Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1277/20.0T8LLE-A.E1
Relator: JOSÉ MANUEL BARATA
Descritores: TÍTULO EXECUTIVO
ACTA DA ASSEMBLEIA GERAL DE CONDÓMINOS
EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS
Data do Acordão: 01/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I.- A solução mais consentânea com as normas implicadas e com a filosofia integradora do instituto da propriedade horizontal é a que admite a aplicação direta da norma do artigo 6.º/1, do Dec.-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro, aos proprietários dos lotes de empreendimentos turísticos, uma vez que estão submetidos genericamente ao regime legal da propriedade horizontal.
II.- Revestem a natureza de títulos executivos as atas das respetivas assembleias de proprietários, desde que preencham os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Proc.º 1277/20.0T8LLE-A.E1


Acordam os Juízes da 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora


Recorrente: (…) – Associação de Proprietários (…), Administradora do Condomínio denominado “Administração das Partes Comuns do (…) – (…)”

Recorrida: (…) Investments LLC
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No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo de Execução de Loulé – Juiz 1, no âmbito da execução proposta por (…) – Associação de Proprietários (…), Administradora do Condomínio denominado “Administração das Partes Comuns do (…)”, contra (…) Investments LLC, veio a executada opor-se por embargos por inexistência de título executivo, pedindo a consequente extinção da execução.
Em sede de despacho saneador-sentença foi proferida a seguinte decisão:
Nos termos expostos, o Tribunal decide:
a) Julgar os embargos de executado totalmente procedentes por provados e, em consequência, declara-se extinta a execução;
b) Condenar a Embargada/exequente «(…) – Associação dos Proprietários (…)» na qualidade de administradora do condomínio denominado “Administração das Partes Comuns do (…)” no pagamento das custas e demais encargos com o processo.
Registe e notifique, sendo também o (a) Senhor (a) Agente de Execução.

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Não se conformando com o decidido, a recorrente (…) apelou formulando as seguintes conclusões, que delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, artigos 608.º/2, 609.º, 635.º/4, 639.º e 663.º/2, do CPC:

25. O argumento da Apelante é, em suma, o seguinte:

a. Como foi recentemente decidido nesta Colenda Relação, nos doutos acórdãos citados (§ 17º), que versaram sobre este mesmo loteamento, e é jurisprudência dominante, as atas das reuniões das assembleias dos proprietários dos lotes, como as aqui dadas à execução, são tidas como atas de assembleias de condóminos, designadamente para efeitos do disposto no Artigo 6.º, n.º 1, do DL n.º 268/94, de 25 de outubro.

b. Com efeito, este DL contém normas regulamentares dos Artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil, os quais são aplicáveis ao loteamento dos autos por força da remissão do Artigo 43.º, n.º 4, do RJUE.

c. Não se trata, portanto, de aplicação analógica do Artigo 6.º, n.º 1, do DL n.º 268/94, mas de aplicação direta.

d. O entendimento oposto, que nega a exequibilidade destas atas, não serve os interesses da comunidade jurídica, nem dos inúmeros loteamentos aos quais esta questão se aplica, pois seria de todo impraticável, e incomportável para os tribunais, que se obrigassem os condomínios como a Apelante, com dezenas de condóminos, a intentar ações declarativas de cada vez que um deles não pagasse voluntariamente as contribuições devidas.

e. Sendo julgada procedente a apelação, e por força do Artigo 665.º do Código de Processo Civil, deverão V. Exas. apreciar as demais questões colocadas para decisão, que não foram apreciadas em face da solução dada ao litígio, julgando totalmente improcedentes os embargos.

f. No entender da Apelante, a douta decisão recorrida violou as regras legais mencionadas no corpo das presentes alegações, em especial o Artigo 6.º, n.º 1, do DL n.º 268/94, de 25 de outubro.

26. Por tudo o exposto, requer-se a V. Exas. reformem a douta decisão recorrida, julgando improcedentes os embargos de executado, aceitando que a Apelante dispõe de título executivo para cobrança dos valores cujo pagamento está a ser reclamado, ordenando, por isso, o prosseguimento da execução.


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Contra-alegou a recorrida, mas não formulou conclusões, pedindo a improcedência do recurso.

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As questões que importa decidir são:
1.- A exequibilidade do título executivo dado à execução, consubstanciado em atas de assembleia do condomínio (…).
2.- A ausência de permilagem e a não unanimidade da aprovação do Regulamento do Condomínio.
O tribunal a quo deu como provada e não provada a matéria de facto constante da sentença, não tendo a mesma sido impugnada nem havendo lugar oficiosamente a qualquer alteração da matéria de facto, pelo que se remete para os termos da decisão de 1ª instância que decidiu tal matéria, nos termos do artigo 663.º/6, do CPC.
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Conhecendo.
Um dos pressupostos da ação executiva, porventura o mais importante, é que o dever de prestar conste de um título, o título executivo.
Sem este pressuposto formal, inexiste o grau de certeza que o sistema tem como necessário para o recurso à ação executiva, ou seja, à realização coativa de uma determinada prestação.
Tal título deve oferecer a segurança mínima reputada suficiente quanto à existência do direito de crédito que se pretende executar.
“O título executivo constitui pressuposto de carácter formal da ação executiva, destinado a conferir à pretensão substantiva um grau de certeza reputado suficiente para consentir a subsequente agressão patrimonial aos bens do devedor.
Constitui, assim, a base da execução, por ele se determinando o tipo de ação e o seu objeto (artigo 45.º/1), assim como a legitimidade ativa e passiva para a ação (artigo 55.º/1)” – Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1999, pág. 87.
Nenhuma ação executiva deve ter seguimento sem que o tribunal de execução interprete o título que lhe serve de fundamento e, sempre que existam dúvidas acerca do tipo ou do objeto da obrigação titulada, o título não é exequível e o credor tem de recorrer previamente a uma ação declarativa de condenação ou de simples apreciação – Lebre de Freitas, “A acção executiva depois da reforma da reforma”, 5.ª edição, pág. 35.
Os títulos executivos estão tipificados no artigo 703.º/1, do CPC, podendo ser atribuída por lei força executiva a outros documentos (alínea d)).
Nestes se inclui o previsto no Dec. Lei 268/94, de 25-10 – a ata de reunião da assembleia de condóminos constituída por um documento particular (artigo 363.º do CC).
Nos termos do disposto no artigo 6.º/1, daquele diploma, “A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.”
Na exposição de motivos do Dec.-Lei n.º 268/94 consignou-se o seu objetivo: “procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros”.
De onde se infere que a occasio legis e a ratio do preceito estão na constatação de que existia na comunidade um foco de conflitualidade nas relações de condomínio que implicava ações declarativas por valores diminutos, pelo que a teleologia da norma se orientaria para a procura de soluções céleres e eficazes para a litigiosidade alargada que geralmente se constitui nas relações entre condóminos, tudo no respeito pelo preceituado no artigo 9.º do Código Civil (designadamente que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, apesar de nela dever ter um mínimo de correspondência verbal).
A questão controvertida nestes autos é a de saber se as atas dadas à execução são título executivo, nos termos previstos no Dec. Lei 268/94, de 25-10, aplicável a relações entre proprietários cujas propriedades não se integraram em propriedade horizontal, mas que são submetidas ao regime dos artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil.
Esta questão tem sido reiteradamente decidia por este tribunal da Relação em vários arestos encontrando-se a jurisprudência pacificada quanto à questão levantada.
Por isso, se transcreve a apreciação da mesma questão e relativamente à mesma exequente/embargada, ora recorrida, efetuada no Acórdão de 09-06-2022, Proc.º 1370/20.0T8LLE-A.E1, que, aliás, se apoia igualmente em anteriores arestos deste tribunal, todos concluindo no mesmo sentido:
A questão a decidir concernente à (in)existência de título executivo enuncia-se de forma mais concretizada nos seguintes termos: as atas dadas à execução são título executivo, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 268/94, de 25-10, que é aplicável a realidades não constituídas em propriedade horizontal, mas que estão submetidas ao regime dos artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil, como é o caso do loteamento (…)?
A sentença recorrida considerou que não, em suma, por entender que a remissão feita pelo artigo 43.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16-10 (Regime Jurídico da Urbanização e Edificação - RJUE) ser apenas para os artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil não estando aí incluída a regra do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25-10, e dada a excecionalidade da norma, não comporta aplicação analógica, não podendo, por isso, ser aplicada ao caso dos autos.
A sentença segue a jurisprudência acolhida no Ac. da Relação de Lisboa de 12-12-2013, lendo-se no respetivo sumário: «O artigo 6.º, n.º 1, do DL n.º 268/94, de 25 de Outubro, ao dispor sobre a formação de título executivo, é uma norma excecional que não comporta aplicação analógica, ainda que permita uma interpretação extensiva (artigo 11.º CC), não sendo por isso aplicável à situação de compropriedade resultante de loteamento.»
Porém, a questão tem sido decidida em sentido diverso em vários arestos desta Relação de Évora em situações em tudo semelhante à dos autos, inclusivamente em relação ao mesmo loteamento (...), e que, salvo o devido respeito, se afigura mais consentânea com a interpretação das normas em causa e com a realidade económica e social que a situação apresenta.
Por ordem de antiguidade da sua prolação, mencionam-se:
- Ac. RE, de 05-11-2020, lendo-se no sumário:

«Para efeitos de aplicação do regime legal atinente à propriedade horizontal, considera-se condomínio a realidade decorrente de operação de loteamento (cfr. artigos 1438.º-A do CC e 43.º/4, do DL n.º 555/99, de 16/10);
- As atas das reuniões das assembleias dos proprietários dos lotes são tidas como atas de assembleias de condóminos, designadamente para efeitos do disposto no artigo 6.º/1, do DL n.º 268/94, de 25/10, podendo assumir a qualidade de título executivo se apresentarem as caraterísticas enunciadas nesse normativo;».

- Ac. RE, de 24-02-2022, lendo-se no sumário:
«A solução mais consentânea com as normas implicadas e com a filosofia integradora do instituto da propriedade horizontal é a que admite a aplicação direta da norma do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 268/94 (com natureza regulamentar) aos proprietários dos lotes de empreendimentos turísticos, uma vez que estão submetidos ao regime legal da propriedade horizontal.»
- Ac. RE de 10-03-2022[4], lendo-se no sumário:
«I – Para efeitos de aplicação do regime legal atinente à propriedade horizontal, considera-se condomínio a realidade decorrente de operação de loteamento (cfr. artigos 1438.º-A do CC e 43.º, n.º 4, do DL n.º 555/99, de 16/10.
II - As atas das reuniões das assembleias dos proprietários dos lotes são tidas como atas de assembleias de condóminos, designadamente para efeitos do disposto no artigo 6.º, nº 1, do DL n.º 268/94, de 25/10, assumindo a qualidade de título executivo se apresentarem as caraterísticas enunciadas naquele normativo.”
- Ac. RE, de 28-04-2022, lendo-se no sumário:
«1 – A solução mais consentânea com as normas implicadas e com a filosofia integradora do instituto da propriedade horizontal é a que admite a aplicação direta da norma do art. 6.º do Decreto-Lei n.º 268/94 (com natureza regulamentar) aos proprietários dos lotes de empreendimentos turísticos, uma vez que estão submetidos genericamente ao regime legal da propriedade horizontal.
2 – Consequentemente, revestem a natureza de títulos executivos as atas das respetivas assembleias de proprietários, desde que preenchem os requisitos gerais de exequibilidade.»
A fundamentação jurídica que sustenta o largo consenso que se vem formando nesta Relação sobre esta matéria, encontra-se sintetizada no supracitado acórdão de 24-02-2022, que passamos a transcrever:
«Está em causa determinar se as atas das assembleias de proprietários duma urbanização que disponha de espaços comuns se integra na categoria de “documentos que, por disposição especial, seja atribuída força executiva”, nos termos do artigo 703.º, 1, d), do CPC.
Entendeu o tribunal a quo que inexiste título executivo, porquanto o artigo 6.º do DL n.º 268/94, de 25-10 que estabelece normas regulamentares do regime da propriedade horizontal, e que atribui o estatuto de título executivo à ata da assembleia de condóminos, é uma norma excecional e enquanto tal não tem aplicação analógica (artigo 11.º do CC).
Desse modo, o artigo 43.º, n.º 4, do DL n.º 555/99, de 16-12 (Regime Jurídico da Urbanização e Edificação) que prevê que: - “4 - Os espaços verdes e de utilização coletiva, infraestruturas viárias e equipamentos de natureza privada constituem partes comuns dos lotes resultantes da operação de loteamento e dos edifícios que neles venham a ser construídos e regem-se pelo disposto nos artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil” - não remete em bloco para o regime da propriedade horizontal, remete apenas para os artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil, ou seja, para uma parte desse regime, não podendo, por isso, apesar da analogia de situações, abranger a norma do artigo 6.º do DL 268/94 de 25-10, por ser esta uma norma excecional.
Seguiu o tribunal a quo, de muito perto, a fundamentação do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12/12/2013, proferido no processo n.º 2292/10.8TBOER-A.L1-8 (Luís Correia de Mendonça).
Cremos que não obstante o rigor formal dessa interpretação, outro é o nosso entendimento, em concordância, entre outros, com o acórdão desta Relação de Évora de 05/11/2020, proferido no processo n.º 3152/18.0T8LLE-A.E1 e que contempla um litígio semelhante ao dos autos.
Vejamos:
Está em causa um empreendimento do tipo aldeamento turístico que tem diversas áreas ou espaços verdes, e equipamentos existentes nos lotes (identificados no título executivo), de natureza privada e de utilização coletiva e que constituem partes comuns das moradias e dos blocos de apartamentos resultantes dos loteamentos licenciados e construídos.
Dispõe o artigo 43.º, n.º 4, do DL n.º 555/99, de 16-10 (Regime Jurídico da Urbanização e Edificação) que: «Os espaços verdes e de utilização coletiva, infraestruturas viárias e equipamentos de natureza privada constituem partes comuns dos lotes resultantes da operação de loteamento e dos edifícios que neles venham a ser construídos e regem-se pelo disposto nos artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil».
Os artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil para que o diploma remete contemplam o regime da propriedade horizontal no respeitante aos “Direitos e encargos dos condóminos” e “Administração das partes comuns do edifício”.
Sendo, por força de tal remissão, aplicável ao empreendimento dos autos o regime do Código Civil atinente aos direitos e encargos dos condóminos, entendidos como tal os proprietários dos lotes que beneficiam dessas partes comuns (artigos 1420.º a 1429.º-A do CC) e, atinente à administração das partes comuns do edifício, entendido como tal os lotes dos proprietários (artigos 1430.º a 1438.º-A do CC).

Ora, o regime da propriedade horizontal constante do Código Civil e em que assenta a remissão, foi alterado pelo DL n.º 267/94, de 25-10 (que veio alterar o regime da propriedade horizontal constante do Código Civil e o Código do Registo Predial) constituindo o DL n.º 268/94, de 25-10 regulamentação dele, logo, também daquela parte do Código Civil.
Este DL n.º 268/94, de 25/10, surgiu da “necessidade de desenvolver alguns aspetos do regime da propriedade horizontal, aliada à opção de preservar a integração da disciplina daquele instituto no Código Civil, explica a aprovação do presente diploma. Na verdade, as regras aqui consagradas estatuem ou sobre matérias estranhas à natureza de um diploma como o Código Civil ou com carácter regulamentar, e têm o objetivo de procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros”, conforme se lê na sua introdução.
Entre essas normas regulamentares, estatuiu que a ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte – cfr. artigo 6.º, n.º 1.
A solução mais consentânea com as normas implicadas e com a filosofia integradora do instituto da propriedade horizontal é a que admite a aplicação direta da norma do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 268/94 (com natureza regulamentar) aos proprietários dos lotes de empreendimentos turísticos, uma vez que estão submetidos ao regime legal da propriedade horizontal (às partes verdes e de utilização coletiva infraestruturas viárias e equipamentos de natureza privada destes aplicam-se as normas dos artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil).
Resulta da factualidade provada que, os proprietários dos lotes aprovaram um regulamento que denominaram de Regulamento de Condomínio.
Reuniram regularmente em assembleia de proprietários do condomínio, submetendo a votação as contas e os orçamentos anuais relativos a encargos com espaços tidos como comuns. Nomearam administração, reclamaram o pagamento de verbas aos proprietários dos lotes, nomeadamente à recorrente. O que, se compatibiliza com o regime legal da propriedade horizontal consagrado nos artigos 1420.º e ss. do CC.
Assim, ao contrário do tribunal a quo é nosso entendimento que as atas juntas aos autos de execução constituem título executivo, nos termos do n.º 1 do artigo 6.º do DL n.º 268/94, de 25.10.
Tendo o legislador atribuído força executiva à ata da assembleia de condóminos, aqui proprietários, permitindo ao “condomínio” aqui “associação de proprietários do aldeamento com empreendimento turístico” a instauração de ação executiva contra o proprietário da fração (condómino) devedor, relativamente à sua contribuição para as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, na proporção acordada, nos termos do artigo 1424.º do Código Civil, fica o “condomínio” dispensado de recorrer ao processo de declaração a fim de obter o reconhecimento desse crédito.
A fonte da obrigação pecuniária do condómino deriva da aprovação da despesa em assembleia de condóminos, não da vontade expressa ou implícita do condómino em integrar o condomínio.
Tendo, contudo, ao seu alcance, a possibilidade de votar contraproposta que considere ilegal ou antirregulamentar, bem como de impugnar a ata da assembleia de condóminos nos termos do artigo 1433.º do CC.
A ata da assembleia de condóminos que aprove o orçamento das despesas é título executivo contra os condóminos que a não impugnaram, para obter o pagamento das contribuições não pagas atempadamente (Ac. TRE de 15-12-2009, P. 793/04.6TBEVR.E1).
O silêncio dos condóminos é considerado como aprovação da deliberação comunicada (artigo 1432.º, n.º 11, CC).
Ora, no caso em discussão, nada se demonstra que permita considerar não estarem os embargantes vinculados ao conteúdo das atas.»
Concorda-se inteiramente com a interpretação jurídica acima exposta tanto mais que está em causa o mesmo loteamento e a situação factual é exatamente a mesma.
Concluindo-se, assim, que existe título executivo, pelo que não pode subsistir a sentença proferida, que tem de ser revogada.
O que significa que têm de ser apreciadas as questões suscitadas na oposição á execução e que ainda não se encontram decididas, ao abrigo do disposto no artigo 655.º, n.º 2, do CPC.
No artigo 160.º da oposição, a embargante alega que, não havendo propriedade horizontal, não existe permilagem, pelo que não se podem fixar os valores a pagar por cada titular.
Contudo, como consta do ponto 3 da matéria de facto provada, para além do mais, o seguinte:
“Ata da Assembleia geral Extraordinária do Condomínio (…), 23 de Novembro de 2012. Agenda. 1. Aprovação do novo Regulamento do Condomínio que compreende as Regras Principais (contidas no corpo base do Regulamento) e as Regras Complementares (contidas nos Anexos às Regras Principais) (…)
2. Aprovação especifica, para efeitos de registo subsequente na Conservatória do Registo Predial, da seguinte regra “o valor relativo de cada Unidade Habitacional no Condomínio do (…), incluindo moradias e apartamentos (i. e. todas e cada uma das unidades habitacionais desanexadas das descrições do registo predial com os números … ou … da freguesia de Almancil, do concelho de Loulé), será estabelecido com base no número de camas disponíveis em cada Unidade Habitacional (estipulando-se para o efeito que cada quarto de dormir corresponde a duas camas) de acordo com o licenciamento ao abrigo do qual foi emitida a licença de utilização ou habitação original de cada Unidade, de que resultam os valores relativos constantes da lista anexa.”
Assim sendo, os proprietários das moradias e apartamentos estipularam um critério seguro para repartir os encargos com as partes comuns do condomínio (…), equivalente à permilagem na propriedade horizontal, o que implica, também por este motivo, a improcedência dos embargos, devendo a execução seguir os seus termos.
Numa outra vertente, também não merece provimento a alegação da embargante acerca da consequência da deliberação que aprovou o regulamento do condomínio, onde se fixou a forma de determinar as responsabilidades de cada casa e apartamento pelas despesas das partes comuns.
Esta questão também tem sido objeto de várias decisões jurisprudenciais neste tribunal da Relação de Évora, todas no mesmo sentido, pelo que retomamos, sobre a mesma, o citado acórdão de 09-06-2022, Proc.º n.º 1370/20.0T8LLE-A.E1, onde se escreveu:
“No que concerne à aprovação do Regulamento das partes comuns, falta de participação/aprovação por parte dos Embargantes e inexistência de uma realidade condominial caraterística da propriedade horizontal, importa sublinhar que estamos perante uma operação de loteamento que implicou na constituição de múltiplos lotes com áreas de utilização coletiva de natureza privada, ao qual se aplica, como já acima referido, os artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil (e não todo o regime da propriedade horizontal).
Efetivamente, nos termos do artigo 2.º, alínea i), do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16-10 (RJUE), e alterações posteriores, definem-se as operações de loteamento como «as ações que tenham por objeto ou por efeito a constituição de um ou mais lotes destinados, imediata ou subsequentemente, à edificação urbana e que resulte da divisão de um ou vários prédios ou do seu reparcelamento».
E nos termos do artigo 43.º, n.º 4, do RJUE, «os espaços verdes e de utilização coletiva, infraestruturas viárias e equipamentos de natureza privada constituem partes comuns dos lotes resultantes da operação de loteamento e dos edifícios que neles venham a ser construídos e regem-se pelo disposto nos artigos 1420.º a 1438.º-A do Código Civil.»

Destes normativos concluiu-se que aos loteamentos onde foi ou venha a ser feita edificação urbana da qual resulte divisão de um ou vários prédios ou do seu reparcelamento, aplica-se o regime atinente aos direitos e encargos dos condóminos, entendidos estes como os proprietários dos lotes que beneficiam dessas partes comuns, como resulta dos artigos 1420.º a 1429.º-A do Código Civil, aplicando-se à administração das partes comuns do edifício, entendido como lotes, o disposto nos artigos 1430.º a 1438.º-A do Código Civil.
No caso em apreço, o Regulamento de 23-11-2012 foi aprovado por maioria e a validade da deliberação da aprovação não depende da unanimidade de todos os proprietários, constando no Ponto I («Aspectos Gerais»), o seguinte:
«1. Este Regulamento aplica-se ao condomínio existente sobre as áreas comuns do Empreendimento (…), objeto de propriedade comum a todos e cada um dos lotes (e edifícios neles construídos) conforme disposto no artigo 43.º, n.º 4, do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação regulado pelo Decreto-lei n.º 555/99.
2. O (…) compreende toda a área designada no Plano de Urbanização da (…) como Lote (…) e corresponde ao conjunto dos loteamentos licenciados pela Câmara Municipal de Loulé ao abrigo dos alvarás de loteamento (…) e (…), respeitantes à 1ª Fase, Aldeamento Turístico do (…) e à 2ª Fase, Aldeamento Turístico do (…), respetivamente, conforme planta que se junta como Anexo I.
3. O Regulamento tem por objeto direto a utilização das áreas comuns e a prestação dos serviços comuns e aplica-se indiretamente à utilização das Unidades Habitacionais, na medida em que tal utilização possa afetar o uso das áreas comuns.
4. São destinatários do Regulamento todos os Proprietários e demais utilizadores das Unidades Habitacionais por direito próprio ou mediante autorização dos respetivos proprietários, o Administrador e todas as pessoas ou entidades que o auxiliem ou colaborem com o mesmo no exercício das suas funções.»
Ora, a recorrida adquiriu a propriedade em causa nos autos – moradia … – 1ª Fase, Aldeamento Turístico do (…) –, identificada no ponto 5. da matéria de facto provada, constando do ponto 4. que constitui uma das 92 moradias do aldeamento, encontrando-se servida por áreas comuns também ali identificadas.
Por outro lado, não existem sinais nos autos de que a embargante tenha impugnado a aprovação do Regulamento em causa, o que poderia ter efetuado ao abrigo do que dispõe o artigo 1433.º do Código Civil.
De onde se conclui que a quantia exequenda é certa, líquida e exigível, pelo que improcedem os embargos na totalidade.
Em consequência, procede a apelação, o que implica a revogação da sentença apelada e o prosseguimento da execução.
No sentido do decidido cfr. também os Acórdãos deste TRE de 24-02-2022, Proc.º n.º 1372/20.6T8LLE-A.E1; 10-03-2022, Proc.º n.º 1368/20.8T8LLE-A.E1; 28-04-2022, Proc.º n.º 1276/20.2T8LLE-A.E1; 09-06-22, Proc.º n.º 1370/20.0T8LLE-A.E1 e 12-07-2018, Tomé Ramião, Proc.º n.º 3148/17.9T8FAR.E1.
***

Sumário:

(…)


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DECISÃO.

Em face do exposto, a 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora julga:

1.- Procedente a apelação e revoga a sentença recorrida.

2.- Improcedente a oposição à execução, determinando-se o seu prosseguimento.

Custas pela recorrida – Artigo 527.º do CPC.
Notifique.

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Évora, 12-01-2023

José Manuel Barata (relator)

Cristina Dá Mesquita

Rui Machado e Moura