Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1632/15.8T8ACB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARLINDO OLIVEIRA
Descritores: CADUCIDADE DO ARRENDAMENTO
PERDA DA COISA LOCADA
INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 11/07/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA, CALDAS DA RAINHA, JUÍZO LOCAL CÍVEL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 1051.º, N.º 1, AL. E), DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: 1. Tendo o telhado do prédio em que se situava o locado ruído por falta de obras por parte do senhorio, o contrato de arrendamento em causa caducou nessa mesma data, por perda da coisa locada.
2. Uma vez que no caso em apreço, a ruína do telhado se ficou a dever ao facto de o senhorio não ter feito obras, sobre ele recai, a obrigação de indemnizar a arrendatária pelos prejuízos por esta sofridos, decorrentes da caducidade do contrato.

3. Esta obrigação de indemnização mantém-se apesar do contrato de arrendamento ser anterior à data em que o senhorio adquiriu o prédio locado, dado que o adquirente, sucede nos direitos e obrigações do locador.

Decisão Texto Integral:

            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

           

A... , LDA., com sede na Rua (...) , intentou a presente acção declarativa sob a forma comum contra Escola de Condução B... , LDA., pessoa colectiva n.º (...) , com sede na Rua (...) .

Pede a condenação da ré no pagamento à autora das seguintes quantias:

- € 6.021,02, relativa a rendas;

- € 3.010,51, a título de indemnização pela mora.

- € 3.125,00 acrescida de IVA à taxa legal em vigor, para reparação da instalação eléctrica;

- € 289,00, pela mudança da fechadura do locado.

Para tanto, alega, em síntese que é proprietária do prédio que identifica no artigo 1.º da petição inicial, o qual lhe adveio por compra e venda outorgada em Fevereiro de 2014 no processo de insolvência da anterior proprietária “ C... , Lda.”; ao tempo da aquisição pela autora, a fracção “U” do prédio em referência encontrava-se dada de arrendamento à ré com a renda mensal de 215,04€, a pagar até ao dia 8 de cada mês; a ré não pagou as rendas que se venceram desde Agosto de 2012 até Fevereiro de 2014, nem as que se foram vencendo até à data em que veio a desocupar a fracção; em 25.08.2014, a autora foi notificada pela Câmara Municipal de (...) para no prazo de 5 dias interditar o acesso às salas do primeiro andar e no prazo de 30 dias ordenar o despejo do prédio, atenta a degradação do imóvel e falta de segurança, podendo ocorrer desabamento dos tectos/pavimentos; no dia 12.08.2014, a autora enviou à ré uma carta através da qual denunciou o contrato de arrendamento com efeitos no prazo de 30 dias após a recepção da mesma; a ré, por carta de 25.08.2014, opôs-se à denúncia do contrato de arrendamento; a ré desocupou o locado no dia 24.11.2014 mas não entregou as chaves do mesmo; em consequência de tal facto a autora teve de custear a despesa de 289,00€ para aceder ao locado, o que apenas conseguiu fazer no dia 04.12.2014; a ré deixou o locado com todos os cabos eléctricos e de telecomunicações, calhas de suporte da cablagem eléctrica, tomadas, interruptores e aparelhos de iluminação arrancados, no valor total de 3.125,00€.

A ré apresentou contestação, nos termos da qual admite a existência do contrato de arrendamento, o estado de degradação do locado e as diligências realizadas pela Câmara Municipal de (...) descritas pela autora. Alega, porém, que o estado de degradação do locado deveu-se à falta de manutenção pelo senhorio e que originou graves infiltrações de águas pluviais; que tais infiltrações impossibilitavam a utilização da sala afecta à formação prática de mecânica; que a ré deu conhecimento de tais factos ao senhorio em Agosto de 2011, tendo nessa data solicitado a realização de obras com caracter de urgência; que, nada tendo sido feito pelo senhorio, no dia 13.11.2011 ocorreu um curto-circuito no locado que deu causa a prejuízos materiais à ré; que, em consequência de tal facto, a ré requereu junto da Câmara Municipal de (...) uma vistoria urgente, a qual veio a ter lugar no dia 04.01.2012; que, não obstante, nem o senhorio, nem a Câmara deram início às obras; que, porquanto a ré se encontrava impossibilitada de utilizar integralmente o locado e o senhorio não realizava as obras necessárias, a partir de Agosto de 2012 deixou de pagar a renda, dando conhecimento das razões de tal omissão ao senhorio. Alega ainda que após a aquisição do locado pela aqui autora e na sequência de negociações iniciadas entre autora e ré em Junho de 2014 com vista à realização de obras e pagamento das rendas vencidas, a ré pagou àquela a renda respeitante ao mês de Julho de 2014; que, porém, em 24.07.2014, o telhado do prédio ruiu, prejudicando definitivamente a utilização do locado, e dando azo à ordem de despejo emitida pela Câmara Municipal de (...) em 25.07.2014. Invoca, pois, a ré a excepção de não cumprimento com referência à falta de pagamento das rendas vencidas desde Agosto de 2012, bem como o abuso de direito por parte da autora no pedido formulado nos autos. Mais invoca a ineficácia da denúncia do contrato, uma vez que a autora não cumpriu o disposto no art. 6.º n.º1 do DL 157/2006, tendo optado, de forma unilateral e abusiva, por denunciar o contrato e indemnizar a ré, sem que, porém, houvesse disponibilizado a indemnização no momento da entrega do locado, pugnando por “um verdadeiro caso de caducidade do contrato de arrendamento dos autos por perda da coisa locada”, concluindo que tendo o contrato caducado com a ruína do telhado do prédio em Julho de 2014, não é devido, nem o pagamento das rendas peticionadas com respeito aos meses de Julho a Setembro de 2014, nem a entrega das chaves do locado antes de decorrido o prazo de 6 meses previsto no art. 1053.º do CC.

A ré deduz ainda pedido reconvencional, alegando, por um lado que, após prévia autorização do anterior senhorio, realizou obras de pintura e substituição do pavimento do locado no valor de 312,10€, as quais qualifica como benfeitorias licitas e insusceptíveis de levantamento, pelo que tem direito à respectiva compensação; e, por outro lado, que o vício que determinou a cessação do contrato é imputável à actuação omissiva da autora, e que, em consequência da cessação do contrato de arrendamento, teve necessidade de mudar as suas instalações, pelo que, estando a actividade de escola de condução adstrita ao cumprimento de inúmeros requisitos legais, tal facto implicou diversos custos administrativos, bem como obras, despesas de publicidade e divulgação da nova localização e aumento da despesa com rendas (no valor total de 6.123,87€), bem como, que, em consequência da menor visibilidade da nova localização das novas instalações, sofreu uma redução de formandos equivalente a uma perda de 23.560,00€.

Como tal, pede a condenação da autora a pagar-lhe a quantia total de 29.995,97€.

A autora respondeu à contestação e à reconvenção, pugnando pela improcedência da excepção de não cumprimento, uma vez que a privação do gozo de uma única sala do locado não permitia à ré deixar de pagar a totalidade da renda, que nunca a autora se recusou a realizar as obras necessárias, tendo diligenciado para esse fim logo após a aquisição do prédio, e que existe manifesta desproporcionalidade entre o custo das obras a realizar no local, no valor de 105.165,00€ e o valor da renda mensal (257,74€); bem como pela improcedência do pedido reconvencional, porquanto de acordo com o clausulado do contrato de arrendamento, o arrendatário perde para o senhorio o direito a todas as benfeitorias realizadas no locado e que, ainda que assim não fosse, as benfeitorias alegadas pela ré não são nem necessárias nem úteis, impugnando ainda as despesas, custos e perda de lucros alegados pela ré em consequência da mudança de instalações.

Proferido despacho saneador a fls. 126-127vs, foi admitida a reconvenção, bem como foi definido o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, sem reclamações.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, finda a qual foi proferida a sentença de fl.s 157 a 179 v.º, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e, a final, se decidiu o seguinte:

“Pelo exposto,

A) Julgo parcialmente procedente por parcialmente provada a acção e, em consequência, condeno a ré a pagar à autora:

a. O valor de 2.060,32 € (dois mil e sessenta euros e trinta e dois cêntimos), correspondente às rendas vencidas entre Março e Junho de 2014, e entre Agosto e Novembro de 2014;

b. O valor de 1.030,16 € (mil e trinta euros e dezasseis cêntimos), correspondente à indemnização moratória, na proporção e 50% do valor das rendas devidas.

c. No mais, absolvo a ré do que contra si foi peticionado nestes autos.

B) Julgo parcialmente procedente por parcialmente provada a reconvenção e, em consequência, condeno a autora a pagar à ré:

a. O valor de 3.425,00€ (três mil, quatrocentos e vinte e cinco euros), correspondente à indemnização devida pelos danos emergentes.

b. No mais, absolvo a autora do que contra si foi peticionado nestes autos.

Mantenho o valor da causa fixado no despacho saneador.

Custas por ambas as partes, na proporção dos decaimentos.”.

Inconformadas com a mesma, interpuseram a autora A... , L.da e a ré B... , recursos, esses, admitidos como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo – (cf. despachos de fl.s 220 e 220 v.º e 221, respectivamente), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

Recurso da autora A... , L.da:

i. O presente recurso vem interposto da Sentença proferida que considerou parcialmente procedente a ação apresentada pela ora Recorrente e parcialmente procedente a reconvenção apresentada pela Recorrida, com a qual esta não se conforma, pelas razões de facto e de direito que, acima se indicaram e que ora concluem do seguinte modo;

ii. Com efeito, e salvo o devido respeito, considera a ora Recorrente que a Sentença ora impugnada perece reparos ou censura no que diz respeito à apreciação da prova e em especial à aplicação do Direito;

iii. A sentença, em nosso modesto entendimento encontra-se ferida de nulidade decorrente da contradição entre os factos dados como provados e entre estes e a decisão nos termos do disposto na al. c) do n.º 1 do artigo 615º do CPC,

iv. Desde logo, a sentença entendeu que o contrato de arrendamento dos presentes autos cessou por denuncia do contrato feita pela A., por carta enviada à R. no dia 12.08.2014;

v. Ora, andou mal o Tribunal ad quo, porquanto naquela data de 12.08.02014 já o contrato de arrendamento havia caducado por perda da coisa locada, na sequência da notificação camarária feita à A. e R. no dia 06.08.2014, e pela qual ficou a A. notificada para, em cumprimento do despacho do Sr. Vice Presidente de 25.07.2014, e, “(...) no prazo de 5 dias (...), interditar o acesso às salas do 1º andar que poderão pôr em perigo pessoas e bens, e no prazo de 30 dias ordenar o despejo de quem possa estar a ocupar o edifício sito na Rua (...) -“, conforme documento de fls. 20-23”- ponto 20 dos factos provados.

vi. Na qual se juntou cópia do Auto de Vistoria, e do qual consta nomeadamente que o locado apresentava um “avançado estado de degradação” o que constitui “motivo de preocupação quanto à segurança do edifico porque pode ocorrer desabamentos de tactos/pavimentos, colocando em perigo pessoas e bens, designadamente as que laboram no piso da B... ”- ponto 22 n. 3 dos factos provados;

vii. E no qual se conclui que: (...) atendendo à degradação e ao estado devoluto de alguns pisos, os mesmos não reúnem condições para se desenvolverem as funções que lhe eram destinadas – ponto 22 n. 5 dos factos provados

viii. Pelo que a carta enviada à R. apenas teve por objetivo a saída imediata do locado, de forma a que a A. pudesse interditar o locado em cumprimento da notificação camarária;

ix. Com efeito, a denúncia do arrendamento foi efetuada pela Câmara Municipal das (...) no âmbito do disposto nos art.º 89º, n.º 2 e 4, 91º e 92º do DL 555/99 de 16 de dezembro com as alterações dos DL 26/2010 de 30/03 e 266-C/2012 de 31/12;

x. Ora, os elementos de facto conduzem à conclusão de que o imóvel já não podia ser gozado ou utilizado para os fins a que se destina;

xi. Pelo que à luz de uma concepção jurídico normativa haverá perda do local quando, objetivamente, ele já tenha perdido as aptidões necessárias para ser usado;

xii. Tendo ocorrido a perda da coisa nos termos da al. e) do art.º 1051º do CC;

xiii. A perda da coisa faz extinguir a obrigação quando a prestação se torne impossível por acto não imputável ao devedor (art.º 790º, nº 1 CC);

xiv. Parece assim haver nulidade da sentença neste tema ou ao menos, fez uma errada interpretação dos art.s 89º, n.º 2.a 4, 91º e 92º do D.L. 555/99 de 16 de dezembro, com as alterações dos DL 26/2010 de 30/03 e 266-C/2012 de 31/12 , do art. 1º, n.1 al. b ) e artigo 7º, n. 2, al. a) do D.L 157/2006 e 1051º al. e), 790º, n. 1 e 1045º 1, e 2 do Código Civil;

xv. Chegados aqui, importava saber se a A. era responsável pela indemnização à R. pelos danos sofridos;

xvi. Ou seja, impunha-se apurar se a A. cumpriu o contrato, nomeadamente quanto ao seu dever de manter o gozo da coisa locada para o fim a que se destina, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 1031º, al. b), 1074º e 1111º, nº 2 do Código Civil, para se aferir, de seguida, da obrigação de indemnização;

xvii. Ora, conforme resulta dos factos provados nos pontos 8 a 15, todos os factos respeitantes à obrigação de manutenção e conservação do locado decorreram antes da data em que a A. adquiriu o imóvel, o que apenas sucedeu no dia 14.02.2014;

xviii. Pelo que a A. nos termos do disposto no art.º 1057º do CC, a A. apenas poderia ser responsabilizada após a aquisição do edifico;

xix. Ora, quanto a este aspeto, apurou-se que logo que a A. conseguiu identificar a R., enquanto arrendatária, entrou em contacto com a mesma, por carta de 05.05.2014, a qual, na sequência do contacto com esta se apercebeu de que o edifício carecia de obras;

xx. Ato contínuo, em junho de 2014, a A. fez deslocar ao imóvel os seus responsáveis a fim de avaliar a situação do imóvel, com vista à realização das obras a que nunca se recusou;

xxi. Todavia, antes mesmo de a A. poder fazer o levantamento das obras e respetivo custo, o telhado do prédio ruiu em 24.07.2014;

xxii. E nessa sequencia no dia 25.07.2014, foi feita uma vistoria ao prédio e por ofício de 06-08-2014, a Câmara Municipal de (...) notificou a A. para interditar o acesso às salas do 1º andar que poderão por em perigo pessoas e bens e ordenar o despejo no prazo de 30 dias.

xxiii. Que no entanto, só pode proceder às diligências necessárias para a realização das obras, após ter acesso ao locado, o que só veio a suceder em 04.12.2014- ponto 30 dos factos provados;

xxiv. Pelo a A. efetuou todas as obras de que o prédio necessitava e era exigível de acordo com as leis vigentes

xxv. Sendo que o avançado estado de degradação do prédio decorreu dos 56 anos que o prédio tinha sido dado de arrendamento sem que tenha sido sujeito a qualquer intervenção, situação da qual a A. não poderá ser da responsabilizada;

xxvi. Pelo que, não sendo da responsabilidade da A. o vício que determinou a cessação do contrato, deve alterar-se a decisão recorrida e substituída por outra, porquanto a A. não pode ser responsabilizada pelos danos ocorridos e reclamados pela Ré, devendo ser absolvida da obrigação de pagamento da quantia de € 3.425,00 em que foi condenada.

xxvii. Pelo que a sentença é quanto este ponto igualmente nula por se encontra ferida do vício a a que alude a al. c) do n.º 1 do art. 615º do CPC ou quando muito terá havido errada aplicação do direito aos factos provados em violação do disposto nos artigos 1031º, al. b), 1074º e 1111º, nº 2 do Código Civil devendo antes aplicar-se a al. e) do artigo 1051º e 790º, n. 1, 798º, 799º ,562º, 563º, 566º, n. 2 do Código Civil.

xxviii. Por outro lado, ainda se entende que, ainda que de facto se verificasse a obrigação de realização das obras, a verdade é que existia uma enorme desproporção entre o valor das rendas e o custo das obras;

xxix. As obras necessárias à reconstrução do edifício ascenderam a € 105.165,00;

xxx. Além disso a A. ainda teve de despender a quantia de € 3125,00 mais IVA para repor a instalação elétrica do locado,

xxxi. Ora, o facto de se tratar de prédio dado de arrendamento, em 01.09.1958, e por isso há mais de 56 anos; no qual nunca foram realizadas obras de manutenção e conservação, que já não dispunha de condições para nele se desenvolverem as funções que lhe eram destinadas, que as obras de que necessitava respeitavam à cobertura do prédio, e ao avançado estado de degradação do 1º e 2º andares, podendo ocorrer desabamentos de tectos e pavimentos, colocando em perigo pessoas e bens; e que as obras nele realizadas tiveram um custo de € 105.165,00, com IVA incluído, acrescido de 3.125,00 mais IVA e finalmente que a R. pagava uma renda de 257,54, não nos deixa grande dúvida de que as obras tinham um custo avultado;

xxxii. E que em face da renda paga pela R., necessitaria de pelo menos 12 anos para recuperar o valor das obras, e apenas, caso não tivesse de pagar quaisquer impostos, água, luz, e juros de empréstimos bancários;

xxxiii. Sendo que não se pode esquecer que a A. havia gasta na aquisição do prédio a quantia de € 250.000,00, ignorando que teria de gastar aquele montante apenas alguns meses após a compra,

xxxiv. Pelo que a pretensão da R. no que respeita á exigência da realização de tais obras configura uma situação e exercício abusivo do direito, nos termos do artigo 334º do C. Civil

xxxv. Pelo que, errou o tribunal ad quo, quanto à solução jurídica que propugnou uma vez que se entende que fez uma desadequada subsunção dos factos ao direito e errada interpretação dos artigos 1031º, al. b), 1074º, n.º 2 e 111º, n.º 2 e 334º do Código Civil.

xxxvi. Entende-se ainda que o tribunal Ad quo errou ainda ao entender dever presumir-se que, ao abrigo do disposto no nº 2 do art. 1043º do CC, a R. entregou o locado à A. no estado em que o recebeu;

xxxvii. Uma vez dos factos provados resulta que Aquando da entrega do locado à autora a ré arrancou cabos elétricos e de telecomunicações, calhas de suporte da cablagem elétrica, tomadas, interruptores, comutadores e alguns aparelhos de iluminação.- ponto 31 dos factos provados

xxxviii. Por carta datada de 07.01.2014, a autora comunicou à ré para proceder à reparação do locado no prazo de 15 dias e que, caso não o fizesse, iriam ordenar a sua reparação por terceiros - ponto 32 dos factos provados

xxxix. Respondeu a ré por carta datada de 27-01-2014 que a instalação elétrica do locado encontrava-se já em mau estado em virtude de inúmeros e sucessivos curto-circuitos – ponto 33 dos factos provados

xl. Além do mais consta das fotos 36 a 39 dos autos fotos que são demonstrativas do estado em que a R. deixou o locado.

xli. Não sendo pois de presumir, que a entrega foi efetuada no estado em que recebeu o locado, pois contraria toda a prova produzida

xlii. Pelo que se conclui, que quanto a este aspeto o tribunal decidiu mal, e que a decisão, nesta parte se encontra ferida de nulidade com o vício constante da al. c) do n.º 1 do art.º 615º CPC

xliii. Tendo feito errada aplicação do direito aos factos e errada interpretação do disposto no artigo 1043º, nº 2 e 799º do C.Civil.

xliv. Devendo por isso proceder o presente recurso e substituir-se a sentença por outra que condene a R. ao pagamento das despesas em que a A. incorreu pela substituição da instalação elétrica, no montante de € 3.125,00 acrescido de IVA.

xlv. Finalmente entende-se que a matéria de facto não foi corretamente apreciada, uma vez que existem factos determinantes que foram considerados provados ao arrepio da prova produzida e outros que não foram considerados provados que o deveriam ter sido, a saber:

a. Que tendo ficado largamente provado que a A. fez as obras de acordo com a notificação camarária do ponto 16 dos factos provados deve ficar a constar que: A senhoria “ C... , Ld.ª”, não procedeu a quaisquer obras no locado.

b. Que uma vez que a A. notificou a R. por carta de 12.08.2014, na sequência, não só, após a notificação feita pela Câmara Municipal de (...) de que deveria interditar o acesso ao 1º andar e ordenar o despejo no prazo máximo de 30 dias, mas também após conhecimento de que em 08.08.2014 a R. tinha solicitado junto daquela edilidade a prorrogação desse prazo.

c. Pelo que do ponto 23 dos factos provados deve passar a constar que: “Na sequência da notificação referida em 20), 21), e do facto referido em 26) a autora no dia 12/08/2014 enviou carta registada com aviso de recepção à ré comunicando a: “(...) denuncia do supra identificado contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 07/08/2014. (...) juntando, para os devidos efeitos, notificação que atesta a necessidade de realização de obras de remodelação ou restauro profundos.(...) Mais se informa que na data da entrega efetiva do imóvel, será descontado ao valor de rendas de agosto de 2012 a julho de 2013 (art.º. 6º al. a) do DL 157/2006 de 08 de agosto), a título de indemnização legal (...)” – conforme documento de fls. 24, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigo 12º da petição inicial).

d. Por fim e uma vez que as D... , e E... , conforme consta da motivação da sentença afirmaram nos respetivos depoimentos que o eletricista tinha cobrado mais € 3.000,00 pela instalação elétrica da fração alocada à R., e que quando as portas do locado foram abertas viu a instalação elétrica arrancada;

e. Que do ponto 31 dos factos provados consta que: “Aquando da entrega do locado à autora a ré arrancou cabos elétricos e de telecomunicações, calhas de suporte da cablagem elétrica, tomadas, interruptores, comutadores e alguns aparelhos de iluminação.”

f. Que das fotos juntas de fls. 36 a 39, prova o estado em que o locado foi deixado pela R., nomeadamente quanto á instalação elétrica, que teve de ser reparada e que esse arranjo teve de ser efetuado igualmente pela A. o que veio agravar o custo das obras do prédio.

g. Dos factos provados deveria ter ficado a constar que: “Pela instalação elétrica do locado, a A. pagou a quantia de € 3.125.00, acrescido de IVA”.

Nestes termos, e nos melhores de Direito, sempre com o douto suprimento de V.Exas., deverá ser revogada a sentença recorrida e substituir-se por outra nos termos sobreditos e

a) Condenar-se a R. a pagar à A. as rendas vencidas desde março de 2014 até novembro de 2014, sendo que as últimas elevadas ao dobro, no montante de € 2.832,94 e a indemnização pela mora, no valor de € 1.416.47;

b) Condenar-se a R. a pagar à A. a reparação da instalação elétrica do locado, no montante de € 3.125,00 acrescida de IVA à taxa legal em vigor;

c) Absolver-se a A. do do pedido reconvencional, no respeita ao pagamento dos prejuízos sofridos no montante em que foi condenada de € 3.425,00.

Por ser de inteira justiça!

Recurso da B... :

i) A ora Recorrente não se pode conformar com o teor da sentença proferida, designadamente, com o segmento decisório referente à respectiva condenação no pagamento das indicadas rendas e indemnização moratória, assim como com o segmento decisório referente ao pedido reconvencional deduzido, na parte em que absolveu a Autora do pagamento do ali peticionado quanto a benfeitorias, parte dos danos emergentes e lucros cessantes invocados, pois que não fez o Tribunal a quo uma correcta interpretação do Direito nos autos e em face do acervo factual provado, a sua decisão não se mostra de acordo com o sentido que a prova produzida nos autos lhe impunha.

ii) Com efeito, foram pela Ré, ora Recorrente, prosseguidos dois caminhos de raciocínio jurídico tendentes à prolação de decisão diversa e que, sucintamente, se referem à excepção de não cumprimento e à subsequente caducidade do contrato de arrendamento por perda do locado, restringindo-se a presente sindicância, neste tocante, apenas ao que foi decidido relativamente às sobreditas rendas vencidas entre Março de 2014 e a data da desocupação do locado.

iii) É notório, em face da própria factualidade dada como provada pelo Tribunal a quo e que melhor resulta da sentença sindicada, que os vícios, assim como a comprovada necessidade de intervenção no locado, não se restringiram a uma das divisões ocupadas pela Ré, nem se limitaram a provocar um mero impedimento parcial do direito de utilização e fruição, indo mais além do que a simples impossibilidade de utilização da divisão afecta à formação prática de mecânica, já que o locado – no seu todo, assim como o prédio onde se insere – apresentava àquela data necessidade urgente de intervenção, necessidade esta que não foi confinada pela Câmara Municipal das (...) – nem pela prova produzida nos autos, tal como constante da sentença sindicada – à dita divisão alocada à formação prática de mecânica, mas a todo o locado.

iv) Por outro lado, encontra-se provado nos autos que as partes encetaram negociações – negociado o pagamento das rendas em dívida contra a realização de obras –, o que, por si só, é demonstrativo de que a Autora, reconhecendo o direito que à Ré assistia de não pagar as rendas vencidas e vincendas enquanto não fossem levadas a cabo as obras necessárias, institui, desta forma, um novo sinalagma, diverso daquele que resultava do contrato de arrendamento, ou seja, que o pagamento das rendas dependeria da sua acção de conservação.

v) Donde, à arguida excepção de não cumprimento, nos moldes previstos no art.º 428.º n.º 1 do Código Civil, haveria que reconhecer eficácia total relativamente a todo o montante da renda e não apenas à proporção calculada pelo Tribunal a quo, o que, não sucedendo, produziu uma errada apreciação da prova produzida, e, consequentemente, uma errada interpretação e aplicação do Direito em função da prova produzida.

vi) Neste seguimento, mal andou o Tribunal a quo ao decidir pela condenação da Ré no pagamento do montante diferencial de rendas no valor de €.2.060,32 e da consequente indemnização moratória no valor de €.1.030,16, pois que, dada a comprovada dimensão dos vícios de que o locado padecia e a consequente impossibilidade de a Ré ali fazer prosseguir em segurança e em condições mínimas a sua actividade, não deu a Autora cumprimento à sua prestação positiva de manutenção do gozo da coisa, determinando para a Ré o direito de suspender o pagamento de toda a renda e não só de parte dela, assim se rogando seja decidido, com todas as devidas e legais consequências.

vii) Doutro passo, não obstante a específica factualidade que o Tribunal a quo logrou julgar como provada, o certo, porém, é que não entendeu existir no caso vertente uma situação de impedimento total de utilização do locado e, por conseguinte, da ocorrência de caducidade para efeitos de aplicação da Lei, sustentando a sua decisão na circunstância de que “a intervenção não impunha a demolição do edifício mas apenas a realização de obras de remodelação ou restauro profundo, cujo regime vem regulado no DL 157/2006, de 08.08”, pelo que julgou não estar verificada, assim, a caducidade do contrato de arrendamento dos autos.

viii) Perfilhando o entendimento do Supremo Tribunal de Justiça constante do acórdão proferido em 02/07/2015 no âmbito do processo n.º 1700/12.8TVLSB.L1.S1, disponível in www.dgsi.pt, “o contrato de arrendamento caduca com a perda da coisa locada nos termos do disposto no art.º 1051.º al. e) do Código Civil, desde que essa perda seja completa e irreversível e impossibilite, por razões de segurança de pessoas e bens, que os locatários continuem no locado sobre o qual incida o arrendamento, sendo que há perda absoluta e irreversível se a autoridade camarária, após vistoria na sequência de derrocada parcial do imóvel, impõe o despejo administrativo.” E nada refere o reproduzido aresto quanto à futura e eventual possibilidade de regresso ao locado, tampouco diferencia, para efeitos de determinação da perda absoluta e irreversível, os casos de necessidade de demolição e os casos de simples remodelação ou restauro profundo, bastando-se com a mera circunstância de os inquilinos não poderem continuar no locado.

ix) Assim, o entendimento legal e adequado à prova efectuada nos autos, sempre seria o de declarar no caso vertente a ocorrência de caducidade no preciso momento em que a Ré foi interpelada para imediatamente desocupar o locado por razões de segurança de pessoas e bens, o que se requer seja declarado por dever de Justiça e sem necessidade de ulteriores argumentos, para todos os devidos e legais efeitos.

x) Ademais, o Tribunal a quo, alicerçado num vício de interpretação no que concerne à ocorrência de caducidade nos presentes autos – que não admitiu –, condenou a Ré no pagamento das rendas vencidas entre aquele momento e a desocupação do locado, acrescido da correspondente indemnização moratória, como se o contrato de arrendamento subsistisse após aquela data e como se de mora na entrega do locado se tratasse.

xi) É entendimento perfilhado pelo Supremo Tribunal de Justiça no acórdão proferido em 07/07/2009 no âmbito do processo n.º 360/09.8YFLSB, disponível in www.dgsi.pt, que “Este caso de caducidade não configura, no rigor dos termos, um caso de caducidade em sentido estrito, mas antes um caso de extinção da obrigação assumida pelo locador de proporcionar ao locatário o gozo da coisa, por impossibilidade superveniente quanto ao objecto do litígio. (…) É que se o contrato finda e a coisa locada continua a existir, compreende-se bem o regime sancionatório do artigo 1045.º. Não assim se o contrato finda pela singela razão de que a coisa, objecto do contrato, se perdeu. Ali, extinta a relação contratual, justifica-se a aplicação de tal regime em homenagem ao equilíbrio prestacional que a norteou; aqui, o contrato findou, é certo, mas não há nada a liquidar, já que a coisa se perdeu e, portanto, deixou de haver qualquer possibilidade de gozo (…) Daí que o artigo 1053.º do Código Civil se deva interpretar de modo hábil, excluindo da sua previsão, o caso de o arrendamento ter caducado por perda da coisa, pois que não faria qualquer sentido a imposição de entrega da coisa que…deixou de existir.”, concluindo que “o preceituado no artigo 1045.º do Código Civil é inaplicável aos casos de caducidade do arrendamento por perda da coisa locada”.

xii) Assim, a eventual compensação da Autora sempre dependeria da prova que esta fizesse dos requisitos de outro mecanismo que não alegou, designadamente, do instituto do enriquecimento sem causa, mormente, da prova da ocorrência do enriquecimento que a Ré obteve com a mora na entrega do locado, não bastando, para cumprir aquele ónus probatório, provar que a Ré, simplesmente, não entregou as chaves.

xiii) Assim, com base em todos os argumentos expendidos, deverá ser ordenada a revogação da sentença impugnada relativamente ao segmento decisório por via do qual condena a Ré no pagamento à Autora da quantia de €.2.060,32 a título de rendas e de €.1.030,61 a título de indemnização moratória, substituindo-se a mesma por decisão que absolva a Ré do mencionado pedido por falta de prova do enriquecimento sem causa tido pela Ré durante aquele período, o que se requer com todas as devidas e legais consequências.

xiv) Ademais, para além de uma incorrecta aplicação do Direito ao caso dos autos, desconsiderou ainda o Tribunal a quo o real sentido e alcance da prova produzida, fazendo uma utilização errada da prova que tão devidamente entendeu, pois que tomando como credível e coerente que despesa de €.312,10 foi efectuada pela Ré em prol do locado e que telefonicamente obteve a sua sócia L... do senhorio autorização para uma intervenção escassos meses após o seu ingresso no capital social da Ré e, por conseguinte, no locado, não podia ficar com dúvidas quando àquela autorização.

xv) É que, houvesse outros trabalhos e despesas reclamados pela Ré nos autos e facilmente se compreenderia que o Tribunal a quo redobrasse o seu cuidado relativamente à prova feita, mas sendo esta a única despesa que a Ré invoca nos autos ter tido em prol do locado e que houve contacto com o senhorio com vista à sua autorização, não podia o Tribunal a quo exigir que tais obras fossem pela dita testemunha concretizadas/especificadas, tanto mais quando, confrontada que foi em julgamento com a respectiva factura, o confirmou, donde deve ser levada aos factos provados a seguinte factualidade:

1. A Ré realizou os trabalhos descritos em 44) após prévia autorização do senhorio (parte do art.º 143.º da contestação).

xvi) Caso fosse a sobredita factualidade dada como provada, em face da prova produzida e não contrariada nos autos, sempre teria o Tribunal a quo decidido em sentido diverso, qual fosse, o da licitude das obras levadas a cabo pela Ré, com o seu consequente direito à correspondente compensação por via da condenação da Autora no pagamento do valor peticionado pela Ré ao apontado título, o que se requer seja declarado para todos os devidos e legais efeitos.

xvii) Outrossim, em função da prova testemunhal produzida pela testemunha L... e reproduzida no presente articulado, deveria ter sido dado como provado o seguinte facto adicional: i) O locado dos autos encontrava-se edificado numa zona central das (...) , perto do mercado da localidade, onde todos os dias circulam centenas de residentes (artigo 166.º da contestação).

xviii) Da prova da referida factualidade, sempre resultaria, por consequência, uma reavaliação da prova que dos demais factos invocados no antecedente n.º 81 deste articulado foi feita, já que, constituindo a localização de um estabelecimento comercial facto absolutamente determinante ao seu sucesso e ao incremento do respectivo volume dos negócios e provando-se, como foi, a privilegiada localização que o locado dos autos tinha e mantendo-se, como também se requer, a falta de prova de que as actuais instalações beneficiam de idêntica característica, é evidente que a mudança de instalações foi facto determinante e insubstituível da verificada e também demonstrada quebra de afluência de público e, consequentemente, da quebra da receita proveniente para a Ré das cartas de condução que vende.

xix) Tal realidade foi aos autos trazida e demonstrada pela Ré, designadamente, pelo depoimento da testemunha L... , não de forma pouco segura ou credível – como tenta o Tribunal a quo justificar com base no interesse que têm aqueles na causa, o que é, manifestamente, de lamentar –, mas antes de forma absolutamente séria, segura e até emocionada, bastando, para o efeito, ouvir o julgamento para o compreender.

xx) Ademais, na esteira do entendimento vertido no acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça em 25/11/2009, no âmbito do processo n.º 397/03.0GEBNV.S1, disponível in www.dgsi.pt, os danos futuros “devem calcular-se segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade, de acordo com o que é normal e natural acontecer, com o que em cada caso concreto, poderá vir a acontecer, pressupondo que as coisas seguem o seu curso normal, estando-se perante cálculo feito de acordo com o id quod plerumque accidit; e se, mesmo assim, não puder apurar-se o seu valor exacto, o tribunal deve julgar, segundo a equidade”.

xxi) O dano futuro, neste seguimento, deve compreender a expectativa que o lesado tinha à data da vicissitude danosa, caso esta última não ocorresse e todas as demais condicionantes fosse de prever se mantivessem inalteradas.

xxii) Em face do exposto, a correcta aplicação do Direito ao caso dos autos, neste tocante, sempre determinaria ao Tribunal a quo decisão diversa da que proferiu, o que merece censura e a sua consequente revogação.

xxiii) Neste seguimento, impunha-se ao Tribunal a quo dar como provada a seguinte factualidade adicional:

i) No período decorrido entre 27/10/2013 e 26/04/2014 a Ré registou 194 inscrições de alunos para diversas categorias de cartas de condução (artigo 168.º da contestação);

ii) Das quais 178 inscrições respeitam a carta de condução da categoria B (artigo 169.º da contestação);

iii) Entre 27/10/2014 e 15/09/2015 o número de inscrições para a sobredita categoria foi de 116 (artigo 170.º da contestação);

iv) A ré cobra o preço de 380,00€ para a formação de categoria B (artigo 172.º da contestação);

v) Caso se mantivesse a dita escola de condução no locado dos autos, era expectável que o número de inscrições se aproximasse, mantendo-se a tendência, do número de 178 e não das verificadas 116 inscrições naquela categoria (artigo 173.º da contestação).

xxiv) Em face do todo o exposto, impõe-se arredar da Ordem Jurídica uma sentença como a dos autos, que faz tábua rasa dos mais elementares princípios de Direito, fazendo uma errada aplicação da Lei e do Direito e, bem assim, que olvidou de considerar a prova que diante de si foi produzida, dando como não provados factos que o foram e dos mesmos, por conseguinte, excluindo relevante factualidade que foi provada, donde deve decidir-se pela revogação da sentença em apreço, declarando, consequentemente, a total improcedência do pedido da Autora e, a par, julgar a total procedência do pedido reconvencional deduzido pela Ré, ora Recorrente nos autos, com todas as devidas e legais consequências.

Nestes termos e nos melhores de Direito que V.Exas., Meritíssimos Juízes Desembargadores, doutamente suprirão, deverá, com os invocados fundamentos de facto e de Direito, merecer provimento o presente recurso de apelação, devendo ser revogada a ora impugnada sentença, proferindo-se, em sua substituição, decisão que julgue a acção totalmente improcedente e, doutro passo, o pedido reconvencional totalmente procedente por provado, com a consequente condenação da Autora na integralidade do pedido reconvencional, com todas as devidas e legais consequências, assim se assegurando, no caso dos autos, a concretização da JUSTIÇA!

Contra-alegando, a ré, no que respeita ao recurso interposto pela autora, defende que deve improceder o respectivo recurso, na sua vertente de facto; que o contrato de arrendamento caducou por perda do locado, pelo que não pode exigir o pagamento de rendas e existindo tal direito, ficam as mesmas condicionadas à efectiva utilização do locado, por parte da ré; que os danos que invoca são de responsabilidade da autora, por não terem sido efectuadas as obras de que o locado carecia; em função do que pugna pela improcedência do recurso da autora.

Colhidos os vistos legais, há que decidir.    

Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado no artigo 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do NCPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, são as seguintes as questões a decidir:

Recurso interposto pela autora A... :

A. Se a sentença recorrida padece da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. c), do CPC;

B. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da prova gravada, relativamente aos factos constantes dos itens 16.º, 23.º e 31.º, dos factos dados como provados, que devem passar a ser considerados como provados, nos termos referidos na conclusão 45.ª, bem como acrescentar-se aos factos provados, o que nesta se acha mencionado na al.. d), da ora referida conclusão;

C. Se ocorreu a caducidade do contrato de arrendamento sub judice, por perda da coisa locada, em 06 de Agosto de 2014 e consequências daí decorrentes, designadamente se a autora é responsável pela indemnização peticionada pela ré, referente aos danos por esta invocados;

D. Se a ré age em abuso do direito, dada a desproporção entre o valor das rendas por si pagas e o custo das obras a efectuar no prédio em que se situava o locado;

E. Se a autora tem direito a receber da ré a quantia de 3.125,00 €, acrescida de IVA, correspondente à substituição da instalação eléctrica existente no locado, que aquela destruiu.

Recurso interposto pela ré B... :

F. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da prova gravada, relativamente aos factos descritos nas conclusões 15.ª, 17.ª e 23.ª, que devem passar a ser considerados como provados;

G. Se a excepção de não cumprimento do contrato, invocada pela ré, deve ser reconhecida, relativamente a todo o montante da renda e não apenas na proporção em que o foi na sentença recorrida;

H. Se ocorreu a caducidade do contrato de arrendamento, por perda do locado, no momento em que a ré foi interpelada para, de imediato, desocupar o locado, por razões de segurança de pessoas e bens e;

I. Se o pedido reconvencional formulado pela ré deve proceder na totalidade.

 É a seguinte a matéria de facto dada por provada na decisão recorrida:

1. A autora é dona e legítima possuidora do prédio sito na Rua K... , inscrito na matriz predial urbana da União das Freguesias de (...) - K... sob o artigo K... , com o valor patrimonial total de 329.440,00€, e descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº K... /19920122 – cf. caderneta predial urbana de fls. 9-12 e escritura notarial de fls. 13-19, cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos (artigo 1.º da petição inicial).

2. O prédio veio à titularidade da autora por compra e venda realizada por escritura pública outorgada em 14 Fevereiro de 2014, pelo preço de 250.000,00€, tendo sido a vendedora “ C... , Lda.” representada naquele acto pelo administrador da Insolvência nomeado no respectivo processo de insolvência – cf. escritura notarial de fls. 13-19 (artigo 2.º da petição inicial).

3. À data da compra e venda referida em 2), o primeiro andar do prédio identificado em 1) encontrava-se dado de arrendamento à ré, desde 01.09.1958, para exercício da actividade de “escola de condução” (artigo 3.º da petição inicial e artigo 3.º da contestação).

4. Mediante a renda mensal de 257,54€ a pagar até ao dia 8 de cada mês (artigo 13.º da contestação e 53.º da réplica).

 

5. No âmbito do contrato de arrendamento referido em 3), acordaram as partes outorgantes que a renda mensal devia ser «paga nesta cidade em casa do senhorio ou de quem o representar» [cf. o art. 5.º n.º2 al. a) do novo CPC].

*

6. A autora, após a aquisição do locado, contactou a ré em 05.05.2014, através da carta de fls. 76vs., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigo 49.º da contestação).

7. Por via da mencionada comunicação, pretendia a Autora cobrar da Ré o montante de €5.412,54 a título de rendas vencidas e não pagas, acrescido de uma indemnização correspondente a 50% do valor em dívida (artigo 50.º da contestação).

*

8. Fruto da vetustez do edifício onde se localiza o locado dos autos e da sua falta de manutenção pelo senhorio, começou o mesmo a apresentar sérios indícios de degradação em 2011, sobretudo no respectivo telhado de cobertura, com consequente introdução de águas pluviais e surgimento de infiltrações graves na fracção autónoma dos autos, designadamente, no tecto da divisão afecta à formação prática de mecânica (artigo 5.º da contestação).

9. Nessa sequência, em meados de Agosto de 2011, a ré solicitou ao legal representante da senhoria “ C... , Lda.” a realização de obras no locado com carácter de urgência, na medida em que as sobreditas infiltrações sucediam-se e intensificavam-se (artigo 6.º da contestação).

10. Em resposta, a senhoria “ C... , Lda.” fez deslocar ao locado, em meados de Outubro de 2011, uma sua representante para ver o estado geral do edifício e, bem assim, o estado do locado (artigo 7.º da contestação).

11. Contudo, aquela representante informou à ré que, por falta de dinheiro, não seria ao senhorio possível proceder a quaisquer intervenções, muito menos às reparações de que o prédio já carecia, por serem as mesmas de natureza estrutural e, consequentemente, bastante onerosas, para além de que, decorrendo já o Inverno, não era aquele o momento indicado e adequado para a realização de quaisquer obras (artigo 8.º da contestação).

12. No dia 13 de Novembro de 2011, em consequência do facto descrito em 8), ocorreu um curto-circuito no locado (artigo 9.º da contestação).

13. Em consequência de tal facto e do manifesto agravamento do estado de degradação do imóvel, a Ré, em 15.11.2011, requereu à Câmara Municipal das (...) uma vistoria urgente para determinar a existência de eventuais más condições de salubridade e de segurança – conforme documento de fls. 73-73vs, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigo 10.º da contestação).

14. A vistoria foi agendada para o dia 04.01.2012, pelas 10:45h (artigo 11.º da contestação).

15. Na sequência da qual, a proprietária do prédio foi notificada em 28.02.2012 para proceder às obras de conservação necessárias a fim de manter a edificação, sita na Rua (...) , freguesia de (...) – X (...) , nas condições existentes à data da sua construção (artigo 31.º da contestação).

16. A senhoria não procedeu a quaisquer obras no locado (artigo 15.º da contestação).

17. Em consequência dos factos acima descritos, no dia 24.07.2014, o telhado do edifício ruiu (artigos 55.º e 59.º da contestação).

18. A ré requereu a comparência no local da protecção civil e da câmara municipal de (...) (artigo 56.º da contestação).

19. No dia 25.07.2014 teve lugar uma vistoria ao prédio para efeitos de verificação das condições de segurança e salubridade do imóvel nos termos do art. 90º do Regime Jurídica da Urbanização e Edificação (RJUE) aprovado pelo DL 555/99 de 16/12, com as alterações dos DL 26/2010 de 30/03 e 266-C/2012 de 31/12 (artigo 8.º da petição inicial).

20. Por ofício datado de 06.08.2014, a autora foi notificada pela Câmara Municipal de (...) , (proc. nº 03/2011/1572) «(...) para no prazo de 5 dias (...), interditar o acesso às salas do 1º andar que poderão pôr em perigo pessoas e bens, e no prazo de 30 dias ordenar o despejo de quem possa estar a ocupar o edifício sito na [Rua (...) ].» – conforme documento de fls. 20-23, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigos 7.º e 11.º da petição inicial).

21. Bem como do Auto de Vistoria efectuado na sequência da diligência referida em 21) (artigo 8.º da petição inicial).

22. Do qual consta, nomeadamente, que:

«1. A degradação do edifício que tem vindo a ser relatada nos autos de vistoria anteriores se agravou;

2. Não tendo sido possível aceder à cobertura, por falta de acesso a partir do último piso e por condições de segurança, é visível pelo avançado estado de degradação dos tectos dos 1.º e 2.º andares (Fotos 1 e 2, respectivamente) e da própria salubridade deste piso, que a cobertura, em telha com estrutura de madeira não cumpre a sua função de estanquicidade às águas pluviais, resultando no apodrecimento da estrutura e subsequentes da capacidade da resistência à mesma;

3. A situação referida constitui motivo de preocupação quanto à segurança do edifício porque pode ocorrer desabamentos dos tectos/pavimentos, colocando em perigo pessoas e bens, designadamente as que laboram no piso da B... ;

4. O edifício carece todo de intervenção urgente, sob pena de colocar em causa a solidez da estrutura, pelos danos causados por diversos factores (clima, humidade, localização, qualidade da construção, idade, …), razão pela qual deve existir uma manutenção/conservação regular;

5. Atendendo à degradação e o seu estado devoluto de alguns pisos, os mesmos não reúnem condições para se desenvolverem as funções que lhe eram destinadas.» (artigos 9.º e 10.º da petição inicial).

23. Na sequência da notificação referida em 20) e 21), a autora, no dia 12.08.2014, enviou carta registada com aviso de recepção à ré, comunicando a

«(…) denúncia do supra identificado contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 07/08/2014. (…) juntando, para os devidos efeitos, notificação que atesta a necessidade de realização de obras de remodelação ou restauro profundos. (…) Mais se informa que na data da entrega efectiva do imóvel, será descontado ao valor de rendas em dívida no montante relativo a um ano de renda, correspondente ao período de rendas de agosto de 2012 a julho de 2013 (art. 6º, al. a) DL 157/2066 de 8 de agosto), a título de indemnização legal. (…)» – conforme documento de fls. 24, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigo 12.º da petição inicial).

24. Que a ré recebeu no dia 13.08.2014 (artigo 13.º da petição inicial).

25. A ré respondeu à autora por carta datada de 25.08.2014, comunicando-lhe a sua «(…) oposição à referida denúncia.

Com efeito, e salvo melhor opinião não pode tal denúncia, nos termos em que foi efectuada, produzir os seus efeitos, uma vez que a mesma não foi feita nos termos da lei.

Termos em que, o contrato de arrendamento em questão não cessará na data indicada. (…)» – conforme documento de fls. 26, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigo 14.º da petição inicial e 80.º da contestação).

26. No dia 08.08.2014, a ré requereu junto da Câmara Municipal das (...) a prorrogação do prazo para desocupar o imóvel (artigo 15.º da petição inicial).

27. Pedido esse que foi indeferido pela Câmara Municipal, cuja decisão foi comunicada à ré por ofício datado de 26.09.2014, sendo a mesma notificada, «(…) para de imediato (24 horas), (…), interditar o acesso às salas do 1.º andar, do prédio sito na Rua (...) , que poderão pôr em perigo pessoas e bens.» – conforme documento de fls. 27, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigo 16.º da petição inicial).

28. E foi a autora notificada, por ofício datado do mesmo dia, de que a Câmara Municipal de (...) havia notificado a ré, B... , Ldª nos termos referidos em 27) – conforme documento de fls. 28, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigo 17.º da petição inicial).

29. A ré desocupou o locado em 24.11.2014 (artigo 18.º da petição inicial).

30. A autora teve acesso ao interior do locado no dia 04.12.2014 (parte do artigo 22.º da petição inicial).

*

31. Aquando da entrega do locado à autora a ré arrancou cabos eléctricos e de telecomunicações, calhas de suporte da cablagem eléctrica, tomadas, interruptores, comutadores e alguns dos aparelhos de iluminação (parte do artigo 25.º da petição inicial).

32. Por carta datada de 07.01.2014, a autora comunicou à ré para proceder à reparação do locado no prazo de 15 dias e que, caso não o fizesse, iriam ordenar a sua reparação por terceiros (artigo 27.º da petição inicial).

33. Respondeu a ré por carta datada de 27.01.2015 que a instalação eléctrica do locado encontrava-se já em mau estado em virtude de inúmeros e sucessivos curto-circuitos (artigo 132.º da contestação).

*

34. Em consequência dos factos descritos em 8) e 9), a divisão onde a ré ministrava aulas técnicas da categoria C, isto é, da carta de condução de veículos pesados, apresentava graves infiltrações, empolamento da tinta e humidades (artigo 17.º da contestação).

35. Razão pela qual a ré, a partir de Novembro de 2011, não pôde dar utilização à sobredita divisão (artigo 17.º da contestação).

36. Na qual se encontravam instalados motores e chassis de veículos automóveis para prossecução da componente prática da formação técnica de mecânica da categoria C, os quais, dado o seu peso e dimensão, não podiam ser dali removidos e transferidos para outra divisão (artigo 24.º da contestação).

37. Todas as divisões do locado encontravam-se pela Ré afectas a propósitos e finalidades específicas (artigo 23.º da contestação).

38. Todas as restantes divisões encontravam-se já afectas a diversas outras finalidades, sendo impossível, em termos logísticos, proceder a qualquer alteração da organização do espaço (artigo 25.º da contestação).

39. Pelo que que a ré deixou de dar aulas técnicas aos alunos de cartas de condução de pesados (categoria C) (artigo 27.º da contestação).

40. Em consequência dos factos descritos em 34) a 39), a ré deixou de pagar as rendas a partir de Agosto de 2012 (parte do artigo 18.º da contestação).

*

41. Após a recepção da carta referida em 6) e 7), ré e autora iniciaram negociações tendentes à resolução consensual do litígio no que concerne ao pagamento do invocado montante e da realização de obras no locado (artigo 51.º da contestação).

42. Em meados de Junho de 2014, a autora fez deslocar ao prédio os seus representantes com o propósito de avaliar o estado do locado (artigo 52.º da contestação).

43. Na sequência das negociações acima referidas, a Ré procedeu ao pagamento da renda respeitante ao mês de Julho de 2014 (artigo 54.º da contestação).

*

44. Em 27.05.2011 a Ré realizou diversos trabalhos de pintura e de substituição do pavimento do locado, com os quais despendeu a quantia total de 312,10€ (artigo 143.º da contestação).

*

45. Para alteração da localização das suas instalações, a ré despendeu a quantia de 33,00€ com a obtenção, em 04.09.2014, junto da Câmara Municipal das (...) , de uma planta de localização para comprovar a inexistência de outras escolas de condução a menos de 500 metros da nova localização (artigo 143.º da contestação).

46. Para efeitos de habilitação do novo espaço ao realojamento da escola de condução de acordo com as regras imposta pelo IMT, a Ré contratou os serviços técnicos de engenharia e arquitectura da empresa “O...., Lda.”, com o que despendeu em 30.09.2014 a quantia de 246,00€ (artigo 156.º da contestação).

47. Com a preparação do novo espaço despendeu ainda a Ré a quantia de 2.941,61€, a título de materiais de construção, mão-de-obra, equipamentos, fechaduras, entre outros (artigo 157.º da contestação).

48. Para efeitos de divulgação ao público da sobredita mudança de instalações, a Ré recorreu a serviços publicitários em 18.11.2014, com o que despendeu a quantia de 54,39€ (parte do artigo 158.º da contestação).

49. Para efeitos de vistoria das novas instalações pelo IMT, despendeu a Ré em 29.05.2015 a quantia de 150,00€ (artigo 159.º da contestação).

50. Para realojamento da escola de condução a Ré celebrou, em 18.09.2014, um contrato de arrendamento da fracção autónoma “I” do prédio urbano sito na Rua (...) , em (...) , com K...., cuja cópia se junta como documento n.º 37, no âmbito do qual foi fixada uma renda mensal no valor de 450,00€ entre 15 de Outubro de 2014 e 15 de Setembro de 2015 e no valor mensal de 500,00€ nos meses subsequentes – conforme documento de fls. 96-98, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigo 161.º da contestação).

*

51. As obras necessárias à reposição do edifício em bom estado de conservação foram orçamentadas no valor de 82.000,00€, acrescido de IVA (artigo 49.º da réplica).

52. Às quais acresce o custo de substituição das janelas, no valor de 4.305,00€ (artigo 51.º da réplica).

*

53. O prédio identificado em 1) é composto por três pisos: rés-do-chão para comércio; primeiro andar para habitação com 7 divisões; 2.º andar para habitação com 7 divisões e sótão com 3 divisões para arrecadações, pertencente ao 2.º andar e uma pequena casa de arrecadações – conforme certidão matricial de fls. 9-12.

Os Factos não provados:

a. Nas circunstâncias de tempo relatadas nos factos n.º8 e 9, as sobreditas infiltrações já impossibilitavam a utilização de algumas das divisões do locado (artigo 6.º da contestação).

b. Nas circunstâncias relatadas em 13) supra, o locado apresentava já sérios indícios de vir a ruir, colocando em perigo pessoas e bens (parte do artigo 10.º da contestação).

c. Em face da omissão descrita em 16) supra, em 13.08.2012, a ré voltou a insistir junto do Município de (...) pela tomada de medidas urgentes (artigo 16.º da contestação).

d. Sem qualquer sucesso (artigo 16.º da contestação).

e. A ruína do telhado do edifício no dia 24.07.2014 prejudicou definitivamente a utilização do locado (artigo 55.º da contestação).

*

f. A autora não entregou as chaves do locado (artigo 19.º da petição inicial).

g. Pelo que a autora contratou os serviços de um serralheiro para proceder à abertura das portas do locado e poder ter acesso ao mesmo (artigo 20.º da petição inicial).

h. A quem teve de pagar a quantia de € 235,00, acrescido de IVA à taxa legal, num total de € 289,00 (artigo 21.º da petição inicial).

i. A ré libertou definitivamente o locado em 27.10.2014 (artigo 102.º da contestação).

j. Contudo, permaneceram alguns equipamentos e mobiliários no locado, o que a autora aceitou, pois que combinou com a ré a entrega definitiva das chaves para o dia 02.12.2014, pelas 18 horas, à porta do locado (artigo 103.º da contestação).

k. Sucede, porém, que no invocado dia e hora, ninguém apareceu (artigo 104.º da contestação).

l. Perante tal circunstância, autora e ré acordaram o dia 04.12.2014, nas novas instalações da ré, para o aludido efeito (artigo 105.º da contestação).

m. No invocado dia, pelas 12 horas, a Autora mandatou o Sr. P..., da empresa “ G... ” para que ali comparecesse e recolhesse as chaves de acesso ao locado (artigos 106.º e 107.º da contestação).

n. O que este fez, tendo-lhe a ré entregado as chaves do locado (artigos 106.º e 109.º da contestação).

*

o. Nas circunstâncias descritas em 31), a ré arrancou todos os cabos eléctricos e demais materiais aí descritos.

p. Os materiais e equipamentos referidos em 31) têm o valor total de 3.125,00€ acrescido de IVA à taxa legal em vigor (artigo 26.º da petição inicial).

*

q. A ré deu conhecimento pessoal à senhoria do facto descrito em 40) supra (parte do artigo 18.º da contestação).

*

r. A ré realizou os trabalhos descritos em 44) após prévia autorização do senhorio (parte do artigo 143.º da contestação).

*

s. Para efeitos de divulgação ao público da sobredita mudança de instalações, para além da quantia referida em 48), a ré despendeu ainda as quantias de 153,50 e 43,39€ com serviços publicitários (parte do artigo 158.º da contestação)

t. A renda referida em 50) foi a mais baixa que a ré conseguiu para um espaço com uma dimensão aproximada da dimensão do locado dos autos (artigo 162.º da contestação).

u. O locado dos autos encontrava-se edificado numa zona central das (...) , perto do mercado da localidade, onde todos os dias circulam centenas de residentes (artigo 166.º da contestação).

v. A localização das novas instalações da ré dista das anteriores menos de 500m e é de igual modo numa zona central e de passagem de centenas de pessoas residentes (artigo 124.º da réplica).

w. E é local de passagem para as escolas da cidade, que se encontram a menos de 50m das novas instalações (artigo 125.º da réplica).

x. No período decorrido entre 27.10.2013 e 26.10.2014 a Ré registou 194 inscrições de alunos para diversas categorias de cartas de condução (artigo 168.º da contestação).

y. Das quais 178 inscrições respeitam a carta de condução da categoria B (artigo 169.º da contestação).

z. Entre 27/10/2014 e 15/09/2015 o número de inscrições para a sobredita categoria foi de 116 (artigo 170.º da contestação).

aa. A ré cobra o preço de 380,00€ para a formação de categoria B (artigo 172.º da contestação).

bb. Caso se mantivesse a dita escola de condução no locado dos autos, era expectável que o número de inscrições se aproximasse, mantendo-se a tendência, do número de 178 e não das verificadas 116 inscrições naquela categoria (artigo 173.º da contestação).

Recurso interposto pela autora A... :

A. Se a sentença recorrida padece da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. c), do CPC;

Relativamente a esta questão, refere a ora recorrente que a sentença recorrida padece da invocada nulidade porque na mesma se entendeu que o contrato cessou por denúncia, quando, no seu entender, o mesmo caducou por perda do locado, bem como que não deve ser responsabilizada pelos danos alegadamente sofridos pela ré, com o fundamento em que a degradação sofrida pelo prédio onde se situava o locado não é de sua responsabilidade, dado que o adquiriu apenas poucos meses antes da derrocada do telhado.

O artigo 615, n.º 1, al. c), sanciona com a nulidade a sentença, quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão.

Cf. A. Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, in Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, a pág. 669, a oposição entre a decisão e os respectivos fundamentos, respeita à contradição real entre os fundamentos e a decisão, em que a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue caminho oposto.

Salvo o devido respeito, não padece a sentença recorrida da nulidade com base na oposição entre os seus fundamentos e a decisão que nela foi proferida.

Isto porque na mesma se considerou que não ocorreu a caducidade do contrato de arrendamento, em função do que eram devidas as rendas correspondentes ao tempo de utilização do locado, bem como que a autora seria responsável pelos prejuízos sofridos pela ré, porque os mesmos só ocorreram devido ao facto de não terem sido feitas obras no prédio.

Ou seja, a decisão a que se chegou na sentença recorrida baseia-se na apreciação jurídica que mereceram os factos provados, deles extraindo a conclusão lógica, em consonância com a aplicação do direito, nesse enquadramento (adoptado), pelo que inexiste a invocada nulidade.

Outra questão é a de saber se estamos perante um caso de denúncia do contrato ou, ao invés, da sua caducidade, por perda da coisa locada. Mas isso, não configura a alegada nulidade, mas sim qual o enquadramento jurídico a dar aos factos provados.

Consequentemente, não padece a sentença recorrida da apontada nulidade.

Pelo que, nesta parte, o presente recurso tem de improceder.

Recursos interpostos por ambas as partes:

B. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da prova gravada, relativamente aos factos constantes dos itens 16.º, 23.º e 31.º, dos factos dados como provados, que devem passar a ser considerados como provados, nos termos referidos na conclusão 45.ª, bem como acrescentar-se aos factos provados, o que nesta se acha mencionado na al.. d), da ora referida conclusão;

F. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da prova gravada, relativamente aos factos descritos nas conclusões 15.ª, 17.ª e 23.ª, que devem passar a ser considerados como provados;

Alegam a autora, ora recorrente, que o Tribunal incorreu em erro de julgamento ao dar como provados e não provados, os factos ora referidos, devendo, na sua óptica, os mesmos serem dados como provados ou passar a considerarem-se provados, nos termos acima referidos, estribando-se, para tal nos depoimentos prestados pelas testemunhas D... e E... .

Por seu turno, a ré, pugna pela sobredita alteração da matéria de facto, estribando-se no depoimento prestado pela testemunha L... .

Posto isto, e em tese geral, convém, desde já, deixar algumas notas acerca da produção da prova e definir os contornos em que a mesma deve ser apreciada em 2.ª instância.

Toda e qualquer decisão judicial em matéria de facto, como operação de reconstituição de factos ou acontecimento delituoso imputado a uma pessoa ou entidade, esta através dos seus representantes, dependente está da prova que, em audiência pública, sob os princípios da investigação oficiosa (nos limites e termos em que esta é permitida ao julgador) e da verdade material, se processa e produz, bem como do juízo apreciativo que sobre a mesma recai por parte do julgador, nos moldes definidos nos artigos 653, n.º 2 e 655, n.º 1, CPC – as já supra mencionadas regras da experiência e o princípio da livre convicção.

Submetidas ao crivo do contraditório, as provas são pois elemento determinante da decisão de facto.

Ora, o valor da prova, isto é, a sua relevância enquanto elemento reconstituinte dos factos em apreço, depende fundamentalmente da sua credibilidade, ou seja, da sua idoneidade e autenticidade.

Por outro lado, certo é que o juízo de credibilidade da prova por declarações, depende essencialmente do carácter e probidade moral de quem as presta, sendo que tais atributos e qualidades, como regra, não são apreensíveis mediante o exame e análise das peças ou textos processuais onde as mesmas se encontram documentadas, mas sim através do contacto directo com as pessoas, razão pela qual o tribunal de recurso, salvo casos de excepção, deve adoptar o juízo valorativo formulado pelo tribunal recorrido.

Quanto à apreciação da prova, actividade que se processa segundo as regras da experiência comum e o princípio da livre convicção, certo é que em matéria de prova testemunhal (em sentido amplo) quer directa quer indirecta, tendo em vista a carga subjectiva inerente, a mesma não dispensa um tratamento a nível cognitivo por parte do julgador, mediante operações de cotejo com os restantes meios de prova, sendo que a mesma, tal como a prova indiciária de qualquer outra natureza, pode e deve ser objecto de formulação de deduções e induções, as quais partindo da inteligência, hão-de basear-se na correcção de raciocínio, mediante a utilização das regras de experiência e conhecimentos científicos, tudo se englobando na expressão legal “regras de experiência”.

Estando em discussão a matéria de facto nas duas instâncias, nada impede que o tribunal superior, fundado no mesmo princípio da livre apreciação da prova, conclua de forma diversa do tribunal recorrido, mas para o fazer terá de ter bases sólidas e objectivas.

Não se pode olvidar que existe uma incomensurável diferença entre a apreciação da prova em primeira instância e a efectuada em tribunal de recurso, ainda que com base nas transcrições dos depoimentos prestados, a qual, como é óbvio, decorre de que só quem o observa se pode aperceber da forma como o testemunho é produzido, cuja sensibilidade se fundamenta no conhecimento das reacções humanas e observação directa dos comportamentos objectivados no momento em que tal depoimento é prestado, o que tudo só se logra obter através do princípio da imediação considerado este como a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes de modo a que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá de ter como base da decisão.

As consequências concretas da aceitação de tal princípio definem o núcleo essencial do acto de julgar em que emerge o senso; a maturidade e a própria cultura daquele sobre quem recai tal responsabilidade. Estamos em crer que quando a opção do julgador se centre em elementos directamente interligados com o princípio da imediação (v. g. quando o julgador refere não foram (ou foram) convincentes num determinado sentido) o tribunal de recurso não tem grandes possibilidades de sindicar a aplicação concreta de tal princípio.

Na verdade, o depoimento oral de uma testemunha é formado por um complexo de situações e factos em que sobressai o seu porte, reacções imediatas, o contexto em que é prestado o depoimento e o ambiente gerado em torno de quem o presta, não sendo, ainda, despiciendo, o próprio modo como é feito o interrogatório e surge a resposta, tudo isso contribuindo para a convicção do julgador.

A comunicação vai muito para além das palavras e mesmo estas devem ser valoradas no contexto da mensagem em que se inserem, pois como informa Lair Ribeiro, as pesquisas neurolinguísticas numa situação de comunicação apenas 7% da capacidade de influência é exercida através da palavra sendo que o tom de voz e a fisiologia, que é a postura corporal dos interlocutores, representam, respectivamente, 38% e 55% desse poder - “Comunicação Global, Lisboa, 1998, pág. 14.

Já Enriço Altavilla, in Psicologia Judiciaria, vol. II, Coimbra, 3.ª edição, pág. 12, refere que “o interrogatório como qualquer testemunho, está sujeito à crítica do juiz, que poderá considerá-lo todo verdadeiro ou todo falso, mas poderá também aceitar como verdadeiras certas partes e negar crédito a outras”.

Então, perguntar-se-á, qual o papel do tribunal de recurso no controle da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento?

Este tribunal poderá sempre controlar a convicção do julgador na primeira instância quando se mostre ser contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos. Para além disso, admitido que é o duplo grau de jurisdição em termos de matéria de facto, o tribunal de recurso poderá sempre sindicar a formação da convicção do juiz ou seja o processo lógico. Porém, o tribunal de recurso encontra-se impedido de controlar tal processo lógico no segmento em que a prova produzida na primeira instância escapa ao seu controle porquanto foi relevante o funcionamento do princípio da imediação.

Tudo isto, sem prejuízo, como acima já referido, de o Tribunal de recurso, adquirir diferente (e própria) convicção (sendo este o papel do Tribunal da Relação, ao reapreciar a matéria de facto e não apenas o de um mero controle formal da motivação efectuada em 1.ª instância – cf. Acórdão do STJ, de 22 de Fevereiro de 2011, in CJ, STJ, ano XIX, tomo I/2011, a pág. 76 e seg.s e de 30/05/2013, Processo 253/05.7.TBBRG.G1.S1, in http://www.dgsi.pt/jstj.

Tendo por base tais asserções, dado que se procedeu à gravação da prova produzida, passemos, então, à reapreciação da matéria de facto em causa, a fim de averiguar se a mesma é de manter ou de alterar, em conformidade com o disposto no artigo 662.º, do CPC., pelo que, nos termos expostos, nos compete apurar da razoabilidade da convicção probatória do tribunal de 1.ª instância, face aos elementos de prova considerados (sem prejuízo, como acima referido de, com base neles, formarmos a nossa própria convicção).

Vejamos, então, a factualidade posta em causa pelos ora recorrentes, nas respectivas alegações de recurso.

B. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da prova gravada, relativamente aos factos constantes dos itens 16.º, 23.º e 31.º, dos factos dados como provados, que devem passar a ser considerados como provados, nos termos referidos na conclusão 45.ª, bem como acrescentar-se aos factos provados, o que nesta se acha mencionado na al.. d), da ora referida conclusão;

G. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da prova gravada, relativamente aos factos descritos nas conclusões 15.ª, 17.ª e 23.ª, que devem passar a ser considerados como provados;

Para melhor esclarecimento e facilitar a decisão desta questão, passa-se a transcrever o teor de tal factualidade:

(Recurso da autora)

“16. A senhoria não procedeu a quaisquer obras no locado (artigo 15.º da contestação).

23. Na sequência da notificação referida em 20) e 21), a autora, no dia 12.08.2014, enviou carta registada com aviso de recepção à ré, comunicando a

«(…) denúncia do supra identificado contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 07/08/2014. (…) juntando, para os devidos efeitos, notificação que atesta a necessidade de realização de obras de remodelação ou restauro profundos. (…) Mais se informa que na data da entrega efectiva do imóvel, será descontado ao valor de rendas em dívida no montante relativo a um ano de renda, correspondente ao período de rendas de agosto de 2012 a julho de 2013 (art. 6º, al. a) DL 157/2066 de 8 de agosto), a título de indemnização legal. (…)» – conforme documento de fls. 24, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigo 12.º da petição inicial).

31. Aquando da entrega do locado à autora a ré arrancou cabos eléctricos e de telecomunicações, calhas de suporte da cablagem eléctrica, tomadas, interruptores, comutadores e alguns dos aparelhos de iluminação (parte do artigo 25.º da petição inicial).”.

(Recurso da ré)

“A ré realizou os trabalhos descritos no item 44.º, após prévia autorização do senhorio.

O locado dos autos encontrava-se edificado numa zona central das (...) , perto do mercado da localidade, onde todos os dias circulam centenas de residentes.

No período decorrido entre 27/10/2013 e 26/04/2014 a Ré registou 194 inscrições de alunos para diversas categorias de cartas de condução.

Das quais 178 inscrições respeitam a carta de condução da categoria B.

Entre 27/10/2014 e 15/09/2015 o número de inscrições para a sobredita categoria foi de 116.

A ré cobra o preço de 380,00€ para a formação de categoria B.

Caso se mantivesse a dita escola de condução no locado dos autos, era expectável que o número de inscrições se aproximasse, mantendo-se a tendência, do número de 178 e não das verificadas 116 inscrições naquela categoria.”.

Como acima já referido e consta da sentença recorrida, a matéria de facto em causa foi considerada como provada e não provada, conforme ora se transcreveu.

É a seguinte a respectiva motivação (cf. fl.s 163 v.º a 167):

“Consigna-se que não foram reconduzidas à factualidade considerada provada, nem aos factos não provados, as alegações constantes do requerimento inicial, da oposição e da resposta, que revestem natureza vaga ou conclusiva, nem as que se revelam improfícuas ou inúteis para o exame e decisão da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito e as regras que regem a distribuição do ónus de alegação e prova dos factos constitutivos do direito invocado pela autora e dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse mesmo direito.

Assim, excluídas, naturalmente, as referências meramente conclusivas constantes dos articulados, com relevo para a decisão a proferir em face do pedido formulado pela autora e das regras de repartição do ónus da prova, não se provaram quaisquer outros factos alegados nos articulados que não se encontrem descritos como provados ou que se mostrem em oposição aos provados ou prejudicados por estes.

Consigno, desde logo, que o Tribunal considerou na exposição dos factos provados os factos provados por documento autêntico – factos n.º 1, 2 e 53 -, e os factos provados por confissão da ré (expressada no articulado de contestação) – factos n.º 41 a 43.

Em face da selecção dos factos relevantes para a decisão a proferir nos autos (em conformidade com o pedido formulado pela autora e sendo certo que a decisão do Tribunal encontra-se, quantitativa e qualitativamente, limitada pelo mesmo – cf. o art. 609.º n.º1 do novo CPC), para responder à matéria controvertida, o Tribunal assentou a sua convicção na ponderação conjunta da prova a seguir indicada, apreciada em conjugação com as presunções judiciais ou naturais inerentes ao princípio da normalidade dos comportamentos humanos e com as regras da experiência comum, sem prejuízo das regras legais sobre o ónus da prova.

Assim, para formar a sua convicção e considerar provada a factualidade acima descrita, o Tribunal considerou e valorou criticamente:

i) a admissão das partes, expressa nos respectivos articulados ou por falta de impugnação,

- Conjugada com o teor da cópia do contrato de arrendamento junto aos autos a fls. 72vs e o recibo de renda junto aos autos a fls. 98vs, cuja exactidão não foi impugnada, para prova dos factos descritos sob os números 3) a 5);

- Conjugada com o teor do documento junto aos autos a fls. 76vs, cuja exactidão não foi impugnada, para prova dos factos descritos sob os números 6) e 7);

- Conjugada com o teor dos documentos juntos aos autos a fls. 20-23, 24, 26, 27, 28, cuja exactidão não foi impugnada, para prova dos factos descritos sob os números 17) a 28);

- Conjugada com o teor dos documentos juntos aos autos a fls. 40-41 e 77v-79, cuja exactidão não foi impugnada, para prova dos factos descritos sob os números 31) a 33);

ii) os demais documentos particulares apresentados pelos autores, juntos aos autos a fls. 52-53 e 123-123v.º, e apresentados pelos réus, juntos a fls. 70, 71, 72 e 73, cuja exactidão não foi impugnada;

iv) as declarações de parte do gerente da ré H... , com 53 anos de idade, instrutor de condução;

v) os depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência de julgamento:

- F... , com 40 anos de idade, consultor imobiliário, trabalhador da sociedade G... de (...) , o qual confirmou conhecer o imóvel dos autos, porquanto há dois ou três anos diligenciou com vista à angariação de comprador a pedido da anterior proprietária C... . Com relevância para a decisão de facto, afirmou que nunca lhe foi pedido para recolher as chaves da fracção arrendada pela ré.

- E... , com 52 anos de idade, empresário e legal representante da G... de (...) , o qual intermediou a compra e venda do imóvel entre a massa insolvente da C... e a autora e afirmou que, conforme informação do administrador da insolvência da vendedora, a ré não pagava a renda desde Agosto de 2012; que em Junho de 2014 acompanhou o legal representante da autora em uma visita ao interior do imóvel para averiguar do estado do mesmo e das obras necessárias; que, pelo menos desde essa data, a ré reclamava a necessidade de obras; que a pretensão da autora foi sempre realizar as obras necessárias, as quais apenas não foram iniciadas, porque em Julho ruiu parte da cobertura, ao que se seguiu o procedimento de despejo pela Câmara Municipal; que a ré nunca lhe entregou as chaves do locado, e que não foi o depoente quem diligenciou pela abertura das portas; que estava presente quando as portas foram abertas e viu a instalação eléctrica arrancada (conforme as fotografias de fls. 36 a 39, com as quais foi confrontado); e que as obras foram realizadas, encontrando-se terminadas.

- D... , com 68 anos de idade, pedreiro e construtor civil, o qual realizou as obras no imóvel objecto dos autos, por conta da autora. A testemunha confirmou que a natureza das obras realizadas (no interior e exterior do prédio) não permitia a permanência dos inquilinos durante a sua execução. Mais declarou a testemunha que a instalação eléctrica da fracção ocupada pela ré estava mais “vandalizada” e que o electricista “levou mais 3.000,00€ por isso”.

- I... , com 56 anos de idade, serralheiro civil, tendo executado várias obras para a autora, nomeadamente, forneceu e aplicou as janelas do prédio objecto dos autos, e o qual também afirmou que os inquilinos teriam sempre que sair para execução das obras em referência.

- J... , com 26 anos de idade, trabalhador-estudante (call center), filho dos sócios da ré. A testemunha relatou que no início de 2013 ajudou os pais na

secretaria da escola de condução e nas pequenas obras de remodelação que executaram nas instalações (pintura e piso da recepção), bem como auxiliou na publicidade aquando da mudança de instalações depois da cessação do contrato de arrendamento. Nesta matéria afirmou que as facturas de fls. 94vs e 95 são referentes a flyers e spots publicitários (em Junho, Julho e Agosto de 2015) para divulgar a nova localização da escola.

- L... , com 51 anos de idade, empresária e sócia da ré. Relatou que, em Fevereiro de 2011, a depoente e o marido adquiriram as quotas da escola de condução aqui ré e que, pelo menos desde essa data, detectaram infiltrações e degradação das instalações, nomeadamente, com rachas nas paredes, quer na parte da frente do imóvel (zona da secretaria), quer nas traseiras (salas da aulas), onde as infiltrações eram mais acentuadas, com água a pingar nas lâmpadas. Fizeram pequenas obras de remodelação, as quais foram aceites telefonicamente pelo senhorio, e pediram obras de fundo ao senhorio. Para tanto, em Agosto de 2011, falou telefonicamente com o “sr. N... ” e pediu as obras por escrito (embora não recorde que obras em concreto solicitou); em Outubro de 2011 recebeu uma visita da sócia do sr. N... (de cujo nome não recorda), a qual viu as condições do locado mas que respondeu que o senhorio não tinha dinheiro para realizar as obras. Que houve um curto-circuito por causa das infiltrações de água e por isso fez uma denúncia à Câmara Municipal; soube que o senhorio foi notificado para realizar obras de intervenção ao nível do telhado, mas, não obstante, nada foi feito. Posteriormente caíram bocados do tecto na sala afecta às aulas de mecânica e por isso tiveram de deixar de utilizar esse espaço, sendo que como não tinham outro espaço disponível para instalarem os equipamentos, tiveram de deixar de dar aulas de mecânica. Na sequência de tal facto, deixou de pagar rendas a partir de Agosto de 2012 como forma de pressionar o senhorio a realizar as obras, motivo que referiu verbalmente à responsável da loja “ X (...) ” que funcionava no rés-do-chão. Teve conhecimento da compra do imóvel pela autora em Maio de 2014 quando recebeu uma carta a reclamar o pagamento das rendas em falta, após o que iniciou negociações com a autora para resolverem a questão das obras e das rendas, tendo, em face do acordo (pagamento das rendas contra a realização de obras), procedido ao pagamento da renda de Julho de 2014. Porém, o tecto caiu em Julho de 2014 e o acordo ficou sem efeito. Após a ordem para desocuparem o locado, tiveram dificuldade em encontrar outro espaço adequado à actividade de escola de condução, tendo sido obrigados a instalarem-se em outra localização “às portas da cidade”, sendo certo que tiveram diversas despesas com a mudança de instalações (obras de remodelação e adequação do espaço, despesas de licenciamento junto do IMT e despesas de publicidade) e apenas vieram a reiniciar a actividade no novo local em 27.10.2015 e entregaram as chaves do locado no dia 04.12.2015 conforme combinado com a autora. Mais relatou que a localização das novas instalações é menos visível e menos central que a anterior, que a ré perdeu o acesso às escolas e aos institutos superiores, e que a renda é mais elevada (250,00€ nos dois primeiros anos e 500,00€ depois desse período). E que, em consequência da mudança de instalações, receberam menos inscrições, conforme gráficos de fls. 99vs-101, os quais foram elaborados pela própria testemunha através do programa de contabilidade da ré.

Concretamente, a demonstração da factualidade descrita sob os números 8) a 16) e 34) a 40) resulta da análise conjugada das declarações de parte prestadas pelo gerente da ré, do depoimento da testemunha L... e do teor dos documentos de fls. 73-76, bem como do teor dos documentos de fls. 20-22. Nestes termos, as declarações e o depoimento em referência foram prestados de forma espontânea, coerente e sem contradições entre si e encontra suficiente sustentação nos documentos em referência. Por outro lado, em face do estado efectivo do prédio em Agosto de 2014, que justificou o “despejo” ordenado pela Câmara Municipal de (...) , a progressiva degradação do prédio e as consequências daí decorrentes nos termos relatados pelo gerente da ré e pela testemunha L... afiguram-se razoáveis e credíveis perante as regras da experiência comum e da realidade comprovada nos autos. No entanto, com referência aos factos descritos sob as alíneas a) a d), os depoimentos ora referenciados não confirmaram expressamente tais factos, sendo certo que também não resultam do teor dos documentos juntos autos, nem podem configurar uma consequência necessária da demais factualidade apurada. Nesta matéria releva ainda o facto descrito sob a alínea d), cuja resposta negativa resulta da ausência de prova apta e bastante à sua demonstração. Alega-se que a queda da cobertura do prédio prejudicou definitivamente a utilização do locado. No entanto, tal factualidade foi contradita pelos depoimentos das testemunhas D... e I... , no sentido de que apesar das obras realizadas no locado implicarem necessariamente a sua desocupação pelos arrendatários, não houve necessidade de demolir o prédio, nem sequer o seu interior. Ou seja, terão sido certamente realizadas obras de fundo na estrutura da cobertura do prédio, bem como foram substituídas as janelas e reparadas as paredes interiores. Como tal, nada nos diz que houve uma inutilização definitiva do locado mas tão-somente necessidade de desocupação temporária (e não definitiva) para realização das obras em causa. Por seu turno, com referência ao facto não provado descrito sob a alínea q), a testemunha L... afirmou que apenas transmitiu verbalmente tal motivação à “gerente de loja da X (...) ” que ocupava o rés-do-chão do mesmo prédio do locado, sendo certo que se desconhece se e qual a relação entre esta pessoa e a senhoria “ C... ”, nomeadamente se a representava.

No que concerne à factualidade descrita, quer sob os números 29 e 30 dos factos provados, quer sob as alíneas f) a n) dos factos não provados, a resposta positiva aos primeiros resulta na admissão de ambas as partes. Ou seja, apesar da contradição das versões apresentadas por ambas as partes, certo é que ambas confluem em dois factos: a ré desocupou o locado, sendo que não se tendo provado a data concreta dessa desocupação, a autora aceita como limite temporal posterior o dia 24.11.2014 (considerando que a demonstração de data anterior aproveitaria à ré, a dúvida quanto à mesma terá de ser decidida contra esta – cf. o art. 346.º, in fine, do CC); e, por outro lado, que a autora teve acesso ao interior do locado no dia 04.12.2014 (fosse através do serralheiro, na versão da autora, fosse através da entrega das chaves, na versão da ré). No que concerne à factualidade não provada, a resposta negativa resulta da contradição entre os depoimentos das testemunhas L... , M... e E... relativamente à existência de acordo para entregar as chaves do locado a um funcionário da mediador, e por outro lado a falta de conhecimento directo da testemunha E... quanto à necessidade e intervenção do serralheiro, uma vez que tal assunto terá sido “tratado” pelo empreiteiro. Em face da ausência de prova apta e bastante à comprovação de qualquer uma das duas versões, resulta a dúvida quanto a ambas, respondendo-se negativas aos factos em referência.

A resposta negativa dada aos factos vertidos sob as alíneas o) e p), resulta igualmente da ausência de prova apta e bastante à sua demonstração. Assim, se é certo que a ré não impugna que tenha arrancado fios e instalações eléctricas do locado, impugna, porém, que tenha arrancado todos os materiais e equipamentos eléctricos. Ora, das fotografias de fls. 31-39 não são perceptíveis quais os materiais e equipamentos “arrancados”, sendo que os mesmos também não foram identificados em concreto nem quantificados pelas testemunhas E... e D... . Por seu turno, o orçamento constante de fls. 30, para além de ser um mero orçamento, também não concretiza o material em referência, pelo que não é possível imputar o custo de reposição ali indicado a qualquer actuação da ré. Por fim, não é igualmente prova bastante à demonstração do facto a mera alegação da testemunha D... no sentido de que o “electricista levou a mais 3.000,00€” sem qualquer concretização dos custos acrescidos em causa ou da junção da respectiva factura identificativa dos mesmos.

A prova dos factos descritos sob o n.º 44) resulta da análise conjugada das declarações de parte prestadas pelo gerente da ré, do depoimento da testemunha L... , do depoimento da testemunha J... e do teor dos documentos de fls. 80-80vs. Ou seja, os depoimentos foram prestados coerentemente entre si e as despesas relatadas mostram-se suportadas nas “Factura/Recibo de fls. 80-80vs. Por outro lado, considerando que os declarantes H... e L... haviam adquirido as quotas da ré, face ao estado degradante do locado (conforme acima descrito), as pequenas obras e pinturas em causa mostram-se compatíveis com tal realidade, estão identificadas e quantificadas nos documentos assinalados e, como tal, são credíveis. Porém no que concerne à autorização prévia do senhorio (alínea r) dos factos não provados) não foi feita prova bastante à sua verificação, desde logo, porque o gerente da ré declarou que apenas deram conhecimento à gerente da loja Benettton (já acima referenciada) e, por outro lado, porque apesar da testemunha L... ter desposto no sentido de que o senhorio aceitou, telefonicamente, “a intervenção mínima para dar outra cara ao locado” não concretizou a intervenção mínima em causa nem confirmou quais as obras que o senhorio teria efectivamente autorizado.

A demonstração da factualidade descrita sob os números 45) a 50) resulta da análise conjugada das declarações de parte prestadas pelo gerente da ré, do depoimento da testemunha L... , do depoimento da testemunha J... e do teor dos documentos de fls. 81-98. Neste sentido, as despesas em referência encontram-se identificadas e quantificadas nos documentos em referência, sendo certo que tais despesas mostram-se plenamente justificadas pela necessidade de mudanças das instalações da escola de condução, sendo certo que a calendarização das obras descrita nos depoimentos em referência mostra-se igualmente suportada nas datas das facturas e recibos juntos aos autos: primeiro, em finais de 2014, foram realizadas as obras de pedreiro e adaptação do espaço à actividade exercida pela ré, e depois, mais tarde, em meados de 2015, foram realizadas obras de remodelação dos lavabos e a respectiva adaptação a pessoas com mobilidade reduzida.

No que concerne, porém, à factualidade não provada descrita sob a alínea s), apesar dos documentos de fls. 94 e 95 se referirem efectivamente a despesas de publicidade não resulta dos mesmos qualquer nexo causal relativamente à mudança de instalações da ré, ou seja, considerando que a ré, como escola de condução fará certamente campanhas e despesas publicitárias com regularidade para divulgação da actividade, não é possível, através dos meios de prova produzidos, imputar as despesas em análise à mudança de instalações, sendo certo que o teor do documento e fls. 95 refere a descrição de “Aulas Pr(…)” e que o depoimento das testemunhas L... e J... não foram bastantes para demonstrar o teor do spot de rádio documentado a fls. 94.

O mesmo se diga quanto à factualidade descrita sob as alíneas t) a bb), cuja resposta negativa decorre da ausência de prova apta e bastante à respectiva demonstração. Ou seja, as declarações de parte do gerente da ré e os depoimentos das testemunhas da mulher e do filho, L... e J... , tendo naturalmente interesse na causa, principalmente no pedido reconvencional a título de lucros cessantes (no valor de 23.560,00€), são subjectivos e parciais nesta matéria, sendo que não se encontram suportados em qualquer prova documental ou outro meio de prova objectivo. Acresce ainda, para efeitos do facto vertido sob a alínea aa) que não a ré pretender provar o preço cobrado para a formação de categoria B com um único e mero recibo emitido pela própria (quando o próprio gerente afirmou em declarações de parte que cobra um preço diferente – 270,00€ - daquele que vem indiciado no recibo). Por seu turno, com referência aos gráficos documentados a fls. 99vs-101, não obstante a testemunha L... ter afirmado que os mesmos foram elaborados através do programa de contabilidade da ré, certo é que tais documentos não se encontram certificados, desconhece-se qual o programa em causa, quais os números e critérios utilizados para elaboração dos gráficos, entre outras informações que poderiam eventualmente relvar para a apreciação de tais factos.

Por fim, a prova do facto descrito sob os n.ºs 51) e 52) resulta do teor dos documentos de fls. 120vs e 122vs, conjugados com os depoimentos das testemunhas D... e I... , as quais confirmaram os factos em referência.”.

Vejamos, então, se dos depoimentos invocados pelos recorrentes, e sem olvidar as considerações prévias, quanto a tal, já acima explanadas, existem motivos para que as supras mencionadas respostas sejam modificadas ou alteradas.

Ora, ouvido, na íntegra, o depoimento prestado por D... , o mesmo referiu que efectuou vários trabalhos de construção civil para a autora, designadamente, as obras de reparação efectuadas no prédio onde se situava o locado.

A sua empresa apresentou o orçamento de fl.s 120 v.º, tendo terminado as obras já no ano de 2016 e foram iniciadas já depois de a ré sair.

Relativamente à instalação eléctrica, referiu que “todo o prédio levou instalação nova”, mas na parte da ré, estavam fios partido e arrancados e “o electricista levou mais dinheiro, mais 3.000,00 €, que tive que pagar a mais do que o orçamento”.

A testemunha E... , disse trabalhar como mediador imobiliário e, nessa qualidade, mediou a venda do prédio à autora.

Referiu a existência de contactos com os sócios da ré, que reclamavam obras e foram ver o prédio em Julho “para ver quais as obras a fazer”. Acrescentou que a autora sempre manifestou vontade de fazer obras para o prédio não ruir e que “as obras não foram iniciadas porque logo a seguir ruiu parte do telhado e seguiu-se a intervenção da Câmara Municipal”.

Diz que viu a instalação eléctrica “arrancada e vandalizada”.

E que as obras foram feitas logo a seguir e já estão terminadas.

A testemunha L... , referiu ser sócia da ré, desde Fevereiro de 2011.

Referiu que contactou telefonicamente o Sr. N... (sócio da primitiva senhoria) para serem feitas obras e ele disse que não. Posteriormente, reforçou tal pedido, mas a resposta foi a mesma, em Outubro de 2011, por “impossibilidade de fazer obras”, em função do que denunciaram a situação na Câmara.

Relativamente às obras referidas no item 44.º, disse que telefonou ao Sr. N... e este “concordou que a gente fizesse alguma coisa. Dissemos que íamos pôr aquilo com outra cara e ele aceitou”.

Já depois da queda do telhado e notificação da Câmara para sair iniciaram as démarches para encontrar novas instalações e só encontraram aquela em que se encontram, dado o condicionalismo de não se poderem instalar a menos de 500 metros de outra escola já existente.

Nas anteriores instalações, estavam na parte central da cidade, perto de duas escolas, de onde provinham grande número de alunos e agora que “é mais longe e deixou de estar no centro, perdemos bastante, diminuíram bastante as inscrições”.

Confrontada com os doc.s de fl.s 99 v.º a 101, explicitou que o n.º 40, se refere ao 1.º ano nas novas instalações e que os gráficos ali juntos foram feitos pela aplicação informática que utilizam, que “assume os números das inscrições”.

Referiu ser de 380,00 €, o valor de uma inscrição para a categoria B e que, por referência a este valor, o lucro será de cerca de 50,00 €.

Ainda relativamente à autorização das obras descritas no item 44.º, disse que a respectiva autorização não foi por escrito, mas por contacto telefónico com o Sr. N... .

Analisados estes depoimentos e demais referidos elementos probatórios, designadamente, os documentais acima referidos, pensamos ser de sufragar, em grande parte, a conclusão a que se chegou na sentença recorrida.

Assim e iniciando a nossa análise pelo recurso da autora, no que se refere à pretendia alteração do item 16.º dos factos provados, é indesmentível que a primitiva proprietária não fez quaisquer obras.

Por outro lado, a actual proprietária – a ora autora e recorrente – também as não fez no período relevante, ou seja, enquanto perdurou a relação contratual com a ré.

Efectivamente, como resulta dos depoimentos das testemunhas D... e E... , a autora apenas iniciou as obras já depois de a ré ter saído (mercê da ruína do telhado e notificação da Câmara Municipal) do locado.

O que interessa para a decisão do pleito é o período em que se manteve a relação contratual entre as partes e não posteriormente.

Assim, é de manter a redacção do item 16.º dos factos provados.

De igual forma, não pode proceder a pretensão da autora no que se refere à alteração da redacção do item 23.º, no sentido de se lhe acrescentar a expressão “e do facto referido em 28”, como se refere na conclusão 45.ª.

O que consta deste item corresponde ao alegado pela autora, na petição inicial e reproduz o doc. que a mesma juntou e que consta a fl.s 24 e no qual não se refere o que ora se pretende ver acrescentado.

De resto, a carta que corporiza tal documento tem a data de 12 de Agosto de 2014, pretendendo denunciar o contrato a partir de 07 desse mês e o requerimento da ré, referido no item 26, só foi apresentado no dia 08 de Agosto, o que tudo indicia que a autora ainda dele não era conhecedora e tudo, sem olvidar a irrelevância desse facto.

Pelo que, se mantém a redacção do referido item 23.º.

Por último, no que se refere à problemática do item 31.º, o que a autora pretende é que se passe a considerar como provada a matéria constante da alínea p), dos factos não provados.

Nesta fez-se consignar não estar demonstrado que os materiais referidos em 31, têm o valor de 3.125,00 €, acrescido de IVA.

Apenas a testemunha D... referiu que dado o estado em que se encontrava a instalação eléctrica no locado, o electricista levou mais 3.000,00€.

Trata-se de uma afirmação vaga e destituída de suporte probatório.

Efectivamente, como se refere a fl.s 166, o orçamento de fl.s 30, não discrimina quais os materiais em concreto ali aplicados, nem qual a parte que respeita à mão de obra, sendo de estranhar que no próprio orçamento se faça a menção de que a instalação eléctrica foi “danificada pelo residente anterior”.

Por outro lado, como o referiu a testemunha D... “todo o prédio levou instalação eléctrica nova” e só relativamente ao locado se apresenta/junta orçamento autónomo.

Consequentemente, mantém-se como não provada a matéria constante da al. q), dos factos não provados.

No que respeita ao recurso da ré, cumpre, em primeiro lugar, averiguar a questão da autorização das obras descritas no item 44.º.

Refere a testemunha L... que as mesmas foram autorizadas pelo Sr. N... , através de contacto telefónico para tal.

O normal em situações destas é os contactos serem pessoais, não se vislumbrando a necessidade de documento escrito, salvo em obras de vulto, o que aqui não foi o caso.

No entanto, como se refere a fl.s 166 v.º, o outro sócio da ré referiu que os contactos não foram com o Sr. N... , mas sim com outra pessoa.

Por outro lado, a testemunha L... não identificou as obras que terá acordado com o Sr. N... , limitando-se a referir que “iam pôr aquilo com outra cara”.

Ora, salvo o devido respeito por contrário entendimento, sem uma concreta identificação das obras a realizar é difícil conceber que exista autorização, tanto mais que o objectivo seria o de salvaguardar futuros, eventuais, interesses da arrendatária.

Face ao que, se mantém como não provada esta matéria – alínea r), dos factos não provados.

No que se refere à matéria constante da alínea u), dos factos não provados, cremos, face ao depoimento da testemunha L... , que a mesma deve considerar-se como provada.

Efectivamente, em termos lógicos, claros e plausíveis, a mesma descreveu o local onde se situava o locado e onde se encontram agora.

Assim, passa a considerar-se como provada a matéria constante da alínea u), dos factos não provados, aditando-se aos factos provados, o item 51.º, com a seguinte redacção:

51. O locado dos autos encontrava-se edificado numa zona central das (...) , perto do mercado da localidade, onde todos os dias circulam centenas de residentes.

No que concerne à demais matéria que a ré pretende ver como provada (conclusão 23.ª), entendemos não existir suporte probatório para tal.

Baseia a mesma tal pretensão no depoimento da testemunha L... , por referência aos gráficos de fl.s 99 v.º a 101.

Estes gráficos resultam de elaboração da própria ré e o facto de o respectivo programa se encontrar certificado, não implica que sejam verdadeiros os dados nele introduzidos.

Por certo, a ré terá contabilidade organizada e nada melhor para demonstrar tal factualidade do que comprovar o número de inscrições efectuadas com recurso a tal contabilidade, complementadas, até, com as listagens dos alunos inscritos.

Por outro lado, nada garante que uma eventual redução do número de alunos se deve apenas à mudança de instalações para outro local, sendo de ponderar outros factores, como preços na concorrência, existência de interessados, condições propiciadas, etc.

Assim, mantém-se como não provada a matéria referida na conclusão 23.ª.

Assim, improcede, quanto a esta questão, em conformidade com o ora decidido, o recurso da autora e procede, parcialmente, o recurso da ré, em função do que se mantém a matéria dada como provada e não provada em 1.ª instância; com excepção da matéria dada como não provada, que constava da respectiva alínea u), que se passa a considerar como provada, em consequência do que, aos factos provados, se adita o item n.º 51.º, com a seguinte redacção:

51. O locado dos autos encontrava-se edificado numa zona central das (...) , perto do mercado da localidade, onde todos os dias circulam centenas de residentes.

Recursos interpostos por ambas as partes:

C. Se ocorreu a caducidade do contrato de arrendamento sub judice, por perda da coisa locada, em 06 de Agosto de 2014 e consequências daí decorrentes, designadamente se a autora é responsável pela indemnização peticionada pela ré, referente aos danos por esta invocados;

H. Se ocorreu a caducidade do contrato de arrendamento, por perda do locado, no momento em que a ré foi interpelada para, de imediato, desocupar o locado, por razões de segurança de pessoas e bens.

No que a esta questão concerne (em ambas as questões suscitadas por cada uma das partes, coloca-se a mesma questão; qual seja a de saber se ocorreu a caducidade do contrato, pelos invocados motivos), importa averiguar quais as consequências a extrair da ruína do prédio em que se encontrava o locado, designadamente, se o mesmo cessou por denúncia da autora ou caducou, por perda da coisa locada.

Como decorre do alegado nos artigos 12.º e seg.s da petição inicial, a autora, configurou o seu direito, com base na denúncia do contrato de arrendamento e no facto de, não obstante tal denúncia, a ré não ter desocupado o locado quando o deveria ter feito.

Contestando, defendeu a ré a ineficácia de tal denúncia, por a mesma não ter respeitado o formalismo exigido e alegando que, dada a degradação do edifício, não pode usufruir do locado; se bem que, cf. artigos 86.o e seg.s da contestação, defenda ter-se verificado a caducidade do contrato de arrendamento, por perda da coisa locada, com as inerentes consequências.

Em sede de alegações de recurso, a autora, veio, igualmente, defender que se trata de caso de caducidade do contrato de arrendamento, por perda da coisa locada.

Conforme artigo 5.º, n.º 3, do CPC, cabe ao Tribunal “ler” o direito, no sentido de que o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, embora com respeito pelo princípio do contraditório, com o alcance de que o Tribunal, não deverá resolver o conflito de interesses, com base numa solução jurídica não tida em conta pelas partes, sem antes exercer o contraditório – cf. artigo 3.º, do CPC.

Dado que in casu ambas as partes referem a questão da caducidade do contrato de arrendamento por perda da coisa locada, como a justificação jurídica para a procedência das respectivas pretensões, passa-se, de imediato, à análise e decisão da questão em apreço, em conformidade com o alegado e, como é óbvio, por referência à factualidade assente.

Como resulta do disposto no artigo 1051.º, n.º 1, al. e), do Código Civil:

“1. O contrato de locação caduca:

(…)

e) Pela perda da coisa locada.”.

Efectivamente, nos termos do disposto no artigo 1031.º, al. b), do Código Civil, uma das principais obrigações do locador é a de assegurar ao locatário o gozo da coisa locada para os fins a que a mesma se destina.

Estando-lhe vedada a prática de actos que diminuam ou impeçam esse gozo e verificando-se tal situação, confere-se ao locatário o direito de, ainda que se trate do locador, de usar dos meios possessórios, tal como estipulado no artigo 1037.º, n.º 2, do Código Civil.

Conexa com a obrigação de propiciar o gozo da coisa locada, está a obrigação, se necessário, que é imposta ao senhorio de levar a cabo as obras necessárias, para que isso se verifique, tal como consta do artigo 1074.º do CC. Podendo o locatário, nos moldes previstos no artigo 1036.º do CC, efectuá-las, nos moldes ali consagrados.

Por outro lado, o regime de responsabilização do locador, nos termos gerais da responsabilidade civil contratual, rege-se pelo disposto nos artigos 798.º e 799.º do CC; ou seja, acarreta a sua responsabilidade de indemnização pelos danos causados ao locatário, incumbindo-lhe a prova de que a falta de cumprimento ou cumprimento defeituoso da obrigação de propiciar o gozo da coisa, para os fins a que a mesma se destina, não procede de culpa sua.

Sendo, ainda, de ter em consideração, que, nos termos do artigo 1034.º, n.º 2, do CC, só se verifica a falta de cumprimento do contrato quando o gozo da coisa for assegurado em moldes tais que determinem a privação definitiva ou temporária ou a diminuição dele por parte do locatário.

Ora, um dos casos em que se verificará a privação (total ou parcial) ou a diminuição do gozo da coisa é o da perda da coisa locada que, como acima já referido, acarreta a caducidade do contrato de arrendamento, configurando-se uma situação de impossibilidade objectiva do cumprimento do contrato, tal como previsto, em geral, no domínio da responsabilidade contratual, no artigo 790.º do CC.

Relevando, aqui, apenas a perda total, dado que em caso de perda parcial, terá aplicação o disposto no artigo 793.º, n.º 1, do CC, caso em que o locador fica exonerado mediante a prestação do que for possível, devendo, neste caso, ser proporcionalmente reduzida a contraprestação (renda) a que a outra parte estiver vinculada.

Conferindo-se-lhe, em alternativa, a possibilidade de resolver o contrato – cf. n.º 2, deste preceito.

Assim, releva a perda total, a qual deverá ser apreciada em consonância de permitir ou não o uso do locado para a realização dos fins contratados.

Caducidade que opera ipso iuris, ou seja de forma automática, acarretando a extinção do contrato e, em caso de culpa do senhorio, fica este constituído no dever de indemnizar o locatário, decorrentes de tal extinção contratual.

Como se refere no Acórdão do STJ, de 09 de Março de 2010, Processo n.º 440/07.4TVPRT.S1, disponível no respectivo sítio do itij, citando Aragão Seia, Arrendamento Urbano, 1996, 2.ª Edição, pág. 332 “só a perda total determina a caducidade do contrato de arrendamento, extinguindo-se imediatamente a obrigação do locador – n.º 1 do artigo 790.º do Código Civil. A perda parcial da coisa locada só faz caducar o contrato de locação se o grau de destruição for tal que não permita o uso da coisa para os fins do respectivo contrato de locação.”.

Ali se acrescentando que “a caducidade do contrato opera ope legis, relevando a culpa do senhorio para efeitos de indemnização ao arrendatário, indemnização em que devem ser ressarcidos tanto os danos patrimoniais como os danos não patrimoniais sofridos” e em que se cita inúmera jurisprudência no mesmo sentido.

Reiterando-se que só a perda total determina a caducidade do contrato, regendo o disposto no artigo 793.º do CC, para o caso de perda parcial.

Verificando-se a caducidade, por facto imputável ao senhorio, não se extingue a obrigação de propiciar o gozo da coisa locada e em face da impossibilidade de a cumprir – proporcionar o gozo da coisa para os fins a que se destina – a mesma é substituída pelo dever de indemnizar.

Em sentido idêntico ao acima citado, se pronunciou o STJ, através de Acórdão de 02 de Julho de 2015, Processo n.º 1700/12.8TVLSB.L1.S1, disponível no mesmo sítio do anterior e no qual se concluiu que, em caso de ruína/derrocada de edifício devida à omissão dos deveres do senhorio em proceder à conservação do imóvel, não fica excluída a obrigação do senhorio em indemnizar os danos causados.

No mesmo sentido se pronuncia a doutrina, referindo-se, para além da citada nos Arestos já mencionados, Fernando Gravato Morais, in Novo Regime do Arrendamento Comercial, 2.ª Edição, Almedina, 2007, a pág.s 273 e 274, que ali refere, dever considerar-se que a perda total da coisa também se verifica quando a “coisa locada não desparece, mas sofre danificações tais que fica inutilizada ou se torna imprópria para servir os fins do arrendamento”.

Só inexistindo obrigação de indemnização a cargo do locador, se a causa da perda não lhe for imputável.

E mesmo em caso de perda parcial em tal grau que impeça a finalidade tida em vista no contrato, deve operar a caducidade do contrato. Assim não sendo, deve prevalecer o procedimento previsto no artigo 793.º do CC.

M. Januário Gomes, in Arrendamentos Comerciais, 2.ª Edição Remodelada, Almedina, 1991, a pág.256, refere que:

“A perda determinante da caducidade é a perda total resultante por ex. de incêndio, terramoto, desabamento, de acção do homem, etc.. Se a perda foi simplesmente parcial, pode haver lugar a redução de renda, nos termos do artigo 1040.º do Código Civil, sem prejuízo de o arrendatário poder resolver o contrato nos termos do artigo 1050.º.

Em concreto, pode ser discutível o carácter total ou parcial da perda. A apreciação deve primar pela razoabilidade: haverá perda total quando, objectivamente, o local tenha perdido as aptidões mínimas necessárias para ser usado. À luz desta concepção funcional, poderá não ser necessário aguardar que um prédio caia como um baralho de cartas para se concluir pela perda do mesmo”.

Ora, in casu como melhor se acha descrito nos itens 8.º a 16.º e 19.º a 22.º dos factos provados, verifica-se que o prédio onde se localizava o locado, nunca foi objecto de obras por parte do senhorio o que determinou que, a nível do telhado, se começassem a infiltrar as águas pluviais, com as consequências daí decorrentes, o que se veio agravando, não obstante os apelos da arrendatária para que fossem feitas obras, até que, em 24 de Julho de 2014, o telhado ruiu.

Na sequência do que se seguiu a intervenção da Câmara Municipal das (...) que culminou com a notificação dos respectivos serviços, efectuada em 06 de Agosto de 2014, para que fosse interditado o acesso às salas do 1.º andar, dada a existência de “perigo para pessoas e bens”, em 5 dias e no prazo de 30, “o despejo de quem possa estar a ocupar o edifício” onde se situava o locado.

Ora, em face do que acima se deixou dito acerca dos requisitos para que se verifique a caducidade do contrato de arrendamento, parece-nos que, com a queda do telhado, se verifica a impossibilidade do uso do locado, para que a ré ali continuasse a exercer as actividades de escola de condução, com a necessária deslocação dos alunos ao edifício em causa, para as aulas de código, mecânica, pedidos de informação, inscrições, etc.

Não se pode exigir à ré que continuasse a exercer a sua actividade num edifício sem telhado, por este ter ruído, por falta de obras de beneficiação/conservação/recuperação, que incumbiam ao senhorio realizar.

De resto, foi a própria Câmara Municipal, entidade competente para o efeito, que determinou, logo de imediato, que fosse impedido o acesso às salas do 1.º andar e o despejo, no prazo de 30 dias, de todo o prédio, dada a já referida situação de perigo para pessoas e bens, que o edifício apresentava.

O telhado é um dos componentes principais de um edifício e não se concebe que se exija que alguém resida ou exerça actividade num edifício cujo telhado ruiu.

Assim, nos termos expostos, é de concluir que, dada a falta de obras por parte do senhorio, o telhado do prédio em que se situava o locado ruiu em 24 de Julho de 2014, o que acarretou a caducidade do contrato de arrendamento em causa, desde essa data, com as consequências já assinaladas.

Uma das quais é a obrigação que impende sobre o locador de indemnizar o locatário pelos danos por este sofridos, em virtude da sua inacção relativamente ao estado de ruína que apresentava o edifício.

Seguindo Pedro Romano Martinez, in Direito das Obrigações (Parte Especial) Contratos, Compra e Venda, Locação, Empreitada, Almedina, 2000, a pág.s 209 e 210:

“Sempre que o contrato de locação caducar por impossibilidade superveniente importa averiguar se há ou não culpa do locador.

Havendo culpa do locador, cuja actuação, por exemplo, levou à perda da coisa locada – hipótese de caducidade prevista no art. 1051.º, al. e) CC –, ele será responsável, tendo de indemnizar o locatário por essa situação. O contrato, na realidade caduca, mas sobre o locador impenderá uma obrigação de indemnizar a contraparte se tiver havido culpa da sua parte no que respeita à produção do facto que desencadeou a caducidade.

Não havendo culpa do locador não existirá a obrigação de indemnizar. Assim, se a casa arrendada ruiu porque o locador não fez as obras necessárias de reparação, o contrato caduca e haverá que indemnizar o locatário, mas se a casa caiu em razão de um tremor de terra ou por força de um incêndio fortuito, não há qualquer obrigação de indemnizar.”.

Uma vez que no caso em apreço, a ruína do telhado se ficou a dever ao facto de o senhorio não ter feito obras, sobre ele recai, nos termos expostos, a obrigação de indemnizar a ré pelos prejuízos por esta sofridos, decorrentes da caducidade do contrato.

Mas será que pelo facto de a autora só ter adquirido o prédio em 14 de Fevereiro de 2014 e o arrendamento já perdurar desde Setembro de 1958, tendo o telhado ruído no dia 24 de Julho de 2014, por falta de obras, não pode ser obrigada a indemnizar a ré?

Ainda assim, parece-nos que se mantém tal responsabilidade.

Nos termos do disposto no artigo 1057.º do Código Civil:

“O adquirente com base no qual foi celebrado o contrato sucede nos direitos e obrigações do locador, sem prejuízo das regras do registo.”.

Como referem P. de Lima e A. Varela, in Código Civil Anotado, Vol. II, 2.ª Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora, 1981, a pág. 387, trata-se de um caso de transmissão de direitos que se produz ipso jure, como efeito da lei, sem necessidade de ser clausulada, nem pode ser excluída e ali acrescentando que “O adquirente, sucedendo nos direitos e obrigações do locador, não pode invocar a ignorância do contrato de locação para se eximir ao seu cumprimento.”.

De igual forma, como se escreve no Acórdão do STJ, de 09 de Março de 2010, acima já citado, não afasta a responsabilidade da autora pela referida indemnização, o facto de ter adquirido o prédio em estado de degradação, ainda que demonstrado que “a proprietária adquiriu um imóvel em estado degradado, facto evidente que não podia desconhecer (…). Se os adquirentes de imóveis em estado de degradação pudessem eximir-se de culpa da obrigação de realização de obras pelo facto de a deterioração do prédio ter resultado de omissão de obras por parte do anterior proprietário, estaria encontrado o modo de os adquirentes de imóveis degradados, que invocassem junto das entidades administrativas a necessidade de demolição total por perda da coisa locada sem suportarem o pagamento de nenhuma indemnização.”.

Mantém-se, pois, a obrigação de indemnização da autora, decorrente da caducidade do contrato de arrendamento por perda da coisa locada.

A restrição consagrada no artigo 1057.º do CC, reflecte o carácter misto das regras que regulam a locação, visando conferir estabilidade e segurança à posição do arrendatário, impondo o respeito da relação locatícia pelo adquirente do direito, embora no âmbito das relações contratuais, de índole obrigacional – cf. Manuel Henrique Mesquita, Obrigações Reais e Ónus Reais, Almedina, 1990, pág.s 138 e 139 (nota 18) e pág.s 176 e 177 (nota 87).

Concluindo, como acima já referido, verifica-se a caducidade do contrato de arrendamento sub judice desde 24 de Julho de 2014, por culpa do locador (aqui se incluindo a autora), o que a faz incorrer na obrigação de indemnizar a ré, pelos prejuízos sofridos.

Consequentemente, quanto a estas questões, procedem os recursos, fixando-se a data em que ocorreu a caducidade no dia 24 de Julho de 2014 e decide-se que à autora incumbe indemnizar a ré pelos respectivos prejuízos.

D. Se a ré age em abuso do direito, dada a desproporção entre o valor das rendas por si pagas e o custo das obras a efectuar no prédio em que se situava o locado.

No que a esta questão concerne, alega a recorrente que em virtude de as obras a realizar ascenderem ao montante de cerca de 105.000,00 € e a renda ser apenas de 257,54 €, constituiria abuso de direito que a autora tivesse que realizar obras.

Não se negando que assim seria, o facto é que esta matéria em nada contende com a apreciação e decisão do pleito que subjaz aos presentes autos.

Efectivamente, apesar de a ré ter solicitado ao anterior senhorio a realização de obras, as mesmas não foram feitas.

A autora, como acima referido (mas não alegado nos autos, por nenhuma das partes), aquando da decisão do recurso da matéria de facto, fê-las já depois de a ré ter abandonado o locado.

Seja como for, o que está aqui em causa é apreciar as consequências que decorrem da caducidade do contrato de arrendamento por perda da coisa locada e nada mais. Uma coisa é/seria considerar que a autora ou o anterior senhorio não estariam obrigados a fazer obras atenta a desproporção entre o valor destas e as rendas pagas pela ré, outra é a de saber se dessa atitude decorre para a autora alguma consequência relevante, designadamente, se tem de indemnizar a ré pelos prejuízos sofridos.

Aquando da apreciação das anteriores questões já se decidiu que, efectivamente, esta obrigação existe e a mesma nada contende com a existência de abuso de direito na exigência de realização de obras.

Reitera-se que uma coisa é a feitura das obras e outra, as consequências da ruína do prédio onde se localizava o locado por inacção do proprietário.

Assim, nada mais há a decidir quanto a tal.

Pelo que, quanto a esta questão, improcede o recurso.

E. Se a autora tem direito a receber da ré a quantia de 3.125,00 €, acrescida de IVA, correspondente à substituição da instalação eléctrica existente no locado, que aquela destruiu.

Relativamente a esta questão, defende a autora que tem direito a haver da ré a quantia supra mencionada, com o fundamento em que a ré destruiu a instalação eléctrica, o que acarretou custos equivalentes à quantia pedida.

Na sentença recorrida decidiu-se pela improcedência de tal pedido com o fundamento em que não se demonstrou o estado do locado no momento da celebração do contrato, pelo que não é possível comparar o estado do locado no momento da celebração do contrato e o da sua restituição à autora.

No que a esta matéria respeita, importa ter em conta o que consta dos itens 31.º a 33.º dos factos provados e alíneas o) e p), dos não provados.

Assim, demonstrou-se que aquando da entrega do locado, a ré arrancou cabos eléctricos (não todos como alegara a autora) e de telecomunicações, calhas, tomadas, interruptores, comutadores e alguns dos aparelhos de iluminação.

A autora instou a ré para que reparasse a instalação eléctrica, o que esta não fez, alegando que a instalação eléctrica já se encontrava em mau estado em virtude de inúmeros e sucessivos curto-circuitos.

Não se provou que o valor de reparação foi o alegado pela ré (referida alínea p).

Conforme se dispõe no artigo 1043.º, n.º 1, do CC, constitui uma das obrigações do locatário a manutenção e restituição da coisa no estado em que a recebeu, ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato.

Do que resulta que a responsabilidade do locatário neste domínio, só lhe pode ser assacada por cotejo com o estado em que recebeu o locado, o que, por regra, se afigurará bastante difícil, designadamente, em casos, como o presente, em que o arrendamento tem décadas.

Razão pela qual, se consagra no n.º 2 do preceito ora em apreço, que se presume que a coisa foi entregue em bom estado de manutenção, salvo a existência de documento em que se descreva o estado aquando da entrega.

Do que decorre, sequencialmente, nos termos do disposto no artigo 350.º do CC que o locador beneficia da presunção – na ausência de demonstração de tal facto – de que o locado foi entregue em boas condições.

Por outro lado, por força do que se dispõe no artigo 1044.º do CC, o locatário responde pela perda ou deteriorações da coisa não inerentes a uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato.

Como referem P. de Lima e A. Varela, ob. cit., pág. 369, consagra este preceito como que uma “responsabilidade objectiva, que tem alguma justificação, quer por ser o locatário quem utiliza a coisa no seu próprio interesse, quer como estímulo legal a uma utilização prudente da coisa que não lhe pertence”.

Ora, por certo que o acto de arrancar cabos eléctricos e de telecomunicações e os demais objectos descritos no item 31.º, não se enquadra numa deterioração inerente a uma prudente utilização do locado, do que resulta – nos termos do supra citado artigo 1044.º - a responsabilidade da ré pelo prejuízo assim causado.

Atento a que não se demonstrou o valor de tal prejuízo, que existe, mas não se encontra, ainda, quantificado, se tem de relegar para posterior liquidação, em conformidade com o disposto no artigo 609.º, n.º 2, do CPC.

Assim, no que concerne a esta questão, procede, parcialmente, o recurso, reconhecendo-se que a autora tem direito a ser ressarcida pelo invocado prejuízo, cuja quantificação se relega para posterior liquidação, tendo como limite máximo a quantia peticionada; ou seja, 3.125,00 €.

Recurso interposto pela ré B... :

F. Se a excepção de não cumprimento do contrato, invocada pela ré, deve ser reconhecida, relativamente a todo o montante da renda e não apenas na proporção em que o foi na sentença recorrida.

No que a esta questão respeita, alega a ré, ora recorrente, que em virtude da extinção do contrato de arrendamento ocorrida em virtude da perda da coisa locada, se deve decidir que não são devidas nenhuma das rendas pedidas, dada a impossibilidade de uso do locado para os fins convencionados.

Contrapõe a autora que a ré só desocupou o locado em 24 de Novembro de 2014, pelo que são devidas as rendas entretanto vencidas e correspondente acréscimo legal.

Na sentença recorrida, considerou-se que apenas eram devidas as rendas vencidas após a autora ter adquirido a propriedade do imóvel onde se situa o locado; ou seja, desde 08 de Março de 2014 e até à desocupação do locado – parte sobre a qual não incidiu recurso, pelo que, está transitada a decisão recorrida, na parte em que decidiu que as rendas só eram devidas à autora, após a data de 08 de Março de 2104 – cf. artigo 635.º, n.º 5, do CPC.

No mais, por se considerar que não se verificou a extinção do contrato de arrendamento, decidiu-se que a autora tinha direito a receber as rendas relativas aos meses correspondentes aos meses de Março a Junho e de Agosto a Novembro de 2014, por reporte à datada desocupação do locado, no valor total de 2.060,32 €, acrescida da quantia de 1.030,€, correspondente a 50% do valor das rendas em dívida, nos termos do artigo 1041.º, n.º 1, do CC.

Como resulta do acima já decidido, entendemos que o contrato se extinguiu/caducou por perda da coisa locada no dia 24 de Julho de 2014, pelo que a partir desta data, não são devidas quaisquer rendas.

Como acima já assinalado, uma das principais obrigações do locador é o de assegurar ao locatário o gozo da coisa locada para os fins a que a mesma se destina – cf. artigo 1031.º, al. b), do CC.

Não se concebe que se continue a usar um edifício cujo telhado ruiu para o exercício das actividades inerentes e indispensáveis de uma escola de ensino da condução.

E, salvo o devido respeito, nem a tal obsta o facto de a ré só ter desocupado o locado em Novembro de 2014.

A contrapartida para o pagamento da renda é o efectivo uso do locado.

Ora, o facto de a desocupação só ter acontecido na data referida não implica que a ré, efectivamente, fruiu, usou o locado. Aliás, em face das condições em que se encontrava o edifício e a tomada de posição da Câmara Municipal das (...) , o normal é que tal uso não tenha acontecido.

Seja como for, entendemos que extinto o contrato nos termos já referidos, não são devidas quaisquer rendas posteriores à data da extinção – 24 de Julho de 2014.

Até esta data, como resulta da matéria de facto descrita nos itens 34.º a 39.º, a partir de Novembro de 2011, estamos perante uma situação de perda parcial do locado, uma vez que a ré ficou impossibilitada de fruir todo o locado, pelo que, tal como decidido na sentença recorrida, se tem de lançar mão do disposto no artigo 793.º, n.º 1, do CC; ou seja, tem a ré direito a ver reduzida a renda na proporção equivalente ao efectivo uso.

Como o locado era composto de sete divisões e apenas uma deixou de pode ser usada, aceita-se que a renda seja reduzida numa sétima parte, como sucedeu na sentença recorrida.

Assim, tem a autora direito a receber as rendas correspondentes ao período de Março a Junho de 2014; ou seja 4 meses.

Atento a que a renda mensal (reduzida) ascende ao montante de 220,74 €, tem a autora direito a receber, a este título, a quantia de 882,96 €, acrescida do montante de 441,48 €, a título de mora, nos termos do disposto no artigo 1041.º, n.º 1, do CC.

Pelo que, quanto a esta questão procede, parcialmente, o recurso.

I. Se o pedido reconvencional formulado pela ré deve proceder na totalidade.

Relativamente a esta questão, defende a ré, ora recorrente, que lhe devem ser pagas todas as quantias que peticiona a título reconvencional.

Como resulta do alegado nos artigos 142.º e seg.s da contestação, são as seguintes as cifras pedidas:

- 312,20 €, a título de benfeitorias que realizou no locado;

- 330,00 €, de despesas relacionadas de planta de localização;

- 246,00 €, de serviços de engenharia e arquitectura;

- 2.941,61 €, despesas com a preparação das novas instalações;

- 251,28 €, despesas de publicidade da nova sede;

- 150,00 €, de vistoria realizada pelo IMT;

- 2.501,98 €, de acréscimo da renda que passou a pagar;

- 23.560,00 €, resultado do prejuízo que sofreu com redução de clientela;

Despesas e prejuízos que alega não teria tido não fora a conduta da autora.

Na sentença recorrida, reconheceu-se à ré o direito a haver da autora, todas estas quantias, com excepção das referentes ao acréscimo da renda, nem a de 23.560,00 €, resultante da diminuição de inscrições.

No que se refere a esta quantia, não se demonstraram os factos em que a ré assenta tal pretensão – cf. alíneas v) a bb), dos factos não provados.

De igual modo, quanto à quantia de 2.501, 98 €, apenas se provou o que consta no item 50.º dos factos provados.

Era à ré que incumbia a prova dos factos correspondentes a tais pedidos, o que a mesma não logrou, o que acarreta a respectiva improcedência – cf. artigo 342.º, n.º 1, do CC.

Para além disto, como referido, peticiona a ré o pagamento da quantia de 312,10 €, a título de benfeitorias que realizou no locado.

 Não se provou que as mesmas tenham sido autorizadas, se bem que tal facto seja irrelevante, porque se trata de benfeitorias, pelo que rege o disposto no artigo 1046.º do CC e não o previsto no seu artigo 1074.º.

A pintura e substituição do pavimento, constituem benfeitorias úteis – cf. artigo 216.º, n.º 1 e n.º 2, 2.ª parte, do CC.

Conforme artigo 1046.º, n.º 1, o locatário é equiparado ao possuidor de má fé quanto a benfeitorias que haja feito na coisa locada.

Rege, assim, o disposto no artigo 1273.º do CC, nos termos do qual, existe o direito ao levantamento das benfeitorias úteis, desde que o possam fazer sem detrimento da coisa; assim não sendo possível, caberá direito a indemnização, calculada segundo as regras do enriquecimento sem causa.

Pressuposto da aplicação deste preceito é, desde logo, que se saiba perante que espécie de benfeitorias estamos e se é possível ou não o levantamento das mesmas, incumbindo ao beneficiário da pretendida indemnização o ónus de provar os respectivos requisitos - nesse sentido, P. de Lima e A. Varela, in Código Civil Anotado, Vol. III, 2.ª Edição Revista e Actualizada (Reimpressão), Coimbra Editora, pág. 42.

Como se refere nos Acórdãos do STJ, de 06 de Fevereiro de 2007, Processo n.º 06A4036 (citado na sentença recorrida) e de 05 de Março de 2009, Processo n.º 08B3677, (ambos disponíveis no respectivo sítio do itij), no caso de indemnização por benfeitorias, incumbe ao autor/requerente alegar e provar, o enriquecimento do réu/requerido, o seu empobrecimento, nexo causal entre um e outro e a falta de causa justificativa daquele enriquecimento.

Tudo isto, só pode resultar da alegação e prova de quais as obras que, em concreto, foram feitas, possibilidade ou impossibilidade do seu levantamento, o que tudo, incumbe ao autor alegar e provar.

Como defendido no Acórdão desta Relação, de 10 de Fevereiro de 2015 (em que o ora Relator interveio como 1.º Adjunto), disponível no mesmo sítio dos anteriores, para ser processualmente reconhecido um crédito por benfeitorias têm que estar alegados e provados elementos factuais que as permitam classificar como necessárias ou úteis; o custo de cada uma delas, o valor que cada uma delas acrescentou à coisa e a medida do seu benefício na data da entrega.

Ora, a ré nada disto alegou, limitando-se a referir que efectuou diversos trabalhos de pintura e de substituição do pavimento do locado, o que nos impossibilita de aferir da existência dos demais requisitos enumerados no artigo 1273.º do Código Civil, designadamente, sobre a possibilidade/impossibilidade de levantamento ou a medida do enriquecimento do beneficiário das mesmas.

Uma vez que, como já referido, se trata dos factos constitutivos do direito a que se arroga a ré, nos termos do disposto no artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, tem tal pedido de improceder.

Pelo que, quanto a esta questão, improcede o recurso.

Nestes termos se decide:      

Julgar parcialmente procedentes os presentes recursos de apelação, em função do que se revoga, parcialmente, a decisão recorrida, nos seguintes termos:

- declara-se a caducidade do contrato de arrendamento sub judice por perda da coisa locada, ocorrida em 24 de Julho de 2014;

- remete-se para liquidação, a quantia que a autora tem direito a receber da ré, correspondente à substituição da instalação eléctrica existente no locado, tendo como limite superior a quantia de 3.125,00 € (três mil cento e vinte e cinco euros);

- a ré tem a pagar à autora a quantia de 882,86 € (oitocentos e oitenta e dois euros e oitenta e seis cêntimos), de rendas em dívida, acrescida da quantia de 441,48 € (quatrocentos e quarenta e um euros e quarenta e oito cêntimos), a título de indemnização moratória;

Mantendo-a quanto ao mais.

Custas da acção a suportar pela apelante e pela apelada, na proporção de 2/3 e 1/3, respectivamente, em ambas as instâncias.

Custas da reconvenção, igualmente, em ambas as instâncias, por apelante e apelada, na proporção dos respectivos decaimentos (dado que se trata de quantias pecuniárias certas e já determinadas, bastando para a elaboração da conta a comparação entre o pedido e a medida da respectiva procedência).

Coimbra, 07 de Novembro de 2017.