na alínea c) do n.º 2 do artigo 550.º do CPC, onde a lei não distingue, sendo, pelo contrário, até bastante clara nos seus termos.
36. É, portanto, aplicável ao processo em apreço, a forma de processo sumária, sendo legalmente dispensada a citação prévia, devendo o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se o douto despacho saneador que absolveu os executados da instância, substituindo-o por outro que declare não verificada a exceção dilatória de erro na forma do processo, prosseguindo o processo os seus demais trâmites.

Não foram apresentadas contra alegações.

Cumpre apreciar e decidir

O objeto do recurso é delimitado pelas suas conclusões, não podendo o tribunal superior conhecer de questões que aí não constem, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento é oficioso.

Tendo por alicerce as conclusões, a questão a apreciar consiste em saber se existe ou não erro na forma de processo sumário indicada pelo Banco exequente, a justificar a nulidade de todo o processado posterior ao requerimento executivo e a absolvição dos executados da instância.


Para apreciar a questão há que ter como relevante a seguinte matéria de matéria de facto:
1. O BCP, em 12/03/2017 instaurou ação executiva, contra os executados aludidos supra, peticionando o pagamento da quantia total de € 1.723.507,16 acrescida dos respetivos juros e demais despesas previstas até efetivo e integral pagamento.
2. Para o efeito apresentou uma livrança já vencida e não paga, subscrita pela sociedade Executada (…) – Sociedade de (…), S.A. e avalizada pelos Executados (…) e (…), bem como juntou uma garantia hipotecária constituída pela também Executada (…) – Sociedade Imobiliária S.A para “(…) garantia do pagamento pontual: a) Das responsabilidades assumidas ou a assumir pela sociedade comercial sua acionista única, denominada “(…) – Sociedade de Armaduras, S.A. (…) perante o mesmo Banco até ao limite de € 2.110.000,00 (dois milhões cento e dez mil euros) em capital, em euros ou em divisas, provenientes de garantias bancárias prestadas ou a prestar pelo Banco a seu pedido, créditos documentários, operações cambiais à vista ou a prazo, operações de derivados de cobertura de risco, empréstimos de qualquer natureza, aberturas de crédito sob a forma de conta corrente, livranças, letras e seus descontos, avales em títulos de crédito, fianças, débitos devidos em virtude da utilização de quaisquer cartões de pagamento, de crédito ou de débito, e de financiamentos concedidos pela permissão da utilização a descoberto de contas de depósitos à ordem, de operações de locação financeira, mobiliária ou imobiliária e de quaisquer operações de factoring, empréstimos obrigacionistas e emissões de papel comercial, até ao indicado limite”.

Conhecendo da questão
No tribunal “a quo” foi considerado que a Exequente cumulou nos presentes autos execuções contra vários devedores e sendo, ainda, que se fundam em diferentes títulos.
E prosseguindo refere: “No que concerne à execução relativa ao titulo «livrança» e atento o valor da ação (€ 1.723.507,16), a forma de processo aplicável é a ordinária e uma vez que se trata de titulo extrajudicial de obrigação pecuniária vencida cujo valor excede o dobro da alçada do tribunal de 1ª instância (cf. artigo 550º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil).
Já quanto à execução que se funda em documento particular de constituição de hipoteca, a forma de processo a seguir é a sumária e na medida em que se trata de titulo extrajudicial de obrigação pecuniária vencida, garantida por hipoteca (cfr. artigo 550º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil). (…)
No caso os autos, atendendo a que se cumularam execuções que deveriam seguir formas de processo diferentes, a forma de processo a seguir deveria ter sido a ordinária, o que não sucedeu, já que os autos seguiram a forma de processo sumária. (…)
Verifica-se, assim, uma exceção dilatória de erro na forma de processo que, por não permitir o aproveitamento dos atos já praticados, determina a nulidade de todo o processado, nos termos do disposto no artigo 193º, nos 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Tal exceção pode ser apreciada oficiosamente e é conhecida na sentença, quando não haja despacho saneador, implicando a absolvição da instância, nos termos conjugados dos artigos 196º, 200º, nº 2, 577º, alínea b) e 576º, nos 1 e 2, todos do Código de Processo Civil.
Termos em que julgo procedente a exceção de erro na forma de processo e, em consequência, declaro nulo todo o processo executivo, absolvendo os executados da instância”.
Parece-nos que o tribunal “a quo”, incorreu em erro na apreciação do título dado à execução, quando entendeu que o exequente procedeu à cumulação de títulos executivos (livrança e hipoteca).
Aliás, o que está em contradição com que o mesmo tribunal decidiu relativamente à exceção invocada da incompetência territorial, quando refere: “No caso dos autos, sem prejuízo de haver pluralidade de executados (pessoas singulares e coletivas), temos que a divida cujo pagamento é peticionada se encontra garantida por hipoteca, pelo que a regra a aplicar será a regra especial contida no nº 2 do artº 89º do CPC”.
Na apreciação desta exceção a M.ª Juiz do Tribunal “a quo”, considerou e bem, que no caso em apreço sem prejuízo de haver pluralidade de executados, a divida cujo pagamento é peticionada se encontra garantida por hipoteca. Por tal não poderia posteriormente concluir que o exequente procedeu à cumulação de títulos executivos (livrança e hipoteca), uma vez que esta garantia o pagamento da divida peticionada que se encontrava vencida.
A hipoteca não é só por si título executivo, mas sim garantia do cumprimento da obrigação, conferindo ao seu titular o direito a ser pago pelo valor dos bens hipotecados, com preferência sobre os demais credores, nos termos do artº 686º do CC.
A escritura pública de hipoteca celebrada complementa o título executivo principal de base – a livrança dada à execução.
Na situação dos presentes autos, não estamos perante uma cumulação de execuções fundadas em títulos executivos diferentes, como entendeu a 1ª instância, mas sim perante uma única ação executiva fundada em título extrajudicial, com pluralidade de executados, cuja legitimidade decorre da assunção por parte destes da obrigação de cumprimento do contrato de empréstimo que a livrança junta aos autos titula.
É consabido que a ação executiva tem na sua base a existência de um título, pelo qual se determinam o seu fim e os respetivos limites subjetivos e objetivos, não podendo as partes constituir títulos executivos para além dos legalmente previstos (artºs 10º, nº 5 e 6, 53º a 55º e 726º, nº 3, a contrario, todos do CPC).
Os títulos executivos, são a peça necessária e suficiente à instauração da ação executiva.
No caso dos presentes autos, o exequente para além de apresentar o titulo de crédito simples que a livrança dada à execução constitui, o qual goza de literalidade e autonomia, alegou igualmente a relação subjacente á posse daquele titulo executivo, invocando a concessão de um empréstimo à sociedade devedora – (…) – Sociedade de (…), S.A., que subscreveu a livrança dada à execução, bem como as garantias de cumprimento prestadas decorrentes do aval prestado pelos executados (…) e (…), que autorizaram o exequente a proceder ao preenchimento da livrança nos termos contratualmente estabelecidos, e a garantia prestada por via da hipoteca voluntária constituída pela (…) – Sociedade Imobiliária, S. A., sobre o imóvel, sito em Benavente, para garantia do pagamento pontual das responsabilidades assumidas.
A hipoteca encontra-se registada a favor da embargada pela Ap. (…), de 2014/04/10, com o montante máximo assegurado de € 2.683.835,60 (doc. 5, junto com o requerimento executivo).
Não existe, portanto cumulação de execuções fundadas em títulos diferentes, nos termos do artº 709º do CPC.
Nos termos do artº 550º do CPC, relativo ao processo de execução, regulando a forma de processo comum para pagamento de quantia certa, estabelecendo no seu nº 1, que pode ser ordinário ou sumário, para no nº 2, afirmar que o processo sumário emprega-se nas execuções baseadas num dos títulos que as suas alíneas elencam, e concretamente na alínea c) que se refere às que sejam fundadas em titulo extrajudicial de obrigação pecuniária vencida, garantida por hipoteca ou penhor.
Conforme referem Lebre De Freitas e Isabel Alexandre in Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª edição. 479, «emprega-se o processo sumário nas execuções comuns para pagamento de quantia certa quando o título executivo seja um dos referidos no nº 2 (…) e estejam verificadas as condições dos nºs 2 e 3. Estas condições são as seguintes: (…) - Estar a obrigação pecuniária, quando constante de titulo extrajudicial, vencida e garantida por hipoteca ou penhor (nº 2-c), pois se assim não for emprega-se o processo ordinário».
Também Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo in A Ação Executiva Anotada e Comentada, 2015, 127), comentando o artº 550º do C.P.C referem «No caso da alínea c) do nº 2, para que a execução possa seguir a forma sumária, apenas se exige que seja baseada em título extrajudicial respeitante a obrigação pecuniária vencida que haja sido garantida por hipoteca ou penhor. Se a hipoteca ou o penhor não resultarem diretamente do título dado à execução, será necessário demonstrar, logo no início do processo, a existência de conexão entre o título e a respetiva garantia».
No caso em apreço, se a garantia hipotecária abrange a livrança dada à execução, o título complexo assim formado beneficia do grau de segurança que o legislador entendeu ser o suficiente para que o credor possa avançar com a penhora sem prévio aviso aos devedores.
Pelo exposto, concluímos que independentemente do valor da obrigação vencida e da existência de outros obrigados pelo título executivo, a presente execução segue a forma de processo comum sumário.
Em conformidade, procede, assim a apelação, sendo de revogar a decisão recorrida.

DECISÃO
Pelo exposto, decide-se julgar procedente a apelação e, em consequência, revogar a decisão recorrida, devendo os embargos prosseguir seus termos para apreciação das demais questões que ficaram prejudicadas pela decisão recorrida.
Custas de parte pela apelada/embargante.
Évora, 27 de Junho de 2019
Maria da Conceição Ferreira
Rui Manuel Duarte Amorim Machado e Moura
Maria Eduarda de Mira Branquinho Canas Mendes

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[1] - Acórdão da Relação de Lisboa de 28/05/1998 (Paixão Pires), disponível em www.dgsi.pt.
[2] - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, 11/07/1996, Relator: Salvador da Costa.
[3] - Rui Pinto, Manual de Execução e Despejo, Agosto 2013, Coimbra Editora, p. 325.
[4] - Eurico Lopes Cardoso, Manual da Acção Executiva, 3.ª Edição, Almedina, 1996, p. 86.