Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2166/19.7T8ACB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS BARREIRA
Descritores: INSOLVÊNCIA
ENCERRAMENTO
VENDA
ACTIVO SUPERVENIENTE
REGISTO PREDIAL
Data do Acordão: 09/22/2021
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DO COMÉRCIO DE ALCOBAÇA DO TRIBUNAL DA COMARCA DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 230.º, 233.º DO CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESA (DL N.º 53/2004, DE 18 DE MARÇO).
Sumário: Encerrado o processo de insolvência por insuficiência da massa não é admissível ao administrador proceder à apreensão e venda de um bem que se apurou pertencer ao insolvente depois daquele encerramento, devendo ser cancelado o registo da insolvência a que se tenha procedido no âmbito do registo predial.
Decisão Texto Integral:






Acordam os Juízes, em Conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra:

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I – RELATÓRIO
Nos presentes autos, melhor supra identificados, foi proferida Decisão Sumária em 22 de julho 2021 que, julgando improcedente o recurso, manteve a decisão recorrida.

Inconformada a requerente, ora recorrente, veio reclamar para a conferência, a fim de que sobre ela recaia acórdão.

Não houve resposta à reclamação.

O teor integral da referida Decisão Sumária é o seguinte:
I – RELATÓRIO:
No processo n.º 2166/19.7T8ACB - pendente no T. J. da Comarca de Leiria –Alcobaça-Juízo de Comércio-J2 -, A…, divorciada, titular do Cartão do Cidadão nº …, NIF …, residente na Rua …, veio requerer a declaração do seu estado de insolvência, com pedido de exoneração do passivo restante.

Formulou o pedido, para, além do mais, de lhe ser concedida a exoneração do passivo restante, alegando, em suma, preencher todos os requisitos e estarem dispostos a observar as condições que lhe são exigíveis.

A Requerente juntou aos autos, para além do mais, a declaração por si subscrita, nos termos do art.º 236.º, n.º 3, do CIRE, e o respectivo certificado de registo criminal.

Foi proferida sentença de declaração de insolvência.

A Ex. ma Sra. Administradora da Insolvência (doravante designado pelo acrónimo de
AI) não se opôs à concessão da exoneração de passivo.

Assim, neste âmbito e no que ora interessa, foi, em 12.03.2020, proferido douto despacho que decidiu nos seguintes termos:
“Pelo exposto, profiro despacho inicial de admissão do pedido de exoneração do passivo restante e determino:
- Durante os cinco anos posteriores ao trânsito em julgado do presente despacho (designado de período da cessão), o rendimento disponível que a insolvente venha a auferir em cada momento, englobando todos os seus rendimentos, qualquer que seja a sua fonte, com exclusão mensal do valor equivalente a 1,2 RMMG por mês, considera-se cedido ao fiduciário;
- Durante o período da cessão fica ainda sujeita aos demais deveres previstos nas als. a) a e), do n.º 4 do artigo 239.º do CIRE, ou seja, a:
«a) Não ocultar ou dissimular rendimentos que aufira, a qualquer título, e a informar o tribunal e o fiduciário sobre os seus rendimentos e património na forma e prazo em que isso lhe seja requisitado;
b) Exercer uma profissão remunerada, não a abandonando sem motivo legítimo, e a procurar diligentemente tal profissão quando desempregado, não recusando desrazoavelmente algum emprego para que seja apto;
c) Entregar imediatamente ao fiduciário os rendimentos objeto de cessão;
d) Informar o tribunal e o fiduciário de qualquer mudança de domicílio ou de condições de emprego, no prazo de 10 dias após a respetiva ocorrência, bem como, quando solicitado e dentro de igual prazo, sobre as diligências realizadas para a obtenção de emprego;
e) Não fazer quaisquer pagamentos aos credores da insolvência a não ser através do fiduciário e a não criar qualquer vantagem especial para algum desses credores.».
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A violação das obrigações impostas sujeitará a insolvente à recusa da concessão da exoneração do passivo restante, nos termos dos artigos 243.º, n.º 1, alínea a) e 244.º, n.º 2, ambos do CIRE, e pode mesmo justificar a revogação da exoneração concedida, tal como estatuído no artigo 246.º do mesmo Código.
Para exercer as funções de fiduciário nomeio a Exmª Sr.ª Administradora de Insolvência nomeada nos autos.
A remuneração do fiduciário e o reembolso das suas despesas constituem um encargo da insolvente, devendo aquele anualmente prestar informação sobre os rendimentos que tenham sido cedidos – preferencialmente após a declaração anual de rendimentos e o recebimento da nota de liquidação de imposto – ou omitidos, sobre a forma de conta corrente, e a enviar ao processo e a cada um dos credores nos termos do artigo 240.º, n.º 2, do CIRE.
A Sr.ª Fiduciária fica ainda responsável por fiscalizar o cumprimento pela devedora das obrigações que sobre esta impedem, com o dever de informar em caso de qualquer violação (cfr. Artigo 241.º, n.º3, do CIRE).
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Valor do incidente: o da causa.
Sem custas.
Notifique, publicite e registe ao abrigo do disposto nos artigos 38.º, n.º 2, 230.º, n.º 2, ex vi, artigo 247.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas e artigo 69.º, n. 1, alínea m), do Código de Registo Civil.
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Fixo a remuneração da fiduciária no montante correspondente a 10% das quantias objecto da cessão, com o limite anual máximo de €5.000,00 (artigo 25.º da Lei n.º 32/2004, de 22/07), que será ainda reembolsada, nos termos gerais, das despesas efectuadas reputadas necessárias ao correcto desempenho da função – artigo 60.º, n.º 1 ex vi 240.º, n.º 2 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
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A remuneração do fiduciário e o reembolso das suas despesas constituem encargo da devedora – artigo 240.º, n.º 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
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Oportunamente, dará o Exmo. Fiduciário cumprimento ao disposto no artigo 241.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
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Anualmente, deverá remeter aos autos e enviar a cada um dos credores informação sucinta sobre o estado da cessão - artigo 61.º, n.º 1 ex vi 240.º, n.º 2 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
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Adverte-se que os subsídios de férias e Natal (13º e 14.º mês) que venham a ser auferidos pela insolvente não são reconduzidos ao conceito de imprescindibilidade para o sustento minimamente condigno do insolvente, ou seja, não estão excluídos do rendimento disponível – neste sentido, entre outros, Acórdãos do TRC de 13.05.2014 e de 17.03.2015; Acórdãos do TRP de 03.12.2013 e de 16.09.2014; Acórdãos do TRL de 23.12.2012 e de 29.05.2013, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
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II. Do encerramento
Propôs (cfr. ref citius 6459509) a Srª. Administradora da insolvência o encerramento do processo, nos termos do artigo 230.º, n.º 1, al. d), do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa, por insuficiência da massa insolvente.
Não foi deduzida oposição ao encerramento por qualquer credor ou pela insolvente.
Nos termos do artigo 230.º, n.º 1, al. d), do mencionado diploma, prosseguindo o processo após a declaração de insolvência, o juiz declara o seu encerramento quando o administrador da insolvência constate a insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa insolvente.
Sendo que, de acordo com o art. 232.º, n.º 7, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, se presume a insuficiência da massa quando o património seja inferior a € 5.000,00.
Destarte, e uma vez que nenhum interessado manifestou a intenção de usar da faculdade prevista no art. 232.º, n.º 2, do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa, deverá ser declarado o encerramento do processo.
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Pelo exposto, e ao abrigo dos arts. 188.º, 230.º, n.º 1, al. d), 232.º, n.º 2, todos do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa, declaro encerrado o presente processo de insolvência com a produção dos efeitos constantes do artigo 233.º, do CIRE.
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Nos moldes previstos pelo artigo 233.º, n.º 6, do CIRE, declaro a presente insolvência com carácter fortuito.
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Custas pela massa insolvente (art. 304.º do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa).
Registe, notifique e publicite, nos termos dos arts. 37.º, 38.º e 230.º, n.º 2, do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa.
Comunique à CRC.
Inscreva a presente decisão no registo informático de execuções.
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III. Das contas da administração
Nos termos do disposto no artigo 233.º, n.º 1, al. b), do CIRE, uma vez encerrado o processo, cessam as funções do Administrador de Insolvência, excepto as referentes à prestação de contas.
Tal preceito aplica-se aos casos em que, embora se conclua pela insuficiência da massa, tal conclusão não é logo determinada na sentença de declaração de insolvência, mas apenas posteriormente, em que o Administrador teve oportunidade de administrar o património da insolvente, gerando receitas e despesas.
Do requerimento apresentado pelo Sr. Administrador da Insolvência resulta que inexistem quaisquer receitas para os autos e as despesas existentes são apensas as legalmente fixadas a título de remuneração ao Administrador e provisão para despesas.
Importa ainda atentar que existe a presunção que a provisão paga corresponde às despesas efectivamente despendidas pelo Administrador, não havendo lugar à restituição caso as mesmas sejam inferiores à provisão paga.
Por último, resulta de forma evidente dos autos que não houve actividade de liquidação por parte do Sr. Administrador da Insolvência.
Donde decorre que dar origem ao apenso de prestação de contas nos termos do disposto no artigo 62.º e seguintes do CIRE se traduziria num acto inútil.
Termos em que, dispenso a Sr.ª Administradora da Insolvência de prestar contas nos autos.
Mais determino se dê pagamento da remuneração legalmente devida à Srª. Administradora da Insolvência.
Notifique, sendo também todos os credores.”

Em 17.02.2021 foi decidido o seguinte:
“Ref citius 7298044: Por despacho proferido em 2020.03.12 foi determinado o encerramento do processo em resultado da constatação da insuficiência da massa insolvente nos termos do disposto nos artigos 230.º, n.º 1, al. d), 232.º, n.º 2, do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa. Tal despacho foi notificado às partes e transitou em julgado, pelo que se encontra esgotado o poder jurisdicional relativamente a tal matéria, não sendo admissível no âmbito destes autos prosseguir com diligências de apreensão e liquidação (sem prejuízo da exoneração do passivo restante).
Notifique.”

E, também em 17.02.2021, mas no apenso B, relativo à apreensão de bens, foi decidido - ref.ª 95751718 - o seguinte:
“Atento o despacho proferido hoje no processo principal deverá a Sr.ª AI providenciar pelo cancelamento da inscrição da declaração de insolvência no Registo Predial, devendo juntar ao apenso de apreensão, no prazo de 15 dias, certidão comprovativa do referido cancelamento.
Dê baixa estatística deste apenso.”

Inconformada, a requerente interpõe o presente recurso de apelação, pedindo a sua procedência, e, em consequência, a revogação das doutas decisões recorridas - porquanto as mesmas, ao terem declarado que se esgotara o poder jurisdicional e que, face ao encerramento do processo de insolvência, deveria ser cancelado o correspondente registo da insolvência, estão a impedir que, no âmbito do processo global que são a insolvência e a exoneração do passivo restante, os credores sejam ressarcidos de todo o activo posto à sua disposição, com a consequente violação dos despachos recorridos dos art.ºs 277.º, 619.º e 627.º, todos do C. P. Civil, 1.º, 18.º, n.º 2, 58.º, 236.º, n.º 1, 239.º, n.º 4, 243.º e 246.º, todos do CIRE - e a sua substituição por outra que permita a apreensão do direito real sobre o imóvel de que a insolvente é titular, para liquidação no âmbito da exoneração do passivo restante e consequente distribuição do produto pelos credores, e que decida a manutenção do registo da declaração de insolvência.
Para o efeito, apresenta a motivação do recurso e as respetivas conclusões.
Estas últimas são do seguinte teor:
(…)
Foi, oportunamente, admitido o recurso nos seguintes termos:
“Ref citius 7519123: Por tempestivo, tendo a recorrente legitimidade, sendo a decisão recorrível, admito o recurso interposto, o qual é de apelação e sobe nos próprios autos, de imediato e com efeito suspensivo (sendo certo que eventuais diligências da Sr.ª AI deverão aguardar a decisão a proferir pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra) – artigo 14.º, n.ºs 5 e 6, do CIRE, arts. 629.º, 631.º nº 1, 638.º nº 1, 644.º nº 1 al. a), 645º nº 1, al. a) e 647.º, todos do Código de Civil.
Notifique e após subam os autos, com urgência, ao Venerando Tribunal da Relação de Coimbra.”

Nesta Relação, foi admitido o recurso e mantida a espécie, efeito e regime de subida fixados pela 1ª Instância, nada obstando ao seu conhecimento.

O Ex. mo Relator entendeu que, atenta simplicidade da questão recursiva colocada, era de proferir Decisão Sumária – art.ºs 652.º, n.º 1, al. c) e 656.º, ambos do C. P. Civil.

Em Decisão Sumária cumpre, pois, apreciar e decidir.

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II – FUNDAMENTAÇÃO
1. Delimitação do objeto do recurso.
É pelas conclusões das alegações do recurso que se afere e delimita o seu objeto – cfr. designadamente, as disposições conjugadas dos art.ºs 5.º, 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.ºs 1, 2 e 3, e 640.º, n.ºs 1, 2 e 3, todos do C. P. Civil – sem prejuízo da apreciação das questões de conhecimento oficioso.
Face às conclusões da motivação do recurso, a única questão a decidir é a seguinte:
Saber se devem ser revogados os dois despachos recorridos – por violação dos invocados art.ºs 277.º, 619.º e 627.º, todos do C. P. Civil, 1.º, 18.º, n.º 2, 58.º, 236.º, n.º 1, 239.º, n.º 4, 243.º e 246.º, todos do CIRE - e substituídos por decisão que permita a apreensão do direito real sobre o imóvel de que a insolvente é titular, para liquidação no âmbito da exoneração do passivo restante e consequente distribuição do produto pelos credores e que mantenha o registo da declaração de insolvência.

2. Os Factos e Circunstancialismo relevantes apurados nos autos
Os Factos e Circunstancialismo apurados e que se mostram relevantes para a boa decisão da causa são os que defluem do antecedente Relatório, os quais se dão aqui por reproduzidos.

3. O Direito
Como vimos supra, a única questão recursiva a decidir é a seguinte:
Saber se devem ser revogados os dois despachos recorridos – por violação dos invocados art.ºs 277.º, 619.º e 627.º, todos do C. P. Civil, 1.º, 18.º, n.º 2, 58.º, 236.º, n.º 1, 239.º, n.º 4, 243.º e 246.º, todos do CIRE - e substituídos por decisão que permita a apreensão do direito real sobre o imóvel de que a insolvente é titular, para liquidação no âmbito da exoneração do passivo restante e consequente distribuição do produto pelos credores e que mantenha o registo da declaração de insolvência.

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Relativamente à única questão recursiva colocada (Saber se devem ser revogados os dois despachos recorridos – por violação dos invocados art.ºs 277.º, 619.º e 627.º, todos do C. P. Civil, 1.º, 18.º, n.º 2, 58.º, 236.º, n.º 1, 239.º, n.º 4, 243.º e 246.º, todos do CIRE - e substituídos por decisão que permita a apreensão do direito real sobre o imóvel de que a insolvente é titular, para liquidação no âmbito da exoneração do passivo restante e consequente distribuição do produto pelos credores e que mantenha o registo da declaração de insolvência.).
Entende a recorrente que devem ser revogados os dois despachos recorridos, por violação dos invocados art.ºs 277.º, 619.º e 627.º, todos do C. P. Civil, 1.º, 18.º, n.º 2, 58.º, 236.º, n.º 1, 239.º, n.º 4, 243.º e 246.º, todos do CIRE, e substituídos por decisão que permita a apreensão do direito real sobre o imóvel de que a insolvente é titular, para liquidação no âmbito da exoneração do passivo restante e consequente distribuição do produto pelos credores e que mantenha o registo da declaração de insolvência.
Como vimos supra, pelos seguintes fundamentos recursivos:
Surgem as presentes alegações no âmbito do recurso de apelação de prazo reduzido, interposto das decisões proferidas, a primeira delas no processo principal por despacho com a referência 95751702, datado de 17/02/2021, em que, com o fundamento de se encontrar esgotado o poder jurisdicional relativamente a diligências de apreensão e liquidação, nega a apreensão do activo da insolvente e do despacho com a referência 95751718 da mesma data, proferido no apenso B de apreensão de bens, que determina o cancelamento do registo da declaração de insolvência em consequência do despacho proferido no processo principal, e com as quais a recorrente não se pode conformar.
No presente processo de insolvência, e nos termos do artigo 155º do CIRE, foi elaborado relatório, no qual, com base na matriz predial e correspondentes informações do respectivo Serviço de Finanças, foi inventariado como direito real da insolvente um meio da fracção autónoma designada pela letra H do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Rua …, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … pela descrição nº 1981 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana do concelho de … sob o artigo 3056º da União das Freguesias de … - …, … e … e, decorrente da existência detectada desse direito, foi proposto no mesmo relatório a correspondente liquidação do activo.
Ao ser tentado o registo da declaração de insolvência, foi constatado que a certidão registal do prédio certificava que todo o imóvel era propriedade de B…, pelo que, dada a natureza constitutiva do registo predial, designadamente face às cadernetas prediais, teve a administradora de Insolvência que propor o encerramento da insolvência por insuficiência da massa, nos termos do artigo 232º, número 1, do CIRE, o que motivou o despacho de encerramento do processo proferido em 12/03/2020 e, em simultâneo, o despacho inicial de exoneração do passivo restante.
Por informações posteriores obtidas pela administradora de insolvência, foi constatado que a indicada B… só tinha adquirido um meio da fração já identificada nas presentes alegações, o que motivou a iniciativa de registar a declaração de insolvência, com a apreensão do restante meio do imóvel, afinal pertencente à insolvente, o que foi dado conhecimento ao tribunal por requerimento junto ao processo principal com a referência …, datado de 21/07/2020, em pleno decurso da exoneração do passivo restante.
Foi este requerimento, bem como o requerimento explicativo da apreensão ocorrida com a referência 37397606, datado de 09/12/2020, que conduziram aos despachos aqui em recurso, e com o que a Recorrente discorda.
Nos termos do artigo 277.º do CPC, o julgamento só extingue a instância quando tal julgamento ponha termo ao processo, e só aí, proferida a sentença, é que fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa.
Não é isto que acontece quando é requerida a insolvência por apresentação, nos termos do artigo 18.º, número 2, do CIRE, com o pedido de exoneração do passivo restante, de acordo com o artigo 236.º, número 1, do mesmo Código, resultando, desde logo, que, quer a liquidação da insolvência, quer os rendimentos ou património encontrado no decurso da exoneração, constituem activo para a repartição do produto obtido pelos credores.
Dentro da instância da insolvência, havendo exoneração, essa instância comporta, quer a parte correspondente ao próprio processo de insolvência, quer a parte correspondente à exoneração, o que integra tudo a mesma instância com decisões do mesmo juiz, o qual encerra o processo de insolvência, seja por insuficiência da massa, seja por rateio, e que também profere despacho inicial de exoneração do passivo restante, com o processo em curso, sendo também o mesmo juiz que profere os despachos de cessação antecipada ou de revogação da exoneração, se o insolvente violou dolosamente as suas obrigações durante o período da cessão.
Uma das situações que, no caso concreto, ocorreu, foi ter sido supervenientemente encontrado, no âmbito da exoneração, património susceptível de ser vendido e de beneficiar os credores, o que só aconteceria mediante a correspondente apreensão do bem para permitir a consequente liquidação e a atribuição do correspondente benefício aos credores através da manutenção do registo da insolvência e consequente venda, com o apoio do magistrado de toda a instância, do administrador de insolvência e do fiduciário.
Deste modo, os despachos recorridos, ao terem declarado que se esgotara o poder jurisdicional e que, face ao encerramento do processo de insolvência, deveria ser cancelado o correspondente registo da insolvência, estão a impedir que, no âmbito do processo global que são a insolvência e a exoneração do passivo restante, os credores sejam ressarcidos de todo o activo posto à sua disposição, com a consequente violação dos despachos recorridos os artigos 277º, 619º e 627º, do CPC, bem como os artigos 1º, 18º, número 2, 58º, 236º, número 1, 239º, número 4, 243º e 246º, do CIRE.
A massa insolvente recorrente não dispõe de qualquer liquidez para suportar os custos da presente demanda, pelo que, tendo recorrido ao benefício do apoio judiciário, na modalidade de isenção de taxa de justiça e demais encargos com o processo, requer que não lhe seja exigido o pagamento de qualquer taxa de justiça, até à obtenção de decisão definitiva do apoio judiciário pelas entidades administrativas competentes.
Nestes termos e nos mais de direito, dever o presente recurso ser julgado procedente e provado e, em consequência:
a) Serem revogados os dois despachos recorridos e substituídos por douto acórdão que permita a apreensão do direito real sobre o imóvel de que a insolvente é titular, para liquidação no âmbito da exoneração do passivo restante e consequente distribuição do produto pelos credores;
b) Para o efeito, deverá também o douto acórdão decidir sobre a manutenção do registo da declaração de insolvência;
c) Ser também confirmada a não exigência de pagamento de qualquer taxa de justiça, até à obtenção de decisão definitiva sobre o apoio judiciário requerido pelas entidades administrativas competentes.
Vejamos.
Em primeiro lugar, dispõem os art.ºs 230.º, n.º 1, al. d) e 233.º, n.º 1, als. a) e b), ambos do CIRE:
“Art.º 230.º:
1 - Prosseguindo o processo após a declaração de insolvência, o juiz declara o seu encerramento:
a) Após a realização do rateio final, sem prejuízo do disposto no n.º 6 do artigo 239.º;
b) Após o trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de insolvência, se a isso não se opuser o conteúdo deste;
c) A pedido do devedor, quando este deixe de se encontrar em situação de insolvência ou todos os credores prestem o seu consentimento;
d) Quando o administrador da insolvência constate a insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa insolvente.
e) Quando este ainda não haja sido declarado, no despacho inicial do incidente de exoneração do passivo restante referido na alínea b) do artigo 237.º
2 - A decisão de encerramento do processo é notificada aos credores e objecto da publicidade e do registo previstos nos artigos 37.º e 38.º, com indicação da razão determinante.
Art.º 233.º:
1 - Encerrado o processo, e sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 217.º Art.º 217.º do CIRE:
“1 - Com a sentença de homologação produzem-se as alterações dos créditos sobre a insolvência introduzidas pelo plano de insolvência, independentemente de tais créditos terem sido, ou não, reclamados ou verificados.
2 - A sentença homologatória confere eficácia a quaisquer actos ou negócios jurídicos previstos no plano de insolvência, independentemente da forma legalmente prevista, desde que constem do processo, por escrito, as necessárias declarações de vontade de terceiros e dos credores que o não tenham votado favoravelmente, ou que, nos termos do plano, devessem ser emitidas posteriormente à aprovação, mas prescindindo-se das declarações de vontade do devedor cujo consentimento não seja obrigatório nos termos das disposições deste Código e da nova sociedade ou sociedades a constituir.
3 - A sentença homologatória constitui, designadamente, título bastante para:
a) A constituição da nova sociedade ou sociedades e para a transmissão em seu benefício dos bens e direitos que deva adquirir, bem como para a realização dos respectivos registos;
b) A redução de capital, aumento de capital, modificação dos estatutos, transformação, exclusão de sócios e alteração dos órgãos sociais da sociedade devedora, bem como para a realização dos respectivos registos.
4 - As providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afetam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os codevedores ou os terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas podem agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos.
5 - A sentença homologatória produz de imediato os efeitos referidos nos n.ºs 1 a 3, ainda que seja interposto recurso.” (Itálico nosso) quanto aos concretos efeitos imediatos da decisão de homologação do plano de insolvência:
a) Cessam todos os efeitos que resultam da declaração de insolvência, recuperando designadamente o devedor o direito de disposição dos seus bens e a livre gestão dos seus negócios, sem prejuízo dos efeitos da qualificação da insolvência como culposa e do disposto no artigo seguinte;
b) A extinção da instância dos processos de verificação de créditos e de restituição e separação de bens já liquidados que se encontrem pendentes, excepto se tiver já sido proferida a sentença de verificação e graduação de créditos prevista no artigo 140.º, ou se o encerramento decorrer da aprovação de plano de insolvência, caso em que prosseguem até final os recursos interpostos dessa sentença e as acções cujos autores assim o requeiram, no prazo de 30 dias;
c) Os credores da insolvência poderão exercer os seus direitos contra o devedor sem outras restrições que não as constantes do eventual plano de insolvência e plano de pagamentos e do n.º 1 do artigo 242.º, constituindo para o efeito título executivo a sentença homologatória do plano de pagamentos, bem como a sentença de verificação de créditos ou a decisão proferida em acção de verificação ulterior, em conjugação, se for o caso, com a sentença homologatória do plano de insolvência;
d) Os credores da massa podem reclamar do devedor os seus direitos não satisfeitos.
2 - O encerramento do processo de insolvência antes do rateio final determina:
a) A ineficácia das resoluções de actos em beneficio da massa insolvente, excepto se o plano de insolvência atribuir ao administrador da insolvência competência para a defesa nas acções dirigidas à respectiva impugnação, bem como nos casos em que as mesmas não possam já ser impugnadas em virtude do decurso do prazo previsto no artigo 125.º, ou em que a impugnação deduzida haja já sido julgada improcedente por decisão com trânsito em julgado;
b) A extinção da instância dos processos de verificação de créditos e de restituição e separação de bens já liquidados que se encontrem pendentes, exceto se tiver já sido proferida a sentença de verificação e graduação de créditos prevista no artigo 140.º, ou se o encerramento decorrer da aprovação do plano de insolvência, caso em que prosseguem até final os recursos interpostos dessa sentença e as ações cujos autores ou a devedora assim o requeiram, no prazo de 30 dias;
c) A extinção da instância das acções pendentes contra os responsáveis legais pelas dívidas do insolvente propostas pelo administrador da insolvência, exceto se o plano de insolvência atribuir ao administrador da insolvência competência para o seu prosseguimento.
3 - As custas das acções de impugnação da resolução de actos em benefício da massa insolvente julgadas procedentes em virtude do disposto na alínea a) do número anterior constituem encargo da massa insolvente, se o processo for encerrado por insuficiência desta.
4 - Excetuados os processos de verificação de créditos, qualquer acção que corra por dependência do processo de insolvência e cuja instância não se extinga, nos termos da alínea b) do n.º 2, nem deva ser prosseguida pelo administrador da insolvência, nos termos do plano de insolvência, é desapensada do processo e remetida para o tribunal competente, passando o devedor a ter exclusiva legitimidade para a causa, independentemente de habilitação ou do acordo da contraparte.
5 - Nos 10 dias posteriores ao encerramento, o administrador da insolvência entrega no tribunal, para arquivo, toda a documentação relativa ao processo que se encontre em seu poder, bem como os elementos da contabilidade do devedor que não hajam de ser restituídos ao próprio.
6 - Sempre que ocorra o encerramento do processo de insolvência sem que tenha sido aberto incidente de qualificação por aplicação do disposto na alínea i) do n.º 1 do artigo 36.º, deve o juiz declarar expressamente na decisão prevista no artigo 230.º o caráter fortuito da insolvência.
7 - O encerramento do processo de insolvência nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 230.º, quando existam bens ou direitos a liquidar, determina unicamente o início do período de cessão do rendimento disponível.” (Itálicos nossos)
Ora, face a estes preceitos, entendemos que, desde logo, não é admissível a venda do bem depois de o processo ter sido encerrado por insuficiência da massa insolvente por decisão transitada em julgado, face ao que se dispõe no art.º 230.º, n.º 1, al. d), do CIRE.
Com efeito, depois de encerrado o processo por insuficiência da massa não é admissível ao administrador proceder à venda de um bem, por a tanto se opor o art.º 233.º do CIRE sobre os efeitos do encerramento do processo de insolvência, designadamente os previstos nas alíneas a) e b), do n.º 1.
De resto, salvo o devido respeito, não tem qualquer apoio no regime da exoneração do passivo restante - regime a que está sujeito o insolvente - a pretensão da massa de pretender vender o referido bem no incidente da exoneração do passivo restante.
No mais, podemos afirmar que também é exato que, ao proferir a decisão recorrida sobre a questão, já transitada em julgado, se esgotou o poder jurisdicional do julgador – art.ºs 613.º, n.ºs 1 e 3, 619.º, n.º 1 e 628.º, todos do C. P. Civil.
Por conseguinte, não merece censura a decisão recorrida que, proferida em 17.02.2021, decidiu: “Por despacho proferido em 2020.03.12 foi determinado o encerramento do processo em resultado da constatação da insuficiência da massa insolvente nos termos do disposto nos artigos 230.º, n.º 1, al. d), 232.º, n.º 2, do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa. Tal despacho foi notificado às partes e transitou em julgado, pelo que se encontra esgotado o poder jurisdicional relativamente a tal matéria, não sendo admissível no âmbito destes autos prosseguir com diligências de apreensão e liquidação (sem prejuízo da exoneração do passivo restante). Notifique.”
Face ao exposto, deve, pois, manter-se esta primeira decisão recorrida, por a mesma não violar o disposto nos invocados (e/ou implicitamente invocados) art.ºs 277.º, (613.º, n.ºs 1 e 3), 619.º, 627.º (e 628.º), todos do C. P. Civil, 1.º, 18.º, n.º 2, 58.º, 236.º, n.º 1, 239.º, n.º 4, 243.º e 246.º, todos do CIRE, ou em quaisquer outros.
Por outro lado, em relação ao veredito que decidiu sobre a questão do cancelamento da inscrição da insolvência no registo predial.
Além do que se dispõe nos art.ºs 230.º, n.º 1, al. d) e 233.º, n.º 1, als. a) e b), e já supratranscritos – e que aqui damos também por reproduzidos -, refere-se nos art.ºs 38.º e 39.º, também do CIRE:
“Art.º 38.º:
1 - (Revogado.)
2 - A declaração de insolvência e a nomeação de um administrador da insolvência são registadas oficiosamente, com base na respectiva certidão, para o efeito remetida pela secretaria:
a) Na conservatória do registo civil, se o devedor for uma pessoa singular;
b) Na conservatória do registo comercial, se houver quaisquer factos relativos ao devedor insolvente sujeitos a esse registo;
c) na entidade encarregada de outro registo público a que o devedor esteja eventualmente sujeito.
3 - Sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 43.º do Código de Registo Predial, a declaração de insolvência é ainda inscrita no registo predial, relativamente aos bens que integrem a massa insolvente, com base em certidão judicial da declaração de insolvência transitada em julgado, se o serviço de registo não conseguir aceder à informação necessária por meios eletrónicos, e em declaração do administrador da insolvência que identifique os bens.
4 - O registo previsto no número anterior, quando efectuado provisoriamente por natureza, é feito com base nas informações incluídas na página informática do tribunal, nos termos da alínea b) do n.º 6, e na declaração do administrador da insolvência que identifique os bens.
5 - Se no registo existir sobre os bens que integram a massa insolvente qualquer inscrição de aquisição ou reconhecimento do direito de propriedade ou de mera posse a favor de pessoa diversa do insolvente, deve o administrador da insolvência juntar ao processo certidão das respetivas inscrições.
6 - A secretaria:
a) Regista oficiosamente a declaração de insolvência e a nomeação do administrador da insolvência no registo informático de execuções estabelecido pelo Código de Processo Civil;
b) Promove a inclusão dessas informações, e ainda do prazo concedido para as reclamações, na página informática do tribunal;
c) Comunica a declaração de insolvência ao Banco de Portugal para que este proceda à sua inscrição na central de riscos de crédito.
7 - Dos registos da nomeação do administrador da insolvência deve constar o seu domicílio profissional.
8 - Todas as diligências destinadas à publicidade e registo da sentença devem ser realizadas no prazo de cinco dias.
9 - A publicidade e a inscrição em registo público da decisão de abertura do processo de insolvência estrangeiro e, se for caso disso, da decisão que nomeia o administrador da insolvência, a que se referem os artigos 28.º e 29.º do Regulamento (UE) n.º 2015/848 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015, devem ser solicitadas no tribunal português da área do estabelecimento do devedor, ou, não sendo esse o caso, no Juízo de Comércio de Lisboa, podendo o tribunal exigir tradução certificada por pessoa que para o efeito seja competente segundo o direito de um Estado-membro da União Europeia.
10 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, se o direito do Estado do processo de insolvência previr a efetivação de registo desconhecido do direito português, é determinado o registo que com aquele apresente maiores semelhanças.
11 - Sem prejuízo do disposto no n.º 9, a publicação regulada no n.º 1 do artigo 29.º do Regulamento (UE) n.º 2015/848 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015, é determinada oficiosamente pelos competentes serviços de registo se o devedor for titular de estabelecimento situado em Portugal.
12 - O registo previsto no n.º 2 deve ainda conter os factos referidos no n.º 2 do artigo 24.º do Regulamento (UE) 2015/848, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015.
Art.º 39.º:
1 - Concluindo o juiz que o património do devedor não é presumivelmente suficiente para a satisfação das custas do processo e das dívidas previsíveis da massa insolvente e não estando essa satisfação por outra forma garantida, faz menção desse facto na sentença de declaração da insolvência, dando nela cumprimento apenas ao preceituado nas alíneas a) a d) e h) do n.º 1 do artigo 36.º, e, caso disponha de elementos que justifiquem a abertura do incidente de qualificação da insolvência, declara aberto o incidente de qualificação com caráter limitado, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto na alínea i) do n.º 1 do artigo 36.º. Art.º 36.º do CIRE:
1 - Na sentença que declarar a insolvência, o juiz:
a) Indica a data e a hora da respectiva prolação, considerando-se que ela teve lugar ao meio-dia na falta de outra indicação;
b) Identifica o devedor insolvente, com indicação da sua sede ou residência;
c) Identifica e fixa residência aos administradores, de direito e de facto, do devedor, bem como ao próprio devedor, se este for pessoa singular;
d) Nomeia o administrador da insolvência, com indicação do seu domicílio profissional;
e) Determina que a administração da massa insolvente será assegurada pelo devedor, quando se verifiquem os pressupostos exigidos pelo n.º 2 do artigo 224.º;
f) Determina que o devedor entregue imediatamente ao administrador da insolvência os documentos referidos no n.º 1 do artigo 24.º que ainda não constem dos autos;
g) Decreta a apreensão, para imediata entrega ao administrador da insolvência, dos elementos da contabilidade do devedor e de todos os seus bens, ainda que arrestados, penhorados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos e sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 150.º;
h) Ordena a entrega ao Ministério Público, para os devidos efeitos, dos elementos que indiciem a prática de infracção penal;
i) Caso disponha de elementos que justifiquem a abertura do incidente de qualificação da insolvência, declara aberto o incidente de qualificação, com caráter pleno ou limitado, sem prejuízo do disposto no artigo 187.º;
j) Designa prazo, até 30 dias, para a reclamação de créditos;
l) Adverte os credores de que devem comunicar prontamente ao administrador da insolvência as garantias reais de que beneficiem;
m) Adverte os devedores do insolvente de que as prestações a que estejam obrigados deverão ser feitas ao administrador da insolvência e não ao próprio insolvente;
n) Designa dia e hora, entre os 45 e os 60 dias subsequentes, para a realização da reunião da assembleia de credores aludida no artigo 156.º, designada por assembleia de apreciação do relatório, ou declara, fundamentadamente, prescindir da realização da mencionada assembleia.
2 - O disposto na parte final da alínea n) do número anterior não se aplica nos casos em que for previsível a apresentação de um plano de insolvência ou em que se determine que a administração da insolvência seja efetuada pelo devedor.
3 - Nos casos em que não é designado dia para realização da assembleia de apreciação do relatório, nos termos da alínea n) do n.º 1, e qualquer interessado, no prazo para apresentação das reclamações de créditos, requeira ao tribunal a sua convocação, o juiz designa dia e hora, entre os 45 e os 60 dias subsequentes à sentença que declarar a insolvência, para a sua realização.
4 - Nos casos em que não é designado dia para realização da assembleia de apreciação do relatório nos termos da alínea n) do n.º 1, os prazos previstos neste Código, contados por referência à data da sua realização, contam-se com referência ao 45.º dia subsequente à data de prolação da sentença de declaração da insolvência.
5 - O juiz que tenha decidido não realizar a assembleia de apreciação do relatório deve, logo na sentença, adequar a marcha processual a tal factualidade, tendo em conta o caso concreto.”

2 - No caso referido no número anterior:
a) Qualquer interessado pode pedir, no prazo de cinco dias, que a sentença seja complementada com as restantes menções do n.º 1 do artigo 36.º;
b) Aplica-se à citação, notificação, publicidade e registo da sentença o disposto nos artigos anteriores, com as modificações exigidas, devendo em todas as comunicações fazer-se adicionalmente referência à possibilidade conferida pela alínea anterior.
3 - O requerente do complemento da sentença deposita à ordem do tribunal o montante que o juiz especificar segundo o que razoavelmente entenda necessário para garantir o pagamento das referidas custas e dívidas, ou cauciona esse pagamento mediante garantia bancária, sendo o depósito movimentado ou a caução acionada apenas depois de comprovada a efectiva insuficiência da massa, e na medida dessa insuficiência.
4 - Requerido o complemento da sentença nos termos dos n.os 2 e 3, deve o juiz dar cumprimento integral ao artigo 36.º, observando-se em seguida o disposto no artigo 37.º e no artigo anterior, e prosseguindo com caráter pleno o incidente de qualificação da insolvência, sempre que ao mesmo haja lugar.
5 - Quem requerer o complemento da sentença pode exigir o reembolso das quantias despendidas às pessoas que, em violação dos seus deveres como administradores, se hajam abstido de requerer a declaração de insolvência do devedor, ou o tenham feito com demora.
6 - O direito estabelecido no número anterior prescreve ao fim de cinco anos.
7 - Não sendo requerido o complemento da sentença:
a) O devedor não fica privado dos poderes de administração e disposição do seu património, nem se produzem quaisquer dos efeitos que normalmente correspondem à declaração de insolvência, ao abrigo das normas deste Código;
b) O processo de insolvência é declarado findo logo que a sentença transite em julgado, sem prejuízo da tramitação até final do incidente limitado de qualificação da insolvência;
c) O administrador da insolvência limita a sua actividade à elaboração do parecer a que se refere o n.º 2 do artigo 188.º;
d) após o respectivo trânsito em julgado, qualquer legitimado pode instaurar a todo o tempo novo processo de insolvência, mas o prosseguimento dos autos depende de que seja depositado à ordem do tribunal o montante que o juiz razoavelmente entenda necessário para garantir o pagamento das custas e das dívidas previsíveis da massa insolvente, aplicando-se o disposto nos n. os 4 e 5.
8 - O disposto neste artigo não é aplicável quando o devedor, sendo uma pessoa singular, tenha requerido, anteriormente à sentença de declaração de insolvência, a exoneração do passivo restante.
9 - Para os efeitos previstos no n.º 1, presume-se a insuficiência da massa quando o património do devedor seja inferior a (euro) 5000.
10 - Sendo o devedor uma sociedade comercial, aplica-se-lhe, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 4 do artigo 234.º.” (Itálicos nossos)
Ora, face a estes referidos preceitos, também se nos afigura correta a segunda decisão ora recorrida, proferida neste âmbito.
Com efeito, andou bem a mesma quando ordenou o cancelamento da inscrição da declaração de insolvência, já que:
Por um lado, “Prosseguindo o processo após a declaração de insolvência, o juiz declara o seu encerramento: (…) Quando o administrador da insolvência constate a insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa insolvente.”, sendo que “A decisão de encerramento do processo é notificada aos credores e objecto da publicidade e do registo previstos nos artigos 37.º e 38.º, com indicação da razão determinante.” – art.º 230.º, n.ºs 1, al. d) e 2, do CIRE
E, por outro lado, “Encerrado o processo, e sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 217.º Art.º 217.º do CIRE:
“1 - Com a sentença de homologação produzem-se as alterações dos créditos sobre a insolvência introduzidas pelo plano de insolvência, independentemente de tais créditos terem sido, ou não, reclamados ou verificados.
2 - A sentença homologatória confere eficácia a quaisquer actos ou negócios jurídicos previstos no plano de insolvência, independentemente da forma legalmente prevista, desde que constem do processo, por escrito, as necessárias declarações de vontade de terceiros e dos credores que o não tenham votado favoravelmente, ou que, nos termos do plano, devessem ser emitidas posteriormente à aprovação, mas prescindindo-se das declarações de vontade do devedor cujo consentimento não seja obrigatório nos termos das disposições deste Código e da nova sociedade ou sociedades a constituir.
3 - A sentença homologatória constitui, designadamente, título bastante para:
a) A constituição da nova sociedade ou sociedades e para a transmissão em seu benefício dos bens e direitos que deva adquirir, bem como para a realização dos respectivos registos;
b) A redução de capital, aumento de capital, modificação dos estatutos, transformação, exclusão de sócios e alteração dos órgãos sociais da sociedade devedora, bem como para a realização dos respectivos registos.
4 - As providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afetam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os codevedores ou os terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas podem agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos.
5 - A sentença homologatória produz de imediato os efeitos referidos nos n.ºs 1 a 3, ainda que seja interposto recurso.” (Itálico nosso) quanto aos concretos efeitos imediatos da decisão de homologação do plano de insolvência: a) Cessam todos os efeitos que resultam da declaração de insolvência, recuperando designadamente o devedor o direito de disposição dos seus bens e a livre gestão dos seus negócios, sem prejuízo dos efeitos da qualificação da insolvência como culposa e do disposto no artigo seguinte – art.º 233.º, n.º 1, al. a), do CIRE.
Assim, se cessam todos os efeitos que resultam da declaração de insolvência, recuperando designadamente o devedor o direito de disposição dos seus bens e a livre gestão dos seus negócios, necessariamente cessam também as inscrições que tenham sido levadas ao registo, designadamente a declaração de insolvência.
Face ao exposto, deve, pois, também manter-se esta segunda de decisão recorrida, já que a mesma não viola, designadamente, o disposto nos invocados (e/ou implicitamente invocados) art.ºs 277.º, (613.º, n.ºs 1 e 3), 619.º, 627.º (e 628.º), todos do C. P. Civil, 1.º, 18.º, n.º 2, (36.º, 38.º e 39.º), 58.º, (230.º, n.ºs 1, al. d) e 2, e 233.º, n.º 1. al. a).), 236.º, n.º 1, 239.º, n.º 4, 243.º e 246.º, todos do CIRE, ou em quaisquer outros.
Por conseguinte, face ao exposto e sem mais considerações, deve improceder a única questão recursiva e, em consequência, manterem-se, pois, ambas as decisões proferidas - porquanto as mesmas não violam, designadamente, o disposto nos invocados (e/ou implicitamente invocados) art.ºs 277.º, (613.º, n.ºs 1 e 3), 619.º, 627.º (e 628.º), todos do C. P. Civil, 1.º, 18.º, n.º 2, (36.º, 38.º e 39.º), 58.º, (230.º, n.ºs 1, al. d) e 2, e 233.º, n.º 1. al. a).), 236.º, n.º 1, 239.º, n.º 4, 243.º e 246.º, todos do CIRE, ou em quaisquer outros.

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Resumindo e concluindo:
Por conseguinte, face ao exposto e sem mais considerações, improcede esta única questão recursiva e, em consequência, mantêm-se ambas as doutas decisões proferidas - porquanto as mesmas não violam, designadamente, o disposto nos invocados (e/ou implicitamente invocados) art.ºs 277.º, (613.º, n.ºs 1 e 3), 619.º, 627.º (e 628.º), todos do C. P. Civil, 1.º, 18.º, n.º 2, (36.º, 38.º e 39.º), 58.º, (230.º, n.ºs 1, al. d) e 2, e 233.º, n.º 1, al. a).), 236.º, n.º 1, 239.º, n.º 4, 243.º e 246.º, todos do CIRE, ou em quaisquer outros – não devendo, portanto, ser substituídas por outra que, por um lado, permita a apreensão do direito real sobre o imóvel de que a insolvente é titular, para liquidação no âmbito da exoneração do passivo restante e consequente distribuição do produto pelos credores e que, por outro lado, não ordene o cancelamento do registo da declaração de insolvência (isto é, que decida pela manutenção do registo da declaração de insolvência.).

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IV – DECISÃO
Pelo exposto, na 1ª Secção Cível, do Tribunal da Relação de Coimbra, decido:
1) Julgar improcedente o recurso.
2) Manter ambas as decisões recorridas.
Custas pela recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário de que possa vir a beneficiar nos autos.

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Coimbra, 22 de julho 2021”


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II – DECISÃO
Assim, em conferência, os Juízes, na 1.ª Seção Cível desta Relação, acordam em – indeferindo a reclamação – confirmar, por não merecer censura, a decisão sumária do Ex. mo Sr. Relator, proferida em 22 de julho de 2021 nos presentes autos (art.º 652.º, n.º 3, do C. P. Civil).
Custas pela reclamante/recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário de que possa vir a beneficiar nos autos.