Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
578/04.0TBTNV-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HÉLDER ROQUE
Descritores: PRAZO
NOTIFICAÇÃO
PAGAMENTO
MULTA
Data do Acordão: 10/24/2006
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE TORRES NOVAS - 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 145º Nº6 DO CPC
Sumário: 1. Decorridos os três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo para a prática do acto, sem ter sido paga a multa devida, a secretaria, independentemente de requerimento ou despacho, deve notificar a parte para pagar a multa-sanção, a que se reporta o nº 6 do art.145º do CPC, ou, então, deve o Tribunal determiná-lo, na hipótese de tal falta ter passado despercebida à secretaria.

2. A notificação oficiosa deve ser efectuada, desde que a multa não tenha sido paga, espontaneamente, quer o interessado tenha chegado a pedir guias, quer o não tenha feito, por a lei não distinguir e a razão de ser da norma não justificar a diferença.

Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA:


A... e mulher, B..., e C... interpuseram recurso de agravo da decisão que, na acção com processo sumário que lhes foi movida e a “D...”, por E... e outro, todos bem identificados nos autos, não admitiu a prova por aqueles indicada, por não terem procedido ao pagamento da multa, prevista no artigo 145º, do Código de Processo Civil (CPC), impedindo-os de a produzirem em audiência, terminando as suas alegações, onde sustenta a revogação do respectivo despacho, formulando as seguintes conclusões:
1ª – O termo do prazo para indicação dos meios de prova terminou no dia 11 de Abril de 2005.
2ª – Nos três dias úteis subsequentes, ou seja, nos dias 12, 13 e 14 de Abril de 2005 poderiam os réus/recorrentes praticar o acto com a sanção a que respeita o nº 5 do artigo 145º do CPC.
3ª – Não tendo sido paga imediatamente a referida sanção – multa -, quando tal falta fosse verificada a secretaria deveria notificar os réus, independentemente de despacho, para o pagamento previsto no nº 6 do citado artigo 145º do CPC.
4ª – A secretaria não notificou os réus para esse efeito.
5ª – O despacho recorrido é ilegal e inadmissível.
6ª – Os réus não perderam o direito de praticar o acto, visto que não chegaram a ser notificados nos termos do citado nº 6 do artigo 145º do CPC.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Exº Juiz sustentou, doutamente, a decisão questionada, por entender que não foi causado qualquer agravo aos recorrentes.
Com interesse relevante para a decisão do mérito do agravo, importa deixar registados os seguintes factos:
1 – O termo do prazo para apresentação dos meios de prova, na presente acção, terminou no dia 11 de Abril de 2005.
2 - Os réus-recorrentes apresentaram, no dia 14 de Abril de 2005, pelas 20,25 horas, através de telecópia, um requerimento de produção de prova, requerendo, nos termos do disposto pelo artigo 145º, nº 5, do CPC, a passagem de guias para pagamento da multa relativa ao terceiro dia, em virtude do referido requerimento ter sido enviado, via faz, a juízo, a hora em que o Tribunal já se encontrava encerrado, o que impossibilitava o levantamento e pagamento das competentes guias – Documento de folhas 32 a 36.
3 – A secção de processos passou e enviou aos réus as guias solicitadas para pagamento da multa referente à prática do acto no terceiro dia útil após o termo do prazo – Documento de folhas 26 e 27.
4 – Os réus não efectuaram o pagamento da multa, aludida em 3, nem foram notificados pelo Tribunal para o seu pagamento, em conformidade com o previsto pelo artigo 145º, nº 6, do CPC – Documento de folhas 26 e 27.

*

Tudo visto e analisado, atento o Direito aplicável, cumpre, finalmente, decidir.
A única questão a decidir no presente agravo, em função da qual se fixa o objecto do recurso, considerando que o «thema decidendum» do mesmo é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, com base no preceituado pelas disposições conjugadas dos artigos 660º, nº 2, 661º, 664º, 684º, nº 3 e 690º, todos do CPC, consiste em saber se os nºs 5 e 6, do artigo 145º, deste diploma legal, são de aplicação, alternativa ou cumulativa, ou seja, se a parte a quem foram enviadas as guias solicitadas para pagamento da multa referente à prática do acto no terceiro dia útil posterior à data do termo do respectivo prazo, mas que não procedeu ao mesmo, deve, não obstante, ser notificada, para o efeito, atento o disposto no nº 6, do normativo em causa.

*

DA NOTIFICAÇÃO PARA PAGAMENTO DA MULTA PARA ALÉM DO PRAZO

É entendimento do Tribunal «a quo» que, tendo a secretaria passado guias, a solicitação dos requerentes na prática do acto, para o terceiro dia útil após o termo do prazo, e não havendo os mesmos procedido ao pagamento da multa correspondente, tendo sido aplicado, ao caso concreto, a solicitação daqueles, o disposto no nº 5, já não havia fundamento legal para ser cumprida a norma do nº 6, ambos do artigo 145º, do CPC, precisamente, ao contrário do que é defendido pelos próprios, como bem resulta do teor das suas alegações de recurso, cujas conclusões se transcreveram.
Dispõe o artigo 145º, nº 5, do CPC, que “independentemente de justo impedimento, pode o acto ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento, até ao termo do 1º dia útil posterior ao da pratica do acto, de uma multa de montante igual a um quarto da taxa de justiça inicial por cada dia de atraso, não podendo a multa excede 3UC”, estipulando o respectivo nº 6 que “decorrido o prazo referido no número anterior, sem ter sido paga a multa devida, a secretaria, independentemente de despacho, notifica o interessado para pagar multa de montante igual ao dobro da taxa de justiça inicial, não podendo a multa exceder 20 UC”.
Para os réus, não tendo estes pago, imediatamente, a multa a que se reporta o nº 5, a secretaria devê-los-ia ter notificado, independentemente de despacho, logo que a falta fosse verificada, para o pagamento previsto no nº 6, ambos do citado artigo 145º, do CPC, o que não aconteceu, pelo que, em consequência, não perderam o direito de praticar o acto.
Com efeito, é entendimento do Tribunal «a quo» que a secretaria só deveria ter notificado os réus para pagar a multa-sanção em causa, decorridos os três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo em que o acto deveria ter sido praticado, se aqueles não tivessem solicitado guias para pagamento da multa correspondente, o que, a ter acontecido, conforme se verificou, fez precludir o direito à notificação, a que se reporta o nº 6, do artigo 145º, do CPC.
A regra de que o decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto admite como atenuação a possibilidade legal da sua realização, nos três dias úteis seguintes ao decurso do respectivo prazo, desde que o faltoso pague, imediatamente, as multas previstas nos nºs 5 e 6, ou, até sem pagar coisa alguma, nos termos do nº 7, tratando-se de pessoa, economicamente, carenciada.
Os prazos peremptórios têm, pois, o seu último dia diferido para o primeiro, segundo ou terceiro dias úteis posteriores aquele que resulta da respectiva marcação pela lei ou da sua fixação pelo juiz, verificado o circunstancionalismo previsto pelo artigo 145º, nºs 5 e 6, do CPC.
Tendo o prazo legal para a apresentação dos meios de prova, na presente acção, terminado, no dia 11 de Abril de 2005, os réus, no dia 14 de Abril seguinte, pelas 20,25 horas, através de telecópia, juntaram aos autos o requerimento de produção de prova, praticando, assim, o acto, no terceiro dia útil subsequente ao termo do correspondente prazo.
Contudo, a validade do acto ficava dependente do pagamento, até ao termo do primeiro dia útil posterior ao da prática do acto, de uma multa de montante igual a um quarto da taxa de justiça inicial, por cada dia de atraso, não podendo a mesma exceder 3UC.
Porém, decorrido o prazo referido no número anterior, sem ter sido paga a multa respectiva, a secretaria, independentemente de requerimento ou de despacho, deveria ter notificado os réus para pagar uma multa, de montante igual ao dobro da taxa de justiça inicial, sem que pudesse exceder 20 UC, ou, então, o Tribunal determinaria que tal fosse efectuado, na hipótese da falta ter passado despercebida à secretaria [ STJ, de 9-12-1999, CJ (STJ), Ano VII, T3, 139. ].
E tudo isto, oficiosamente, ou seja, a actuação da secretaria ou o poder-dever do Tribunal, independentemente de requerimento expresso do interessado que a lei, aliás, não exige [ Abrantes Geraldes, Temas Judiciários, I, 1998, 353.].
Assim sendo, a notificação oficiosa deve ser realizada, desde que a multa não tenha sido paga, espontaneamente, quer o interessado tenha chegado a solicitar guias, quer o não tenha feito, atendendo ao claro significado do nº 6, do artigo 145º, do CPC [ STJ, de 24-10-2000, BMJ nº 500, 274; Cardona Ferreira, Reforma Intercalar do Processo Civil, Notas Práticas, 12. ].
Não distinguindo a lei as duas situações, não se afigura dever o intérprete fazê-lo, privilegiando a parte faltosa que pratica o acto fora do prazo, em relação aquela que se antecipa a requerer o pagamento da multa-sanção, que funciona como condição da sua validade.

*

CONCLUSÕES:

I – Decorridos os três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo para a pratica do acto, sem ter sido paga a multa devida, a secretaria, independentemente de requerimento ou de despacho, deve notificar a parte para pagar a multa-sanção, a que se reporta o nº 6, do artigo 145º, do CPC, ou, então, deve o Tribunal determiná-lo, na hipótese de tal falta ter passado despercebida à secretaria.
II - A notificação oficiosa deve ser efectuada, desde que a multa não tenha sido paga, espontaneamente, quer o interessado tenha chegado a pedir guias, quer o não tenha feito, por a lei não distinguir e a razão de ser da norma não justificar a diferença.

*

DECISÃO:

Por tudo quanto exposto ficou, acordam os Juízes que compõem a 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra, em julgar provido o agravo e, em consequência, revogam a decisão recorrida, devendo o Exº Juiz determinar o cumprimento do disposto pelo artigo 145º, nº 6, do CPC.

*

Sem custas, atendendo ao estipulado pelo artigo 2º, nº 1, g), do Código das Custas Judiciais.

*

Notifique.