Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4134/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: CURA MARIANO
Descritores: QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DO CONTRATO
LOCAÇÃO-VENDA
CLÁUSULA
RESERVA DE PROPRIEDADE
PARTES COMPONENTES
PARTES INTEGRANTES DA COISA
Data do Acordão: 02/07/2006
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COVILHÃ - 2º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 409º E 936º, Nº2, DO C. CIV. .
Sumário: I – A catalogação de um contrato como pertencendo a um determinado tipo contratual, é uma operação lógica subsequente à interpretação das declarações de vontade das partes e dela dependente, constituindo matéria de direito sobre a qual o tribunal se pode pronunciar livremente, sem estar vinculado à denominação que os contraentes tenham empregado .
II – Há, pois, que proceder a uma interpretação da actividade negocial das partes, tendo por elementos de trabalho o texto contratual, as negociações que o antecederam e a vivência da relação negocial estabelecida, de modo a verificar a correcção da nomenclatura utilizada pelos outorgantes .

III – Apesar da figura do contrato de locação-venda se encontrar referida no artº 936º, nº2, do C. Civ., que lhe impõe o regime da compra e venda a prestações, com cláusula de reserva de propriedade, a mesma caiu em desuso, pela perda da sua utilidade, face à admissão deste pacto nos contratos de alienação, expressamente regulada no artº 409º do C. Civ. .

IV – Tendo-se provado que o que a autora e a ré realmente quiseram com o contrato celebrado foi vender e comprar, respectivamente, reservando a propriedade da coisa a favor da autora até ao pagamento do preço, deve interpretar-se o acordado no sentido da enunciada vontade real das partes, segundo o critério imposto pelo artº 236º, nº2, do C. Civ., assim se devendo qualificar juridicamente o contrato celebrado como um contrato de compra e venda, com cláusula de reserva de propriedade sobre o bem vendido .

V – É juridicamente inviável, por violação do princípio da totalidade das coisas, clausular a reserva de propriedade duma coisa já destinada a ser parte componente ou integrante de outra, sobre a qual incide um direito de propriedade titulado por sujeito diferente do beneficiário daquela cláusula .

Decisão Texto Integral:
Autora (apelada): A...

(apelante): B...

*
A Autora propôs a presente acção, com processo ordinário, peticio-nando o seguinte:
- se declare a resolução do contrato de locação e compra e venda cele-brado entre a Autora e a Ré em 20 de Fevereiro de 2002, titulado por documento junto aos autos;
- se declare que a Autora é a legítima dona da Estação de Tratamento de Águas Primárias que foi objecto daquele contrato;
- se condene a Ré a reconhecer este direito;
- se condene a Ré a restituir à Autora aquela Estação de Tratamento de Aguas Primárias, com todos os equipamentos que dela fazem parte integrante, entregando-a à Autora no estado em que a mesma se encontra e permitindo, para a concretização desta entrega, a entrada nas suas instalações de uma equipa de mecâ-nicos contratada pela Autora, para a desmontagem e retirada da mesma Estação de Tratamento de Aguas Primárias;
- se condene a Ré a pagar à Autora uma indemnização de € 58.726,50, pelos prejuízos que causou à autora pelo não cumprimento do contrato celebrado, sendo € 22.726,50, a título de danos emergentes e € 36.000,00, a título de lucros cessantes, quantia aquela acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação até integral pagamento;
- se condene a Ré a pagar à Autora a indemnização que se liquidar em execução de sentença, pelos danos que a Estação de Tratamento de Aguas Primá-rias apresentar no momento em que for entregue à Autora, resultantes das deterio-rações sofridas e a que a Ré deu causa;
- se compense o montante de € 5.000,00, recebido pela Autora, da Ré, correspondente à primeira prestação do contrato celebrado, com a indemnização que for atribuída à Autora no âmbito deste pedido;
- se condene a Ré numa sanção pecuniária compulsória, nos termos do artigo 829°-A, do Código Civil, não inferior a € 1.000,00, por cada dia de atraso na restituição à Autora da Estação de Tratamento de Águas Primárias, restituição essa que só se concretizará com a permissão de entrada nas suas instalações de uma equipa de mecânicos contratada pela Autora, para a desmontagem e retirada da mesma Estação de Tratamento de Aguas Primárias.
Para tanto, alega, em resumo, o seguinte:
- acordou com a Ré, fornecer-lhe e proceder à instalação de uma Estação de tratamento de águas primárias, pelo preço de € 120.000,00, tendo acordado, posteriormente, dadas as dificuldades financeiras da Ré, na celebração de um contrato escrito, que denominaram de locação e compra e venda, titulado por 12 letras de câmbio, 11 delas no valor de € 5 000.00 e a derradeira no valor de € 65.000,00, sendo que a propriedade do equipamento seria da Autora até ao pagamento final, tendo-se, então procedido ao fornecimento da estação, montada numa estru-tura metálica, constituindo uma máquina individualizada, perfeitamente amovível e transportável, para cujo funcionamento bastaria a instalação sobre um simples maciço de betão e a realização das respectivas ligações eléctricas e hidráulicas, a cargo da Ré;
- no entanto, a Ré não cumpriu o contrato, tendo as 2 primeiras letras de câmbio, sido devolvidas por falta de pagamento, o que originou despesas, suporta-das pela Autora, tendo vindo, depois, a ser paga a primeira daqueles letras, não mais tendo sido paga qualquer das restantes, o que conduziu à celebração de um novo acordo de pagamento, que igualmente, não foi cumprido pela Ré, tendo, então, a Autora comunicado àquela que lhe não restava outra alternativa senão a de retirar a estação, solicitando-lhe autorização para aceder às instalações da Ré onde estava aquela instalada, para proceder à sua desmontagem e retirada para Itália, tendo contratado pessoal para o efeito e informando a Ré da data em que pretendia fazer tal tarefa;
- mas a Ré não veio a permitir a entrada da equipa contratada, nem em qualquer outra ocasião, pelo que não restou outra alternativa, que não fosse a de instaurar a presente acção a pedir a resolução do contrato e a restituição da estação, pretendendo, ainda, ser indemnizada, para alem das despesas bancárias já referidas, do valor do transporte da estação para as instalações da Ré e agora para Itália, do custo da mão de obra que suportará com a desmontagem da estação, das despesas com a presente acção judicial e, ainda do que deixou de ganhar por não ter tido acesso à estação, por ter perdido a oportunidade de a negociar, entretanto surgida, pretendendo, finalmente, se fixe uma sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso na restituição do equipamento.

A Ré apresentou contestação, alegando o seguinte:
- o contrato foi celebrado por 2 administradores sem que tenha sido dis-cutido no Conselho de Administração;
- o contrato celebrado é um contrato de compra e venda, com reserva de propriedade, dissimulado de locação;
- a cláusula de reserva de propriedade torna-se ineficaz logo que se con-cretize a instalação da estação de tratamento, pelo que só tem a pagar o preço da estação, abatido da parcela que já pagou, acrescido de juros;
- como não é este o pedido, não pode ser condenada a pagar o preten-dido pela Autora.

Na réplica a Autora propugna por que, seja qual for a qualificação jurí-dica do contrato, o certo é que, como dele resulta, as partes acordaram em que a propriedade dos equipamentos ficava a pertencer à Autora até ao pagamento da ultima prestação, o que de resto foi determinante para a contratação, por parte desta, cláusula que é válida e eficaz, o que não é sequer prejudicado pela natureza dos equipamentos, que não estão integrados no imóvel da Ré, sendo amovíveis e podendo ser facilmente levantados.
Termina por concluir pelo abuso de direito da Ré ao invocar a invalidade da dita cláusula de reserva de propriedade, devendo esta ser condenada como litigante de má fé, em multa e indemnização de valor não inferior a € 10.000,00.

A Ré, defendeu, não ter viabilidade esta última pretensão por não ter deturpado nenhum facto, não colocando em causa a verdade.

Após a realização da audiência de julgamento foi proferida sentença que julgou a acção do seguinte modo:
“- se declara a resolução do contrato celebrado entre a Autora e a Ré em 20 de Fevereiro de 2002;
- se declara que a Autora é a legítima dona da Estação de Tratamento de Águas Primárias que foi objecto daquele contrato e de todos os elementos que fazem parte integrante da mesma;
- se condena a Ré a reconhecer este direito;
- se condena a Ré a restituir à Autora aquela Estação de Tratamento de Aguas Primárias, com todos os equipamentos que dela fazem parte integrante, entregando-a à Autora no estado em que a mesma se encontra e permitindo, para a concretização desta entrega, a entrada nas suas instalações de uma equipa de mecâ-nicos contratada pela Autora, para a desmontagem e retirada do equipamento;
- se condena a Ré a pagar à Autora:
a quantia que se vier a apurar, posteriormente, relativamente ao valor, despesas, suportado pela Autora com a devolução das letras que apresen-tou a pagamento ao Banco Comercial Português;
a quantia equivalente a € 5.000,00, relativamente ao transporte da Esta-ção de Tratamento de Águas Primárias de Itália para as instalações da Ré e destas, novamente, para Itália;

a quantia equivalente a € 2.500,00, relativamente aos custos da mão-de-obra para proceder à desmontagem da Estação de Tratamento de Águas Primárias, de modo a colocá-la em condições de poder ser retirada em segurança para Itália;
a quantia que se vier a apurar posteriormente, que a Autora despendeu com a presente acção judicial;
a quantia que se vier a apurar, posteriormente, relativa ao valor dos eventuais danos que a Estação de Tratamento de Aguas Primárias apresentar no momento em que for entregue à Autora, resultantes das deteriorações sofridas;
a quantia equivalente a € 36.000,00, a título de lucros cessantes;
sobre o valor da indemnização presente e liquidada, efectuada a com-pensação, pagará a Ré juros de mora à taxa legal, hoje de 12%, desde a citação, ocorrida a 27.03.2003, até integral e efectivo pagamento.
- se compensa o montante de € 5.000,00, recebido pela Autora da Ré, correspondente à primeira prestação do contrato celebrado, com a indemnização que vem de ser atribuída;
- se condena a Ré na sanção pecuniária compulsória, de valor equivalente a € 250,00, por cada dia em que a Ré impeça a Autora de iniciar, da forma que lhe aprouver, a desmontagem do equipamento”.

Desta sentença interpôs recurso a Ré, alegando o seguinte:
“- Uma estação de tratamento de águas e como um puzzle que só tem sentido no seu conjunto, mas que, quer as partes, quer o todo, são - ou podem ser - alienados pelo fornecedor.
- Todavia, o que dá o toque especifico ao contrato e a montagem do puzzle, é pôr o conjunto a funcionar;
- A estação de tratamento de águas integrada num edifício fabril por causa deste e para complemento deste torna-se tão do proprietário do imóvel de que faz parte tal como qualquer outro elemento seja componente ou integrante do imóvel, haja a responsabilidade que houver perante o seu fornecedor .
- A cláusula de reserva de propriedade convencionada em contrato de fornecimento e a instalação de uma estação de águas primárias em prédio urbano destinado a unidade industrial torna-se ineficaz logo que se concretize a respectiva instalação.
- A douta sentença em causa viola o disposto nos 1.207°, 405° e 409º do Código Civil, bem como o disposto no Assento do Supremo Tribunal de Justiça (Tribunal Pleno), processo 87495, de 31 de Janeiro de 1996, publicado no BMJ.”

A Autora apresentou contra-alegações em que pugnou pela manutenção do decidido.

*
OS FACTOS
Neste processo provaram-se os seguintes factos:

I - A Autora é uma sociedade comercial italiana que se dedica ao pro-jecto e fornecimento de Estações e Tratamento de Águas e Efluentes, exercendo a sua actividade em Portugal através de um seu Representante, com delegação na cidade do Porto (alínea A dos factos assentes).

II - Em 19 de Abril de 2001, a Ré encomendou à Autora, através do Representante em Portugal desta, uma Estação de Tratamento de Águas Primárias por filtração a quartzo, para ser instalada a sua fábrica da Covilhã e destinada a tratar a água de abastecimento da sua secção de tinturaria e acabamento têxtil (alínea B 1 dos factos assentes).

III - A instalação seria fornecida pela Autora em conformidade com a sua proposta n.º 083-1, apresentada à Ré na sequência de solicitação desta (alínea B 2 dos factos assentes).

IV - O respectivo preço, constante da referida proposta, era de € 120.000,00 e as condições de pagamento seriam a combinar posteriormente entre a Autora e a Ré (alínea C dos factos assentes).

V - Os equipamentos constitutivos da Estação de tratamento de Águas Primárias a fornecer eram os seguintes:
“a) Dois filtros a quartzo inteiramente construídos em aço inox AISI 304, dotados de passagem de homem superior e inferior, válvula de respiro supe-rior, manómetros de banho de glicerina e de contacto e fluxímetro de controlo caudal.
Cada unidade terá as seguintes características de dimensionamento: diâ-metro do reservatório: 2200 mm; altura do leito de filtração: 2500 mm; caudal máximo: 40 m3/hora.
Será fornecido o material filtrante, constituído por um leito de areia quartzífera calibrada nas seguintes classes de dimensão granulométrica: -0,3 a 0,8 mm; 3 a 5 mm; 5 a 8 mm.
b) Doze válvulas pneumáticas tipo wafer com accionamento através de actuador pneumático, uma pressão mínima de accionamento de 6 bar e um diâme-tro tal que a velocidade da água seja inferior a 2,5 m/s. Materiais de construção: corpo em ferro fundido GG25, disco e veio em aço inox AISI 316, e sede de vedação em EPDM.
c) Duas bombas centrífugas de alimentação dos filtros a quartzo com corpo e impulsor em ferro fundido, veio em aço inox AISI 316 e empanque mecâ-nico. As características de dimensionamento de cada uma das bombas são as seguintes:
Caudal: 40 m3/hora;
Prevalência: 20 metros de coluna de água;
Diâmetro de aspiração: DN 65;
Diâmetro de compressão: DN 50;
Potência: 4 KW;
N.º de pólos do motor: 2.
d) Um Grupo de Dosagem de Floculante (sal de Alumínio), constituído por:
Reservatório de 1000 Litros em plástico reforçado com fibra de vidro;
Bomba Doseadora de membrana, com caudal de máximo de 50 L/h e motor de 0,5
Um Misturador Estático de secção quadrada, para mistura do floculante na linha de alimentação do filtro, contendo chicanas de geração de turbulência, inteiramente realizado em aço inox AISI 304.
e) Duas Bombas Centrífugas de Contralavagem dos Filtros a Quartzo com corpo e impulsor em ferro fundido, veio em aço inox AISI 316 e empanque mecânico para lavagem em contracorrente dos filtros. As características de dimen-sionamento de cada uma das bombas são as seguintes:
Caudal. 50 m3/hora;
Prevalência: 22 metros de coluna de água,
Diâmetro da aspiração: DN 65;
Diâmetro da compressão: DN 50;
Potência: 5,5 KW;
N.º de pólos do motor: 2.
f) Uma Instalação Hidráulica, constituída por todas as válvulas necessá-rias à montagem do sistema, num total de 12, que serão de guilhotina em ferro fundido PN10, tanto para a aspiração como para a compressão, e anti-retorno de esfera, e todas as tubagens e suportes de sustentação, que serão em aço inox AISI 304, as flanges e colarinhos em alumínio, os parafusos zincados a quente e as vedações em borracha reforçada com tela.
g) Um Sistema de Controlo de Nível constituído por 4 interruptores de nível para instalação no reservatório da água a tratar, junto das bombas de alimen-tação, e no tanque de água tratada. Serão de tipo diferencial, com corpo em aço inox AISI 304, regulação por cadeia inox e cabo tipo N1 WK, com temperatura de exercício entre 0 e 50°C.
h) Um Medidor de Caudal para instalação na tubagem de alimentação do filtro, com as seguintes características técnicas:
Tipo: de indução electromagnética;
Alimentação: 220 V;
Frequência: 50/60 Hz,
Saídas: 4-20 mA para visualização do caudal, impulsos de 24 V para tota-lização;
Temperatura de exercício: -20 a +100 ºC;
Grau de protecção: IP 65;
Flanges: PN16;
Calibração: através de teclado,
Leitura: directa no visor de LCD.
i) Um Compressor de Contralavagem dos Filtros a Quartzo, com, as características técnicas: Tipo: volumétrico; Caudal: 160 m3/hora; Potência absor-vida: 3 KWI; Versão: vertical; Pressão de exercício: 0,5 bar a 20°C; Acoplamento: directo com junta elástica; Elevação de temperatura do ar: 40°C; Redutor e distri-buidor: engrenagens helicoidais em banho de óleo; Acessórios: silenciador na entrada com filtro, silenciador na compressão, válvula anti-retorno de clapet, vál-vula de segurança com prato e mola, junta elástica anti-vibrante, basamento em aço-carbono perfilado em U; Motor: de 5,5 KW com dois pólos.
j) Um Quadro Eléctrico de Comando e Controlo de toda a Estação de Tratamento, com as seguintes características técnicas: Serralharia metálica com espessura 20/10; Interruptor de linha automático; Porta-fusíveis seccionáveis e botoneira; Contactores e relés térmicos, Alimentação de PLC, Controlo a lógica programável (PLC), Terminal de lógica programável (teclado), Ventilador de arrefe-cimento, Voltímetro e comutador voltimétrico, Botão de emergência; Botão de arranque manual, Botão de reset do alarme”.
(alínea D dos factos assentes).

VI - Na sequência das negociações entre a Autora e a Ré destinadas à fixação das condições de pagamento da encomenda, a Autora, apercebendo-se das dificuldades financeiras da Ré, informou esta última que não lhe entregaria o equi-pamento encomendado sem que, da parte da Ré, lhe fosse prestada uma garantia de pagamento do respectivo preço (alínea E dos factos assentes).

VII - A Ré informou a Autora de que havia iniciado um processo de reestruturação e organização, que até aí decorrera de modo muito complicado e perturbado e no âmbito do qual as negociações com as entidades bancárias conti-nuavam a arrastar-se sem se saber quando teriam um epílogo favorável, pelo que, apresentava à autora a seguinte proposta:
a) Elaboração de um contrato de aluguer de longa duração dos equipa-mentos a fornecer pela autora,
b) Titulação desse aluguer por 12 letras, representando a totalidade da divida;
c) Cada uma das letras teria o valor de 5.000 €, vencendo-se mensal-mente a partir da data de celebração do contrato. A 12.ª letra teria um valor de 65.000 €, devendo, aquando do seu vencimento, ser desdobrada em outras 13 letras, cada um delas no valor de 5.000 euros, vencendo-se a 1.ª delas na data de vencimento da 12.ª letra e as seguintes mensalmente a partir desta data.
d) Os equipamentos seriam, portanto, pagos em 2 anos, podendo a Autora manter as letras em carteira ou descontá-las integralmente nos bancos se assim o pretendesse, financiando-se.
e) A propriedade dos equipamentos seria da Autora até ao pagamento final da última letra, altura em que passaria para a propriedade da Ré.
f) Mensalmente, a Autora emitiria um recibo de aluguer do equipamento, que daria a prestações do pagamento como efectuada. No final do contrato dar-se-ia, finalmente, a transferência da propriedade.
(alínea F dos factos assentes).

VIII - Esta proposta foi feita apenas por dois administradores da Ré (resposta ao quesito 8º).

IX - Através de fax enviado à Ré pela Delegação em Portugal da Autora, em 21.01.2002, a Autora manifestou a sua aceitação da proposta acima descrita, que lhe havia sido feita pela Ré, informando esta que aguardava o envio do respectivo contrato e das 12 letras, para formalização, e, entretanto, iria proceder às diligências necessárias ao transporte do equipamento para a fábrica da Ré (alínea G dos factos assentes).

X - O contrato foi devidamente assinado e datado em 20 de Fevereiro de 2002, com o seguinte texto:
“CONTRATO DE LOCAÇÃO E COMPRA E VENDA
Entre:
1ª OUTORGANTE - B..., NIPC 500203255, com sede na Zona do Parque Industrial, 6200 Covi-lhã, adiante designada por 1ª OUTORGANTE, neste acto representada pelos seus Administradores, Dr. Artur Lã Rosa e Engº Luis Miguel T. Mesquita Nunes, com poderes para obrigar a mesma;
e
2ª OUTORGANTE - A..., NIPC IT 02102890163, com sede na Via Aldo Moro, 1, 24020 Scanzorosciate (BG), Itália, representada pelo seu Admi-nistrador- Delegado, Engº Gianfranco Henzoni, com poderes para obrigar a mesma, adiante designada por 2ª OUTORGANTE;
Considerando que:
A) A 1ª OUTORGANTE necessita urgentemente de instalar na sua fábrica uma estação de tratamento de águas primarias;
H) A 2ª OUTORGANTE, conhecedora da situação financeira da 1ª OUTORGANTE, está disposta a contribuir para a viabilização deste projecto mediante as condições a seguir acordadas.
É celebrado o presente contrato que se rege pelas cláusulas seguintes:
CLÁUSULA PRIMEIRA
(Objecto)
1. O presente contrato tem por objecto regular as relações entre os outorgantes, relativamente à locação, por parte da 1ª OUTORGANTE, do equi-pamento destinado a uma estação de tratamento de águas primárias, propriedade da 2ª OUTORGANTE, pelo prazo de 24 (vinte e quatro) meses, findos os quais a 1ª OUTORGANTE adquire automaticamente a propriedade do referido equipa-mento.
2. O equipamento, objecto do presente contrato, encontra-se discrimi-nado em anexo (anexo 1).
CLÁUSULA SEGUNDA
(Obrigações e responsabilidades diversas)
1. À 2ª OUTORGANTE não é permitido ceder a sua posição contratual no presente contrato a terceiro, sem prévia autorização da 1ª OUTORGANTE, dada por escrito.
2. A 2ª OUTORGANTE compromete-se a entregar, após a assinatura do presente contrato, o equipamento descrito no anexo I em boas condições e perfeito funcionamento até final de Março de 2002.
3. A 2ª OUTORGANTE compromete-se a prestar assistência técnica, quer na montagem dos equipamentos quer no decurso do presente contrato.
CLÁUSULA TERCEIRA
(Prazo )
1. O prazo total da locação são 24 (vinte e quatro) meses - prazo acor-dado para o pagamento total do equipamento constante do anexo I.
2. Findo o referido prazo, a propriedade do equipamento descrito no anexo I passará automaticamente para a 1ª OUTORGANTE.
3. Caso ocorra alguma das seguintes situações:
. Falência da 2ª OUTORGANTE, providência cautelar ou diligência em acção executiva que incida sobre bens e equipamentos que impeçam a normal prossecução da locação.
. Se a 2ª OUTORGANTE for demandada ou requerente em processo especial de recuperação de empresa, falência ou insolvência;
Ambas as OUTORGANTES acordam em que a transferência da pro-priedade dos bens retroagirá à data da celebração do presente contrato, sem pre-juízo do cumprimento integral, por parte da 1ª OUTORGANTE no que toca às prestações ainda em falta nessa data. Desta forma, a 2ª OUTORGANTE conti-nuará a pagar as prestações vincendas sendo, desde logo, proprietária do equipa-mento descrito no anexo 1 e valendo o presente contrato como declaração de transferência de propriedade.
CLÁUSULA QUARTA
(Preço e forma de Pagamento)
O pagamento total é de €. 120.000 (cento e vinte mil euros) e será efectuado da seguinte forma:
a) Numa 1ª fase serão entregues 12 (doze) letras, titulando os primeiros 12 (doze) pagamentos mensais.
b) Cada uma das primeiras 11 (onze) letras terá o valor de €. 5.000 (cinco mil euros) com vencimento mensal e sucessivo a partir do mês de Março de 2002.
c) A 12ª letra terá o valor de €. 65.000 (sessenta e cinco mil euros) e na data do seu vencimento (Março de 2003) será desdobrável em outras 13 (treze) letras, cada uma no valor de €. 5.000 (cinco mil euros).
d) Nesta 2ª fase, a primeira destas 13 (treze) letras vencer-se-á logo na data do vencimento da 12ª letra antiga, ou seja, em Março de 2003.
e) As restantes vencer-se-ão mensal e sucessivamente até Março de 2004.
CLÁUSULA QUINT A
(Quitação)
1. A 2ª OUTORGANTE dará quitação mensal de todos os pagamentos (através de recibo que será enviado mensalmente para a sede da 1ª OUTOR-GANTE) de forma a que, no final, com o último recibo seja transferida automati-camente a propriedade do equipamento para a 1ª OUTORGANTE.
2. Nessa data (Fevereiro de 2004), a 2ª OUTORGANTE obriga-se a emitir uma declaração de venda. Caso a 2ª OUTORGANTE não emita tal declara-ção, o presente contrato juntamente com os recibos de quitação mensais valerão como tal.
3. Caso ocorra alguma das situações excepcionais previstas no n° 3 da cláusula terceira, o equipamento é propriedade da 1ª OUTORGANTE, valendo o presente contrato como declaração de transferência da propriedade, sem prejuízo do pagamento mensal das prestações vincendas e do envio mensal do correspon-dente recibo de quitação.
CLÁUSULA SEXTA
(Resolução do contrato)
1. Constituem causas de resolução do presente contrato:
a) Incumprimento total ou parcial do contrato, por parte da 2ª OUTORGANTE.
b) Se o atraso da entrega e montagem do equipamento, por factos exclusivamente imputáveis à 2ª OUTORGANTE, ultrapassar 30 dias em relação ao previsto para conclusão dos trabalhos ou se se verificar qualquer suspensão injusti-ficada dos mesmos.
c) A entrega de equipamento com defeitos que tornem a mercadoria inadequada ao fim a que se destina.
2. O direito à resolução não prejudica, a qualquer das partes, o direito à indemnização a prestar pela parte faltosa, que cubra eventuais danos emergentes e lucros cessantes.
CLÁUSULA SÉTIMA
(Responsabilidade)
A 2ª OUTORGANTE compromete-se a efectuar o controlo de quali-dade das peças ultimadas de forma a que estas respeitem os padrões de qualidade exigidos pela 1ª OUTORGANTE. Compromete-se, ainda, a responsabilizar-se perante a 1ª OUTORGANTE pelos defeitos e vícios cuja responsabilidade adve-nha das operações de montagem e funcionamento do equipamento, suportando indemnizações, penalizações e despesas que sejam imputadas à 1ª OUTOR-GANTE em virtude desses defeitos ou vícios”.
(alínea H dos factos assentes).

XI - A Autora entregou a Estação de Tratamento de Aguas Primárias no mês de Março de 2002, a qual, é composta pelo conjunto dos equipamentos des-critos em V, montados numa estrutura metálica de suporte com 8 metros de com-primento por 2,56 metros de largura (alínea I dos factos assentes).

XII - A montagem da Estação de Águas levada a cabo pela Autora foi feita numa zona própria, integrando mecanismos, condutas de água e electricidade, tanques, bombas, quadros eléctricos e mecanismos de controlo (resposta ao quesito 9º).

XIII - O que a Autora e a Ré realmente quiseram com o contrato alu-dido em X foi vender e comprar, respectivamente, reservando a propriedade da dita Estação a favor da Autora até ao pagamento do preço (resposta ao quesito 10º).

XIV - A estação de tratamento em causa não chegou a funcionar, não tendo sido ultimada a fase do arranque, e todos os elementos que compõem tais equipamentos e aludidos em V, podem ser levantados da fábrica da Ré, sem dete-rioração dos mesmos e sem deterioração da fábrica da Ré, pois são todos constituí-dos por peças desmontáveis que conservarão sempre a sua utilidade e valor depois do seu levantamento e transporte para outro local (respostas aos quesitos 11º e 12º).

XV – O bem que a Autora forneceu à Ré tem uma vida útil de cerca de, para mais, 20 anos (alínea R dos factos assentes).

XVI - A Ré não cumpriu o contrato celebrado com a Autora no que res-peita ao pagamento das prestações mensais nele previstas, tendo as primeiras duas letras de câmbio aceites pela Ré sido devolvidas por falta de pagamento, acabando a Ré por pagar, com cerca de 1 mês de atraso, apenas a primeira das prestações mensais, no valor de 5.000 €, por meio do cheque n.º 36392191, sacado sobre o BCP, com data de 30.04.2002 (alínea J dos factos assentes).

XVII - Depois da entrega ao representante em Portugal da Autora do cheque acima mencionado, não mais a Ré procedeu a qualquer pagamento à Autora, apesar da mesma se ter recusado a fazer o arranque da instalação enquanto não recebesse as prestações em atraso e ter enviado várias cartas à Ré, solicitando o pagamento das prestações que se iam vencendo mensalmente (alínea L dos factos assentes).

XVIII - Em 16.09.2002, a Autora, através do seu representante em Portugal, enviou uma nova carta à Ré, na qual lhe solicita mais uma vez o paga-mento das prestações em atraso, informando-a que procederia ao arranque da instalação logo após o respectivo pagamento e solicitando um encontro entre o seu administrador delegado, o Senhor Engº Gianfranco Benzoni, que se deslocaria a Portugal na semana seguinte, e a Administração da Ré (alínea M dos factos assentes).

XIX - Esse encontro teve lugar em 25 de Setembro de 2002, e nele par-ticiparam, para além do Senhor Eng.º Gianfranco Benzoni, o Senhor Eng.º Antó-nio Archer, representante em Portugal da Autora e o Senhor Dr. Vasco Lino, como Presidente do Conselho de Administração da Ré, no qual o representante em Portugal da Autora começou por recordar que o contrato firmado em 20 de Feve-reiro de 2002, não estava a ser cumprido pela Ré, pelo que a Autora teria o direito de retirar das instalações da Ré o equipamento fornecido, porquanto ele permane-cia de sua propriedade, conforme os termos do contrato, tendo o Senhor Dr. Vasco Lino proposto um acordo de pagamento que foi aceite pelo Senhor Eng.o Gianfranco Benzoni (alínea N dos factos assentes).

XX - Mais uma vez a Ré não cumpriu o acordado, e o representante em Portugal da Autora enviou, em 09.12.2002, uma nova carta à Ré, na qual, face ao incumprimento da Ré, informou esta de que não restava outra alternativa à Autora senão proceder à retirada da Estação de Tratamento de Aguas Primárias fornecida, uma vez que esta permanecia na sua propriedade, solicitando, nessa mesma carta, autorização para aceder às instalações da Ré durante o mês de Dezembro de 2002, a fim de proceder à desmontagem e retirada para Itália da Estação de Tratamento de Águas Primárias da Autora (alínea O dos factos assentes).

XXI - E não tendo obtido resposta àquela carta, o representante em Portugal da Autora, enviou, em 12.12.2002, um fax à Administração da Ré infor-mando esta de que a Autora tinha contratado uma equipa de mecânicos da Serra-lharia Agostinho & Serra para procederem à desmontagem da sua Estação de Tratamento de Águas Primárias no dia 18 de Dezembro, de 2002, e esperava que a Administração da Ré, respeitando a lei e o direito, autorizasse a entrada daquela equipa de mecânicos nas instalações da Ré, de modo a permitir que a Autora pudesse reaver o bem que lhe pertencia, colocando-o em condições de ser retirado para Itália o mais rapidamente possível, uma vez que ai tinha já um cliente interes-sado em comprar aquela instalação (alínea P dos factos assentes).

XXII - Porém, a Administração da Ré não permitiu a entrada nas suas instalações aquela equipa de mecânicos no dia 18 de Dezembro de 2002, nem em qualquer outro dia, apesar de várias vezes instada para tal (alínea Q dos factos assentes).

XXIII - Em consequência da devolução das letras que a Autora apre-sentou a pagamento ao Banco Comercial Português, aquele teve que suportar, a título de despesas, quantia não apurada (resposta ao quesito 1º).

XXIV - No transporte da Estação de Tratamento de Águas Primárias de Itália para as instalações da Ré despendeu a Autora € 2.500 (resposta ao quesito 2º).

XXV - A Autora terá de despender outros € 2.500 para transportar o equipamento novamente para Itália, bem como, pelo menos, mais € 2.500 em custos de mão-de-obra para proceder à desmontagem da Estação de Tratamento de Águas Primárias, de modo a colocá-la em condições de poder ser retirada em segurança para Itália (respostas aos quesitos 3º e 4º).

XXVI - A Autora gastará com a presente acção judicial, que teve neces-sidade de propor, face à recusa da Ré em restituir-lhe os bens, quantia não apurada (resposta ao quesito 5º).

XXVII - Em consequência da recusa por parte da Ré em não autorizar a Autora a retirar o equipamento, esta perdeu a oportunidade de vender a Estação de Tratamento de Águas Primárias em causa a um cliente Italiano que nela estava interessado, deixando, assim, de ganhar € 36.000 de margem bruta de comercializa-ção naquela venda (resposta ao quesito 6º).

XXVIII - A estação de Tratamento de Águas Primárias fornecida pela Autora, encontrando-se a céu aberto nas instalações da Ré, corre riscos de deterio-ração, a qual será tanto maior, quanto mais tempo decorrer até à sua restituição à Autora, o que implica prejuízos para esta (resposta ao quesito 7º).

*
O DIREITO
Considerando que o objecto do recurso se encontra delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente, cumpre verificar se tendo a Ré pago apenas a primeira das prestações acordadas, a Autora tem ou não direito à restitui-ção do equipamento fornecido.

1. Da qualificação do contrato
Previamente importa qualificar juridicamente o contrato celebrado, de modo a proceder-se ao enquadramento da questão a solucionar.
A catalogação de um contrato como pertencendo a um determinado tipo contratual, necessária para determinar qual o regime jurídico aplicável, é uma ope-ração lógica subsequente à interpretação das declarações de vontade das partes e dela dependente. A qualificação de um contrato é matéria de direito sobre a qual o tribunal se pode pronunciar livremente, sem estar vinculado à denominação que os contraentes tenham empregado. O nome com que as partes baptizaram o acordo celebrado poderá, quanto muito, servir como um elemento, entre muitos outros, a ter em consideração no esforço interpretativo para alcançar o real sentido das declarações de vontade, nada garantindo que a conclusão atingida coincida com o "nomen" utilizado pelas partes.
Como escreveu Galvão Telles :
"A não adequação da designação adoptada pelas partes à real natureza do contrato pode resultar de circunstâncias várias, ou de equívoco ou ignorância ou do objecto de defraudar a lei, procurando enquadrar o negócio num modelo que não é o seu, para, através do uso da denominação específica de outro e a confusão assim estabelecida, tentar extrair daí consequências jurídicas favoráveis às partes ou a uma delas e que não são compatíveis com a índole e regime do negócio efectivamente desejado...Em qualquer dos casos, o regime a observar, em última análise será o do próprio tipo negocial que vier a diagnosticar-se através das operações de interpreta-ção e qualificação, afastando-se todas e quaisquer soluções para que apontasse a incorrecta denominação usada pelas partes, mas que não sejam conciliáveis com a espécie contratual realmente celebrada" [Em parecer publicado na C.J., Ano XVII, Tomo 2, pág. 27.].
Há, pois, que proceder a uma interpretação da actividade negocial das partes, tendo por elementos de trabalho o texto contratual, as negociações que o antecederam e a vivência da relação nrgocial estabelecida, de modo a verificar a correcção da nomenclatura utilizada pelos outorgantes.
O contrato em causa foi intitulado de “Contrato de locação e compra e venda”, tendo-se estabelecido que o mesmo teria o seguinte objecto:
“O presente contrato tem por objecto regular as relações entre os outor-gantes, relativamente à locação, por parte da 1ª OUTORGANTE, do equipamento destinado a uma estação de tratamento de águas primárias, propriedade da 2ª OUTORGANTE, pelo prazo de 24 (vinte e quatro) meses, findos os quais a 1ª OUTORGANTE adquire automaticamente a propriedade do referido equipa-mento”.
Esta figura contratual, denominada locação-venda, foi utilizada com frequência [Escrevia CUNHA GONÇALVES, em “Tratado de direito civil, em comentário ao Código Civil Português”, vol. VIII, pág. 339, da ed. de 1934, da Coimbra Editora: “É vulgaríssima, actualmente, esta forma de contratar, desenvolvida pelos norte-americanos, que largamente usam e abusam do crédito e numerosas transacções efectuam com pagamentos a prestações; mas também em Portugal, assim são feitos os negócios sobre máquinas agrícolas ou industriais, principalmente as máquinas de costura Singer, e sobre vagões reservatórios, automóveis, pianos, mobílias, aparelhos de T.S.F., e até estabelecimentos comerciais e chalets na Costa do Sol (Oeiras a Cascais)”.] antes do nosso direito admitir a estipulação de cláusula reserva de proprie-dade nos negócios de alienação, quando se considerava que esse pacto era ilícito por violar a regra da transfe-rência imediata da propriedade [A cláusula de reserva de propriedade nos contratos de alienação foi admitida pelo C.C. de 1966 (artº 409º), após constar do Anteprojecto de Galvão Telles para o contrato de compra e venda (artº 62º e 63º), tendo, sob proposta de VAZ SERRA (vide o seu estudo “Efeitos dos Contratos”, no B.M.J. nº 74, pág. 356), sido estendida a sua aplicação aos restantes contratos de alienação.].
Como, na altura se escreveu, “dominado por este raciocínio, por esta obsessão de conquista compreensível de uma segurança, de garantias complemen-tares…o comércio passou a ensaiar vários tipos de contratos, todos eles conse-quentes de uma dilatada experiência, até se estabilizar no já estafado contrato de locação-venda…” [In “Da venda a prestações. Ensaio sobre a venda de cousas móveis para uso ou consumo”, de HUMBERTO PELÁGIO, pág. 20, da ed. de 1941].
Apesar desta figura se encontrar ainda referida no artº 936º, nº 2, do C.C., que lhe impõe o regime da compra e venda a prestações, com cláusula de reserva de propriedade, a mesma caiu em desuso, pela perda da sua utilidade, face à admissão deste pacto nos contratos de alienação, expressamente regulada no artº 409º, do C.C..
Contudo, num opção revivalista, as partes, perseguindo o antigo objec-tivo de garantir a posição do vendedor, perante uma eventual perda de solvabili-dade do comprador, esqueceram a existência do moderno artº 409º, do C.C., e adoptaram a terminologia própria do “déjà vue” contrato de locação-venda [GALVÃO TELLES, em “Manual dos contratos em geral”, pág. 477-478, da ed. de 2002, da Coimbra Editora, PEREIRA COELHO, em “Arrendamento”, pág. 22-23, das lições policopiadas de 1984, JOÃO DE MATOS, em “Manual do arrendamento e aluguer”, vol. I, pág. 50-51, da ed. s.d. da Livraria Fernando Machado, e PEDRO ROMANO MARTINEZ, em “Direito das obrigações (Parte especial)”, pág. 96, da 2ª ed., da Livraria Almedina, qualificam este negócio como uma união alternativa de contratos, em que o pagamento da última prestação funcionaria como condição resolutiva do contrato de locação e suspensiva do contrato de compra e venda.
MENEZES LEITÃO, em “Direito das obrigações”, vol. III, pág. 82, da ed. de 2002, da Livraria Almedina, entende que estamos perante um contrato de compra e venda específico.
TERESA ANSELMO VAZ, em “Alguns aspectos do contrato de compra e venda a prestações e contratos análogos”, pág. 72-77, da ed. s.d., da Livraria Almedina, e LIMA PINHEIRO, em “A cláusula de reserva de propriedade”, pág. 36-38, da ed. de 1988, da Livraria Almedina, consideram o contrato de locação-venda como um verdadeiro contrato de compra e venda, opinião que já era perfilhada na vigência do Código de Seabra, por CUNHA GONÇALVES, em “Tratado de direito civil, em comentário ao Código Civil Português”, vol. VIII, pág. 340-341, da ed. de 1934, da Coimbra Editora.].
Apesar da redacção utilizada, considerando os antecedentes negociais (pontos VI e VII da matéria de facto provada) e o facto de se ter provado que “o que a Autora e a Ré realmente quiseram com o contrato celebrado foi vender e comprar, respectivamente, reservando a propriedade da dita Estação a favor da Autora até ao pagamento do preço”, deve interpretar-se o acordado no sentido da enunciada vontade real das partes, segundo o critério imposto pelo artº 236º, nº 2, do C.C. [É nosso entendimento que é possível atingir esta conclusão pela via interpretativa do texto contratual, não sendo necessário recorrer à figura da simulação, para obtermos a aplicação do negócio dissimulado, como defende DOMENICO RUBINO, em “La compravendita”, em “Trattato di diritto civile e commerciale”, vol. XXIII, pág. 445, da 2ª ed., da Giuffré Editore.].
Assim, deve qualificar-se juridicamente o contrato celebrado como um contrato de compra e venda, com cláusula de reserva de propriedade sobre o bem vendido.
E o facto da prestação da Autora não se resumir apenas ao fornecimento de um bem, incluindo também os trabalhos da sua instalação, não é suficiente para podermos concluir que estamos perante um contrato de empreitada ou de um contrato misto [JOSÉ MANUEL VILALONGA, em Compra e venda e empreitada - contributo para a distinção entre os dois contratos, na R.O.A., Ano 57, vol. I, pág. 210, defende que estamos perante um caso de união de contratos.], na modalidade de contrato combinado [Utilizando a classificação corrente, baseada na doutrina alemã e utilizada por VAZ SERRA, em “União de contratos. Contratos mistos”, no B.M.J. nº 91, pág. 41-42, ANTUNES VARELA, em “Das obrigações em geral”, I vol., pág. 286, da 10ª ed., da Livraria Almedina, e ALMEIDA COSTA, em “Direito das obrigações”, pág. 337-338, da 9ª ed., da Livraria Almedina.
Já GALVÃO TELLES, em “Manual dos contratos em geral”, pág. 387, da ed. de 2002, da Coimbra Editora, classifica estes contratos mistos de múltiplos.], em que uma das partes se obriga a duas prestações que integram dois tipos contratuais diferentes - o da compra e venda e o da empreitada - contra uma prestação unitária da contraparte - o paga-mento do preço. É que estas classificações só devem ocorrer se os trabalhos de instalação do bem vendido assumirem uma dimensão principal, ou, pelo menos, relevante, caso contrário eles denunciarão apenas a existência de um mero dever acessório da prestação principal típica do contrato de compra e venda [Foi esta a solução defendida pelo relator deste Acórdão, em “Responsabilidade contratual do empreiteiro pelos defeitos da obra”, pág. 48-49, da 2ª ed., da Livraria Almedina.]. Não se tendo alegado e, consequentemente, demonstrado neste processo, as características desses trabalhos de instalação (quer no texto contratual, quer na matéria fáctica provada relativa à execução do contrato, apenas se fala na montagem dos diferentes elementos que compunham a Estação de Tratamento de Águas Primárias vendida) não tem o tribunal os elementos suficientes para caracterizar o contrato outorgado como contrato de empreitada, como fez a sentença recorrida, ou sequer de misto de compra e venda e empreitada, pelo que há que concluir que apenas foram apurados ele-mentos que permitem a sua integração no tipo contratual dos contratos de compra e venda, na modalidade de compra e venda a prestações, com reserva de proprie-dade.

2. Da validade da cláusula de reserva de propriedade
A recorrente coloca em causa a validade da cláusula de reserva de pro-priedade do bem vendido, aposta no contrato celebrado entre Autora e Ré, atentas as características do bem em causa, defendendo a aplicação do Assento do S.T.J. de 31-1-1996 [O texto deste Assento encontra-se publicado no B.M.J. nº 453, pág. 46]. - “a cláusula de reserva de propriedade em contrato de fornecimento de elevadores em prédios urbanos torna-se eficaz logo que se concretize a respec-tiva instalação”.
Atento o texto deste Assento verifica-se que não estando em causa neste processo o fornecimento de elevadores em prédios urbanos, o mesmo não é direc-tamente aplicável, podendo apenas a sua fundamentação ser utilizada para o julga-mento deste caso.
Nesse Assento, para além da ineficácia da cláusula de reserva de propriedade face a terceiros de boa fé (matéria que não nos interessa, uma vez que neste processo apenas estão em jogo os interesses dos próprios contraentes), sustentou-se a opi-nião que não é válida a cláusula de reserva de propriedade aposta em contrato que tenha por objecto a incorporação em imóvel de coisa que passa a ser sua parte componente ou integrante, por respeito ao princípio da totalidade dos direitos reais.
Proclama esta ideia que os direitos reais, por regra, incidem sobre a totalidade das coisas que constituem o seu objecto [São excepções a este princípio, entre outras, o objecto do direito de servidão, ou da propriedade horizontal, ou do direito de superfície.].
Do funcionamento deste princípio resulta que as partes integrantes ou constitutivas duma coisa seguem o destino jurídico desta, não podendo, enquanto se mantiverem como tal, ser objecto de direitos de propriedade diferentes do direito que incide sobre a totalidade, e que, se uma coisa é incorporada noutra, passando a ser sua parte componente ou integrante, passa a ser abrangida pelo direito real que já incidia sobre a coisa ampliada [Sobre este princípio dos direitos reais, vide HENRIQUE MESQUITA, em “Direitos reais”, sumários das lições ao curso de 1966-1967, pág. 13-14, da ed. pol. s.d., ÁLVARO MOREIRA e CARLOS FRAGA, em “Direitos reais. Segundo as prelecções do Prof. Dr. C.A. da Mota Pinto ao 4º ano jurídico de 1970-71”, pág. 84-89, da ed. s.d., da Livraria Almedina, CARVALHO FERNANDES, em “Lições de direitos reais”, pág. 49, da ed. de 1996, da Quid juris, PENHA GONÇALVES, em “Curso de direitos reais”, pág. 82-83, da 2ª ed., da Universidade Lusíada, e ORLANDO DE CARVALHO, em “Direito das coisas”, pág. 210-218, da ed. de 1977, da Editora Centelha.
Este princípio encontra-se enunciado no artº 93º, do B.G.B. – “As partes constitutivas de uma coisa que não podem ser separadas umas das outras, sem que uma delas seja destruída ou alterada na sua essência, não podem ser objecto de direitos particulares”.].
Deste modo é juridicamente inviável, por violação do mencionado prin-cípio da totalidade, clausular a reserva de propriedade duma coisa já destinada a ser parte componente ou integrante (?) de outra, sobre a qual incide um direito de propriedade titulado por sujeito diferente do beneficiário daquela cláusula [Vide, neste sentido, HENRIQUE MESQUITA, em “Direitos reais”, sumários das lições ao curso de 1966-1967, pág. 14, da ed. pol. s.d., ÁLVARO MOREIRA e CARLOS FRAGA, em “Direitos reais. Segundo as prelecções do Prof. Dr. C.A. da Mota Pinto ao 4º ano jurídico de 1970-71”, pág. 87-88, da ed. s.d., da Livraria Almedina, CARVALHO FERNANDES, em “Lições de direitos reais”, pág. 49, da ed. de 1996, da Quid juris, PENHA GONÇALVES, em “Curso de direitos reais”, pág. 82-83, da 2ª ed., da Universidade Lusíada, e os seguintes Acórdãos:
? da Relação de Lisboa, de 12-5-1988, na C.J., Ano XIII, tomo 3, pág. 141, relatado por CARVALHO PINHEIRO.
? da Relação de Lisboa, de 20-5-1993, na C..J., Ano XVIII, tomo 3, pág. 107, relatado por EDUARDO BAPTISTA.
? do S.T.J., de 6-7-1993, na C.J. (Ac. do S.T.J.), Ano 1, tomo 2, pág. 181, relatado por MACHADO SOARES.
? da Relação de Lisboa, de 7-12-1993, na C.J., Ano XVIII, tomo 5, pág. 137, relatado por AFONSO DE MELO.
? da Relação de Lisboa, de 17-3-1994, na C.J., Ano XIX, tomo 2, pág. 86, relatado por PIRES SALPICO.
? do S.T.J., de 17-11-1994, na C.J. (Ac. do S.T.J.), Ano II, tomo 3, pág. 143, relatado por SEQUEIRA SAMPAIO.
? do S.T.J., de 14-2-1995, na C.J. (Ac. do S.T.J.), Ano III, tomo 1, pág. 88, relatado por FERNANDO FABIÃO.].
Se esse destino é alheio ao negócio onde se clausulou a reserva de pro-priedade a favor do vendedor, a incorporação posterior da coisa vendida em bem pertencente ao comprador, a cláusula é válida, mas cessam os seus efeitos com essa incorporação, atenta a correspondente aquisição originária do direito de proprie-dade sobre ela, pelo comprador [Vide, neste sentido, MENEZES LEITÃO, em “Direito das obrigações”, vol. I, pág. 176, da ed. de 2000, da Livraria Almedina, e LIMA PINHEIRO, em “A cláusula de reserva de propriedade”, pág. 83, da ed. de 1988, da Livraria Almedina.]
. Mas se a incorporação já está prevista no negó-cio, então a cláusula estipulada deve ser considerada juridicamente impossível na sua origem, pelo que é nula (artº 280º, nº 1, do C.C.) [O referido Assento do S.T.J., de 31-1-1996, pub. no B.M.J. nº 453, pág. 46, MENEZES CORDEIRO, na anotação que fez a este Assento, na R.O.A., Ano 56 (1996), vol. I, pág. 329, e o Acórdão da Relação de Lisboa, de 7-12-1993, na C.J., Ano XVIII, tomo 5, pág. 137, relatado por AFONSO DE MELO, preferem a sanção da ineficácia por concurso de normas prevalecentes.].
Deixámos acima um ponto de interrogação sobre esta conclusão, relati-vamente às partes integrantes, sinalizando, assim, as dúvidas expostas por alguns dos autores citados [HENRIQUE MESQUITA, em “Direitos reais”, sumários das lições ao curso de 1966-1967, pág. 14, da ed. pol. s.d., e ÁLVARO MOREIRA e CARLOS FRAGA, em “Direitos reais. Segundo as prelecções do Prof. Dr. C.A. da Mota Pinto ao 4º ano jurídico de 1970-71”, pág. 88, da ed. s.d., da Livraria Almedina.
CARVALHO FERNANDES, em “Lições de direitos reais”, pág. 49, da ed. de 1996, da Quid juris, não faz qualquer distinção entre partes componentes e integrantes para este efeito, e PENHA GONÇALVES, em “Curso de direitos reais”, pág. 82-83, da 2ª ed., da Universidade Lusíada, resolve aquelas dúvidas considerando inadmissível a cláusula de reserva de propriedade relativamente às partes componentes e integrantes desde que estas sejam consideradas não separáveis.], quanto à existência da detectada incompatibilidade de direitos de propriedade, no que respeita às partes integrantes da coisa.
As partes componentes ou constitutivas de um imóvel são aquelas que o formam e sem as quais ele não existia ou era imperfeito. As partes integrantes de um imóvel são coisas móveis que, embora ligadas materialmente àquele, com carácter de permanência, dele podem ser destacadas, sem que este deixe de subsistir ou fique incompleto (artº 204º, nº 3, do C.C.). Note-se, contudo, que podem existir partes que sendo fisicamente qualificáveis como integrantes, mas que, por razões de ordem pública, a sua existência é imposta por lei ou regulamento, devem ser juridi-camente consideradas como partes componentes [Vide, neste sentido, CARVALHO FERNANDES, em “Teoria geral da relação jurídica”, vol. I, pág. 689, da 3ª ed., da Universidade Católica.].
Podemos dizer que o artº 210º, do C.C., nos indica, numa interpretação “a contrario”, a solução para a dúvida enunciada.
Se a lei distingue entre partes integrantes e acessórias duma coisa e ape-nas relativamente a estas últimas estabelece a possibilidade de terem uma autono-mia jurídica (artº 210º, nº 2, do C.C.), é possível concluir que essa autonomia já não existe relativamente às partes integrantes, as quais não comportam um direito de propriedade independente da propriedade da totalidade da coisa [Vide, sustentando esta posição, MENEZES CORDEIRO, em “Tratado de direito civil português”, vol. I, tomo II, pág. 133-137, da ed. de 2000, da Livraria Almedina, e na anotação ao Assento do S.T.J., de 31-1-1996, na R.O.A., Ano 56 (1996), vol. I, pág. 321-323, e os seguintes Acórdãos:
? da Relação de Lisboa, de 12-5-1988, na C.J., Ano XIII, tomo 3, pág. 141, relatado por CARVALHO PINHEIRO.
? da Relação de Lisboa, de 20-5-1993, na C..J., Ano XVIII, tomo 3, pág. 107, relatado por EDUARDO BAPTISTA.
? do S.T.J., de 6-7-1993, na C.J. (Ac. do S.T.J.), Ano 1, tomo 2, pág. 181, relatado por MACHADO SOARES.
? da Relação de Lisboa, de 7-12-1993, na C.J., Ano XVIII, tomo 5, pág. 137, relatado por AFONSO DE MELO.
? da Relação de Lisboa, de 17-3-1994, na C.J., Ano XIX, tomo 2, pág. 86, relatado por PIRES SALPICO.]
.
Mas, talvez, a solução também possa ser encontrada na distinção entre partes integrantes essenciais e não essenciais à fruição da coisa [Vide, neste sentido, o Acórdão da Relação de Lisboa, de 7-12-1993, na C.J., Ano XVIII, tomo 5, pág. 137, relatado por AFONSO DE MELO.].
Contudo, se a resposta a esta dúvida não é líquida, também não é deci-siva para a solução da questão que se suscita nos presentes autos.
Na verdade, a coisa sobre a qual incidiu a cláusula de reserva de proprie-dade, é uma Estação de Tratamento de Águas Primárias.
Provou-se que a Autora entregou essa Estação à Ré e que a mesma é composta pelo conjunto de vários equipamentos, como mecanismos, condutas de água e electricidade, tanques, bombas, quadros eléctricos e mecanismos de con-trolo, montados numa estrutura metálica de suporte com 8 metros de comprimento por 2,56 metros de largura, que se encontra colocada numa área do prédio onde se situa a fábrica da Ré.
Esta Estação de tratamento não chegou a funcionar, não tendo sido ultimada a fase do arranque, e todos os elementos que compõem tais equipamentos podem ser levantados da fábrica da Ré, sem deterioração dos mesmos e sem dete-rioração da fábrica, pois são todos constituídos por peças desmontáveis que con-servarão sempre a sua utilidade e valor depois do seu levantamento e transporte para outro local.
Não se provou, pois, que tivesse chegado a existir uma qualquer ligação material da Estação de Tratamento ao prédio da Ré, uma vez que dos factos prova-dos não resulta que a mesma esteja implantada no solo do prédio, ou que tenha passado a integrar o sistema de canalização de águas da fábrica da Ré.
Não estando demonstrada essa ligação material ao prédio da Ré, não pode a Estação em causa ser considerada parte integrante deste, mas apenas coisa acessória, nos termos dos artº 204º, nº 3 e 210º, nº 1, do C.C..
Sendo coisa acessória, nada impede que, no contrato em que se acordou na sua alienação, se estipule uma cláusula de reserva de propriedade, uma vez que é possível a autonomização desses bens móveis, relativamente ao direito que incide sobre a coisa principal, conforme se lê no artº 210º, nº 2, do C.C..
Revelando-se válida e eficaz a cláusula de reserva de propriedade a favor da Autora, estipulada no contrato de compra e venda que esta celebrou com a Ré, improcedem as razões aduzidas por esta nas suas alegações de recurso, devendo, assim, manter-se a sentença recorrida.

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DECISÃO
Pelo exposto julga-se improcedente o recurso interposto pela Ré e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida.

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Custas do recurso pela Ré.

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Coimbra, 7 de Fevereiro de 2006