Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
729/06.0TBILH-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ISAÍAS PÁDUA
Descritores: AVAL CAMBIÁRIO
RESPONSABILIDADE
AVALISTA
Data do Acordão: 07/08/2008
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE ÍLHAVO – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 30º A 32º E 47º DA LULL
Sumário: I – Pode definir-se o “aval” como um acto pelo qual um terceiro ou um signatário de uma letra ou livrança garante o pagamento desse título por parte de um dos seus subscritores (garante ou cauciona a obrigação de certo obrigado cambiário).

II – O aval é também um verdadeiro acto cambiário, origem de uma obrigação autónoma, pelo que o dador do aval não se limita a responsabilizar-se pela pessoa por honra de quem presta o aval, mas assume também a responsabilidade abstracta/objectiva pelo pagamento da livrança –o aval é incondicionável.

III – Nos termos do artº 47º da LULL, os sacadores, aceitantes, endossantes ou avalistas de uma letra ou livrança são todos solidariamente responsáveis para com o portador, tendo este o direito de accionar todas essas pessoas, individualmente ou colectivamente, sem estar adstrito a observar a ordem porque eles se obrigaram.

IV – Da conjugação de tais normativos resulta, antes de mais, que o avalista fica na situação de devedor cambiário perante aquele portador/beneficiário em face do qual o avalizado é responsável e na mesma medida em que ele o seja.

V – O facto de o exequente não ter ido ao processo de falência de uma sociedade subscritora ou aceitante de uma letra ou livrança (dada à execução) reclamar o seu crédito sobre essa sociedade em nada belisca o seu direito de procurar obter a satisfação integral desse crédito junto das pessoas que avalizam o cumprimento da obrigação contraída por aquela, quer demandando-as individualmente, quer colectivamente, e independentemente de respeitar a ordem pela qual se obrigaram.

Decisão Texto Integral: Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra
I- Relatório
1. No 1º juízo do tribunal Comarca de Ílhavo, autuado sob o nº 729/06.0TBILH, corre termos o processo de execução comum, para pagamento de quantia certa, instaurado pela exequente, A..., contra os executados, B..., C... e D..., tendo por base, e como títulos executivos, 4 livranças que os últimos avalizaram a favor da sociedade subscritora das mesmas (E...).

2. Na sequência da citação que foi ordenada para o efeito, veio aquele primeiro executado, B..., deduzir oposição a tal execução, a qual, em síntese e no essencial, fundamentou no seguinte:
Que as referidas livranças e avais nelas apostas destinavam-se a garantir o pagamento dos compromissos assumidos pela sociedade subscritora das mesmas na sequência de vários contratos de leasing que (na qualidade de locatária) celebrou com a exequente.
Livranças essas que foram entregues em branco à exequente, contendo apenas as assinaturas da sociedade sua subscritora e dos avalistas.
Que o preenchimento de tais livranças veio, todavia, a ser feito de forma abusiva pela ora exequente.
Por outro lado, a referida sociedade subscritora de tais livranças faliu (muito antes da instauração da execução), sem que, todavia, a exequente tivesse ido ao respectivo processo reclamar o respectivo crédito (não obstante ter sido notificada para o efeito), sendo que se o tivesse feito podia ter sido tal crédito ali total ou parcialmente satisfeito e, consequentemente, não teria a exequente necessidade de executar as referidas livranças ou, então, tê-lo-ia feito por montantes inferiores àqueles pelos quais as titulou e tanto mais que elas eram uma garantia do pagamento de uma obrigação principal.
Pelo que terminou pedindo a extinção da instância executiva.

3. A exequente contestou tal oposição, contraditando e rebatendo a versão factual e argumentação jurídica do oponente, negando nomeadamente qualquer preenchimento abusivo de tais títulos, concluindo pela validade dos mesmos e pela responsabilidade do opoente na pagamento da quantia exequenda à luz do aval que neles apôs.
Pelo que terminou pedindo a improcedência da oposição.

4. Na audiência preliminar que foi designada, foi ali elaborado o despacho saneador, onde se afirmou a validade e a regularidade da instância, após o que se procedeu à condensação da matéria de facto.

5. Mais tarde, teve lugar a realização do julgamento – com a gravação da audiência.

6. Seguiu-se a prolação da sentença que, a final, julgou procedente a oposição, declarando nulos os títulos executivos, determinando, consequentemente, extinta a execução.

7. Não se tendo conformado com tal decisão, a exequente dela interpôs recurso, o qual foi recebido como apelação.

8.Nas respectivas alegações de recurso que apresentou, a exequente/apelante concluiu as mesmas, no seguintes termos:
[…]
9. Não foram apresentadas contra-alegações.

10. Corridos que foram os vistos legais, cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.
***
II- Fundamentação
A) De facto.
Pelo tribunal da 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos (cuja ordem de descrição se respeita integralmente):
1. Mostram-se juntas aos autos de execução quatro livranças subscritas por E... e avalizadas, além de outros, pelo opoente, cujo teor se dá por reproduzido.
2. A empresa subscritora das livranças foi declarada falida em processo que, com o número 170/03.6 TBILH do 2º juízo, correu termos neste Tribunal, não tendo a exequente, nesse processo reclamado créditos.
3. Pela 3ª secção da 12ª Vara Cível de Lisboa, com o número 175/06.5 TVLSB correu termos um processo em que a ora exequente demandou a subscritora das livranças para que esta fosse condenada a restituir os equipamentos locados e a pagar uma indemnização pela mora na restituição, acrescida de juros, tendo havido condenação no pedido, conforme sentença junta a folhas 17 e seguintes, cujo teor se dá por reproduzido.
4. A acção nº 175/06.5 TVLSB, supra referida, foi precedida de providência cautelar de entrega judicial de bens que correu termos pela 2ª Secção da 12ª Vara Cível de Lisboa sob o número 6218/05.2 TVLSB.
5. As livranças supra referidas foram entregues em branco, apenas assinadas pelos avalistas e subscritores para garantia e segurança do cumprimento de obrigações assumidas em contrato de locação financeira juntos como documentos 2, 5, 8 e 11 com a contestação à oposição, cujo teor se dá por reproduzido.
6. O preenchimento das livranças foi precedido de autorização concedida pelos avalistas nos termos constantes de folhas 141 a 144 e após o envio das cartas juntas aos autos a fls. 145 e seguintes.
7. O opoente não recebeu as cartas juntas a folhas 149, 150, 157 e 158, 163, 164, 173 e 174.
8. Em 30.04.2001, 02.05.2001 e 31.05.2001 foram dadas à exequente as autorizações de preenchimento das livranças, conforme documentos 4 a 17, a folhas 141 e seguintes.
9. A exequente preencheu as livranças com os valores correspondentes às rendas vencidas e não pagas dos contratos a que respeitavam, acrescidos de juros moratórios calculados à taxa de juro comercial desde a data do vencimento das respectivas responsabilidades até à data de vencimento das livranças de 30.01.2006.
10. A exequente enviou aos avalistas e nomeadamente ao opoente as cartas juntas aos autos a folhas 145 e seguintes.
11. As cartas foram enviadas para a morada fornecida aquando da autorização de preenchimento.
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B) De direito.
1. Delimitação do objecto do recurso.
Como é sabido - num entendimento que hoje se mostra pacífico - é pelas conclusões das alegações dos recursos que se fixa e delimita o seu objecto (cfr. artºs 684, nº 3, e 690, nº 1, do CPC, na versão anterior à dada pelo DL nº 303/2007 de 24/8 - e aqui aplicável nos termos e por força do disposto nos artºs 11, nº 1, e 12, nº 1, desse DL – e à qual se referirão os demais normativos de tal diploma que adiante venham a ser indicados).
1.1 Ora, calcorreando as conclusões do presente recurso, verifica-se que as questões que importa aqui apreciar e decidir são, essencialmente, as seguintes:
a) Da nulidade da sentença.
b) Do erro de julgamento de direito, isto é, da incorrecta subsunção do direito aos factos.
***
2. Quanto à 1ª questão.
Da nulidade da sentença.
2.1 Defende a apelante que a sentença recorrida é nula, por um duplo fundamento, ou seja, por violação quer do disposto na al. b) do artº 668, do CPC, que do disposto na alínea d) dessa mesmo normativo legal.
O artº 668 configura, nas diversas alíneas do seu nº 1, várias situações que podem levar à nulidade da sentença (embora no bom rigor jurídico - e como bem salienta o prof. Lebre de Freitas, in “Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 2ª vol. 2º, pág. 669 – se tratem mais de causas de anulabilidade - da decisão viciada - do que de nulidade da mesma).
É sabido que qualquer das situações ali previstas capazes de conduzir à nulidade sentença têm a ver com vícios estruturais e intrínsecos de que padece a própria sentença.
2.1.1 Da violação da alínea b) do nº 1 do citado artº 668.

Nos termos de tal normativo “é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”.

Vem sendo dominantemente entendido pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores que esse vício (de nulidade de sentença) só ocorre quando houver falta absoluta ou total de fundamentos ou de motivação (de facto ou de direito em que assenta a decisão), e já não quando essa fundamentação ou motivação for deficiente, insuficiente, medíocre ou até errada. Essa fundamentação porventura deficiente, incompleta ou até errada poderá afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas nunca poderá, assim, determinar a sua nulidade. (Neste sentido vidé, por todos, Ac. do STJ de 19/03/02, in “Rev. Nº 537/02-2ª Sec., Sumários, 03/02”; Acs. da RC de 10/02/2004 e de 16/5/2000 in “www.dgsi.pt/jtrc”; Ac. do STJ de 13/01/00, in “Sumários, 37-34”; Ac. RLx de 01/07/99, in “BMJ 489-396” e Ac. do STJ de 22/01/98, in “BMJ 473-427”).

Ora, calcorreando a sentença da 1ª instância não se vislumbra, que a mesma enferme, no caso em apreço, de absoluta falta de fundamentação. Na verdade, basta uma singela leitura da mesma para observar que ela se encontra devidamente fundamentada (quer em termos de facto, quer em termos de direito). Se o está bem ou de forma deficiente ou até errada (nomeadamente ao nível da fundamentação de direito) isso já serão “contas de outro rosário; isto é, tal terá a ver com outra questão que mais adiante abordaremos, o que não se lhe pode, a nosso ver, é apontar o vício de falta de fundamentação.

2.1.2 Da violação do disposto na al. d) do citado artº 668.
Nos termos do disposto de tal normativo “é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
No 1º seguemento de tal normativo configura-se a “chamada omissão de pronúncia”, enquanto que no 2º seguemento se configura o chamado “excesso de pronúncia”.
Normativo esse que se encontra em conexão com o disposto no artº 660, nº 2, do CPC.

É sabido que a causa de nulidade prevista na 1ª parte de tal normativo (por “omissão de pronúncia”), se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no nº 2 do artº 660 do CPC, que é o de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

Constituiu hoje entendimento pacífico que as “questões” referidas no 1º normativo acima citado são as respeitantes ao pedido, à causa do pedir ou às excepções invocadas. Na verdade, vem sendo dominantemente entendido, que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir ou as excepções aduzidas. Tal vício só ocorre, assim, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre as “questões” pelas partes submetidas aos seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente (vidé a propósito, e por todos, o prof. Lebre de Freitas, in “Ob. cit. pág. 670”; Ac. do STJ de 02/10/2003, in “Rec. Rev. nº 2585/03 – 2ª sec.”; Ac. do STJ de 02/10/2003, in “Rec. Agravo nº 480/03 – 7ª sec.” e Ac. do STJ de 22/1/98, in “BMJ 473 – 427”).
Por sua vez, a conexão do seguemento de tal normativo com o referido nº 2 do também citado artº 660 ocorre na parte em que este último dispõe que o juiz não pode ocupar-se senão de questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir o conhecimento oficioso de outras.
Ora, calcorreando a sentença recorrida, não vislumbramos (e salvo sempre do devido respeito por opinião contrário) que padeça de nenhum dos aludidos vícios, quer de omissão quer de excesso pronúncia, ou seja, de acordo com os respectivos conceitos que atrás deixámos exarados, a srª juiz a quo conheceu das questões que lhe foram submetidas a apreciação pelas partes (as quais, no essencial, tinham a ver com aquilo que logo no início se deixou retratado) e sem que tenha extravasado esse âmbito.
E sendo assim, e sem necessidade de outras considerações, é, desde logo, de concluir não a padecer a sentença de nenhum daquele apontados vícios de nulidade.


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3. Quanto à 2ª questão.
Do erro de julgamento de direito, isto é, da incorrecta subsunção do direito aos factos feita pelo tribunal a quo.
Na sentença recorrida, depois de ter julgado (e bem, face aos factos apurados e ao direito aplicável ao caso) improcedente a excepção de preenchimento abusivo das livranças dadas à execução, a srª juiz a quo acabou, todavia, por julgar procedente a oposição, por ter considerado serem nulos aquele títulos executivos, por indeterminação do seu montante.
Conclusão essa que, no essencial, radicou no seguinte raciocino argumentativo:
A exequente não foi, como devia e podia, ao processo em que foi declarada a falência da sociedade subscritora daquelas livranças reclamar o seu crédito, por forma a poder concorrer, assim, à execução universal dos bens da falida. Situação essa com a qual, aliás, poderiam legitimamente estar a contar os seus avalistas.
Se o tivesse feito poderia não ser necessário executar as livranças com os montantes nelas apostos, ou seja, a exequente poderia ter preenchido as mesmas por valores inferiores àqueles que delas constam.
Ora, tal situação é geradora de uma indeterminação do montante (em dívida), motivo esse bastante para determinar a nulidade das livranças, sendo certa ainda que quando as mesmas foram preenchidas não se encontravam ainda sequer esgotados todos os meios para a exequente resolver a situação.
Contra tal decisão, e respectiva fundamentação, insurge-se a apelante.
Apreciemos.
Já acima deixámos expresso que o opoente/executado foi demandado na qualidade de avalista da sociedade subscritora das livranças dada à execução. Estamos perante aquilo que se designa por aval colectivo (já que para além do opoente as letras dadas à execução encontram-se também avalizadas por mais duas pessoas, precisamente os outros dois co-executados).
A figura ao aval encontra-se, no essencial, regulada nos artigos 30 a 32 da LULL.

Tais dispositivos (especificamente previstos para as letras de câmbio) são aplicáveis às livranças por força do disposto no artº 77 – fine – daquele diploma legal.

Ora, resumidamente, pode-se definir o aval como um acto pelo qual um terceiro ou um signatário de uma livrança (neste caso) garante o pagamento da livrança por parte de um dos seus subscritores.

Assim, a sua função específica ou fim próprio é garantir ou caucionar a obrigação de certo obrigado cambiário; sendo essa responsabilidade de garantia primária.

Aval que, desse modo, se apresenta como uma garantia cambiária, e que se destina a garantir ou a caucionar o seu pagamento.

O aval é também um verdadeiro acto cambiário, origem de uma obrigação autónoma. E isso significa que o dador do aval não se limita a responsabilizar-se pela pessoa por honra de quem presta o aval; assume também a responsabilidade abstracta/objectiva pelo pagamento da livrança.

É também sabido, até por força dos princípios acima exarados, que o aval é incondicionável.

Dispõe o artº 32 da LULL “que o dador do aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada. A sua obrigação mantém-se, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma”.

Por outro lado, nos termos disposto no artº 47 daquela Lei (aplicável também às livranças, por força do disposto do já citado artº 77), os sacadores, aceitantes, endossantes ou avalistas de uma letra são todos solidariamente responsáveis para com o portador, tendo este o direito de accionar todas essas pessoas, individualmente ou colectivamente, sem estar adstrito a observar a ordem porque eles se obrigaram.

Da conjugação de tais normativos, resulta, antes de tudo, que o avalista fica na situação de devedor cambiário perante aquele portador/beneficiário em face do qual o avalizado é responsável, e na mesma medida em que ele o seja.

Tal como vem constituindo hoje entendimento dominante, também dali resulta que se, por um lado, essa responsabilidade é solidária com a do avalizado - e não subsidiária ou sequer acessória do mesmo -, já, por outro, essa responsabilidade é própria, autónoma e independente da do avalizado, de tal modo que ela se mantém mesmo que a obrigação deste último seja considerada nula (por motivos que nada a tenham a ver com vícios de forma). Muito embora apresentem alguns similitudes, todavia, o regime do aval é juridicamente diferente do regime da fiança e de tal modo que o avalista, ao contrário do fiador, não goza do benefício de excussão prévia (dos bens do avalizado).

Retratando, aliás, tal realidade jurídica, escrevia, a propósito, o saudoso Mestre, prof. Ferrer Correia (in “Lições de Direito Comercial, Vol. III, Letra de Câmbio, Universidade de Coimbra, 1975, pág. 215”) que “é bom frisar que a responsabilidade do avalista não é subsidiária da do avalizado. Trata-se de uma responsabilidade solidária. O avalista não goza do benefício de excussão prévia, mas responde pelo pagamento da letra solidariamente com os demais subscritores (cfr. artº 47, I). Além de não ser subsidiária, a obrigação do avalista não é, senão imperfeitamente, uma obrigação acessória relativamente à do avalizado. Trata-se de uma obrigação materialmente autónoma, embora dependente da última quanto ao aspecto formal”.

No mesmo sentido vidé ainda, entre muitos outros, Acs. do STJ de 4/3/2008 (págs. 12); de 17/4/2008 (pág. 9); de 15/11/2007 (pág. 8); de 23/9/2003 (págs. 2 e 3), de 28/5/95 (o qual deu então origem ao assento que fixou a doutrina no sentido a prescrição da obrigação cambiária contra o subscritor de uma livrança não produz efeito em relação ao respectivo avalista), todos publicados e disponíveis www.dgsi.pt/jstj, e ainda Paulo Sendin e Evaristo Mendes, in “A Natureza do Aval e a Questão da Necessidade ou não de Protesto para Accionar o Avalista, págs. 27 a 45”.

Ora, perante os normativos atrás citados e os princípios de que deles emergem, afigura-se-nos (e salvaguardado sempre o devido respeito) ser manifesta a falta de fundamento legal em que assentou a sobredita decisão da srª juiz a quo.
O facto de a exequente não ter ido ao processo de falência reclamar o seu crédito - numa tentativa de obter a satisfação integral ou parcial do mesmo, e através da submissão ao concurso da execução universal do património da falida -, que tinha sobre a sociedade subscritora das livranças ora dadas à execução, em nada belisca (quer em termos de preclusão, quer em termos de limitação ou inibição) o seu direito de procurar obter a satisfação integral desse crédito junto das pessoas que avalizaram o cumprimento obrigação contraída por aquela, quer demandando-as individual, quer colectivamente, e independentemente de respeitar a ordem pela qual se obrigaram. Os princípios da responsabilidade solidária do avalista (e não subsidiária) para com a sociedade avalizada - respondendo aquele na exacta medida da responsabilidade da última -, da autonomia e independência das obrigações, assim o impõem.
Não gozando, por outro lado, o avalista do benefício da excussão prévia (previsto no artº 628 do CC para os fiadores), também não faz sentido afirmar-se que não foram esgotados todos os (outros) meios para a exequente/portadora resolver a situação, nomeadamente procurando ressarcir-se através do património da subscritora das livranças dadas à execução, como não faz, assim, sentido falar-se nas legítimas expectativas dos avalistas para que tal sucedesse, por carecerem de suporte legal.
Ao não ter ido reclamar o seu crédito ao aludido processo onde foi decretada a falência da subscritora das livranças, tal apenas terá como consequência para a exequente uma diminuição das possibilidades de ver satisfeito o seu crédito, tendo sido eliminado um dos “elos” da cadeia de garantes do mesmo.
E daí as dificuldades em entender a conclusão a que chegou a srª juiz a quo no sentido de considerar tais livranças nulas, e nomeadamente por indeterminação do seu montante.
Nesses termos, e não se vislumbrando – perante a matéria factual que foi dada como assente na 1ª instância (que não foi objecto de impugnação) – qualquer outro obstáculo legal que impeça a execução de prosseguir os seus ulteriores trâmites, ter-se-á, assim, de julgar improcedente a presente oposição, revogando-se, nessa medida, a sentença recorrida, dando-se, desse modo, provimento ao recurso.

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III- Decisão
Assim, em face do exposto, acorda-se, no provimento do recurso, em revogar a sentença da 1ª instância, julgando-se improcedente a oposição e ordenar, em consequência, que a execução prossiga os seus ulteriores trâmites legais.
Custas (em ambas instâncias) pelo executado/opoente (artº 446, nºs 1 e 2, do CPC).

Coimbra, 2008/07/08