Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
11/10.8TBPRL.E1
Relator: FRANCISCO XAVIER
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
DANOS CAUSADOS POR ANIMAIS
ACIDENTE DE VIAÇÃO
CONTRATO DE SEGURO
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
Data do Acordão: 09/16/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Sumário:
I. Provando-se que o acidente ocorreu porque os animais seguros invadiram, repentinamente e em corrida, a faixa de rodagem, completamente descontroladas e sem as condições mínimas de segurança impostas por lei, nomeadamente nos termos dos artigos 11º, n.º 1, e 97º, n.º 1, 3 e 6, do Código da Estrada, mostra-se preenchida a cláusula inserida nas condições particulares da apólice de seguro celebrado entre o dono dos animais e a seguradora, na qual se exclui do âmbito da garantia os danos causados pelos animais seguros quando estes transitem, permaneçam ou invadam a via pública sem as condições de segurança impostas por lei vigente ou disposições administrativas.
II. Neste contexto a seguradora não pode ser responsabilizada pelo pagamento dos danos causados.
Decisão Texto Integral:
Acórdão na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:

I – Relatório
1. AA, propôs a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra BB, e CC, pedindo a condenação das RR. no pagamento das seguintes quantias:
- Por danos patrimoniais, decorrentes da perda total do veículo, € 11.116,77;
- Por danos patrimoniais, decorrentes do contrato de crédito celebrado com a “DD – Instituição Financeira de Crédito, S. A.”, € 8.656,02;
- Por danos patrimoniais, decorrentes do contrato de crédito celebrado com o “Banco DD, S. A.”, para a aquisição de um novo veículo automóvel, € 4.610,39;
- Por danos patrimoniais, decorrentes da privação do uso de veículo automóvel, € 10.512;
- Por danos não patrimoniais, decorrentes das limitações sofridas na sua vida profissional e pessoal, € 3.500;
- Por danos não patrimoniais, físicos e psicológicos, € 1.500;
- Totalizando € 39.895,18;
- Juros de mora sobre esta última quantia, à taxa supletiva legal, desde a data da citação até integral pagamento.

2. Para tanto, alegou, sem síntese, que: - No dia 03.08.2008, cerca das 6.45 horas, o autor conduzia o seu veículo ligeiro na Estrada Regional n.º 384, sentido Oriola – Portel, pela meia faixa direita de rodagem, atento o seu sentido de marcha, a uma velocidade de 70/80 km/hora; - Ao km 19,400, de forma súbita, surgiram na faixa de rodagem, à sua frente e em corrida, quatro ovelhas, uma das quais foi embater contra a parte direita do veículo do autor, provocando avultados danos neste último; - As ovelhas pertenciam à ré BB, a qual, por ter incumprido o seu dever de guarda e vigilância, é a responsável pelo acidente causado pela sua ovelha; - A responsabilidade civil da ré CC decorre de um contrato de seguro por ela celebrado com a ré BB; - O acidente causou danos ao autor, cujo ressarcimento este pretende nesta acção.

3. A R. BB contestou alegando, em síntese, o seguinte: - O autor seguia em excesso de velocidade; - As ovelhas estavam à guarda do pastor, que se encontrava junto ao local do embate; - Tanto que o pastor conseguiu evitar que três delas permanecessem na faixa de rodagem e só não conseguiu fazer o mesmo relativamente àquela que embateu no veículo do autor porque este seguia com excesso de velocidade; - Pelo que a responsabilidade pelo acidente não é exclusivamente da ré; - A responsável pelo ressarcimento dos danos sofridos pelo autor é a ré CC, pois não se verifica qualquer causa de exclusão da responsabilidade desta última, já que os animais estavam devidamente vigiados por um pastor; - As cercas estavam em normais condições de utilização; - Os animais não atravessavam, transitavam ou permaneciam na via pública, devendo-se a invasão desta por aqueles a circunstâncias imprevisíveis e absolutamente fortuitas e independentes da vontade da ré, constituindo um facto meramente pontual; - Desconhece, pelo que impugna, os danos alegados pelo autor; - É incompreensível o pedido formulado pelo autor quanto à privação do uso do veículo, que constitui litigância de má fé, já que nunca aquele alugou outro veículo ou solicitou tal aluguer a qualquer das rés; - A acção deve ser julgada improcedente, por não provada, com a consequente absolvição da ré da totalidade do pedido; e - Mais requer que a responsabilidade resultante do acidente seja considerada exclusiva da ré CC, reconhecendo-se a validade integral do contrato de seguro celebrado entre ambas as rés.

4. Também a R. CC contestou, confirmando a existência do contrato de seguro de responsabilidade civil com a ré BB, que tinha por objecto 300 cabeças de gado ovino propriedade desta, que o capital seguro era de € 25.000, sendo aplicável uma franquia de 10% dos prejuízos indemnizáveis, com o mínimo de € 50, mas invocando que o acidente dos autos não é enquadrável nas garantias do contrato de seguro, pois este último exclui os danos causados pelos animais seguros quando estes transitem, permaneçam ou invadam a via pública sem as condições de segurança impostas por lei vigente ou disposições administrativas.
Alegou ainda que: - O valor venal do veículo do autor era de € 7.000, sendo o valor do salvado de € 2.300; - Ainda que seja exacto aquilo que o autor alega, o mesmo não tem direito ao pagamento do valor dos empréstimos contraídos com vista à compra do veículo acidentado e do segundo veículo que refere; - O autor não esclarece a razão pela qual não adquiriu outro veículo logo que verificou que o acidentado era irrecuperável; - O autor não alugou qualquer veículo, não lhe advindo, da eventualidade de ter estado algum tempo sem dispor de veículo automóvel, quaisquer danos de natureza patrimonial; - As maçadas que o autor alega ter sofrido não constituem verdadeiros prejuízos que mereçam a tutela do direito; - As indemnizações que o autor peticiona a título de “privação do uso de veículo automóvel” e “limitações da sua vida pessoal e profissional” não são cumuláveis e excluem-se uma à outra; - O valor indicado como o da locação de um veículo equivalente ao sinistrado poderá corresponder ao de um aluguer de poucos dias, sendo exageradíssimo se se considerar que o autor fala de um período de privação de quase dez meses, pois os alugueres de longa duração são muito mais baixos; e - As indemnizações reclamadas a título de danos não patrimoniais são muito exageradas.
Deste modo, concluiu pela sua absolvição do pedido.

5. Foi proferido despacho saneador tabelar e seleccionada a matéria de facto assente e controvertida.
Realizado o julgamento o tribunal respondeu à base instrutória como consta de fls. 347 a 354, que não foi objecto de reclamações, após o que veio a ser proferida a sentença de fls. 362 a 378 (ref.ª 189739), na qual se decidiu julgar a acção parcialmente procedente:
a) Condenando a ré BB a pagar ao autor, AA, as seguintes quantias:
- € 4.700 (quatro mil e setecentos euros), correspondente ao valor do veículo à data do acidente descontado do valor dos salvados;
- € 10.512 (dez mil, quinhentos e doze euros), correspondente ao dano decorrente da privação do uso de veículo automóvel;
- € 4.000 (quatro mil euros) por danos não patrimoniais;
- Juros de mora sobre todas estas quantias, à taxa supletiva legal, desde a data da citação até integral pagamento.
b) Absolvendo a ré BB dos restantes pedidos formulados pelo autor;
c) Absolvendo a ré CC de todos os pedidos formulados pelo autor.
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6. Desta decisão recorreu a R. BB, para este Tribunal da Relação, motivando o recurso, como consta de fls. 383 a 390, tendo, após convite do relator, condensado os fundamentos do recurso nas seguintes conclusões (cf. fls. 453 a 455):
a) A douta sentença recorrida absolveu a Ré companhia de seguros CC de todos os pedidos formulados pelo Autor, por entender que da garantia da apólice estão excluídos os danos causados pelos animais seguros quando estes transitem, permaneçam ou invadam a via pública sem as condições de segurança impostas por lei ou disposições administrativas;
b) Uma vez que considerou provado que o acidente dos autos foi causado por um animal que invadiu a via pública sem as condições de segurança impostas pelos artºs, 11°, n.º 1 e 97°, n.ºs 1, 3 e 6, do Código da Estrada, pelo que assim não responderá esta Ré pelos danos sofridos pelo Autor;
c) Nesta medida, e em consequência, considera como única responsável por tais danos a Ré BB, ora recorrente;
d) A ora recorrente não se conforma com esta decisão por entender que a douta sentença faz no caso dos autos uma errada interpretação das referidas normas do Código da Estrada;
e) O animal que esteve na origem do acidente não circulava ou vagueava na via pública, nem nela se encontrava a ser conduzido, não se tratando também de um caso de entrada do dito animal na via pública, o que afasta o enquadramento da situação ocorrida na previsão das normas legais indicadas;
f) Tratou-se isso sim de uma entrada descontrolada na via pública do animal, ou seja, de um caso fortuito, imponderável e imprevisível;
g) O que cabe no âmbito do contrato de seguro celebrado entre a Ré BB, ora recorrente, e a Ré, CC;
h) No caso em apreço, foi precisamente uma fuga imprevisível do animal que esteve na causa do acidente, sendo de todo impossível atribui-la a uma atitude descuidada do pastor;
i) Mais se provou na douta sentença que o acidente não ocorre numa situação de atravessamento do rebanho ou de circulação ou permanência deste na via pública, muito menos sem se observarem as condições de segurança na via pública;
j) Nestes termos, entende a recorrente que o contrato de seguro, sendo válido, como é, prevê e admite a transferência da responsabilidade civil para a Ré CC na situação dos autos, devendo, por isso, a mesma ser a única responsável pelo pagamento da indemnização dos danos sofridos pelo autor;
k) Por outro lado, a douta sentença recorrida condena a Ré BB, ora recorrente, ao pagamento de indemnização por danos patrimoniais, a saber: por perda do veículo, na quantia de € 4 700; por privação do uso de veículo automóvel entre 3-08-2008, data do acidente, e 18-05-2009, na quantia de € 10 512;
1) Ora, no respeitante à indemnização por estes últimos danos, não pode a ora recorrente conformar-se com a sua condenação, uma vez que entende não se justificarem, nem ter ficado demonstrado que os danos efectivamente ocorreram;
m) O Autor veio dizer que contactou empresas de aluguer de automóveis para saber qual o preço diário de aluguer de um veículo, ainda que de classe inferior ao seu, que lhe permitisse substituir o sinistrado, tendo encontrado, como preço mais baixo, o de € 36,50 por dia;
n) Mas não procedeu ao seu aluguer, nem o solicitou à ora recorrente ou à Ré CC;
o) Para que os danos em causa pudessem ser indemnizados, teriam os mesmos de ser reais, e não meramente virtuais ou hipotéticos, como decorre dos artigos 483°, n.º 1, 562°, 563°, 564° e 566°, do C.C., os quais foram, assim, violados pela douta sentença recorrida;
p) Ficou demonstrado nos autos que o autor recorreu durante esse tempo ao auxílio de colegas, com trocas de escalas de serviço, folgas e fins-de-semana e com o fornecimento de transporte (cf. nºs 38 a 41 da fundamentação de facto, a fls ... );
q) Sem conceder, ainda que se entendesse haver lugar à indemnização, sempre a douta sentença, em nome da equidade e da justiça, teria de levar em linha de conta este auxílio prestado pelos colegas do autor, fixando a indemnização em valor substancialmente mais baixo, em vez de aplicar a fórmula matemática simples, mas injusta e nada equitativa, de multiplicar 288 dias por € 36.50;
r) Até porque, em função da matéria de facto atrás aludida, a privação relevante do veículo para a eventual indemnização, era nas folgas, nos fins de semana, nas férias e nas deslocações semanais a casa de seus pais, na Amieira, e não em todos os 288 dias;
s) Diga-se ainda que os hipotéticos transtornos pela não utilização do veículo, em virtude do acidente, são também tidos como danos não patrimoniais pelo Autor, e a sentença fixou-os em € 3.000;
t) O que é errado e injusto uma vez que devem ser considerados como já indemnizados no âmbito da indemnização fixada a título de danos patrimoniais, no valor de € 10.512,00;
u) Quanto à indemnização pelos danos não patrimoniais físicos e psicológicos, fixada em € 1.000, considera-se igualmente que o Autor não provou quais foram, em concreto, e em que medida ou quanto duraram, limitando-se a dizer que teve dores e que ficou num estado depressivo e de sofrimento, pelo que não se entende a decisão nesta parte, a qual viola o artigo 496º do C.C.;
v) Quanto à dor, a ter existido, terá sido por pouco tempo (dado que teve alta no próprio dia, não houve internamento hospitalar, nem o Autor foi seguido medicamente no período posterior ao acidente, nem houve sequelas);
w) Pelo que um valor de € 1 000 é manifestamente exagerado, em face das regras da experiência comum, não fazendo a douta sentença recorrida nenhuma menção a qualquer circunstância especial que o justifique - carece, por isso, de fundamentação o valor fixado;
x) Por tudo quanto se disse antes nas conclusões anteriores, entende-se que a douta sentença recorrida é nula, violando as alíneas b) e c) do artº 668º do C.P.C.
Nestes termos, nos demais de Direito, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado procedente, e, em consequência, a douta sentença recorrida, ser substituída por outra em que se decrete:
a) A Responsabilidade exclusiva pela indemnização dos danos sofridos pelo Autor em consequência do acidente, nos termos e ao abrigo do contrato de seguro existente, da Ré CC;
b) Caso assim não se entenda, a absolvição da Ré, ora recorrente, do pedido de indemnização formulado pelo Autor a título de danos patrimoniais pela privação do uso do veículo, e
c) A absolvição da Ré, ora recorrente, dos pedidos de indemnização formulados pelo Autor a título de danos não patrimoniais pelas limitações sofridas na sua vida profissional e pessoal e por danos não patrimoniais físicos e psicológicos.
7. Contra-alegou a R. CC., pugnando pela manutenção da sentença recorrida quanto à sua absolvição por a situação em apreço estar excluída da cobertura da apólice celebrada com a R. recorrente.
Também contra-alegou o A., defendendo a confirmação da sentença quanto aos montantes das indemnizações arbitrados.
II – Objecto do recurso
O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 660.º, n.º 2, 684.º, n.º3 e 685º-A, nº1, todos do Código de Processo Civil [redacção vigente à data da decisão recorrida, anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho].
Considerando o teor das conclusões apresentadas, importa decidir as seguintes questões:
(i) Das nulidades da sentença;
(ii) Da responsabilidade da R. Seguradora pelo pagamento dos danos causados;
(iii) Da indemnização pela privação do uso do veículo; e
(iv) Da indemnização por danos patrimoniais.
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III – Fundamentação
A) - Os Factos
Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos:
1 – No dia 03.08.2008, cerca das 06.45 horas, o autor conduzia, pela Estrada Regional n.º 384, no sentido de Oriola – Portel, o veículo ligeiro de mercadorias, com a matrícula 82-09-SM, marca Peugeot, modelo 204, de sua propriedade, acompanhado pelo seu amigo RR.
2 – O autor seguia pela meia faixa direita de rodagem, atento o seu sentido de marcha, a uma velocidade na ordem dos 70/80 Km/hora.
3 – Era dia e o tempo estava bom.
4 – O local em causa é constituído por uma recta extensa, com uma ligeira descida.
5 – Em certa altura do seu percurso, ao chegar ao Km. 19,400, sem que nada o fizesse prever, vindos do lado direito da faixa de rodagem, atento o seu sentido de marcha, por trás de rebentos de eucalipto e de estevas com alguma densidade e altura e a uma distância de dois a três metros do seu veículo automóvel, surgiram repentinamente, à sua frente e em corrida, quatro animais, de médio porte, de raça ovina e de cor branca.
6 – O que o autor não esperava, razão pela qual não conseguiu evitar o embate.
7 – O veículo 82-09-SM embateu, com a sua parte dianteira, num desses animais de raça ovina.
8 – No dia 03.08.2008, a ré “BB” explorava um prédio rústico no local mencionado, possuindo uma exploração agro-pecuária da qual faziam parte dezenas de animais de raça ovina, um dos quais era o referido em 7.
9 – Os quatro animais de raça ovina em questão, nomeadamente aquele que é referido em 7, estavam descontrolados.
10 – Os animais referidos em 5 estavam à guarda do pastor que se encontrava na propriedade referida em 8.
11 – O animal de raça ovina referido em 7 encontrava-se identificado com o brinco n.º 179... e pertencia à ré “BB”.
12 – O animal de raça ovina que embateu na viatura conduziu ao aborto de duas crias e depois quase em acto contínuo à sua morte.
13 – Como consequência directa do embate do animal de raça ovina no 82-09-SM, ficou danificada toda a parte dianteira deste veículo, nomeadamente o pára-choques, os guarda lamas da frente direito e esquerdo, o capot, a grelha da frente, as ópticas da frente direita e esquerda, os farolins da frente direito e esquerdo, o radiador, o motor, o radiador do ar condicionado, o carburador, o motor de arranque e o alternador.
14 – Foi efectuada uma peritagem técnica pelo perito da ré CC, cujo resultado determinou que o valor estimado da reparação dos danos sofridos no 82-09-SM seria de € 5.920,00 (cinco mil novecentos e vinte euros).
15 – O valor venal do 82-09-SM em 03.08.2008 era de €7.000,00 (sete mil euros).
16 – Nos inícios do mês de Julho de 2008, o autor pretendeu trocar o 82-09-SM por outro veículo automóvel, mas que fosse ligeiro de passageiros, de igual cilindrada e a gasóleo.
17 – O autor negociou com um stand de automóveis a aquisição de um veículo automóvel da marca AUDI, modelo A3, de cinco portas, com 1997 cm3 de cilindrada, a gasóleo.
18 – Tendo ficado acordado que depois de serem efectuadas pequenas reparações de mecânica, afinações eléctricas e ligeiros retoques de pintura, o veículo automóvel deveria ser entregue no máximo até meados do mês de Setembro de 2008.
19 – O aludido negócio de aquisição do novo veículo automóvel ficou sem efeito pela ocorrência do acidente dos autos e consequente perda total do 82-09-SM.
20 – O autor deixou de poder contar com o valor do 82-09-SM e não tinha dinheiro para adquirir o novo automóvel.
21 – O autor adquiriu o 82-09-SM em finais do mês de Janeiro de 2007.
22 – Para o que teve de recorrer à DD-Instituição Financeira de Crédito S. A., com a finalidade de lhe ser concedido o financiamento que lhe permitisse efectuar essa aquisição.
23 – A DD-Instituição Financeira de Crédito S. A. concedeu ao autor um crédito no montante de € 10.181,52.
24 – O valor total das prestações do crédito concedido importava na quantia total de €12.592,32 (doze mil quinhentos e noventa e dois euros e trinta e dois cêntimos).
25 – O crédito concedido seria amortizado em quarenta e oito prestações mensais no valor unitário de € 262,34 (duzentos e sessenta e dois euros e trinta e quatro cêntimos), a primeira prestação a vencer-se no dia 28.02.2007 e a quadragésima oitava prestação a vencer-se em 31.01.2011.
26 – Em 03.08.2008, o autor já tinha efectuado o pagamento, por transferência bancária, de dezoito prestações mensais, no valor unitário de € 262,34 (duzentos e sessenta e dois euros e trinta e quatro cêntimos) e no valor total de € 4.722,12 (quatro mil setecentos e vinte e dois euros e doze sentimos).
27 – O autor, independentemente da perda total do veículo automóvel, encontra-se contratualmente obrigado ao pagamento integral de todas as prestações mensais decorrentes do contrato de crédito que celebrou com a DD-Instituição Financeira de Crédito S.A..
28 – Em 25.05.2009, o autor foi transferido do Quartel da GNR da Estrela, em Lisboa, para o Comando Territorial de Beja, onde passaria a prestar serviço.
29 – Pelo que autor adquiriu um novo veículo automóvel, uma vez que poderia ficar colocado em qualquer um dos postos da GNR do distrito de Beja e precisaria de um veículo automóvel para se deslocar todos os dias, da localidade de Amieira, concelho de Portel, para o seu novo local de trabalho, a designar pelos seus superiores hierárquicos.
30 – Nas condições descritas no número anterior, o autor adquiriu o veículo automóvel, marca Rover, modelo 200 DOKLANDS, com a matrícula (...).
31 – Tendo, uma vez mais, recorrido ao Banco DD S.A. para concessão do financiamento que lhe permitisse efectuar essa aquisição.
32 – O Banco DD S.A. concedeu ao autor um crédito no montante de € 3.346, (três mil trezentos e quarenta e seis euros e setenta e dois cêntimos).
33 – O valor total das prestações do crédito concedido importava na quantia total de € 4.268,88 (quatro mil duzentos e sessenta e oito euros e oitenta e oito cêntimos).
34 – O crédito concedido seria amortizado em vinte e quatro prestações mensais no valor unitário de € 177,87 (cento e setenta e sete euros e oitenta e sete cêntimos), a primeira prestação a vencer-se dia 18.06.2009 e a vigésima quarta e última prestação a vencer-se em 18.05.2011.
35 – Por causa do acidente dos autos, o autor ficou privado do uso de veículo automóvel entre 03.08.2008 e a data de aquisição do segundo veículo automóvel, 18.05.2009.
36 – Para satisfazer as necessidades de deslocação do autor, bastaria um veículo automóvel com cilindrada inferior à do 82-09-SM.
37 – Na “HH-Aluguer de Automóveis”, o custo diário do aluguer de um veículo com essas características não seria inferior a € 37,50; na “EE-Aluguer de Automóveis”, o custo diário do aluguer de um veículo com as mesmas características não seria inferior a € 36,50.
38 – Em 03.08.2008, o autor, enquanto militar da Guarda Nacional Republicana, encontrava-se a prestar serviço no Quartel da Estrela, em Lisboa, estando obrigado profissionalmente a cumprir ordens e escala de serviço, as quais são emanadas pelos seus superiores hierárquicos.
39 – Por causa do acidente dos autos, o autor, entre 03.08.2008 e 18.05.2009, viu-se prejudicado no gozo normal das suas folgas e fins de semana, porquanto esteve sempre dependente da boa vontade e disponibilidade dos seus camaradas e dos seus superiores hierárquicos.
40 – E, para se deslocar para a residência de seus pais na localidade de Amieira, concelho de Portel, entre 03.08.2008 e 18.05.2009, não podia usufruir dos transportes públicos, dado que os horários dos mesmos não eram coincidentes com as horas de saída e de entrada para efeitos de gozo de folga ou fins de semana.
41 – Por causa do acidente dos autos, o autor, entre 03.08.2008 e 18.05.2009, trocou escalas de serviço, de forma contínua e ininterrupta, por forma a poder aproveitar o transporte para casa dos seus pais, na Amieira, Portel, na viatura de um seu camarada de armas que também tinha residência na mesma localidade.
42 – Na sequência do acidente dos autos, o autor foi assistido no serviço de urgências do Hospital do Espírito Santo, em Évora.
43 – O autor deu entrada nos serviços de urgência do aludido hospital às 08.45 horas, tendo apresentado problemas nos membros, com dor moderada, a qual numa escala de 0 a 10, se situou em 6 (seis).
44 – O 82-09-SM era um automóvel de 1997, com 140.789 quilómetros percorridos.
45 – Os salvados do 82-09-SM valiam € 2.300 (dois mil e trezentos euros).
46 – A ré BB, transferiu a sua responsabilidade civil pelos eventuais danos causados pelos animais de raça ovina de sua propriedade para a ré CC..
47 – A aludida transferência encontra suporte documental no contrato de seguro a que corresponde a apólice de seguro nº 32. 8341.355, do ramo de responsabilidade civil, da ré CC..
48 – O referido contrato de seguro de responsabilidade civil tinha como objecto 300 cabeças de gado ovino propriedade desta.
49 – O capital seguro na referida apólice era de € 25.000,00, sendo aplicável uma franquia da responsabilidade da segurada de 10% dos prejuízos indemnizáveis, com o mínimo de € 50.
50 – Da garantia da apólice estão excluídos os danos causados pelos animais seguros quando estes transitem, permaneçam ou invadam a via pública sem as condições de segurança impostas por lei vigente ou disposições administrativas.
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B) – O Direito
1. Das nulidades da sentença
Imputa a recorrente à sentença os vícios previstos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 688º do Código de Processo Civil (a que corresponde o actual artigo 615º), que se reportam à falta de fundamentação e à oposição entre os fundamentos e a decisão tomada, e que conduzem à nulidade da sentença.
Mas, basta ler a sentença para se concluir que a mesma está devidamente fundamentada, com enunciação dos factos apurados e da sua subsunção aos preceitos legais tidos por aplicáveis, que conduzem à decisão tomada.
Acresce que das alegações da recorrente resulta manifesto que esta discorda é da decisão quanto à exclusão da responsabilidade da R. seguradora e quanto a parte do cômputo da indemnização arbitrada e é com base nessa sua discordância que conclui na conclusão “x” pela nulidade da sentença.
É pois manifestamente improcedente a pretensão da recorrente quanto às questões de nulidade da sentença.

2. Da responsabilidade da R. Seguradora pelo pagamento dos danos causados
2.1. Entendeu-se na sentença que resulta da matéria de facto provada que o A. nenhuma culpa teve na produção do acidente, pois cumpria todas as regras de trânsito no momento em que este último ocorreu, pois, seguia na sua mão de trânsito e com respeito pelo limite de velocidade, que, na falta de sinalização em contrário, era de 80 km/hora, dado o veículo ser um ligeiro de mercadorias (artigo 27.º do Código da Estrada), e o acidente apenas ocorreu devido à súbita aparição das ovelhas na faixa de rodagem, a escassos 2 ou 3 metros à frente do veículo, o que tornou impossível evitar o embate numa delas.
Mais se entendeu que o facto de as quatro ovelhas terem invadido a faixa de rodagem nos termos descritos na matéria de facto, completamente descontroladas, apesar de estarem à guarda – patentemente descuidada – de um pastor, violou o disposto nos artigos 11.º, n.º 1, e 97.º, números 1, 3 e 6 do Código da Estrada. Logo, a responsabilidade civil pelos danos resultantes do acidente recai sobre a ré BB, proprietária da ovelha embatida pelo veículo do autor, nos termos dos artigos 483.º, n.º 1, e 493.º, n.º 1, do Código Civil.
E, como se salientou, este último preceito legal estabelece, inclusivamente, uma presunção de culpa, que no caso dos autos se mostra desnecessária para fundamentar a responsabilidade civil da R. BB, dado que as circunstâncias em que o acidente ocorreu demonstram, com clareza, que a culpa por este último é de atribuir a quem não cuidou de guardar diligentemente as ovelhas, por forma a que as mesmas não invadissem a via pública, ou seja, à sua proprietária.

2.2. A R. BB no seu recurso não questiona a sua responsabilidade na produção do evento danoso, o que discorda é do entendimento seguido na sentença recorrida, enquanto nela se excluiu da obrigação de ressarcimento dos danos a R. seguradora (Companhia de Seguros CC), por tal obrigação estar excluída do contrato de seguro celebrado entre as RR., nas circunstâncias em que ocorreu o evento danoso.

2.3. Na sentença recorrida decidiu-se pela absolvição da R. seguradora porque se concluiu que a situação em apreço se enquadrava na cláusula de exclusão do seguro celebrado entre as RR., a que se reporta o ponto 50 da matéria de facto, onde se exclui da garantia da apólice os danos causados pelos animais seguros quando estes transitem, permaneçam ou invadam a via pública sem as condições de segurança impostas por lei vigente ou disposições administrativas, uma vez que o acidente foi causado por um animal que invadiu a via pública sem as condições de segurança impostas pelos artigos 11.º, n.º 1, e 97.º, números 1, 3 e 6 do Código da Estrada.
A recorrente discorda deste entendimento, alegando que o animal não vagueava na via pública, nem nela se encontrava a ser conduzido, o que afasta o enquadramento da situação ocorrida na previsão das normas legais indicadas na decisão, e que se tratou de uma fuga imprevisível, sendo impossível atribuí-la a uma atitude descuidada do pastor.
Vejamos.

2.4. Como resulta dos pontos 46 a 50 da matéria de facto:
“46 – A ré BB, transferiu a sua responsabilidade civil pelos eventuais danos causados pelos animais de raça ovina de sua propriedade para a ré CC..
47 – A aludida transferência encontra suporte documental no contrato de seguro a que corresponde a apólice de seguro nº 32. 8341.355, do ramo de responsabilidade civil, da ré CC..
48 – O referido contrato de seguro de responsabilidade civil tinha como objecto 300 cabeças de gado ovino propriedade desta.
49 – O capital seguro na referida apólice era de € 25.000,00, sendo aplicável uma franquia da responsabilidade da segurada de 10% dos prejuízos indemnizáveis, com o mínimo de € 50.
50 – Da garantia da apólice estão excluídos os danos causados pelos animais seguros quando estes transitem, permaneçam ou invadam a via pública sem as condições de segurança impostas por lei vigente ou disposições administrativas.”

A cláusula do contrato de seguro a que se refere este último ponto da matéria de facto está inserida nas condições particulares da apólice com o seguinte teor:
Condições Particulares
“Animais”
1. A Seguradora obriga-se pelo presente contrato, até ao limite do valor seguro, a pagar as indemnizações que, ao abrigo da lei civil, sejam exigíveis ao Segurado, em consequência de danos decorrentes de lesões corporais e/ou materiais causadas a terceiros pelos animais designados nas Condições Particulares.
2. A garantia concedida não abrange os danos causados:
a) Pelo animal seguro, quando este transite, permaneça ou invada a via pública sem as condições de segurança impostas por lei vigente ou disposições administrativas; (destaque nosso)
(…)

Da articulação destas duas cláusulas das condições particulares do seguro resulta, no que respeita a acidentes ocorridos com os animais incluídos no seguro, que só estão abrangidos pela garantia do seguro, no que respeita às situações em que o animal seguro “transita, permaneça ou invada a via pública” quando esse trânsito, permanência ou invasão decorra de acordo com as normas de segurança impostas legalmente. Esta é a interpretação útil que se retira destas cláusulas.
Relativamente a esta matéria, estabelece-se no Código da Estrada (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, na redacção do Decreto-Lei n.º 113/2008, de 1 de Julho), nas disposições convocadas na decisão recorrida, seguinte:
Artigo 11.º
Condução de veículos e animais
1. Todo o veículo ou animal que circule na via pública deve ter um condutor, salvo as excepções previstas neste Código.
(…)
Artigo 97.º
Regras especiais
1. Os condutores de veículos de tracção animal ou de animais devem conduzi-los de modo a manter sempre o domínio sobre a sua marcha e a evitar impedimento ou perigo para o trânsito.
2. Nas pontes, túneis e passagens de nível, os condutores de animais, atrelados ou não, devem fazê-los seguir a passo.
3. A entrada de gado na via pública deve ser devidamente assinalada pelo respectivo condutor e fazer-se por caminhos ou serventias a esse fim destinados.
4. Sempre que, nos termos do artigo 61.º, seja obrigatória a utilização de dispositivos de sinalização luminosa, os condutores de veículos de tracção animal ou de animais em grupo devem utilizar uma lanterna de luz branca, visível em ambos os sentidos de trânsito.
5. Quem infringir o disposto nos números anteriores é sancionado com coima de (euro) 30 a (euro) 150.
6. O proprietário de animal que o deixe vaguear na via pública por forma a impedir ou fazer perigar o trânsito é sancionado com coima de (euro) 30 a (euro) 150.

2.5. Ora, face à matéria de facto provada, relativa ao modo como ocorreu a “invasão” pelos animais que originaram o acidente, conclui-se que tal invasão ou atravessamento não ocorreu da forma controlada como prescrito nas normas estradais.
De facto provou-se que:
- O autor conduzia um veículo ligeiro de mercadorias na sua mão de trânsito, a uma velocidade na ordem dos 70/80 Km/hora;
- Inesperadamente, surgiram à frente do veículo do autor, a uma distância de dois a três metros, em corrida, vindos do lado direito da faixa de rodagem, de trás de rebentos de eucalipto e de estevas com alguma densidade e altura e automóvel, quatro ovelhas;
- O veículo do autor embateu, com a sua parte dianteira, numa das ovelhas, pertencente à ré “BB”;
- O autor não conseguiu evitar o embate porque não estava à espera que lhe aparecessem as ovelhas à frente da forma descrita;
- As quatro ovelhas estavam à guarda de um pastor que se encontrava na propriedade da ré BB, mas estavam descontroladas.

Destes factos decorre pois que os animais invadiram a via pública de forma descontrolada, a que só se pode atribuir a descuido de quem tinha o dever de os vigiar, que não os controlou, de modo a evitar que invadissem a via pública.
E, como tal “invasão” não ocorreu de forma controlada, nos termos prescritos nas norma legais vigentes, cai no âmbito de exclusão da referida cláusula do contrato de seguro, não podendo a seguradora ser responsabilizada pelo pagamento da indemnização pelos danos causados ao A..

3. Da indemnização pela privação de uso do veículo
3.1. Na sentença recorrida, com relevo para a fixação da indemnização considerou-se a seguinte matéria de facto:
- O autor trabalhava em Lisboa e tinha residência na Amieira, concelho de Portel, razão pela qual necessitava de se deslocar regularmente entre estas duas localidades, distantes entre si, deslocações essas que eram efectuadas no seu veículo automóvel;
- Por causa do acidente, o autor ficou privado do uso de veículo automóvel entre 03.08.2008 e 18.05.2009;
- Para satisfazer as necessidades de deslocação do autor, bastaria um veículo automóvel com cilindrada inferior à do 82-09-SM.
- Na “HH-Aluguer de Automóveis”, o custo diário do aluguer de um veículo com essas características não seria inferior a € 37,50; na “EE-Aluguer de Automóveis”, o custo diário do aluguer de um veículo com as mesmas características não seria inferior a € 36,50.

3.2. Neste contexto factual, considerou-se que estando provado que o A. utilizava efectivamente o veículo acidentado para realizar deslocações entre a sua residência e o seu local de trabalho e, por causa do acidente, deixou de poder contar com o mesmo veículo, estão, assim, reunidos os pressupostos do direito a ser indemnizado pela privação temporária do uso deste último.
No que toca à avaliação deste dano, considerou-se que, estando em causa indemnizar a privação do uso de veículo, o valor da indemnização deverá corresponder ao valor desse mesmo uso, que no caso dos autos foi apurado.

3.3. Ora, independentemente da posição que se tenha quanto à problemática dos pressupostos necessários ao ressarcimento da “privação de uso”, designadamente saber se basta a simples alegação dessa privação ou é essencial que se aleguem e provem factos concretos de onde resultem os prejuízos causados por essa privação, no caso dos autos, como resulta da matéria de facto provada, tal discussão é inócua, posto que o A. alegou e demonstrou que teve prejuízos com a privação do uso do veículo.
Prejuízos esses que não são apenas os acima referidos, que a decisão recorrida utilizou, mas ainda os que decorrem dos factos enunciados nos pontos 39 a 41 da matéria de facto, decorrentes dos transtornos causados ao A., que, entre 03/08/2008 e 18/05/2009, viu-se prejudicado no gozo normal das suas folgas e fins de semana, porquanto esteve sempre dependente da boa vontade e disponibilidade dos seus camaradas e dos seus superiores hierárquicos, e viu-se na necessidade de trocar escalas de serviço, de forma contínua e ininterrupta, por forma a poder aproveitar o transporte para a Amieira na viatura de um seu camarada de armas que também tinha residência na mesma localidade.
Estes prejuízos ocorreram por o A. ter ficado privado do uso do veículo e, como tal, como alerta a recorrente têm que se considerar incluídos nesta sede e não como danos não patrimoniais.

3.4. Quanto ao critério a utilizar no cálculo da indemnização, e não tendo os danos decorrentes da privação do uso do veículo causado outos danos que justifiquem uma ponderação diferente, tem-se por equilibrado o citério utilizado na sentença, atribuindo-se ao A. uma indemnização correspondente ao valor diário mais baixo apurado por que seria possível alugar um veículo automóvel com características semelhantes àquele que ficou destruído (€ 36,50), multiplicado pelo número de dias de privação do uso (288), o que tem como resultado a quantia de € 10.512.
E, não se diga que tal valor só seria devido se o A. tivesse alugado um veículo por aquele valor, porque tal alegação não conduz ao resultado pretendido pela recorrente, mas à confirmação da decisão, pois se o A. tivesse feito esse aluguer, para evitar os danos pela privação do uso do seu veículo, condenar-se-ia a recorrente a ressarcir o A. do valor despendido, como o A. não alugou o veículo, condenou-se a recorrente a pagar uma indemnização pelos danos causados pela privação, e bem.

4. Da indemnização por danos não patrimoniais
4.1. Do que se disse quanto à indemnização pela privação do uso do veículo resulta que os transtornos pessoais e de serviço causados ao A. não podem ser novamente valorados, como salienta a recorrente.
Deste modo, não tem o A. direito a receber a quantia de € 3.000 arbitrados na sentença a este título.
Quanto aos restantes danos não patrimoniais, decorrentes do sofrimento do A. em consequência do acidente, provou-se que:
42 – Na sequência do acidente dos autos, o autor foi assistido no serviço de urgências do Hospital do Espírito Santo, em Évora.
43 – O autor deu entrada nos serviços de urgência do aludido hospital às 08.45 horas, tendo apresentado problemas nos membros, com dor moderada, a qual numa escala de 0 a 10, se situou em 6 (seis).

4.2. Não sabemos, no entanto, qual o tempo que o A. permaneceu no hospital, o tempo de recuperação, nem se necessitou de acompanhamento médico e por quanto tempo. Certo é que teve necessidade de assistência hospitalar, devida a problemas nos membros, com dor moderada, que se situou em 6 numa escala de 0 a 10.
Neste contexto factual, não temos dúvidas que as dores causadas, não são simples incómodos, e não terão ocorrido momentaneamente, face à sua intensidade, pelo que merecem a tutela do direito, nos termos do artigo 496º do Código Civil, não se vendo razões para reduzir o montante de € 1.000 arbitrado na sentença.

5. Em face do exposto, improcede a apelação, com excepção da parte relativa à indemnização por danos não patrimoniais, que se fixa em € 1.000, confirmando-se, no mais decidido, a sentença recorrida.
*
C) - Sumário
I. Provando-se que o acidente ocorreu porque os animais seguros invadiram, repentinamente e em corrida, a faixa de rodagem, completamente descontroladas e sem as condições mínimas de segurança impostas por lei, nomeadamente nos termos dos artigos 11º, n.º 1, e 97º, n.º 1, 3 e 6, do Código da Estrada, mostra-se preenchida a cláusula inserida nas condições particulares da apólice de seguro celebrado entre o dono dos animais e a seguradora, na qual se exclui do âmbito da garantia os danos causados pelos animais seguros quando estes transitem, permaneçam ou invadam a via pública sem as condições de segurança impostas por lei vigente ou disposições administrativas.
II. Neste contexto a seguradora não pode ser responsabilizada pelo pagamento dos danos causados.
*
IV – Decisão

Nestes termos e com tais fundamentos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, com excepção da parte relativa à indemnização dos danos não patrimoniais, que se reduzem para € 1.000 (mil euros), confirmando-se, no mais, o decidido na sentença recorrida.
Custas a cargo da R. recorrente e do A., na proporção do decaimento.
*
Évora, 16 de Setembro de 2014
(Francisco Xavier)
(Elisabete Valente)
(Cristina Cerdeira)