Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
242/13.9TBSRT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: VASQUES OSÓRIO
Descritores: CIRCULAÇÃO
VEÍCULO
POLÍCIA
URGÊNCIA
CLÁUSULA
EXCLUSÃO DA ILICITUDE
Data do Acordão: 11/27/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE TRIBUNAL JUDICIAL DA SERTÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGO 64º DO CÓDIGO DA ESTRADA
Sumário: 1.- Como decorre da epígrafe do artigo 64º do Código da Estrada, este não regula o trânsito de veículos em missão de polícia, mas o trânsito de veículos em serviço de urgência.

2.- A circunstância de um veículo circular em missão de polícia não significa, por si só, que transita em serviço de urgência. Para que assim seja, e possa atuar a cláusula de exclusão da ilicitude prevista no referido preceito é necessário, em primeiro lugar, que a natureza da missão, pela sua urgência e relevância, o exija e, em segundo lugar, que a marcha urgente seja devidamente assinalada, seja por avisadores sonoros e luminosos seja, caso aqueles não existam, por sinais de luzes e sinais sonoros.

Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra


I. RELATÓRIO


Por decisão de 22 de Março de 2011, da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, foi o arguido A..., com os demais sinais nos autos, condenado pela prática de uma contra-ordenação muito grave, p. e p. pelos arts. 27º, nºs 1 e 2, a), 133º, 138º, 143º, 146º e 147º, nº 2, todos do C. da Estrada, na sanção acessória de inibição de conduzir, pelo período de cento e vinte dias. 

Inconformado com a decisão administrativa, o arguido interpôs recurso de impugnação judicial o qual, por sentença de 4 de Julho de 2013, foi julgado improcedente.
           
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            De novo inconformado com a decisão, recorre o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões:
            “ (…).
            1º No requerimento de impugnação da decisão administrativa apresentado em juízo, o arguido, entre outros, alegou que: "nas circunstâncias de tempo e lugar descritas no auto de contra-ordenação e na decisão administrativa se encontrava numa missão de polícia, dirigindo-se a um encontro operacional compreendido numa investigação naquela altura."
2º Realizado Julgamento com formalismo legalmente previsto veio o Tribunal de primeira instância a dar como factos assentes nos pontos 1, 2 e 5 dos factos provados que:
3. No dia 24.09.2010, pelas 11h09, o arguido/recorrente circulava ao volante do veículo de matrícula (...), na EN 241, ao Km. 29,1 – Moitas, Proença-a-Nova, imprimindo aquele uma velocidade de, pelo menos, 106 Km/h
4. No referido local a velocidade máxima permitida era de 50 Km/h
6. À data dos factos, o arguido exercia funções na Brigada da Região Centro da Unidade Central de Investigação e Fiscalização e dirigia-se naquele momento a um encontro operacional no âmbito de uma investigação que se encontrava a realizar".
3° Por douta decisão proferida nos presentes autos, julgou-se que o arguido praticou factos que "constituem um ilícito contra-ordenacional classificado como grave p.p. nos artigos 27°, nº 1 e 2 alínea a) 3º e 146 alínea i) do Código da Estrada" e assim mantendo-se a coima fixada na decisão administrativa, que de resto não foi objecto de impugnação, condenou-se o arguido ora recorrente "na sanção de inibição de conduzir pelo período de 120 dias, conforme fixado na decisão recorrida."
4º O arguido apesar de muito respeitar a decisão tomada, com ela não se conforma, porque a decisão não apreciou a seu pedido, não se pronunciou se o arguido desenvolvia uma missão de polícia e se por tal circunstância se encontrava isento de culpabilização pelo seu comportamento.
5º Com efeito como supra se referiu encontra-se provado nos presentes autos que o arguido exercia funções na Brigada da Região Centro da Unidade Central de Investigação e Fiscalização da ASAE e estava a desenvolver uma Investigação num local para onde se deslocava.
                6º O arguido praticou os factos na sua qualidade profissional, porque se encontrava em deslocação de serviço, o que salvo melhor e mais sabia opinião demonstra que o arguido se encontrava numa missão de polícia.
7º Pelo que haveria a douta sentença de se pronunciar quanto à causa de exclusão de ilicitude que prevê o citado artigo 64,º n.º 1 do Código da Estrada invocada no requerimento de impugnação judicial deduzido peio arguido recorrente, aplicando-o ao caso dos autos, o que não ocorreu, o que salvo o devido respeito, além de constituir flagrante violação de tal preceito legal, dita ainda a nulidade da decisão por força do estipulado no artigo 379 n.º 1 alínea c) do Código de Processo Penal.
Termos em que, E nos melhores de direito, que V. Exas. doutamente suprirão, deve a Veneranda Relação, dar provimento ao recurso ora interposto, decretando a final a revogação da decisão proferida, substituindo-a por outra em que se absolva o arguido da sanção acessória que lhe foi aplicada, fazendo-se deste modo a costuma, inteira e sã Justiça!
            (…)”.

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            Respondeu a Digna Magistrada do Ministério Público, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões:
            “ (…).
            1. No recurso de impugnação que apresentou o arguido apenas pediu que fosse apreciada a questão da eventual suspensão da sanção de inibição de condução em que foi condenado.
2. Da decisão recorrida decorre que o tribunal a quo não considerou justificada a conduta do arguido.
3. In casu, não se verifica a causa de exclusão da ilicitude prevista no artigo 64º, nº 1, do Código da Estrada.
4. A decisão recorrida não violou qualquer imperativo legal.
Deste modo, a decisão recorrida não merece qualquer reparo, devendo ser mantida na íntegra e, consequentemente, deve ser negado provimento ao recurso interposto pelo arguido recorrente, assim se fazendo JUSTIÇA!
            (…)”.

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Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, acompanhando a argumentação do Ministério Público junto da 1ª instância, e concluiu pelo não provimento do recurso.

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            Foi cumprido o art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal.
           
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

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II. FUNDAMENTAÇÃO


            Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. As conclusões constituem pois, o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.
Assim, tendo em consideração a limitação dos poderes de cognição do tribunal de recurso no âmbito do direito de mera ordenação social, imposta pelo art. 75º, nº 1 do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas [RGCOC], a única questão a decidir, atentas as conclusões apresentadas pelo recorrente é a de saber se a sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia.

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            Para a resolução desta questão importa ter presente o seguinte:

            A) No recurso de impugnação judicial de fls. 11 a 15 foram formuladas as seguintes conclusões:
            “ (…).
            1. O Arguido é Inspector da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), sendo que, no dia 24 de Setembro, pelas 11h10, transitava na viatura (...) em missão de polícia, conforme o art.º 64 do Código da Estrada;
                2. O Arguido excedeu a velocidade ao conduzir o veículo por razões relacionadas com a sua profissão, justificada pelas funções que desempenha;
                3. Sendo certo que houve negligência por parte do Arguido, e que a mesma deve ser sancionada, deve atender-se que face às circunstâncias concretas supra descritas que a negligência foi inconsciente, o que deverá contribuir para uma redução da medida da sanção.
                4. Por outro lado, Arguido no exercício das suas funções profissionais, necessita de utilizar diariamente o seu veículo, pelo que a aplicação da sanção acessória de inibição de conduzir, resulta consequências danosas para a sua vida profissional, desde logo porque o impedem de realizar o seu trabalho. 
                Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exa. Doutamente suprirá, Requer a V. Exa., ao abrigo do art. 141º do Código da Estrada, se digne determinar a suspensão da sanção de inibição de conduzir aplicada ao arguido, com prestação de caução de boa conduta se assim considerar necessário.
            (…)”.

            B) Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
            “ (…).
            1. No dia 24.09.2010, pelas 11h09, o arguido/recorrente circulava ao volante do veículo automóvel de matrícula (...), na EN 241, ao Km. 29,1 – Moitas, Proença-a-Nova, imprimindo àquele uma velocidade de, pelo menos, 106 km/h.
2. No local referido em A a velocidade máxima permitida era de 50 km/h.
3. Ao actuar da forma descrita, o arguido não agiu com o cuidado a que estava obrigado e de que era capaz, enquanto condutor.
4. Nos cinco anos anteriores à prática dos factos referidos em 1, o arguido foi sancionado, no âmbito do processo n.º 256252165, pela prática de uma contra-ordenação grave.
[Do recurso de impugnação judicial:]
                5. À data dos factos, o arguido exercia funções na Brigada da Região Centro da Unidade Central de Investigação e Fiscalização e dirigia-se naquele momento a um encontro operacional no âmbito de uma investigação que se encontrava a realizar.
            (…)”.

            E dela consta a seguinte fundamentação de direito:
            “ (…).
            O arguido/recorrente vem acusado da prática de uma contra-ordenação prevista pelos artigos 27.º, 138.º e 146.º c) e 147.º n.º 1 e 2 do Código da Estrada, tendo-lhe sido aplicada uma coima de € 300,00 e uma sanção de inibição de conduzir por 120 dias.
Dispõe o artigo 27.º n.º 1 do Código da Estrada, aprovado pelo DL n.º 114/94, de 3.05, na versão vigente à data da prática dos factos, que sem prejuízo do disposto nos artigos 24.º e 25. º e de limites inferiores que lhes sejam impostos, nas vias públicas dentro das localidades, os condutores de automóveis ligeiros não podem exceder a velocidade de 50 km/h, acrescentando, por sua vez, o n.º 2 que quem conduzir automóvel ligeiro ou motociclo e exceder os limites máximos de velocidade é sancionado com uma coima de € 300 a € 1500, se exceder em mais de 40 km/h e até 60 km/h, dentro das localidades.
Os factos praticados pelo arguido constituem um ilícito contra-ordenacional classificado como grave, previsto e punido nos artigos 27.º n.º 1 e 2 a) 3.º e 146.º i) do Código da Estrada.
Tratando-se de uma contra-ordenação muito grave, a sua prática é sancionada com a aplicação de uma coima e ainda com a aplicação de uma sanção acessória de inibição de conduzir de duração mínima de 2 meses e máxima de 2 anos, tudo nos termos do disposto nos artigos 138.º e 147.º n.º 1 e 2 do referido diploma legal, cujas medidas concretas hão-de ser encontradas segundo os critérios estabelecidos no artigo 139.º, nomeadamente em função da gravidade da contra-ordenação e da culpa, tendo ainda em conta os antecedentes do infractor.
Porém, o arguido vem acusado como reincidente, nos termos previstos no artigo 143.º do C.E., onde se dispõe que é sancionado como reincidente o infractor que cometa contra-ordenação cominada com sanção acessória, depois de ter sido condenado por outra contra-ordenação ao mesmo diploma legal ou seus regulamentos, praticada há menos de cinco anos e também sancionada com sanção acessória. No caso de reincidência, estabelece o n.º 3 daquele artigo, que os limites mínimos de duração da sanção acessória previstos para a respectiva contra-ordenação são elevados para o dobro.
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No caso concreto, resulta da factualidade provada que o arguido/recorrente circulava na EN 241, ao Km. 29,1 – Moitas, Proença-a-Nova, a uma velocidade de, pelo menos, 106 km/h, sendo que a velocidade máxima permitida naquele local era de 50 km/h, não tendo agido com o cuidado que lhe era imposto e de que era capaz nas circunstâncias em causa.
Pelo que cometeu assim a contra-ordenação prevista no artigo 27.º n.º 1 e 2 a) 3.º do Código da Estrada que é classificada como muito grave nos termos do artigo 146.º i) do mesmo diploma.
                111.2 - Determinação da sanção acessória de inibição de conduzir
A contra-ordenação praticada pelo arguido/recorrente é punida, nos termos previstos no artigo 27.º n.º 2 a) 3.º com uma coima de € 300,00 a € 1500,00 e, face à usa reincidência, com uma sanção acessória de inibição de conduzir entre 4 meses e 4 anos, nos termos previstos nos artigos 138.º, 143.º n.º 3 e 147.º n.º 1 e 2 do C.E.
Não estando em causa a sindicância da coima aplicada, importa apenas atentar na justeza da medida da sanção acessória e na possibilidade de a sua execução ser suspensa.
A este propósito rege o artigo 139.º n.º 1 do C.E. que a medida e o regime de execução da sanção determinam-se em função da gravidade da contra-ordenação e da culpa, tendo ainda em conta os antecedentes do infractor relativamente ao diploma legal infringido ou aos seus regulamentos, acrescentando o n.º 3 que quando a contra-ordenação for praticada no exercício da condução, além dos critérios referidos no número anterior, deve atender-se, como circunstância agravante, aos especiais deveres de cuidado que recaem sobre o condutor, designadamente quando este conduza veículos de socorro ou de serviço urgente, de transporte colectivo de crianças, táxis, pesados de passageiros ou de mercadorias, ou de transporte de mercadorias perigosas.
No caso sub judice, a contra-ordenação cometida pelo arguido/recorrente é classificada como muito grave e é já a segunda vez que aquele comete uma infracção rodoviária, embora a valoração da reincidência esteja já, neste caso, ínsita nos limites da moldura abstracta (elevados ao dobro).
Por seu lado, a culpa do arguido/recorrente afigura-se-nos ser de grau médio, contribuindo apenas para a atenuar o facto de se dirigir a uma diligência de investigação no âmbito das suas funções.
Finalmente, da conduta do arguido/recorrente não resultou qualquer perigo concreto para terceiros, nem qualquer outra consequência no âmbito da circulação rodoviária.
Pelo que, ponderando todos estes factores, julga-se adequada a aplicação da sanção de inibição de conduzir pelo período de 120 dias, conforme fixado na decisão recorrida.
(…)”. 

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            Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia

            1. A sentença é nula quando, além do mais, deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar – omissão de pronúncia – ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento – excesso de pronúncia (art. 379º, nº 1, c), do C. Processo Penal). Na parte que releva para os autos, se a sentença ignorou um aspecto sobre o qual se deveria ter pronunciado, enferma de omissão de pronúncia.
No entanto, não é uma qualquer omissão que releva para este efeito. O aspecto omitido terá sempre que ter por objecto uma concreta questão, de facto ou de direito, relevantemente relacionada com o objecto do processo que, quando não seja de conhecimento oficioso, tenha sido suscitada por qualquer interveniente processual. Isto significa que o tribunal não tem que se pronunciar sobre meros argumentos ou teorias, como também não tem que se pronunciar sobre todas as questões que, em abstracto, podem equacionar-se em cada caso.
Posto isto.

2. Alega o recorrente que a sentença não se pronunciou sobre se a conduta que determinou a sua condenação se inseria numa missão de polícia e se essa circunstância, e nos termos do art. 64º do C. da Estrada, se encontrava isento de culpabilização pelo seu comportamento, padecendo por isso da nulidade prevista no art. 379º, nº 1, c), do C. Processo Penal.
            Vejamos então se lhe assiste ou não razão.

2.1. No recurso de impugnação judicial afirma-se, na sua conclusão 1, que o arguido, inspector da ASAE, no dia 24 de Setembro [de 2010], pelas 11h10, transitava no veículo (...) em missão de polícia, conforme art. 64º do C. da Estrada. Ou seja, no essencial, o que o arguido diz é que a conduta que levou a autoridade administrativa a concluir pela verificação da contra-ordenação, tinha por si sido levada a cabo em missão de polícia, conforme o art. 64º do C. da Estrada.

Dispõe o art. 64º do C. da Estrada, com a epígrafe, «Trânsito de veículos em serviço de urgência», na parte relevante:
1 – Os condutores de veículos que transitem em missão de polícia, de prestação de socorro ou de serviço urgente de interesse público assinalando adequadamente a sua marcha podem, quando a sua missão o exigir, deixar de observar as regras e os sinais de trânsito, mas devem respeitar as ordens dos agentes reguladores do trânsito.
2 – Os referidos condutores não podem, porém, em circunstância alguma, pôr em perigo os demais utentes da via, sendo, designadamente, obrigados a suspender a sua marcha:
a) Perante o sinal luminoso vermelho de regulação de trânsito, embora possam prosseguir, depois de tomadas as devidas precauções, sem esperar que a sinalização mude;
b) Perante o sinal de paragem obrigatória em cruzamento ou entroncamento.,
3 – A marcha urgente deve ser assinalada através da utilização dos avisadores sonoros e luminosos especiais referidos, respectivamente, nos artigos 22.º e 23.º.
4 – Caso os veículos não estejam equipados com os dispositivos referidos no número anterior, a marcha urgente pode ser assinalada:
a) Utilizando alternadamente os máximos com os médios ou,
b) Durante o dia, utilizando repetidamente os sinais sonoros.
(…)

Como decorre da epígrafe do artigo, ele não regula o trânsito de veículos em missão de polícia, mas o trânsito de veículos em serviço de urgência.
A circunstância de um veículo circular em missão de polícia não significa, por si só, que transita em serviço de urgência. Para que assim seja, e possa actuar a cláusula de exclusão da ilicitude prevista no artigo portanto, para que ao condutor de veículo em missão de polícia seja lícito deixar de observar as regras e os sinais de trânsito – e ainda assim, não todos, como resulta do nº 2 do mesmo artigo – é necessário, em primeiro lugar, que a natureza da missão, pela sua urgência e relevância, o exija e, em segundo lugar, que a marcha urgente seja devidamente assinalada, seja por avisadores sonoros e luminosos seja, caso aqueles não existam, por sinais de luzes e sinais sonoros.

Certamente porque estava ciente de que a circunstância de se encontrar em missão de polícia não bastava para fazer operar a cláusula de exclusão da ilicitude, e de que, in casu, não se verificavam as condicionantes supra referidas [não tendo sido alegada qualquer factualidade tendente à sua demonstração] é que o arguido, em vez de pugnar pela licitude da conduta e consequente absolvição, alegou na conclusão 3 que actuou de forma negligente e que, porque a negligência foi inconsciente, deveria permitir uma redução da medida da sanção, e a final, pediu a suspensão da sanção de inibição de conduzir.

2.2. Na perspectiva do facto, o tribunal a quo não ignorou a questão suscitada pelo arguido. Com efeito, na sentença recorrida consta como provado, e com menção de origem, digamos assim – do recurso de impugnação judicial – o seguinte facto: [5] À data dos factos, o arguido exercia funções na Brigada da Região Centro da Unidade Central de Investigação e Fiscalização e dirigia-se naquele momento a um encontro operacional no âmbito de uma investigação que se encontrava a realizar. Facto este que resulta do alegado pelo arguido no artigo 6º do recurso de impugnação judicial.
Mas a circunstância de, como se provou, o arguido se dirigir para um encontro operacional, mesmo que se admita tratar-se de uma missão de polícia, não permite concluir pelo grau de urgência necessário à justificação da inobservância das regras de trânsito [aliás, alegando o próprio arguido, no referido artigo 6º, que o encontro era com outros inspectores da ASAE, da Unidade Central de Investigação, de Lisboa e do Porto, para desenvolver uma acção que ocorreria tempos depois e que terá sido de considerável envergadura e resultado, a chegada ao encontro com atraso não poderia nunca colocar em causa o êxito da futura acção]. 

Na perspectiva do direito, ainda que a sentença não afirme claramente a não verificação da cláusula de exclusão da ilicitude – não tendo sido, como supra se disse, alegada, sempre vigoraria a máxima, jura novit curia – certo é que considerou o facto em referência como relevando para a graduação da culpa, para efeitos de determinação da medida da sanção acessória [lê-se na sentença, a fls. 94, «Por seu lado, a culpa do arguido/recorrente afigura-se-nos ser de grau médio, contribuindo apenas para a atenuar o facto de se dirigir a uma diligência de investigação no âmbito das suas funções.».].

Assim, tendo o tribunal a quo conhecido da questão de facto suscitada, e tendo dado à mesma uma relevância jurídica ao nível da culpa, portanto, uma relevância jurídica distinta da pretendida pelo arguido, e mencionada na conclusão 7ª do presente recurso [cláusula de exclusão da ilicitude, apesar de na conclusão 4ª se alegar que «por tal circunstância se encontrar isento de culpabilização pelo seu comportamento.»], não subsistem dúvidas de que se pronunciou sobre a concreta questão suscitada pelo arguido, quer na perspectiva do facto, quer na perspectiva do direito, embora, quanto a este, de forma demasiado sintética.

Em conclusão, não padece a sentença da nulidade – omissão de pronúncia – prevista no art. 379º, nº 1, c), do C. Processo Penal.

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Tal como se entendeu na sentença recorrida, a factualidade apurada não preenche a previsão do art. 64º, nº 1, do C. da Estrada.
A medida da sanção acessória aplicada arguido foi determinada com observância dos critérios legais.
A natureza da contra-ordenação praticada pelo arguido, qualificada como muito grave, não permite a suspensão da execução da sanção acessória, que só se encontra prevista para as contra-ordenações graves (art. 141º do C. da Estrada).

Assim, deve ser mantida a sentença recorrida.


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            III. DECISÃO

              
Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmam a sentença recorrida.

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            Custas pelo arguido, fixando-se a taxa de justiça em 3 UCS. (art. 93º, nº 3, do RGCOC, art. 513º, nº 1, do C. Processo Penal, art. 8º, nº 9, do R. Custas Processuais e Tabela III, anexa).

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Coimbra, 27 de Novembro de 2013


 (Heitor Vasques Osório -  Relator)

 (Fernando Chaves)